5. Julia

1164 Words
Fomos para o quarto quase em silêncio. O corredor curto, os passos apressados, os toques cada vez mais ousados. Ele me encostou contra a parede antes de chegar na cama. Beijou meu pescoço como se já soubesse que ali eu perdia o controle. — Você tem cheiro de coisa errada. — murmurei, quase sem voz. — E você tem gosto de mulher que vai me deixar maluco. A forma como ele dizia as coisas me fazia derreter por dentro. Não era só o que ele dizia. Era o como. O tom. O olhar. Era como se tudo nele dissesse: "Você é minha agora." Chegamos na beirada da cama e ele me deitou com cuidado. Os olhos escorriam pelo meu corpo como se decorassem. Tirou a própria camisa com um puxão só. Tinha o peito marcado, várias tatuagens escondidas e músculos definidos, mas não exagerados. Era o tipo de corpo que parece ter sido esculpido pela vida, não pela vaidade. Subiu sobre mim devagar. Os beijos agora iam da minha boca até meu queixo, pescoço, clavícula. Cada ponto que ele encontrava, ele beijava como se estivesse aprendendo. Eu gemia baixo, tentando conter, mas o corpo já traía qualquer tentativa de controle. Minhas mãos desceram até a barra da minha própria blusa e ele me ajudou a tirar. O sutiã caiu logo depois. Quando os lábios dele tocaram meus s***s, perdi completamente o fôlego. A língua era quente, paciente. O toque, ao mesmo tempo firme e respeitoso. Ele alternava entre o carinho e a pegada, como se soubesse exatamente quando meu corpo queria um ou outro. Meu jeans foi embora com a pressa de quem não aguentava mais. A calcinha caiu logo depois. Ele me olhou ali, nua, com um olhar que não era só de desejo. Tinha reverência. Tinha fome. Tinha algo mais. — Tu é linda pra c*****o. — disse, com a voz mais rouca do que antes. — Fala menos. — pedi, puxando-o de volta pra mim. Ele tirou a própria calça, e quando me penetrou, meu corpo arqueou. Era quente, intenso, fundo. Ele se movia como se me conhecesse. Como se já tivesse estado ali antes, mesmo que nunca tivesse. Foi naquele exato momento que eu me perguntei o que tinha de bom naquele casamento. Rodrigo não conseguiu fazer durante anos juntos, o que o esse garoto fez de primeira. Os movimentos começaram lentos. Depois foram aumentando. Eu gemia, ele também. O quarto estava quente, úmido, cheio do cheiro de nós dois. Era suor, saliva, pele e algo que eu não sabia nomear, mas que me fazia sentir viva como há muito tempo eu não me sentia. Ele dizia meu nome no meu ouvido como se fosse uma oração. E quando chegamos juntos ao fim - quase ao mesmo tempo, como se fôssemos corpo e corpo, não dois - eu entendi. Entendi o porquê do medo. O porquê da tensão. O porquê da Vera não dizer o nome dele. Era perigoso. Mas eu queria de novo. Queria mais. Queria ele. Depois, ficamos deitados lado a lado. Suados, ofegantes. Eu com a cabeça virada pro teto. Ele com o braço jogado sobre a barriga, como se ainda sentisse meu peso ali. Ninguém disse nada por um tempo. E o que eu não queria admitir em voz alta... o silêncio gritava por mim. Eu estava fodidamente perdida. E talvez... exatamente onde queria estar. [...] O sol já invadia o quarto quando abri os olhos. Por um segundo, pensei que tivesse sonhado. Que o calor, os toques, os gemidos abafados no travesseiro tinham sido parte de alguma fantasia adormecida. Mas aí senti. Meu corpo doía nos lugares certos. Havia marcas. Vestígios. Um cheiro diferente no lençol. Na minha pele. No meu travesseiro. E a ausência dele. Virei de lado, ainda de olhos fechados, procurando com a mão aquele calor que esteve ali por horas. O espaço estava frio. O travesseiro ao lado afundado, mas vazio. Kay não estava mais ali. Fiquei imóvel por alguns minutos. O quarto em silêncio, a cidade acordando devagar lá fora. Um cachorro latia ao longe. A chaleira da vizinha apitava. Os sons da rotina voltando. Depois de tudo, depois de deixar que ele me tocasse como ninguém tinha tocado em meses, depois de esquecer os limites que eu mesma me impus, depois de cruzar aquela linha tão tênue entre o certo e o que me fazia sentir... eu achei que acordaria arrependida. Mas não. Havia um sorriso nos cantos da minha boca que eu não conseguia controlar. Um calor no peito. Um silêncio leve, quase bonito. Não era sobre ele. Não só. Era sobre mim. Sobre o que eu permiti. Sobre ter sentido. Sobre estar viva de novo. Levantei devagar, o corpo reclamando em alguns pontos, os pés frios no chão. Fui até o banheiro, encarei meu reflexo. Cabelo bagunçado, olhos ainda marcados pelo sono. Mas havia algo diferente. Um brilho discreto. Uma espécie de paz. Tomei banho com calma. A água quente me ajudou a acordar por dentro. Cada gota escorrendo parecia limpar não só a pele, mas o peso das últimas semanas. Saí, vesti a primeira roupa limpa que achei. Calça de tecido leve, blusa branca simples. Prendi o cabelo num coque. Um batom discreto. Um brinco pequeno. Não tinha necessidade de capricho. Mas havia vontade de estar bem. De manter aquela sensação boa por perto. Fui até a cozinha. A cerveja vazia dele ainda estava na pia. Me apoiei com os dois braços no balcão e olhei a lata por alguns segundos. Peguei minha bolsa, as chaves, e desci os degraus do prédio com passos firmes. O morro estava cheio de vida, como sempre. Vendedores abrindo as barracas, música alta saindo de uma casa com a porta aberta, crianças com uniforme correndo pro colégio. E eu no meio de tudo isso, sentindo que pela primeira vez em muito tempo, eu estava... inteira. Quando passei pelo beco que leva ao núcleo, quase olhei pro canto onde Kay tinha acendido o cigarro na noite anterior. A sombra ainda estava lá, mesmo sem ele. Mas não me deixei prender e seguir. Vera já estava na sede, como sempre. Sentada com os papéis no colo, discutindo orçamento com uma das coordenadoras. Quando me viu, levantou os olhos por cima dos óculos. — Tá viva? — Por enquanto. — Assenti, tentando esconder o sorriso que ameaçava escapar. — Tá com uma cara diferente. — Cabelo preso. — brinquei. Ela não insistiu. Mas me olhou por um segundo a mais do que o normal. Como se visse alguma coisa por baixo da superfície. Como se sentisse. Desviei, sentei à mesa e comecei a organizar as fichas do dia. As vozes, os risos das crianças, o barulho da rua entrando pelas janelas... tudo parecia mais leve. Como se o mundo tivesse mudado de cor, mesmo que ninguém soubesse, só eu. Talvez fosse passageiro. Talvez eu me arrependesse depois. Talvez ele nunca mais aparecesse. Mas agora? Agora eu estava bem e eu queria continuar assim.
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD