Camila Volta a Atacar

1145 Words
O silêncio que veio depois da tempestade parecia um descanso. Mas era só a calmaria antes de um novo golpe. Eu deveria ter previsto. Camila nunca perde fácil. Mulheres como ela não suportam ser esquecidas, muito menos substituídas — ainda que apenas nas manchetes. Na manhã seguinte ao meu pronunciamento, as redes sociais estavam divididas. Metade me defendia, metade me atacava. E no meio desse caos, alguém reapareceu com mais força do que nunca. Camila Duarte. A mulher de sorriso calculado e veneno na língua. A ex-namorada que sabia transformar uma mentira em espetáculo. A primeira bomba veio por uma entrevista. Um vídeo, espalhado como fogo nas redes. Camila sentada num estúdio, maquiada, elegante, com o olhar sereno e o tom ensaiado de quem sabe manipular corações. “Eu só quero que a verdade venha à tona. Eu e Leonardo nunca deixamos de nos falar. Quando ele se casou, foi... um momento complicado. Ele me contou que não era amor, e sim uma questão de negócios. Que ele estava sendo chantageado.” As palavras saíam suaves, mas cada uma delas era um punhal. Senti o chão sumir sob meus pés. “Eu não quero causar dor a ninguém. Mas não posso fingir que não existo. Ele nunca quis esse casamento. Todos sabem disso.” Parei o vídeo. Minhas mãos tremiam. O sangue fervia. A raiva subiu feito fogo. — Chantageado… — murmurei. — Então agora eu sou a chantagista? O telefone tocou. Era Helena. — Filha, não veja mais nada — pediu. — Isso é baixaria. — Eles estão me pintando como uma criminosa, mãe. — A verdade vence. — Só quando alguém se importa com ela. Helena suspirou. — E ele? — Ele não ligou. — Nem vai. — A voz dela ficou triste. — Porque o orgulho é a muleta dos covardes. Fechei os olhos. Ela estava certa. À tarde, o portal da empresa dele publicou uma nota oficial. Eu li, e cada palavra me arrancou o ar. “O Grupo Valença esclarece que a vida pessoal do Sr. Leonardo Valença não interfere nas suas responsabilidades profissionais. As alegações recentes de sua esposa sobre sua vida conjugal não refletem a realidade. Pedimos respeito e privacidade neste momento.” “Não refletem a realidade.” A frase se repetiu na minha mente como um eco c***l. Leonardo havia permitido — ou mandado — publicar aquilo. Ele tinha acabado de me desmentir diante do mundo. Mais uma vez, me tornando a vilã da própria história. As câmeras voltaram a aparecer no portão. Mas agora, os flashes vinham acompanhados de risadas e comentários venenosos. “Ei, Isabella! Dizem que você inventou essa gravidez pra prender ele!” “Camila disse que o bebê nem pode ser dele!” “Acha justo destruir a reputação do CEO mais importante do país?” As palavras deles me atravessaram como tiros. Tentei manter o olhar firme, mas o peito ardia. Abaixei a cabeça e entrei de volta em casa. As portas se fecharam, abafando o barulho — mas não o peso da humilhação. Horas depois, recebi um envelope. Sem remetente. Dentro, fotos impressas. Leonardo e Camila. Num restaurante, num hotel, num carro. Algumas recentes, outras antigas. E uma frase escrita à mão: “Ele sempre foi meu.” Senti as mãos gelarem. O ar sumir. A garganta fechar. Aquelas fotos eram o recado que ela queria me dar: você nunca teve lugar aqui. Sentei no chão da sala, o envelope aberto ao meu lado. As lágrimas caíram, pesadas, silenciosas. O bebê se mexeu dentro de mim, como se sentisse o impacto. Toquei o ventre, tremendo. — Desculpa, meu amor… — sussurrei. — Você não merecia nascer nesse inferno. O choro veio forte. Não o tipo bonito, de novela. O verdadeiro — aquele que rasga por dentro. Quando o telefone tocou, eu ainda chorava. Atendi sem olhar o número. Era ele. — Isabella. A voz dele era fria, controlada. Mas eu ouvi o incômodo. — Veio se certificar de que eu vi as fotos? — perguntei, amarga. — Não sei do que está falando. Ri, entre soluços. — Claro que não. Sempre o mesmo discurso: inocente, racional, distante. — Eu só liguei pra saber se você está bem. — Depois de desmentir tudo publicamente? — gritei. — Depois de me deixar parecer uma mentirosa diante do país inteiro? — Eu precisava proteger o nome da empresa. — E o da mulher que carrega o seu filho, quem protege? Silêncio. — Você sabe que Camila mente. — E mesmo assim deixou ela vencer de novo. Ele suspirou, irritado. — Você não entende o que está em jogo. — Eu entendo, Leonardo. — minha voz saiu firme. — O que está em jogo é o seu orgulho. Sempre foi. — Isabella… — Não. — interrompi. — Agora é minha vez de falar. A raiva se transformava em coragem. — Eu fui humilhada, abandonada e agora difamada. E você, o homem que jurou me proteger, virou cúmplice do meu silêncio. Mas sabe o que é pior? Eu ainda te amava até ontem. Do outro lado da linha, ele ficou mudo. — Parabéns, Leonardo. — continuei. — Você conseguiu matar o que ainda restava de mim. E desliguei. A noite caiu. A casa estava em completa escuridão. Sentei no chão do quarto, as costas contra a parede, o envelope com as fotos ainda nas mãos. A dor era tanta que o corpo parecia não caber nela. Fechei os olhos e deixei as lágrimas correrem em silêncio. Mas quando o cansaço venceu, algo mudou. Entre o choro e o vazio, um pensamento me atravessou: isso não pode ser o fim. Eu toquei o ventre de novo, mais forte. — Você vai nascer, meu amor. E vai saber quem eu fui. Não a mulher que ele destruiu, mas a que aprendeu a se reconstruir. Levantei devagar, o corpo tremendo, mas a alma acendendo. Fui até o espelho. O rosto inchado, os olhos vermelhos — mas havia algo novo ali. Um brilho. Determinação. Peguei o diário e escrevi, com letras firmes: Hoje, Camila venceu uma batalha. Mas a guerra ainda é minha. Porque nenhuma mentira sobrevive quando uma mulher decide falar por si. Fechei o caderno. Olhei pra janela. Lá fora, a chuva começava outra vez. Mas, pela primeira vez, eu não a temi. A chuva não era mais o som da dor — era o batismo da minha nova versão. Sorri entre lágrimas. — Você mexeu comigo, Camila. Mas não me derrubou. Deitei, abracei o travesseiro e sussurrei pro bebê: — A mamãe não é fraca. Só estava aprendendo a se tornar forte. O coração batia firme. E, pela primeira vez em muito tempo, o medo deu lugar a algo diferente. A raiva virou combustível. E a dor, propósito. Porque se o amor tinha me destruído… agora seria a minha própria força que iria me salvar.
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