Lili Harris
Eu encaro o meu reflexo através do enorme espelho à minha frente e fico sem expressão alguma enquanto me perco nos meus pensamentos. Hoje é o meu casamento. É hoje que me tornarei Liane Baldoni, esposa de Alex Baldoni que nunca vi nem por foto.
Toda vez que penso nesse ponto, eu sinto um frio na barriga.
Eu não tenho mais como fugir nem se eu quisesse. Já assinei tudo me vendendo e a culpa disso é de Flávio. Aquele louco estragou a minha vida e por coisa dele, ficarei presa para sempre a uma pessoa que não faço ideia de como seja. E se ele for explosivo? E se ele for arrogante? Um alcoólatra? Um bruto? E se ele for agressivo? E se ele me machucar?
Já era pra mim. Estou condenada!
A minha imagem me mostra quase pronta. Eu estou já dentro do vestido de noiva, com os saltos adequados e maquiagem feita. Só falta os cabelos, o véu e o buquê. O vestido ficou adequado nos ajustes e por mais que não seja um ideal para mim, ele é apropriado. Longo, básico, comportado e branco. É mais que suficiente.
— Sente-se aqui. Vai ser mais fácil para eu modelar. — Dina me pede e eu me sento na cama. — Você não tem falado nada, Liane... estou preocupada. — Eu apenas suspiro fundo e forte. — Você vai ficar bem... o senhor Gustavo não iria ter o trabalho de cuidar e proteger você para ser machucada... não faz sentido.
— Nada faz sentido há muito tempo... — Eu decido falar. — Não lembro quando algo fez sentido. — Ela não rebate. — Eu estava tão assustada que... nem li o documento todo.
— Não leu? Sério? — Eu confirmo. — Que loucura... agora não tem mais jeito, Liane.
— Não... não tem. E nunca teve... — Os meus ombros caem. — Eu estou presa pra sempre... com um homem que não sei nada além de ser rico e ocupado.
Nessa hora, Caramelo passa nas minhas pernas e eu o pego nos braços. Eu fico com ele aqui fazendo um carinho na sua barriga e ele fica todo à vontade. Então, Dina começa a preparar os meus cabelos.
Ontem eu tive uma sessão leve de cuidados. Fiz as unhas, uma depilação completa que quase me fez morrer pela dor, uma massagem rápida e teve as sobrancelhas. Os meus cabelos estão normais e eles estão bem comportados. Dina trouxe uns produtos ótimos que desmaiou os fios. Então, em uma hora, eu irei ser levada a um cartório que foi reservado para o casamento e em seguida, serei levada à Londres.
É, Alex conseguiu reservar um cartório completo. Sinal de que dinheiro e poder é algo que pertence a ele.
Não falamos mais nada aqui, mas noto um olhar preocupado dela através do espelho. Caramelo aqui fica bem comportado, mas eu decido soltá-lo ao notar que ele quer arranhar o meu vestido.
— Dina... eu quero levá-lo comigo. Como faço? — Eu me refiro ao meu gato.
— Eu cuido disso! A caixa de transporte dele está aqui e quando formos, eu deixo no carro com os homens. — Eu fico aliviada.
— E... você vai comigo? — Ela me olha pelo espelho. — Ao casamento e para Londres... irá?
— Desculpe... o meu trabalho é aqui! Eu trabalho diretamente para o senhor Gustavo e ele não mencionou nada. — Eu murcho mais ainda. — E... o pouco que eu tenho... é aqui. Não tenho nada em lugar algum. E-eu sinto muito. — Eu apenas aceno.
Então, o que vou ter de conhecido na minha nova casa será apenas Caramelo. Somente!
Eu vou passar por mais um processo de conhecer pessoas. A governanta, funcionárias, seguranças e claro, o meu marido. Não vou poder confiar em alguém por muito tempo. são nesses momentos que chego ao ponto de questionar o motivo de eu ter nascido. De verdade, por quê? Eu sinto que nunca vivi nada e já sou uma adulta.
Eu nunca pude escolher nada, decidir nada e ir a lugar algum.
Os meus problemas seriam muito bem resolvidos se Flávio morresse. Por que ele não morre de vez? Até recentemente, eu nunca desejei a morte de uma pessoa, mas depois daquele ataque, eu mudei os meus conceitos. Eu quase morri! Então, ele sendo uma pessoa rüim, por que o universo não me ajuda?
Um infarto estava ótimo!
É, eu tenho pensado mesmo nisso e ainda tem aquela frase que Gustavo falou.
“Você conheceria o infernö na terra!”
Eu não faço questão de conhecer e por isso, quando coloquei na balança, eu achei que me casar agora poderia ser “melhor”. Eu nunca tive opção e não seria agora que eu teria. Quem sabe, depois do casamento, eu ainda tenha um tempo para conhecer o meu marido antes de me entregar.
Eu não paro de lembrar desse momento. Consumação!
Eu aposto que ele é um homem muito experiente. Com certeza já deve ter feito de tudo e eu não conheço quase nada. Sou virgëm? Não, mas não sou a pessoa que sabe de tudo. só fiz sexö duas vezes que mais se consideram uma. Então, eu não sei de nada. Mas ainda há um peso enorme na situação.
Como farei isso?
— Prontinho... — Eu saio dos pensamentos. — O que achou? Ficou umas mechas soltinhas aqui e acho que ficará bem com o véu.
— Obrigada... eu gostei! — Ela sorrir. — Se puder, queria que estivesse ao menos lá.
— Eu vou tentar, querida. — Eu agradeço.
Eu gostei e gosto da Dina. Ela tem um jeito tão doce e tão prestativo e claro, um jeito tão paciente. Ela é incrível! Ela pede licença e fico aqui no quarto olhando o buquê de flores. Eu nem preciso disso, mas trouxeram. Eu fico de pé dando uma olhada em mim e não vejo nada de errado, a não ser a minha expressão. Não há nada leve e não há a presença de sorriso algum.
Eu não pareço nada com uma mulher que vai se casar. O vestido não é o principal atributo.
É a felicidade e não há nada como isso aqui. Não tem nada que me faça mudar essa expressão e, eu acredito que, se ainda hoje viesse a notícia de que Flávio está mortö, eu não sairia dessa já que assinei tudo. Algo pode quebrar um contrato? Eu não entendo nada disso.
Dina volta pouco depois com uma bandeja contendo duas xícaras de chá e tomamos aqui juntas na tentativa de acalmar.
Mas, nada será possível.