- TRANSMUTAÇÃO!

1622 Words
Ponto de vista de Logan Teresa, ainda tremendo, tenta recuperar o fôlego. Quando finalmente se recompõe, assente com a cabeça, como se reconhecesse que havia cruzado um limite perigoso. Mas então… algo nela muda. Como se fosse outra pessoa, sua postura se altera e, com uma ousadia inesperada, ela cutuca Kira no ombro. — Você realmente não quer saber o que é? Quem foi um dia? A resposta de Kira vem sem hesitação, sem emoção, como se a pergunta sequer fizesse sentido: — Não. Quem eu fui ficou no passado. Não me importa. Se deixei de ser, é porque eu era fraca. Quem eu sou agora é o que me define. E o que quero ser no futuro é o que realmente importa. Teresa estreita os olhos. Algo dentro dela desperta, uma indignação crua e sem filtro. — E quem você quer ser no futuro? — Sua voz sai carregada de frustração. — A superarma da BioCom? Uma supersoldado da Elitech? Uma aberração viva que mata por prazer? Quem, Kira? Quem?! As palavras saem cuspidas, afiadas como navalhas, mas Kira apenas avança, sem pressa. Sem raiva. A calma dela é o que mais assusta. — Vocês parecem não ter entendido nada sobre quem eu sou. Ela solta um riso baixo, desdenhoso. Algo gélido e sem humor. — Mas tudo bem. Eu sou uma pessoa prática. Eu posso mostrar. A voz dela é de gelar a espinha. Ela se aproxima ainda mais de Teresa, até que suas mãos toquem seu rosto. Os dedos deslizam lentamente até seu pescoço, um toque que, por um instante, parece quase gentil. Mas eu vejo. Todos vemos. Dos braços de Kira, surgem apêndices biológicos, retorcendo-se como serpentes vivas. — Quem eu toco… jamais se volta contra mim, Teresa. Sua voz sai arrastada, fria como um sussurro da morte. Então, Teresa grita. Ela cai de joelhos, as mãos apertando a cabeça como se algo estivesse tentando rasgá-la por dentro. Seus olhos sangram. Seu corpo se contrai violentamente, ossos estalando de maneira grotesca. O som é doentio, como se estivesse sendo desmontada e remontada ao mesmo tempo. Me sinto dentro de um filme de terror. Ela se estica. Encolhe. Contorce-se em espasmos inumanos. O sofrimento transborda dela em ondas viscerais. De repente, seus ouvidos sangram, e então percebo algo ainda mais aterrorizante—implantes cibernéticos caem no chão, expelidos de seu corpo. Seus olhos biônicos… não existem mais. Agora, o que resta são olhos biológicos, vivos, humanos. E então, como se toda a dor tivesse sido arrancada de seu corpo, Teresa simplesmente… pára. Ela abre os olhos, mas não parece estar ali. Seu olhar está vidrado, frenético, os globos oculares se movendo de um lado para o outro, como se estivessem processando informações invisíveis a nós. Até que, de repente, tudo se aquieta. Os gritos cessam. Os gemidos desaparecem. O corpo dela relaxa, ofegante. E sob sua pele, vejo os apêndices de Kira se recolhendo lentamente, como predadores satisfeitos voltando para sua toca. O silêncio que se segue é sepulcral. E eu percebo… Kira não quebrou Teresa, não houve maldade. Ela a transformou. Kira solta um suspiro, virando-se com a expressão indecifrável. — Killey chegou. Ela caminha até a porta e a abre sem hesitação. Killey está ali, parado na soleira, observando o ambiente com olhar atento. Ele é alto, os cabelos de um castanho-claro que, dependendo da luz, quase parecem loiros. Seus olhos são claros, e há algo nele—um traço sutil, um detalhe difícil de nomear—que me faz pensar em Kira. Meu olhar oscila entre ele e Teresa, que agora se levanta do chão. Dou um passo em sua direção, instintivamente querendo oferecer conforto, mas sou surpreendido pelo sorriso que ela me dá. Um sorriso radiante. Feliz. E isso me assusta. A cena de pouco antes foi pura dor, um sofrimento que parecia insuportável. Nada ali sugeria felicidade. Então, por que ela está sorrindo assim? Kira entra na sala com passos firmes, Killey logo atrás. Há um brilho predatório em seu olhar quando ela sorri de leve e diz: — A K'Corp será apenas uma fachada. Mas teremos que ter muito cuidado, afinal, contratos são levados a sério. Se vacilarmos, podemos acabar queimados e perder acesso aos trabalhos certos. Sem isso, nunca chegaremos onde queremos. Enquanto ela explica seu plano, as engrenagens da minha mente começam a girar. Agora tudo faz sentido. Uma corporação que lida com espionagem e segurança… Uma sombra entre as sombras. Kira não está apenas construindo algo, ela quer os segredos dos outros, roubando projetos e destruindo as corporações de dentro para fora. Kira sabe que nem tudo se resume em força de combate. Mas ainda assim o que ela fez com Teresa. Algo em minha mente me inquieta. Quais seus verdadeiros planos? — Então, vamos pegar informações, roubar sob contrato e, quando tivermos acesso aos dados, decidir o que pode ou não ser repassado? — questiono, tentando entender a lógica por trás do plano. Kira me lança um olhar afiado, quase divertido pela minha ingenuidade. — Não. Somos contratados para roubar algo específico. Mas já saberemos exatamente o que estamos pegando. E quando entregarmos os dados… eles estarão modificados. Ela faz uma breve pausa, permitindo que suas palavras se assentem. — Os projetos que repassarmos estarão alterados ou protegidos por uma criptografia tão avançada que ninguém jamais conseguirá quebrá-la. Seu olhar então se volta para Analisa, que até agora permaneceu impassível, alheia ao que aconteceu com Teresa. — E para isso, vou contar com você, Analisa. A sala fica em silêncio por um instante. Analisa, antes relaxada, agora ergue levemente uma sobrancelha, um pequeno sorriso se formando em seus lábios. Kira acaba de puxá-la para o jogo. — Na verdade, estou contratando todos vocês para a minha corporação. Dessa forma, terão registros oficiais como seguranças corporativos e acesso a certos tipos de armas que normalmente são restritas aos civis. As palavras de Kira pairam no ar como uma promessa perigosa. Não posso negar—isso me empolga. Kira é absurdamente sagaz, sempre um passo à frente. Mas, ao mesmo tempo, algo dentro de mim se agita. Ela realmente não é tão submissa à BioCom quanto parece… ou será que estamos apenas sendo manipulados? Minha mente começa a vagar por um caminho que eu preferia não seguir. Um caminho onde Kira não é aliada, mas sim uma jogadora habilidosa nos usando como peças em seu tabuleiro. Mas vou esperar para ver o que o futuro nos reserva. Afinal, o futuro já é sombrio, incerto e, por vezes, crüel. Quem sabe Kira seja a mudança que está por vir... só resta saber se para o bem ou para o mäl. Talvez nem um, nem outro. Talvez seja apenas algo novo. Mas uma coisa eu sei: quero estar do lado certo. E sinto, no mais profundo do meu ser, que o lado dela é o vencedor. — Mas não se iludam — sua voz ressoa com firmeza, preenchendo o ambiente — esse caminho não será fácil. Será árduo, tempestuoso. Em muitos momentos, a verdade estará diante de nós, e ainda assim, não conseguiremos enxergá-la com clareza. Mas juntos... seremos maiores. Seremos melhores. Enquanto ela fala, minha atenção se fixa nela. E então eu vejo. Um brilho avermelhado, sutil, profundo, que reluz no fundo de seus olhos por um instante. Meu coração dispara. Olho ao redor, mas ninguém parece notar. Apenas eu. E não é só isso. Quando aquele brilho surge, percebo uma mudança sutil em Teresa e Jair. Algo imperceptível para os outros, mas claro para mim. A forma como eles reagem, um reflexo quase involuntário. Um leve tensionar dos músculos. Um instante de sincronia perfeita com Kira. Meu corpo começa a tremer, um frio gélido subindo pela espinha. Um homem como eu... tomado pelo medo. Então é isso que Kira pretende? Como se pudesse ouvir meus pensamentos, ela se aproxima lentamente, seus olhos fixos nos meus. Seu olhar é intenso, penetrante, como se sondasse algo dentro de mim que nem eu mesmo compreendo. Um sorriso enigmático se forma em seus lábios antes que ela murmure: — Logan... não se preocupe. Quando recebem o meu toque, tudo faz sentido. Tudo muda. As cores se tornam mais vivas, a vida ganha um novo propósito. Sua voz é baixa, suave, quase hipnótica. — E não pense que são meus escravos. Eles não são. Têm vontade própria... apenas não querem ir contra mim. Afinal eles despertam para o que realmente importa. Ninguém mais parece notar a gravidade dessas palavras. Mas eu sei. Kira não pede lealdade. Ela a cria. Eu apenas assinto com a cabeça, e Kira se afasta lentamente, sem pressa, como se soubesse que sua presença já havia deixado a marca necessária. Ivan se aproxima ao lado de Iara, interrompendo o momento com sua voz despreocupada: — Aí, cambada, pedi comida! Tô morrendo de fome. Vocês ficam aí falando, falando... e nada de comer. Iara solta uma risadinha, lançando um olhar de admiração para ele. Ah... essa aí tá caidinha. Enquanto isso, Teresa se aproxima de mim. Mas algo nela mudou. Diferente do instante em que descobriu que Killey era Chang, agora ela parece... indiferente. Não há mais aquele brilho de choque ou hesitação. Como se isso simplesmente não importasse mais. Será que era disso que Kira falava? Esse tal "despertar" que ela mencionou? Olho de relance para Killey, que permaneceu em silêncio o tempo todo. Mas há algo diferente nele. Ele não é como Teresa e Jair. Killey e Kira... não estão ligados. Ele é algo à parte. Um produto. Algo fabricado. Uma tentativa de cópia de Kira, segundo os documentos que recebemos sobre ele. Mas cópias nunca são perfeitas. E isso me faz pensar... Será que ele sabe o que realmente é?
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