Capítulo 2

1408 Words
⸻ Vou direto pra minha cadeira de sempre, e Luana se joga na do lado com pressa. — Não vou levantar se o Washington quiser sentar aqui. — já avisa, jogando a mochila atrás da cadeira. — Ele só senta aqui no tempo vago. Quando tem aula, ele fica lá no fundão, na bagunça. — explico. Ela concorda, ajeitando o cabelo. A primeira aula é de português, e o professor Afonso não suporta conversas durante a explicação. Eu também não gosto. Principalmente porque português é a minha matéria favorita, e gosto de prestar atenção. Por isso, não sento com qualquer pessoa. Depois entra o professor Gileno, de matemática. A matéria? Um pesadelo. Mas o professor? Um anjo. Gileno é incrível. Explica bem, tem paciência, se preocupa de verdade com a gente. Ele consegue fazer matemática parecer quase suportável. Quase. Minhas notas até melhoraram. O sinal toca e a sala inteira entra em modo de pânico: todos querendo sair correndo pro pátio. — Olha quem tá lá na porta. — Mariane sussurra quase no meu ouvido. Ergo a cabeça. Yuri. Ele tá parado bem na entrada da sala, e quando nossos olhos se encontram, ele sorri. Fico tensa. Yuri é do segundo ano, e é um fofo. Eu sei que ele tá interessado em mim, mas ainda me sinto meio travada. Ele é bonito, educado, simpático... mas será que é o meu tipo? Não sei. Talvez o problema seja eu mesma. Washington passa por ele na porta e o encara, como sempre faz com qualquer menino que chega perto de mim. Mas Yuri nem se abala. Acho que ele é o único que não se intimida com o olhar fechado do meu melhor amigo. — Ele tá muito na sua. — Cassiane canta, me cutucando. Dou um sorriso sem graça. Até que Yuri é bonitinho. Mas não sei se é o meu bonitinho. Talvez eu tenha algum bloqueio emocional. Já tô com quase 15 anos e nem um crush real? Todo mundo da minha idade já tá namorando, ficando, vivendo histórias... E eu aqui, esperando algo que nem sei o que é. — Oi. — ele diz quando a gente se aproxima. — Oi. — respondemos em coro, eu e as meninas. Ele sorri. Um sorriso tão fácil, tão leve. As meninas ficam derretidas. E ele vem direto até mim, ignorando o alvoroço, andando ao meu lado até o pátio. — Animada pro fim de semana? — pergunta, meio tímido. — Dessa vez, tô sim. — respondo. — Vai fazer algo especial? — ele me olha, esperando algo. — Vou ver minhas irmãs. Vai ter uma festa lá, todos os meus primos vão. Tô morrendo de saudade. — omito o motivo real de tanta ansiedade. — Ah, legal. — ele responde, meio desanimado, enquanto descemos a rampa. — E você? Vai fazer o quê? Ele pensa um pouco. — Vai ter uma resenha no domingo. Eu ia te chamar... mas agora que você já tem plano... — Me manda mensagem. A festa é sábado. Quem sabe? — digo, e vejo os olhos dele se iluminarem. Trocamos números e nos despedimos. O intervalo dele não é no mesmo horário, então ele só saiu da sala pra vir falar comigo. Um fofo mesmo. — Acho que vai rolar, hein. — Cassiane provoca. — Gosto dele... mas não é o suficiente. — digo, acabando com a empolgação dela. Luana para de andar de repente, me fazendo trombar nela. — Qual é, Bia? O menino tá babando por você, igual vários outros da escola. As meninas da nossa idade já estão até perdendo a virgindade, e você nem beijou colante ainda. — ela fala como se eu fosse um ET. Fico envergonhada, me encolho com o olhar julgador dela. — Deixa ela, Luana. A Bianca nem tem 15 ainda. Ela é romântica, acredita nessas coisas de amor de livro, de príncipe encantado... — Mariane tenta me defender. Mas só me faz corar ainda mais. — Não é isso. Eu só... eu só acho que tem que ter conexão. Eu não sei exatamente o que tô procurando, mas sei que ainda não encontrei. E não vou ficar com qualquer um só pra ser como todo mundo. — falo com firmeza. Luana revira os olhos e volta a andar. As outras balançam a cabeça, mas sinto que nenhuma pensa como eu. Parece que elas estão desesperadas pra serem notadas pelos meninos. Eles viraram o centro do universo. Qualquer garoto que sorria pra elas já é suficiente. E eu? Eu quero mais. Quero um sentimento que faça sentido. Não quero só um namorado por status. Pretendentes não faltam. Eu sei que não sou feia, e me olho no espelho com carinho. Mas nenhum deles passa de um rostinho bonito. Eu quero mais. O único que, talvez, me fez pensar diferente foi o Júnior — o garoto que conheci na casa da minha avó. Ele é um pouco mais velho, a conversa foi boa... e eu realmente tive vontade de beijar ele. Mas talvez isso seja só pressão da adolescência. Talvez eu esteja confundindo. Ou talvez eu só precise pagar pra ver. Lanchamos, conversamos, rimos dos meninos fazendo batalha de passinho no pátio. A fofoca corre solta até o sinal tocar de novo. Washington me espera no corredor e pendura o braço no meu pescoço, como sempre. Me dá um beijo na bochecha e vai lá pro fundão da sala. — E o Washington? Vai dizer que ele também não te interessa? — Luana pergunta, já se ajeitando na cadeira. — Claro que não. — enrugo a testa. Washington não tem nada a ver comigo. Sim, ele é meu melhor amigo, mas não serve pra namoro. Ele vive na bagunça, adora chamar atenção, e as meninas vivem brigando por causa dele. E ele adora. Washington se acha, mas elas que alimentam isso. E, sinceramente, nada disso me atrai. Temos mais matemática até, finalmente, chegar a aula de educação física. Trocamos de roupa e vamos pra quadra. — Eita, assim você me deixa doido! — Isac grita do fundão quando saio do vestiário. Fico morrendo de vergonha. Tô de cropped, quase um top, short de malhar enrolado e tênis. Minha pele n***a brilha com o suor do aquecimento, e prendo o cabelo num coque alto pra não atrapalhar no jogo. — Isso tudo é seu ou foi marimbondo que mordeu? — um menino de outra turma grita pra mim. — Ô, tá maluco? — Washington berra, me defendendo. O menino levanta as mãos, rindo. Reviro os olhos e continuo aquecendo. — Se eu tivesse toda essa atenção, pegava todos eles. — Vanessa comenta. — Claro, olha esse cabelão enrolado, essa pele maravilhosa, esse corpo perfeito. Rostinho de Barbie. Eles ficam doidos. — Andressa complementa, me fazendo sorrir. — Vocês tão me enchendo demais. Assim eu fico me achando! — digo, rindo, enquanto vamos pro nosso lado da quadra. Hoje é vôlei. A gente protestou até conseguir. Os meninos só querem saber de futebol. Mas a gente também quer se divertir! Eu adoro vôlei. Pena que minha altura não ajuda. Provavelmente sou a mais baixinha da turma. Mas sou rápida e dou trabalho. Jogamos, rimos, e depois deixamos os meninos jogarem a bola deles, só pra calarem a boca. Quando a aula termina, estamos mortas. — Quem vai querer tomar banho? — pergunta a professora Juliana. — Eu vou tomar em casa, professora. — respondo, já pegando a mochila. Marciele me manda um SMS avisando que tá me esperando no portão. Me despeço da galera e desço correndo. No pátio, ouço assobios e "que isso, hein!" pra todos os lados. Nem me dou ao trabalho de olhar. — Adora chamar atenção, né? — Marciele balança a cabeça, me esperando. — Se eu tomasse banho e trocasse de roupa, você ia reclamar. — faço cara feia. Ela retribui. Marciele é como uma irmã. Quando éramos pequenas, minha mãe fazia a gente usar roupa combinando. Achávamos o máximo. Até começar a brigar porque uma "roubou" a roupa da outra. Mas de parecidas mesmo, a gente não tem nada. Ela é loira, cabelo liso até o ombro, rosto fino, nariz pequeno e boca delicada. Eu sou n***a, rosto mais afilado, lábios carnudos, nariz achatadinho, cabelo enrolado até o meio das costas e olhos puxados. A semelhança entre nós não tá na aparência — tá na criação. No jeito de ser. E só por isso... a gente é como irmã mesmo.
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