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1465 Words
ALEX NARRANDO Nunca pensei que eu, as sete da manhã, estaria numa rodoviária fazendo uma gambiarra pra conseguir falar com a minha mãe. Pedi um telefone qualquer emprestado, e quando ela atendeu, dei graças a Deus mentalmente. — Alô? — Mãe. — Ela começou a chorar do outro lado da linha. — Você me deixou semanas sem notícias! Eu achei que você tivesse morrido, seu cretino! — Eu ri comigo mesmo. — Tá tudo bem, senhora Quinn. Eu tô vivo e inteiro. Tá tudo bem aí? — Claro que não! Todo mundo tá louco atrás de você, tá sendo um inferno! — Mãe, eu não tenho muito tempo. Esse celular é emprestado. Eu tô precisando urgente de uns duzentos dólares, preciso fazer uma coisa. Consegue me ajudar? — Ela ficou quieta por alguns instantes. — Posso. Como eu mando pra você? — Eu não sei. Eu só preciso de uma noite em um hotel e roupas, mãe. Amanhã vou procurar emprego junto com uma amiga. Você conseguiria ajudar com isso? — Onde você está? — Ela questionou. Tive medo de responder, mas preciso de ajuda. — Inglaterra. — Filho da p**a. — Rosnou. — Vai para o hotel Pallace, no centro. Eu tenho um contato lá e te mandarei o dinheiro por esse contato. Procure por Olga. — Certo. — Filho? — Sim, mãe. — Eu te amo. — Minha mãe quebra meu coração. — Também te amo, mãe. Devolvi o celular para a pessoa que me emprestou e vi Maya sentada em um banquinho da rodoviária. — Oi. — Ela olhava para os próprios pés, mas me olhou ao ouvir. — Vamos vazar daqui. — Conseguiu falar com teu contato? — Consegui. Vamos ao Pallace. É o contato do meu contato. — Maya se levantou e cruzou os braços. — Para de falar em código! Parece que tô falando com alguém da máfia, credo. — Se ela soubesse... — É porque eu sou um mafioso. Vem logo, capitão caverna. Eu e Maya andamos por dois ou três quilômetros pela cidade. Dois idiotas com dezessete anos perdidos no mundo, completamente sozinhos, buscando melhorar de vida. Eu nunca achei que fosse ser assim. E bom, aparentemente, eu estou caminhando ao lado de alguém que me detesta. — Desfaz essa cara, Maya. — Eu disse, me referindo a cara séria que fazia. — Por quê? — Tá assustando as pessoas. — Brinquei. Ela girou os olhos. — Eu não acho que as pessoas estejam com medo de uma menina de um metro e meio. Talvez o problema seja o garoto todo tatuado, com cabelo m*l pintado de preto andando com cara de pitbull ao lado dela. — Ela sorriu de forma irônica. — Pitbull e capitão caverna. Gosto dos nossos apelidos carinhosos. — Ei, aquele é o hotel? — Apontou e eu concordei. — Sim, vamos. Preciso falar com uma tal de Olga. Segurei Maya pelo braço para atravessar a rua. Ela pode ser um porre, mas estamos juntos nessa, então, eu sinto que devo protegê-la. — Bom dia... — O recepcionista me olhou de cima a baixo. Um hotel de alto luxo como aquele não deve receber clientes como... Bom, nós dois. De fato, se eu estivesse com meu pai aqui, os olhares seriam outros. — Bom dia. Preciso falar com Olga. — Ele me olhou mais uma vez com superioridade. Aquilo estava me irritando, mas mantive a calma do jeito que dava. — Poderia parar de olhar para as minhas tatuagens e fazer o que eu pedi? — Desculpe. — Ele pegou o telefone e começou a discar. — Olga? Acho que as crianças que você está esperando chegaram. Certo. Maya parecia encantada com o hotel. Seus olhos se vidravam nas lindas obras de arte nas paredes, e vez ou outra ela sorria consigo mesma. É chato admitir, mas a Maya é linda. — Sim? Oh! — Olga veio em direção a mim, com os braços abertos. Me abraçou com força e eu retribuí meio que por educação. Ela é baixinha, gordinha e muito fofa. — Você quer matar sua mãe do coração, garoto? — Qual é, ela quem me ajudou a fugir. — Olga me soltou. — Mas era pra você mandar notícias. Ela me ligou várias vezes perguntando se eu tinha ouvido falar de um garoto como você andando por aqui. Aliás, eu sou a Olga, conheci sua mãe em uma viagem... Ela é uma pessoa maravilhosa. — Que bom que gosta dela. Ela é uma pessoa boa. — No momento, não sei se a considero assim. Que mãe boa quer casar o filho com uma estranha? — Oi. — Maya se aproximou de nós e esticou a mão para Olga, que a cumprimentou também. — Sou Maya. — Oi, querida. — Ela sorriu e depois virou para o recepcionista. — Eu preciso dar uma saída, em umas duas horas eu volto. Venham comigo vocês dois. — Certo. Andamos até um carro bonito, e entramos junto com ela. Ela dirigiu durante dez minutos e estacionou na frente de um prédio simples que se misturava a paisagem da rua. Gosto do tom vermelho terroso que ele está pintado. Ao entrarmos, vi que era ainda mais bonito por dentro. A casa de Olga é cheia de obras de arte, percebi que é uma colecionadora e não duvido que metade dessas coisas tenham sido mercadorias do meu pai. — Bom, eu vou deixar vocês ficarem com o quarto da empregada, já que ela se demitiu na semana passada e não vem mais. — Eu e ela olhamos um para o outro e concordamos. — Tem um banheiro lá... — Ela foi caminhando com a gente, abriu a porta do quarto e nos mostrou. A cama era de casal. Maya arregalou os olhos. — Tem um colchão extra? Desculpa se for pedir demais. — Maya disse e Olga negou. — Não tenho, mas posso pedir para meu filho trazer. Ele vem pra cá no final de semana. — Muito obrigada, eu agradeço. — Agora, vocês dois... — Olga tirou a carteira da bolsa e pegou cerca de duzentos dólares. — Tua mãe me mandou dois mil dólares pra você. Pega esses duzentos, compre uma roupa decente e pinte esse cabelo direito que está um horror. — Mais uma pra falar do meu cabelo. — Certo... — Respondi. — Maya, né? — Olga falou, olhando para Maya. — Isso. — Eu consigo um trabalho pra você na cafeteria do hotel durante duas semanas. Uma das garçonetes está afastada porque quebrou a perna. Acha que ajuda? — Com certeza. Nossa, com certeza mesmo. — Maya sorriu. — Não é muito, são cento e vinte dólares por semana e as gorgetas são suas. Você vai tirar uns duzentos na semana, contanto com as gorgetas. — Está ótimo, dona Olga. Se você quiser eu começo hoje e... — Ela interrompeu. — Não, hoje vocês precisam se livrar dessas roupas velhas e voltarem a parecer pessoas que moram na civilização, não em uma... Caverna. — Eu caí na risada. Maya cruzou os braços. — Falei que você era o capitão caverna. — Comentei, rindo. Ela me olhou feio, mas prendendo a risada. — Bobão. — Vai, Maya, vamos arrumar logo nossa vida. — Coloquei os duzentos dólares no bolso e a puxei pelo braço. — Obrigado, dona Olga. — De nada, querido. Ah! — Ela foi até um pequeno balcão na sala e tirou uma chave. — A cópia da chave da minha casa. Se vocês aprontarem ou estragarem qualquer coisa, eu mato vocês dois. — Agressividade aleatória, típico de pessoas instáveis que se relacionam com meus pais. — Não se preocupe, não vamos tocar em nada da sua casa além do quarto, é óbvio. — Garanti. E agora, finalmente, nós tínhamos onde dormir e tomar banho. Quando Olga saiu, Maya respirou fundo e cruzou os dedos, fechando os olhos. — Obrigada, Jesus. Obrigada por ouvir minha oração. — Tá falando com seu amigo imaginário? — Ela abriu os olhos e me olhou feio. — Ele não é imaginário. Às vezes eu sinto que Ele não me ouve e brigo com Ele... E duvido da existência... Mas Ele existe. — Eu concordei com a cabeça. — Por isso a cruz. Você é católica. — Ela negou com a cabeça. — Mais ou menos. É difícil de explicar. Eu estudei a vida toda em uma escola católica, sabe? Internato. Mas enfim, eu não quero falar sobre isso. — Tudo bem, a gente fala do seu amigo imaginário depois. — Brinquei e saímos andando. Por algum motivo, sinto que minha vida está começando agora. Por mais que eu esteja cheio dos perrengues, nervoso com algumas coisas... Tudo parece tão melhor do que estava na minha casa... Seria a independência que estou garantindo em mim?
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