TRÊS ANOS DEPOIS
—Não tenho certeza se devo ter pena ou inveja de você. Disse Tiphany, pensativa, enquanto espionamos a festa oferecida para os pais jardim. Da varanda acima, ela olhou para os ombros impecáveis de Christian e bateu com o piercing da língua nos dentes da frente. — Me diga. É uma coisa boa ter Christian Henderson como pai?
Suspirei. — Ele é meu guardião legal. Isso não faz dele o meu pai.
—Ele pode muito bem gostar de toda a diversão que você pode dar a ele, você deveria tentar. Há quanto tempo você mora com ele?
Eu a corrigi. — Eu não moro com ele.
Inclinando-me sobre o corrimão, fixei meus olhos em Christian. Quando olhei para o seu rosto, o seu misterioso rosto, senti a minha determinação endurecer. Meu tempo com ele estava quase acabando. Quando eu completasse dezoito anos e me formasse no ensino médio, ele me libertaria. Eu estava quase terminando o terceiro ano e a realidade de que precisava mudar drasticamente o nosso relacionamento pairava sobre mim.
Era hora de parar de fazer o que ele queria. Isso, por si só, seria difícil. Tive imenso prazer em fazer exatamente o que ele sugeriu. Fiz as aulas que ele sugeriu, usei as roupas que ele achou que ficavam melhor em mim, reli as suas mensagens e pensei constantemente no que iria agradá-lo. O problema era que, se eu continuasse seguindo as suas regras, ele me manteria firmemente dentro dos limites que considerava mais confortáveis.
Esses limites não me agradavam.
Eu olhei para ele no meio daquelas pessoas e pensei em quem ele era, e no que eu havia aprendido sobre ele, durante os últimos três anos.
Como ele era? O seu cabelo era ondulado, de um tom louro-amarelado. Era bastante desgrenhado até removê-lo da testa com gel. Ele poderia parecer infantil até que sua testa ficasse exposta, e então ele parecia um homem que poderia ser suave ou implacável conforme a situação ditasse. Os seus olhos eram castanhos, mas nunca pareciam exatamente da mesma cor de antes. Era como se os seus olhos não soubessem se eram verdes, marrons ou cinzas.
A cor não importava.
Eram os olhos dele e poderiam ser de qualquer cor, que eu não me importava. Para mim, tudo nele era perfeito.
Se o humor dele estivesse bom, eu nem olhava muito para o restante. Ele tinha olhos maravilhosos que tinham o poder de me deixar excitada.
Sempre que ele falava, ele me fazia sentir como se estivesse me deixando entrar em um mundo onde só existíamos nós dois, prometendo uma proximidade deliciosa entre nós dois.
Exceto que não durava. Ele sempre ia embora.
O período mais longo que ele ficou comigo nas férias foi quando eu estava me recuperando da minha cirurgia final. Depois disso, as férias duravam no máximo uma semana. Quando estávamos de férias, eu estava no paraíso, mas o tempo sempre passava rápido. Logo era mandada de volta para a escola, ou para um acampamento de verão, ou algo destinado a enriquecer a minha vida e me manter longe dele.
Christian nunca hesitou em me mandar embora.
Eu tinha que ser protegida.
De quê? Eu sempre me perguntava.
Você poderia pensar que ele era um playboy com montanhas de mulheres que precisavam ser escondidas de mim. Mas, não era isso. Eu sabia que não era.
Eu sabia que ele namorava de vez em quando, mas não foram esses relacionamentos passageiros que o afastaram de mim.
Era o trabalho dele? Ele era diretor responsável pelo marketing internacional de uma empresa de comunicação na Inglaterra. Ele gostava do seu trabalho e era bom nisso, mas isso também não era o argumento decisivo. O problema é que esse não era o seu único trabalho. Disso eu tinha certeza.
O fato é que Christian Henderson não era o seu nome verdadeiro.
Na festa no jardim, observei ele apertar a mão do meu professor de inglês. A fachada que cobria o rosto de Christian era perfeita, como tudo nele. Era uma noite de cabelo na testa, onde a frescura da sua camisa combinada com o brilho branco do seu sorriso exalava riqueza, educação e sabedoria mundana. A sua marca registrada de luxo o marcava como o homem mais bem vestido do lugar, mesmo que ele não estivesse usando o terno mais caro. Era a forma como ele andava, a forma como se apresentava e a forma como ele prestava atenção em tudo. Ninguém poderia comprar ou replicar o seu estilo porque não era real. Enquanto eu o observava, não via o cavalheiro perfeito que todos viam. Só via o vigarista que sabia deixar uma boa impressão.
Eu me perguntei o que eu trocaria por meia hora do tipo de atenção que ele dispensava aos outros.
Ele nunca olhou para mim como se quisesse me enganar, me encantar ou me seduzir. E eu queria tudo isso.
Ele era um mentiroso e um cavalheiro e agora achava que era o meu pai. Tudo o que ele estava fazendo, dizendo, era para o meu benefício. Ele não tinha nada a ganhar falando docemente comigo. Mesmo que ele fosse um mentiroso, eu acreditava que o meu pai não ficaria desapontado com a sua escolha, mas ele não era Christian Henderson.
Se ele não era Christian Henderson, quem era ele? Qual era o seu verdadeiro trabalho? Eu gostaria de saber.
Certa vez, quando eu estava hospedada com ele em um hotel em Nova York, ele atendeu um telefonema como Damon Cross. Ele só percebeu depois de desligar que eu ouvi a sua conversa.
Eu tinha quinze anos e estava desconfiada, então li algumas das suas mensagens no seu notebook. Ele tinha um sistema operacional único e programas desconhecidos. Encontrei um pedido para ele ir para Israel.
Ele ficou furioso quando me pegou. Fiquei apavorada quando ele fechou o notebook. Por uma fração de segundo, pensei que ele fosse me bater. Ele não o fez, mas me mandou de volta para o internato naquela noite. Antes de me mandar embora, ele me deu um sermão incrivelmente paternal sobre bisbilhotice.
— Você não faria isso com as coisas do seu pai, acha isso certo? Ele disse esbravejando.
Eu não fazia ideia. Eu não tive um pai. E realmente não queria que Christian ou Damon, ou sei lá qual era o seu nome verdadeiro agora, fosse.
No avião, fiquei furiosa.
Christian não era o meu pai e a sua imitação de ser um me deixava com vontade de vomitar.
A questão era que ele sentiu que tinha que me colocar em uma caixa onde as suas “outras vidas” não me afetassem. E eu queria que ele soubesse que não havia necessidade disso. Não importava para mim o que Christian tinha feito ou estava fazendo atualmente na sua vida dupla ou tripla. Qualquer que fosse o poder que ele tivesse, ele o usou para salvar a minha vida. Eu sabia que o sacrifício tinha sido demais. Embora ele tenha feito tudo o que pôde para impedir que o seu desconforto aparecesse, algo o incomodava e não o incomodava antes da minha operação. Talvez ele devesse dinheiro. Talvez ele estivesse fugindo de alguém. O que quer que estivesse acontecendo, aos quinze anos eu não sabia como reagir.
Da última vez que tive notícias dele na escola, ele me enviou uma carta com o carimbo de Libéria. Não respondi porque não tinha certeza de como proceder. Eu precisava saber a verdade sobre o modo como ele vivia a vida, mas ele nunca meccontou. Só o vi de novo no Natal naquele ano, quando ele me levou para Paris e me encheu de presentes.
Ele agiu como ele mesmo, e até me pediu desculpas por estar tão bravo em Nova York. Por que provavelmente eu estava apenas tentando verificar as minhas redes sociais.
Foi nesse momento que aprendi que, para ficar com ele, precisava evitar fazer perguntas ou levantar um dedo para descobrir a verdade. Eu o amava incondicionalmente e precisava dar-lhe liberdade para lidar com tudo o que tivesse que lidar sem a minha interferência.
Eu faria qualquer coisa para ter ele do meu lado... mesmo que ele mentisse para mim constantemente.