Capítulo 27. Dias difíceis

453 Words
As manhãs na mansão Cavalcante tornaram-se todas iguais frias, longas e pesadas.O sol m*l entrava pelas janelas altas da ala dos empregados, e o cheiro de sabão e ferro quente dominava o ar.Nos primeiros dias, Amélie tentava se misturar às outras criadas, cumprindo cada ordem com docilidade e silêncio, mas logo percebeu que não era bem-vinda ali. As moças a observavam com olhares tortos desde o primeiro instante todas sabiam que ela não era “uma delas”.A história correra rápido: a filha do homem endividado, acolhida pela patroa como forma de pagamento. Francesca Cavalcante não precisara dizer nada diretamente bastara o seu olhar e o seu silêncio para que as demais entendessem o recado: > “Façam-na lembrar do lugar que ocupa.” Certa manhã, enquanto limpava os degraus do saguão, Elena,uma das criadas mais velhas, aproximou-se com um balde cheio de água suja. — Cuidado aí, menina da dívida — disse com um tom carregado de ironia. — Não vá manchar o chão que você tanto tenta deixar limpo. Amélie levantou o olhar, tentando manter a compostura. — Eu só estou fazendo o que me mandaram. Elena sorriu de lado. — Pois devia agradecer à senhora Francesca por isso. Nem todas têm o privilégio de pagar as contas do pai esfregando o chão dos outros. As outras riram risadas abafadas, cortantes.Amélie permaneceu calada, as mãos trêmulas, mas não respondeu.Sabia que qualquer palavra seria usada contra ela. Quando as criadas se afastaram, ela continuou a limpar o chão, deixando que as lágrimas caíssem junto à água do balde. Três meses se passaram. O inverno aproximava-se, e o vento frio varria os pátios de pedra.Amélie emagrecera, o rosto mais pálido, as mãos marcadas pelo trabalho constante. Apesar disso, havia algodiferente em seu olhar: uma calma serena, quase desafiadora, como se tivesse aprendido a suportar tudo em silêncio. Francesca observava-a de longe, sempre que podia, avaliando com a precisão de quem mede uma peça de porcelana: ainda firme, mas prestes a trincar. Estefano, por sua vez, quase não via Amélie.Francesca cuidava disso com zelo sempre enviava o filho para fora em negócios quando a moça estava nos corredores principais. Mesmo assim, às vezes ele a via por acaso no jardim, estendendo lençóis ao vento, ou cruzando o pátio com uma cesta de roupa nos braços. E toda vez que seus olhares se encontravam, por um instante o tempo parava.Ela abaixava a cabeça e se afastava depressa, e ele ficava imóvel, sentindo o coração pesar. Mas naquela tarde cinzenta, o destino decidiu testá-los outra vez. Enquanto limpava o saguão principal, Amélie ouviu passos conhecidos ecoando atrás dela passos firmes, familiares. E, antes mesmo de se virar, sentiu o ar mudar. Estefano estava de volta.
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