No dia seguinte, o Hugo, o empresário amigo do Carlos, me telefonou e me propôs um trabalho que consistia em servir bebidas num PUB. Não era o emprego dos meus sonhos, mas pior ainda, não era ter nada.
Nos encontramos naquela mesma noite para começar a trabalhar, o único requisito era me vestir um pouco exuberante, então coloquei uma calça de couro, uma camisa de renda preta transparente e botas de salto alto. Passei base e delineei as maçãs do rosto com um tom rosado que combinava com o batom. Nas pálpebras resolvi arriscar e misturei o preto com um tom cereja que me deu luminosidade no olhar. Por fim apliquei o rímel para dar volume e espessura. Eu estava pronta para começar.
...
ENZO
Eu não conseguia tirar aquele morena atrevida de olhos pretos da minha cabeça. Que tipo de pessoa tenta conseguir um emprego assim? Suada e quase sem fôlego.
— Com licença... você está me ouvindo?
— Sim Sim. Vinte anos de experiência foi o que você disse, certo? Eh….
— Ana, Ana Sanches. Ela parecia chateada.
— Perfeito, Ana, chega de informação, entre hoje e amanhã você terá a resposta. Muito obrigado.
— Não podia me concentrar naquele momento.
Enquanto a conduzia até a porta, imaginei ela saindo voando com um guarda-chuva, não pude conter o meu sorriso.
— Eu pareço engraçada para você? Ela protestou.
— Que? Não não. Com licença, não é uma boa hora hoje, é só isso.
— Tenho muito que fazer para perder tempo, essa entrevista não me pareceu séria, senti o Senhor ausente como se não estivesse nem um pouco interessado no que eu lhe contava.
— Claro que estou interessado, desculpe incomodar... Ehh.
Eu não podia acreditar que esqueci o nome novamente. vez.
— Anne. Ela rosnou.
— Isso... Ana Sanchez. Obrigado e me desculpe.
Fechei a porta e fui direto para o computador do meu escritório.
— Samantha... Samantha. Aqui está. Abri o arquivo e lá estava o currículo dela.
Samantha Arias Rojas. Vinte e cinco anos. Experiência profissional... empregada de mesa, balconista numa loja de roupa, balconista numa sapataria... mas... nem sequer tem experiência em empregos semelhantes a empregada doméstica.
Isso me deixou totalmente perplexo. Se ela queria atenção, ela conseguiu. Talvez ela fosse mais esperta do que eu pensava ou ousada demais.
O que ela conseguiu foi que eu não prestasse atenção nas outras candidatas e não tirar ela da cabeça.
Talvez não fosse uma má ideia ter alguém mais jovem trabalhando. Eu poderia dar uma chance a ela, eu não tinha nada a perder e sua forma de agir me chamou muito a atenção. Eu estava extremamente curioso sobre ela.
...
Acordei cedo como de costume. Minha cabeça ia explodir e eu sentia náuseas.
— Por*ra! —Anteontem eu esqueci de levar a minha pílula é por isso que me senti assim.
Fiz um café para mim e fui direto para o escritório que ficava do outro lado da casa. Havia muita papelada da clínica e minhas irmãs estariam prestes a me ligar pedindo.
—Ringgg!! Tinha que ser um delas.
— Sim? Minha voz ainda parecia sonolenta.
— Como vai querido? Ainda bem que era Elena.
— Tudo bem, El. Tenho praticamente tudo pronto, me dê apenas alguns minutos e eu mando para você. Eu tinha que correr se queria que essa coisa de "minutos" fosse verdade.
— Enzo, pare por alguns minutos. Dúvido que você tenha feito alguma coisa. A voz de Pilar soou ao fundo.
— Pilar, não se preocupe, não é tão urgente assim. Elena sempre me defendeu de tudo, ela era como uma mãe para mim.
Desde a morte dos meus pais, quando eu tinha apenas cinco anos e ela dezoito, ela cuidou de mim, evidentemente formamos um vínculo especial.
Pilar era diferente, era mais nova quando tudo aconteceu, tinha quinze anos e sempre exigia demais de mim a ponto de me sufocar de vez em quando. Ela queria que eu tirasse as melhores notas, fosse o melhor na música, tocasse violino perfeitamente... o que eu sempre odiei. Sei que ela queria o melhor para mim, mas há momentos em que não nos damos bem.
— A propósito… arranjou alguém para trabalhar na sua casa?
Eu ouvi a Pilar no fundo novamente.
— Diga a ela que... quase. Eu estou trabalhando nisso. Eu só tenho que fazer uma ligação e é isso. — Se eu dissesse não a elas, tinha certeza de que elas mesmos me trariam uma.
— Perfeito, ligue para nós assim que tiver.
— Sim. Eu desliguei.
Elas continuavam me tratando como uma criança pequena, era algo impossível de evitar, mesmo sendo quase o dobro da altura delas.
Passei a manhã toda rodeada de papéis, faturas, recibos de entrega... Precisava de uma pausa, mas primeiro tinha que enviar os papéis de que precisavam.
Tirei a minha roupa, e coloquei a sunga e atravessei o ginásio até chegar às janelas francesas que davam para a piscina nos fundos da casa.
Nada melhor do que um refresco para limpar o corpo e a mente.
Eu tinha uma bagunça consideravel em casa e isso me estressava muito porque eu não estava acostumado. Não era exagero de ordem, mas gostava de ter tudo no seu devido lugar.
Amália ia ser avó e ela queria curtir o neto então me disse nove meses antes de partir, mas até ela parar de vir eu não comecei a procurar ninguém.
Deixar alguém entrar em sua casa, abrir suas gavetas, ver seus defeitos e hobbies... não é algo que me anime a fazer, mas... Cheguei a um ponto em que, por mais que tentasse, meu trabalho estava se acumulando.
Era sexta-feira, eu poderia ligar para aquela garota e testá-la ou talvez fosse melhor esperar até segunda-feira... Que dia*bos! Eu ligaria para ela amanhã.