Capítulo 8

1526 Words
Iago Tava na boca, bolando uns bagulho na mente, quando meu pai e o RD entraram na sala. A cara dos dois já dizia tudo. Tavam na bronca. — Ih, qual foi? Essa cara de velório aí vai espantar até os noia. — soltei, jogando o corpo pra trás na cadeira. Meu pai puxou uma cadeira, se sentou com os ombros pesados, cigarro entre os dedos. O RD caiu no sofá, rodando a tampa da garrafa d’água na mão, mas com aquele ar sério. — O tal do promotor tá fazendo de tudo pra me jogar de volta praquela p***a. — meu pai mandou, olhando pra mim. — f**a-se. — soltei na hora, dando de ombros e encarando os dois na minha frente. — Isso vai mudar em quê? Ele bateu a mão na mesa, se inclinando pra frente. — Vai mudar que ter a polícia entrando aqui vai voltar a ser rotina. Tu acha que é o p**a porque pegou o morro na maré mansa. Tu não sabe o que é helicóptero baixando todo dia, caveirão subindo, ter que botar a p***a dessa tua carinha bonitinha aí na linha de tiro. Eu e teu tio que mastigamo pra tu poder engolir, c*****o! Eu só fiquei mirando ele, sem piscar. — Eu só quis dizer que não adianta ficar com medo, c*****o. Deixa eles subirem. — soltei. — Vão ter dois trabalho: subir e descer. O RD soltou uma risadinha e levantou com os braços abertos. — Deixa eu desenhar pra esse moleque, Terror. A fita não é essa. Ninguém aqui tem medo de policia. O que nós não quer é polícia acampada na entrada do morro, travando o nosso fluxo e atrasando o nosso corre. Isso quebra nosso caixa, morô? — Então resolvem. — falei, frio. — Tu não é o manda-chuva? Não tá acostumado a mastigar o pão? Então resolve,p***a. Tá com o comando na tua mão. Corta logo esse maluco do mapa. Ele respirou fundo, fechou os olhos um segundo, depois encarou eu e o RD. — Tu acha que eu não quero tirar esse arrombado do mapa, p***a? Mas eu já passei da idade de ser emocionado. Hoje cada passo é calculado. Esse promotor é rato, tem costa quente. Se eu me jogar de qualquer jeito, quem vai se fuder sou eu e geral que tá comigo. Tenho que achar o jeito certo de derrubar ele. Eu me inclinei na mesa, cotovelo apoiado, queimando eles no olhar. — E se o jeito for pela mina dele? RD franziu o cenho. — Que mina, Iago? — A filha do safado. — mandei direto, dedo batendo no tampo da mesa. — Se eu tiver perto dela, eu tenho acesso a ele. Vou saber seus passos, horário que acontece a troca de turno dos seguranças e sem contar que eu posso ter acesso a tudo. Tu precisa de alguém infiltrado, eu posso ser esse alguém. RD coçou o queixo. — Sei não, Iaguin… essas mina é mó enjoadinha, papo reto. Patricinha cheia de marra, se pá nem vai te dar papo. Não é igual as mina daqui do morro, não. Cruzei os braços, encostando na cadeira. — Tá bom. Então me diz, tem ideia melhor? — larguei. Meu pai respirou fundo, esfregando as duas mãos na cara. — Não tenho. — falou na sinceridade, mas ficou evidente que tava odiando admitir isso — Então esquece, deixa essa p***a na minha mão. — bati a palma na mesa, corpo pra frente, olhar cravado nos dois. — Eu mesmo vou bolar o corre pra colar na mina. Ela vai ser a ponte pra nós abrir caminho até o pai dela. Eu te jogo a cabeça desse filha da p**a numa bandeja de ouro, sacou? RD apontou o dedo na minha cara. — Tu tá ligado que é só isso, né? Chegar, colher informação e meter o pé. Não é pra se enrolar com a mina. — Relaxa. — sorri de lado. — Eu não erro foco, não.— respondo firme Terror soltou a fumaça pro lado, demorou uns segundos e depois balançou a cabeça aceitando. — Então já é, Iago. Faz do teu jeito. Mas lembra: a partir do momento que tu entrar nessa p***a, não pode ter erro. Não dá mole ou tu vai terminar no mesmo lugar que eu. Dia seguinte... Tudo acertado desde a noite anterior, o plano rodava na minha cabeça passo a passo. Agora era só executar. Empurrei a porta de vidro, o sininho tilintou lá em cima e eu segui reto pro balcão. A recepcionista levantou o olhar rapidinho pra mim e voltou pro computador. — Seis e meia, né? Consulta do Arthuro? — conferiu. — Isso. — soltei curto, puxando a carteira e largando a grana no balcão. Ela contou, guardou e apontou pras cadeiras. — Pode sentar. A doutora já chama. Encostei na cadeira e o Arturo pulou do meu braço pro meu colo, agitado, não parava um segundo. Fiquei passando a mão na cabecinha dele enquanto a gente esperava. A porta branca abriu e a veterinária apareceu. Novinha, devia ter a minha idade ou menos. Jaleco meio aberto, blusa clara por baixo, cabelo liso batendo na cintura, balançando quando ela andava. Pele clara, quase sem maquiagem, só uma pinta no rosto que não sei porque chamou a minha atenção. Os olhos dela eram amêndoados, atentos e diretos. — Arturo? — chamou, olhando a prancheta. Levantei, botei ele no ombro e entrei. A sala era branca, tudo arrumadinho. Armário encostado na parede, detalhe em madeira clara quebrando o branco com desenho de patinha pintada. Tinha brinquedo de cachorro e gato espalhado num canto. E o ar-condicionado lá em cima deixava o ar gelado. No canto da sala, tinha uma mesa com computador e duas cadeiras. No meio, a mesa de inox. Coloquei o Arturo lá e ele já bateu as mãos no metal, rindo com o barulho. Ela puxou as luvas e se aproximou tranquila. — O que ele tem sentido? — perguntou, sem levantar muito o olhar. — Tá agitado, uns dias já. — respondi direto. Ela assentiu, encostou o estetoscópio no peito dele, ouviu com atenção, depois abriu a boca, olhou os dentes, ergueu a pata, passou a mão devagar pelo pelo. Não tava só examinando ele. Dava pra ver que ela curtia o que fazia, fazia com amor, como quem gosta mesmo de bicho. O toque dela era firme, mas parecia um carinho. O Arturo ficou quieto, só encarando. Eu também, fiquei calado, reparando nela. Suas mãos eram ágeis e ao mesmo tempo delicadas. Eu tava viajando nela quando um grito estourou na recepção. Ela travou olhando pra porta e o Arturo se escondeu, assustado. Quando abriu a boca pra falar, a porta do consultório abriu num chute. Um moleque de capuz entrou armado e com a mira do revólver direto nela. — Perdeu, doutora! Passa o celular, passa grana, eu quero tudo na minha mão! — berrou. Ele foi pra cima dela com tudo e a preensou na parede. Uma mão puxando o cabelo e a outra mão mantendo o cano na cara dela. A mina gritava, chorava, tentando empurrar o peito dele, mas não tinha força suficiente. Ela era pequena, frágil, indefesa. A cena parecia real. Fiquei parado próximo a porta, com as duas mãos no alto da cabeça, quieto, só deixando o bagulho correr. Tudo tinha que parecer verdadeiro pra caso depois alguém puxasse nas câmeras . Dei alguns passos lentos e no momento certo bati o ombro com força no dele. O corpo leve dele bateu na parede ao lado e virou de frente pra mim. Não teve novela não. Entrei rasgando, mandei uma voadora no braço que segurava a arma e a pistola caiu no chão. Já fui pra cima. Soco na cara, direto no nariz, chute no estômago, outro soco no queixo. Sequência rápida, sem respirar. Bati tanto no Neguinho que ele não teve nem tempo de reagir. Caiu contra a parede, o rosto ensanguentado e praticamente apagado. Catei a arma no chão e puxei a doutora pela mão, jogando ela atrás de mim. Seu corpo bateu no meu, leve, as mãos agarraram minha cintura como se eu fosse a única proteção que ela tinha. Acho que ela nem pensou, me abraçou sem notar. Fiquei parado, com a pistola apontada pro cara caído no chão e pronto pra meter bala se precisasse. Mas não ia precisar, porém se fosse pra dar mais realismo, eu atirava sem pensar duas vezes. Ouvi alguns passos se aproximando e quando olhei pra porta, vi o Juninho. O menor tava de toca na cara e uma .40 na mão. Me viu e seguiu o script direitinho. Correu pra fora, largando o parceiro. — Liga pra polícia! — gritei, sem tirar a mira do outro no chão. O cheiro dela bateu no meu nariz e me desconcertou por um segundo, mas logo senti quando ela me soltou e disparou pelo corredor, desesperada. Permaneci onde tava, plantado no chão, pistola firme na mão e sem piscar nem um instante. A encenação precisava ser perfeita e eu precisava ser só mais um refém que reagiu na hora certa.
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