Capítulo 13

1776 Words
Manu narrando: Enquanto eu olho pela janela, sinto o rosto quente e o coração batendo num ritmo que eu não consigo controlar. A lembrança do beijo dele me faz apertar as mãos contra as pernas, a pressão do seu corpo contra o meu, das mãos firmes segurando minha cintura, me puxando mais pra ele. Solto um suspiro e fecho os olhos por um segundo, como se isso pudesse afastar o turbilhão de sensações que ele trouxe. A voz dele ainda ecoa e sinto um arrepio percorrer meu corpo, me fazendo morder o lábio, tentando não ceder à lembrança dele. Passo a mão pelo rosto, um jeito de tentar apagar o sorriso bobo que não sai. Jogo o cabelo pra trás e respiro fundo, mas não adianta. Ele tá preso em cada detalhe, em cada pensamento. Minhas mãos parecem inquietas, buscando o que fazer enquanto os pensamentos giram. Brinco com uma mecha de cabelo, enrolando nos dedos, e a imagem do corpo dele, da barba roçando minha pele, me faz corar de novo. Dou uma olhada discreta pra Any lá na frente, quase como se ela pudesse ler minha mente, e viro o rosto rapidamente. Um sorriso pequeno escapa, mas logo me forço a encarar a realidade, o arrependimento sutil se esgueirando junto com o desejo. E ele, será que tá sentindo alguma coisa disso? Tento me convencer que talvez pra ele não tenha passado de um momento, mas meu coração dá um pulo só de pensar na próxima vez que nossos olhares se cruzarem. O carro estaciona e abro a porta sendo acompanhada por eles. Enquanto entramos, respiro fundo, tentando manter a normalidade e disfarçar o que tá fervendo aqui dentro. Passo pela porta e sem pensar duas vezes, me agarro à primeira desculpa que me vem à cabeça pra me manter longe deles. Manu: Vou fazer um chá, alguém aceita? – falo rápido, já me afastando. Só preciso de um segundo sozinha. Não consigo evitar o pensar que, se eles olharem direito, vão sacar tudo o que aconteceu. Minha mãe sempre dizia que sou um livro aberto quando faço alguma besteira. E agora, mais do que nunca, sinto que tá escrito no meio da minha testa o que fiz. Vou até a cozinha e começo a esquentar a água, mas logo me pego lembrando do jeito que ele falou no meu ouvido, da pressão dos braços dele me segurando. Meu Deus, eu ia mesmo fazer aquilo ali? Mordo o lábio e balanço a cabeça, sem acreditar no ponto que cheguei. Ainda bem que a Any chegou bem na hora e me impediu de fazer essa loucura. Depois que saí da cozinha, ele simplesmente desapareceu. Evaporou, como se o que rolou não tivesse significado nada pra ele. E na real ele não está errado, foi apenas um beijo. Sem sentimento algum. Os barulhos dos passos deles me puxam de volta, e num reflexo, ajeito o cabelo, tentando disfarçar. RD e Any entram na cozinha, se sentam e começam a conversar. Eu pego a xícara com as mãos meio trêmulas, e tento fingir que tudo tá absolutamente normal, mesmo sabendo que não está. Any: Senta aí, Manu – ela fala, apontando pra cadeira, enquanto se espreguiça. Manu: Não, amiga... vou deitar. Amanhã levanto cedo – tento escapar, mas o abençoado do RD, resolve puxar o bendito assunto que estou tentando fugir. RD: O que tu achou do trampo na casa do Terror? Any: É, amiga, me conta como foi lá! Nem tivemos tempo de conversar. – Ela se levanta, arrastando uma cadeira pra me dar espaço. Acabo me rendendo, sentando meio sem escolha. Manu: Foi tranquilo... apesar da ignorância dele no início, o resto foi de boa – tento responder rápido, bem por cima, porque, se eu der qualquer brecha, sei que vou acabar me entregando. RD: O Terror é meio complicado, saca? Quanto menos você trocar ideia com ele, é melhor pra tu – ele fala, me olhando sério, e gelo na hora. Meu estômago revira, e, por um segundo, sinto o sangue correr mais rápido. Será que ele viu a gente? Meu rosto queima só de pensar. Se ele viu… que vergonha, deve estar me achando o quê? Não sei se foi ele que nos viu ou se o Terror foi contar vantagem porque, né, homem adora fazer isso. E agora o RD tá tentando me alertar de um jeito disfarçado, sutil. Só pode ser isso. Engulo seco, desviando o olhar, mexendo na borda da xícara como se aquilo fosse a coisa mais interessante do mundo. O melhor que eu faço é me afastar desse homem mesmo. Partir de agora nosso assunto será apenas a dona Marta. RD: Mas a ideia que eu quero trocar com vocês é outra. As coisas devem esquentar por aqui nos próximos dias, entendeu? Nem era pra tá abrindo essa fita pra vocês, mas conhecendo essa daqui... — ele aponta pra Any, com uma expressão quase resignada — Se eu não disser a real, sei que vai acabar indo de morro em morro atrás de mim. Any: Vou mesmo! Ainda bem que você sabe. — ela confirma, sem nem pensar duas vezes, cruzando os braços e o encarando. Manu: Vai ter invasão? — pergunto, tentando manter a voz firme, mesmo sentindo o coração bater mais forte, morrendo de medo. Any: Amiga, lembra que te falei como funciona o morro quando tem invasão? — pergunta, e eu só confirmo com a cabeça. — É a mesma coisa, mas dessa vez não é facção rival, é os cana. Manu: Entendi. RD: A polícia deve subir o morro pra fazer operação. — fala direto e sério —E não é pra dar mole porque os verme sobem no esculacho, metendo tiro na cara de morador, prendendo quem não tem nada a ver, querem nem saber de p***a nenhuma. Any: Mas por que cê tá falando essas coisas? — Ela o observa, desconfiada. RD: Pra tu ficar na moral, respeitar o toque de recolher, e não ficar dando uma de maluca, saindo de dentro de casa. E outra se o bagulho ficar feio, é pra tu meter o pé com o Terror, sim! — Ele enfatiza, sem rodeios. — Ele já tá ligado. Pode ser que precisem dar um tempo do morro. Any: Eu não vou sair daqui, Rodrigo! — Ela afirma, firme, e ele n**a com a cabeça. — Você sabe que não vou fazer isso, não sou bandida pra ficar fugindo de polícia. Estudei pra c*****o pra ser presa fugindo com bandido? — o tom de voz dela se eleva, mostrando sua indignação. RD: Tu acha que se eles te pegarem vão fazer o quê contigo, ô princesa? Quer saber? Vou te falar pra tu deixar de ser maluca. Vão te quebrar na porrada, esculachar, te torturar até onde der pra arrancar o que quiserem sobre mim. Acorda, c*****o! Tu é irmã de vagabundo, não tem conversa! E, se precisar ir, tu vai, nem que eu mande os cria te levar na ignorância mesmo, entendeu? — O tom dele aumenta, os olhos fixos nela, como se tentasse enfiar a realidade goela abaixo. — Tô de saco cheio das tuas gracinhas, Tatiany. Vai se fuder, c*****o! Vai tomar no seu cu.— Fala irritado Any: Vai você, seu merda! — Enxuga as lágrimas — Onde você vai estar pra eu ter que sair correndo com o Terror? RD: Vou tá fazer um corre e não vou tá aqui. Ela se levanta da cadeira, soltando uma risada irônica, mãos na cintura, andando de um lado pro outro, claramente irritada. Any: Tu vai tá fazendo o quê? — altera o tom de voz, a raiva no olhar dela é nítida. — Cê me disse que não iria mais pra linha de frente fora do morro. — Ela coloca as mãos na mesa e encara ele de frente, mas RD abaixa a cabeça, evitando seus olhos. Manu: Amiga... — tento tocá-la no ombro, mas ela desvia. Então, me levanto e me afasto um pouco, só observando de longe. RD: Não dá, não dá pra ficar aqui parado, mano. Não tô na trinca pra viver preso nessa p***a. Any: — Esse merda quase morreu, Manuela! Eu tive que ver ele todo furado, jogado no pé do morro como um animal. E tá aí agora — ela faz um gesto brusco com a mão, apontando pra ele, a voz embargada de raiva — querendo dar uma de homem de ferro de novo. c*****o! — As mãos dela vão ao rosto, e as lágrimas finalmente escorrem. A dor nos olhos dela é nítida, enquanto RD desvia o olhar e se levanta da cadeira. RD para um instante e coça a nuca. RD: Mas eu não morri, tô vivão. Só faz o que eu pedi e fica mec. Any: Tá ligado que eu só tenho você nessa vida né? RD: Tô maluca! Any: Pelo menos me diz o que tu vai fazer. — Ela seca o canto dos olhos, ainda com a expressão triste. RD: Tu vai ficar sabendo, fica mec. Não é a primeira e não vai ser a última vez que eu vou pra guerra. Essa é a vida que eu escolhi, pô. Do mesmo jeito que tu gosta das tuas paradas, de cuidar dos cria na moral, eu gosto de tá com o fuzil na mão, trocando tiro, granada comendo, bala voando. — Ele faz uma pausa — Tu não vai mudar meu pensamento, e nem eu o teu. Nós nasceu pra isso. Ele puxa Any de lado, passando um braço em volta do pescoço dela, num gesto meio firme, meio desajeitado, como se quisesse mostrar segurança. Any: Promete que volta inteiro e não dentro de um saco preto do IML? — Ela o encara, séria, antes de desfazerem o abraço. RD: Prometo, pô! Não vai ser agora que tu vai me enterrar, não. Manu: Vocês são lindos! — abro um sorriso, tentando parecer sincera. Ele me puxa pra um abraço rápido. RD: Cuida dela pra mim, jáé? — Ele solta uma risada, leve, mas com um olhar que diz mais do que qualquer palavra. Manu: Já é. — Respondo com um sorriso, e faço um toque com ele, numa despedida que tem um peso silencioso. RD: Vou nessa que tenho que resolver uma outra parada também. Any: Tá bom então... te amo, não esquece nunca, tá? — Ela o abraça de novo, apertado, como se quisesse prendê-lo ali. RD: Também, e muito. — Ele sussurra de volta, segurando-a um pouco mais forte antes de soltá-la. Manu: Vai com Deus. RD: Fica com ele também. — E, com um último olhar, RD se despede, saindo porta afora.
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