Capítulo 51.

1717 Words
Terror narrando Tô sentado no chão do barraco da 15, ouvindo calado o sermão do RD e do Renan. Eles tão falando, falando igual papagaio de pirata. Mas a real é que minha mente tá longe, girando num lugar onde só existe arrependimento e ódio de mim mesmo. Levo as mãos na cabeça, encostando a testa entre os joelhos e fecho os olhos com força. A verdade é crua e tá escancarada: fiz o mesmo que o verme do homem que me pôs no mundo. Machuquei quem não merecia, e isso tá me corroendo. Não acredito que fiz uma p***a dessas. Nego, nada que esses dois tão falando vai me acusar mais do que minha própria consciência já tá fazendo. Minha cabeça não para, gira num loop de arrependimento e ódio. Eu nunca quis machucar ela. Nunca. Mas ver ela beijando aquele cuzão foi como jogar gasolina no fogo que eu tento apagar desde que rolou aquela p***a toda com a Diana. A consciência tá martelando sem dó, jogando na cara o fudido que eu sou. Me mostrando o monstro que tento esconder, o lado que jurei pra mim mesmo que não ia mais deixar sair. Só que ele saiu, e agora eu tô aqui, tentando juntar os cacos de mim mesmo. O arrependimento bateu rápido, quase instantâneo, assim que desci o último degrau daquela escada. O que eu fiz me acertou no peito como um tiro a queima roupa, mas não dava pra voltar atrás. Nunca dá. A merda já tava feita, e agora só restava lidar com o estrago. RD, me jogou dentro do carro e me trouxe direto pra cá. Ele me conhece bem o suficiente pra saber que aquilo terminaria m*l. Antes que eu pudesse reagir, já tinha tomado minha arma. Precaução dele. Talvez até um pouco de exagero. Mas eu nem posso culpa-lo, Se tivesse com aquela peça na mão, quem sabe até onde minha raiva teria me levado? Poucas vezes na vida me senti assim com um ódio tão profundo de mim mesmo como tô sentindo agora. E nem é só por ela. É por me sentir como ele. Por olhar no espelho e ver o rosto daquele desgraçado que eu passei a vida toda odiando. Parece que quanto mais eu tento fugir, mais me aproximo de ser igual ao verme. Enquanto o RD e o Renan tão aqui, falando sem parar, eu tô num loop na minha cabeça. A cena dele batendo na minha mãe se repete, como um filme antigo que não consigo desligar. E junto com isso, a voz dele. A p***a daquela voz maldita que, mesmo morto assombra minha mente, me lembrando que: "Somos iguais." Meu peito aperta, e a vontade de sumir de vez sobe com tudo. Acabar com essa minha droga de vida. Porque, no fundo, a maior luta que eu tenho não é com ninguém lá fora. É comigo mesmo. Com esse lado podre que eu juro pra mim mesmo que não existe, mas que vem à tona e me faz questionar se eu realmente sou diferente daquele lixo. RD: Tá me ouvindo, Terror! Responde, c*****o. – A voz dele invade meus pensamentos. Renan: Tu acha que vai resolver alguma coisa assim? Tá maluco? – O tom é firme. RD: Não respeitou nem a resenha do Pelé, irmão. – Ele solta com desgosto, balançando a cabeça. Terror: Já entendi, p***a! Não precisa ficar de ladainha na minha orelha. – Levanto a cabeça de repente, encarando o RD. – Eu sei o que fiz, sei que foi errado. Então larga de encher o saco.– Falo encarando o chão. RD: Olha pra mim, p***a! Tu acha que tua mãe ia se orgulhar dessa merda? Tu acha que é isso que ela quer? RD me sacode como se isso fosse tirar alguma coisa de mim. As palavras dele entram, mas é como se ficassem presas, ecoando sem fazer efeito. Terror: Cala a boca, RD! – Minha voz sai num estouro, cheia de dor e raiva, enquanto me levanto num pulo. – Não mete minha mãe nessa p***a, irmão! Tu não sabe o que eu tô sentindo aqui dentro! – Bato no peito com força, como se quisesse arrancar o sentimento que tá me esmagando. – Eu já tô no inferno, c*****o! Não precisa me jogar mais fundo. Só rala daqui os dois e me deixa sozinho. RD solta um suspiro pesado, dá um passo pra trás, mas mantém os olhos cravados em mim. Aquela cara de "não vou te largar, não importa o que tu faça" me irrita e, ao mesmo tempo, me desarma. Ele sabe que eu tô quebrado, sabe que tô à beira do abismo, mas ainda tá aqui, firme. Renan: Terror, tu pode continuar se destruindo ou pode tentar consertar essa p***a. Mas deixa eu te falar uma parada... ninguém vai fazer isso por tu. Se tu continuar se afundando, vai acabar igual o teu pai, e aí, parceiro, já era. Tu é melhor que isso, p***a. Se liga! Tá na hora de agir como o cara que tu jura ser. Balanço a cabeça, passando a mão no rosto, tentando limpar o suor que parece que não para de escorrer. Terror: Eu tentei ser diferente, tentei fazer certo... mas no fim, olha o que eu fiz. RD: Tentou? p***a nenhuma, Terror! Tentou nada! Fazer certo não é só querer, irmão, é segurar a p***a do impulso e não f***r quem tá do teu lado. Tu acha que tá fudido agora? Imagina ela! Terror: Eu sei, p***a! Tu acha que eu não sei? Eu olho pra mim e só vejo merda. Tentei segurar, tentei ser melhor... mas é isso aí, RD, eu sou um vacilão! Um fudido que só destrói tudo que toca. Renan: Terror, olha só... às vezes, o melhor que tu pode fazer é dar um tempo. Deixa ela respirar, irmão. Dá espaço pra cabeça dela organizar as coisas, e a tua também. Forçar agora só vai piorar. Se tu realmente quer ela, deixa a poeira baixar primeiro. Terror: Tu acha que ela vai querer olhar na minha cara depois disso, Renan? Esquece, mano... já era. Eu perdi ela. Não tem espaço pra p***a de tempo ou respiro. Acabou, parceiro. E a culpa é minha, total minha. RD: Parça, quem erra, conserta. Terror: Só queria saber como ela tá... ter uma p***a de notícia, c*****o. – Passo a mão no rosto, meio perdido. – Cadê meu celular? RD: Teu celular? Tá comigo. E tu nem vai encostar nessa p***a, tá entendendo? Não adianta querer ir atrás dela agora, Terror. Tu só vai piorar as coisas. Terror: p***a, RD, só quero saber como ela tá! Não vou falar nada, nem chegar perto... só preciso saber se tá bem, se não se machucou mais. Me dá essa p***a logo! Renan: Já troquei ideia com o Pelé, ele disse que ela tava indo pro hospital com a filha dele. Relaxa, ela tá sendo cuidada. Terror: c*****o, mano, eu não devia ter deixado chegar nesse ponto. Dá esse celular aqui, RD. RD: Que celular, p***a? Tá maluco? Tu não vai resolver nada ligando pra ela agora, só vai piorar as coisas. Renan: Vai dormir, Terror. Tu tá fora de si e só vai fazer mais cagada se continuar nessa pilha. Já falei com os menor, vão ficar dois vapores aqui na sala e dois lá fora na contenção. E tua arma vai ficar com a gente até amanhã. Não adianta querer bancar o bravo agora, deixa a poeira baixar. RD: É isso mesmo, Terror. Tu tá com a cabeça fervendo e a última coisa que a gente precisa agora é tu metendo os pés pelas mãos. Escuta o Renan, dorme, esfria a mente. Os menor tão aqui pra segurar qualquer bagulho e tua arma tá mais segura com nóis. Amanhã tu vê como resolve essa merda. Terror: Faz o que quiser com a p***a da arma. Mas eu não vou dormir, não. Não tem como desligar essa merda na minha cabeça. Se eu fechar o olho, vou ver ela, vou ouvir o que falei, vou lembrar do que fiz. Então deixa rolar... RD: Beleza, então. Vai ficar aí remoendo, mas não faz nenhuma cagada. Amanhã a gente troca essa ideia direito. Renan: Tenta descansar, Terror. Por mais que seja difícil, tu precisa da mente limpa pra resolver as paradas. Se precisar, aciona nós e os moleques vão ta aí na contenção. Amanhã cedo tô de volta. RD: E outra... lembra que tu não tá sozinho, irmão. Não esquece isso. Eles fazem toque comigo, cada um do seu jeito, e saem. O RD com aquele olhar de tipo “não vacila mais”, e o Renan mais tranquilo, mas firme no tom. Agora é só eu e o vazio desse barraco. (....) Abro a gaveta do guarda-roupa e minhas mãos tremem quando tiro o saquinho do pó lá de dentro, um escape. Um alívio rápido pra dor que não quer passar. Coloco o saquinho na cabeceira da cama, e abro com cuidado, mas com uma urgência que não consigo disfarçar. A lâmina do canivete já tá pronta no bolso, sempre no jeito. Estico o pó, linha por linha, enquanto a respiração acelera. O coração já começa a martelar só de olhar. Pego um canudo e me inclino. Uma das linhas desaparece com um puxão só, seco e violento, igual o que tá no meu peito. Sinto o pó queimando dentro de mim, subindo rápido pela narina, invadindo a mente. É como se um raio passasse pelo meu corpo. O coração acelera mais ainda, quase explode. Me sento no chão me escorando na cama. Jogo a cabeça pra trás, a respiração pesada, sentindo o efeito começar. É imediato. O mundo parece mais claro, mas não no bom sentido. Tudo fica nítido demais. As cores, as lembranças, as dores. Não dá pra fugir delas. Minha mão vai automaticamente pra outra linha, repetindo o movimento. Já perdi as contas do que usei hoje: haxixe, lança, uns goles de uísque pra apagar a mente... mas nada resolve. E essa p***a não apaga o rosto dela da minha cabeça, nem a merda que fiz. Estou cheirando como se fosse minha única saída. Mas no fundo eu sei: tô cavando um buraco, e quanto mais fundo eu vou, mais difícil fica sair.
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