Helô
Fiquei ali segurando o machucado dele e pensando em como um homem bonito pode ser um monstro acordado. Eu já tinha ouvido falar do Destrutor, os carcereiros falam muito dele. Dizem que ele matou várias pessoas aqui dentro. Do lado de fora, ele é o chefe da facção. Eu nunca tinha cruzado o caminho dele na enfermaria, até porque eu acho que ele nunca tinha sido machucado antes. Mas agora, olhando assim pra ele, ele parecia só um homem. Se eu cruzasse com ele na rua, eu nunca diria que ele é traficante.
Os outros voltaram com as coisas e eu continuei fazendo o meu trabalho. Depois que eu terminei, fui sair da cela, mas o homem que tinha apontado a arma pra mim colocou a mão na frente.
Sabiá: foi m*l, doutora, mas tu vai ter que ficar aqui até amanhã de manhã, porque se ele passar m*l não tem como a gente saber o que fazer, tá ligado? Tu vai ter que segurar essa barra, vai ter que ficar aí dentro da cela com o chefe.
Helô: isso é maluquice! Eu não posso ficar aqui dentro com ele, ele é perigoso! Vocês são perigosos! Eu só tô fazendo meu trabalho, eu quero voltar pra enfermaria agora. Vocês falaram que era pra eu salvar a vida dele, e eu salvei. Agora vocês têm que cumprir a parte de vocês.
Sabiá: não mete bronca pra cima de mim não, doutora. Tu ainda não salvou a vida dele, porque ele ainda não tá acordado e falando. Tu só vai sair daqui quando ele tiver acordado e falando. Antes disso, pode ficar quietinha aí e dar uma sossegada, pô. Ninguém aqui vai te fazer m*l não. A gente já mandou o carcereiro falar que tá tudo bem pra polícia e já molhamos a mão dele pra ele trazer comida pra você. Pode ficar suave que não vai vir comida estragada que nem vem pra gente aqui dentro, não.
Helô: eu não quero ficar aqui dentro dessa sala com esse homem! Eu vou voltar agora!
Tentei sair da cela, fiz força contra eles, mas me jogaram dentro de novo. Eles começaram a rir, falando que eu era uma boneca e que não deveria ficar tentando lutar contra eles. Um deles trouxe um colchão e jogou pra mim.
Sabiá: o patrão vai ficar na cama e tu vai ter que dormir nesse colchão. Ele não divide a sala com ninguém, então tu vai ter que dormir no chão mesmo. Mas pode ficar suave que ninguém vai te incomodar, não. Nós vamos ficar aqui fora fazendo a segurança a noite toda. Vagabundo não vai encostar em tu não, até porque tá bonita pra c*****o, doutora — com todo respeito.
Sabe aquela hora que te dá medo? Porque eu vi que eles estavam me olhando com malícia. Então eu peguei os panos da cela, desci tampando tudo, e fechei a cela. Fiquei encolhida no canto. Eu não sabia qual ia ser a reação quando ele acordasse, só sei que eu tava com muito medo.
Peguei o meu telefone que tava no jaleco e mandei uma mensagem perguntando se tava tudo bem com a minha filha, e respirei fundo quando recebi a mensagem dizendo que tava tudo certo, que meu ex-marido não tinha aparecido na minha casa. Pelo menos isso. Coloquei o celular no jaleco de novo e peguei um cobertor que tava na cela. Estava limpo e, pra minha surpresa, cheiroso. Depois de alguns minutos, eles fizeram barulho do lado de fora, e eu, me tremendo toda, me aproximei da grade. O cara me entregou comida. Eu fiquei olhando pra comida e respirei fundo. Comecei a comer, e foi aí que ele começou a se mexer. Eu olhei pra ele com os olhos arregalados, e ele abriu os olhos devagar. Cheguei perto dele porque ele começou a falar várias coisas aleatórias, e quando me viu, me encarou e disse:
Destrutor: c*****o, eu não acredito que eu morri e consegui pisar no céu, p**a que pariu.
Helô: você não morreu, você continua em Bangu. Você tá bem longe do céu.
Ele tentou se levantar rápido, mas sentiu dor. Colocou a mão em cima do ferimento e me encarou novamente.
Destrutor: se tu não é um anjo, então quem é você?
Helô: eu me chamo Heloísa, eu sou uma médica que trabalha aqui no presídio. Os seus subordinados me sequestraram e me trouxeram pra poder salvar sua vida. Agora eu tô aqui esperando você acordar. Eles não me deixaram sair da cela, falaram que eu vou ter que cuidar de você a noite toda.
Destrutor: doutora, tu tem noção que é tão bonita que eu pensei que tu fosse um anjo?
Eu travei durante alguns segundos, porque eu não esperava que ele falasse esse tipo de coisa. Então eu voltei pro canto e me encolhi de novo, tentando comer a comida.
Ele tentou se levantar de novo, mas eu não deixei.
Helô: você pode ficar deitado, pelo amor de Deus. Esses pontos vão abrir. Eu não sou especialista em sutura, se isso abrir eles não vão me deixar sair daqui.
Destrutor: não seria nada m*l ficar trancado com a doutora aqui na cela. Acho que tu é a mina mais gata que entrou aqui nos últimos anos, mas eu preciso levantar pra mijar, tô apertadão.
Helô: eu devia ter mandado os seus homens trazerem fralda também.
Quando eu falei isso, ele me encarou com a sobrancelha arqueada e deu um sorrisinho de lado.
Destrutor: tá maluca? Tu acha que eu sou homem de usar fralda?
Helô: é melhor do que forçar, só tem algumas horas que eu limpei isso aí.
Destrutor: me ajuda aqui que eu vou mijar em pé, eu sou sujeito homem.
Eu me aproximei devagar, tentando ajudar ele a se levantar, mas ele era muito pesado. Eu encarei ele e respirei fundo, diferente.
Helô: é melhor chamar um dos seus homens, eles tão aqui fora. Eles vão te ajudar melhor.
Destrutor: suave, chama aí.
Eu bati na cela e dois homens apareceram. Eu falei o que tava acontecendo e eles entraram. Ajudaram ele a levantar e levaram até o local pra ele poder fazer as necessidades. Colocaram ele na cama de novo, e um deles me encarou com malícia e falou:
— bem que nós podia fazer uma festinha, né, doutora?
Eu me encolhi de medo, achando que iam me tocar, mas foi aí que ele falou:
Destrutor: toca nela pra tu ver. Eu vou cortar teu p*u e vou fazer tu comer, seu filho da p**a. Sai daqui agora!
— desculpa aí, chefe, foi m*l — ele falou e saiu desesperado.