Cap- 04. Beijo, Tapa e a Verdade Que Arde

1705 Words
Pricila valle O sol já nasceu e eu... nem dormi. Passei a noite revirando na cama, pensando demais e dormindo de menos. Me levanto, vou direto pro banho e depois preparo um café bem forte. Como estou sozinha hoje — Brian só chega mais tarde — resolvo aproveitar pra fazer uma bela faxina. Termino o café, prendo o cabelo, pego a vassoura e, quando estou pronta pra começar, meu celular toca. Olho o visor e suspiro ao ver a foto da vaca da minha melhor amiga. Ligação ON — Oi, Lu... sua vaca. Nunca mais aceito convite seu pra sair. — Ai, migles... desculpa! Mas eu precisava tirar o atraso, cê me entende, né? — Se queria se divertir com o loiraço, então nem devia ter me chamado! Me deixou na pista como um fantasma social. — Foi m*l, gata... mas ele era o meu número. Impossível resistir. — Lu, você me abandonou menos de uma hora depois que a gente entrou na boate! — Ah, PRI, não fica brava. Eu tô tão feliz! Tive uma noite MARAVILHOSA! — Que bom. Pelo menos você se divertiu. — E como! Agora, me conta: você pegou alguém? — Não. Assim que recebi sua mensagem, fui chamar um Uber e fui embora. — Não acredito! Você foi embora?! O bar tava lotado de gatinhos! Até o nosso chefinho estava por lá... — E daí, sua doida? — E daí, que você é linda, e devia ter ficado! Vai que rolava alguma coisa... até com o chefe! — Tá maluca, mulher?! Eu nunca me envolveria com o nosso chefe. — Que pena... porque se ele me der bola, miga, EU APROVEITO. E como aproveito aquele corpinho... — Você é s*******o, Luna. — s*******o, não! Eu só gosto de viver. E você devia tentar fazer o mesmo. — Eu faço! — Sei... você só vive pro seu irmão. Tá na hora de arrumar um boy. Um namorado. Um colinho. — Quem sabe um dia. Por enquanto, meu foco é trabalho. — Você não tem jeito. — Tchau, bicha. Preciso terminar a faxina antes que meu irmão chegue. — Beijo, até segunda! — Até! Ligação OFF Desligo o telefone, coloco uma playlist animada e volto pra limpeza. Vassoura pra cá, pano pra lá, canto alto umas músicas bregas e dou conta da casa inteira. Quando percebo, já escureceu. Corro pra cozinha, começo a preparar o jantar. Brian deve chegar a qualquer momento e não tem nada pronto. Desde que nossos pais morreram, sou pai, mãe, irmã e apoio pra ele. Abri mão de muita coisa pra vê-lo realizar os sonhos dele. E faria tudo de novo. Minutos depois, ouço a porta da frente se abrir. Brian entra, jogando a mochila no sofá com aquele jeitão preguiçoso e fofo dele. — Até que enfim resolveu limpar a casa, hein? Já tava pedindo socorro! — diz ele, me dando um beijo no rosto. — E você podia bem me ajudar de vez em quando, né? — Eu ajudo! — Aham. Sei. Vai tomar banho logo, vai. O jantar tá quase pronto. — Já tô indo, maninha. Ele sobe as escadas e eu começo a arrumar a mesa com um leve sorriso no rosto. A vida não é fácil… Mas ver meu irmão bem me faz esquecer qualquer cansaço. (***) Segunda-feira. A rotina me puxa de volta pela coleira. Já arrumada, tomo café com o Brian, trocamos algumas palavras rápidas e saímos. Ele me deixa na porta da empresa e segue para a universidade. Entro no prédio e dou bom dia ao senhor João, o porteiro mais simpático que já conheci. Subo as escadas, como de costume — se não dá tempo pra academia, que pelo menos as escadas me deixem com a consciência limpa. Chego no meu andar morta de cansaço. Juro que se tivesse mais um lance, eu deitaria ali mesmo. Por que, meu Deus, todo CEO insiste em montar escritório no último andar? É síndrome de grandeza, só pode. Vou direto pra minha mesa, jogo o corpo na cadeira e tiro os sapatos, sentindo os pés gritarem de dor. E claro… justo nesse momento, o elevador se abre e ele sai de lá. Thiago Velásquez. Impecável. Frio. Lindo. E com o mau humor de sempre estampado no rosto. — Na minha sala agora, senhorita Valle. — diz, passando por mim sem sequer olhar. — Nenhum “bom dia”? Que delicadeza, chefinho. — murmuro baixinho, tentando calçar os sapatos às pressas. Suspirando fundo, me levanto e o sigo. Bato na porta aberta e entro. — Com licença. O senhor deseja algo? — Sim. Se não quisesse, não teria te chamado. Agora entra e fecha a porta. — responde sem tirar os olhos do notebook. Arrogância tem nome, sobrenome e CPF. Faço o que ele manda e fico ali, esperando ele dizer o motivo de tanta urgência. Mas ele só continua mexendo no notebook, como se eu nem estivesse ali. — Senhor Velásquez… em que posso ajudar? — pergunto após longos minutos de silêncio. Nada. Nem um olhar. Nem um gesto. Deus me dá paciência. Viro-me para sair. Tenho uma pilha de relatórios esperando por mim. Mas quando minha mão toca a maçaneta, a voz dele me corta como uma navalha quente. — Pare. Eu não mandei você sair. Viro lentamente, tentando manter a compostura. — Estou parada aqui há mais de cinco minutos, feito uma planta. O senhor não diz nada. Ele levanta da cadeira. E então começa a caminhar na minha direção. Devagar. Letal. Sexy como o inferno. É quase surreal. O terno azul escuro marcando o corpo, os olhos castanhos cravados nos meus… e eu? Congelada. Meu rosto esquenta e um frio invade minha barriga. Sinto a pele arrepiar antes mesmo de ele chegar perto. — Por que não aceitou minha carona naquela noite? — pergunta com a voz baixa, rouca, perigosa. — Porque… porque não quis. — respondo, já dando dois passos para trás. — E porque você é meu chefe. Não seria... apropriado. — Eu não ia te morder. A não ser que você quisesse. — diz, com um meio sorriso torto, enquanto coloca uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha. Meu coração pula. Meu cérebro trava. Minhas pernas tremem. — Senhor... eu não tô te entendendo… — murmuro, quase gaguejando. Ele sorri. Um sorriso de quem sabe exatamente o efeito que causa. — Não se faça de ingênua, senhorita Valle. Você sabe muito bem do que estou falando. — Eu… não sei. Estou aqui porque você me chamou, só isso. E eu queria acreditar nas próprias palavras. Mas o jeito que ele me olha… como se já tivesse me despido mil vezes com os olhos… me deixa sem ar. Ele se inclina, seu rosto próximo demais, seu cheiro invadindo o ar ao meu redor. — Desde aquela noite… — ele sussurra perto do meu ouvido — quando te vi naquele mini vestido... tive pensamentos inapropriados. Vários. Minha garganta seca. Meu corpo inteiro entra em alerta. E eu… não sei se quero fugir ou provocá-lo mais. Antes que eu possa responder qualquer coisa, ele toma minha boca num beijo feroz. É rápido. Quente. Dominante. Meus olhos se arregalam e meu corpo tenta resistir, empurrá-lo, negar o que está acontecendo. Mas a boca dele é exigente. Seu toque é firme. Ele insiste, buscando passagem, exigindo minha rendição com a língua. E eu cedo. Mesmo relutante, meu corpo trai minha razão. Nossas línguas se encontram e se encaixam como se já se conhecessem de outras vidas. A sincronia é absurda. O gosto dele, viciante. E por um instante, eu me esqueço de tudo. Mas só por um instante. Empurro-o com força e, sem pensar duas vezes, dou um tapa em seu rosto. A palma estala no silêncio da sala. — O que pensa que está fazendo?! — disparo, com o rosto em fogo e o coração acelerado. Ele leva a mão à bochecha, sorri... e alisa o próprio rosto com calma, como se eu tivesse feito um carinho. — Te beijando. — responde com ironia, os olhos queimando nos meus. — Nunca mais ouse me beijar de novo. — Vai dizer que não gostou? — rebate com aquele sorriso cínico que dá vontade de socar… ou de beijar de novo. Maldição. — Não. Não gostei. — minto. Na cara dura. Porque, sinceramente? Que beijo foi aquele, minha santinha do céu? Ele dá uma risada alta, debochada, como se tivesse lido meus pensamentos. — Tá rindo de quê? — pergunto, irritada. — De você. Da sua tentativa patética de fingir que está no controle. — diz, se aproximando mais uma vez, devagar, como se saboreasse o jogo. — Sei muito bem o tipo de mulher que você é, Pricila. Arqueio uma sobrancelha, pronta para soltar fogo. — Ah, sabe? — Claro. No início, você faz esse papel de durona. Finge que é diferente, que não quer nada... mas no fundo tá só me testando. Tentando ver até onde eu vou. Só quer me ver correndo atrás. E depois? Vai acabar se jogando na minha cama, como todas as outras. — Você tá me confundindo, senhor Velásquez. E muito. Ele ergue o queixo, provocativo. — Tô? — TÁ. Eu não sou esse tipo de mulher. Se está acostumado com gente que implora por um olhar seu, sinto muito em decepcionar. Mas comigo, esse joguinho de poder não cola. — Então quer que eu jogue sozinho? — Exatamente. Porque eu não participo de joguinhos sujos. A raiva toma conta do meu corpo. O peito sobe e desce com força. O coração ainda bate acelerado — não só pelo beijo, mas por tudo. Pela ousadia. Pela audácia. Pela prepotência. Ele me encara, e por um segundo… seus olhos mudam. Um relance. Como se eu tivesse acertado algo nele. Mas logo o sorriso volta. O sorriso de quem acha que já ganhou. — Vai ver, eu gosto de desafios. — E eu gosto de paz. Então mantenha distância. Entendido? Silêncio. Tensão no ar. E eu? Eu saio da sala com o rosto quente, as pernas bambas… e a sensação de que, mesmo tendo dito tudo, ele ainda levou alguma parte de mim naquele beijo.
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