Afhany o seguiu ainda meio tonta com tanta descoberta. Entraram num ambiente ricamente mobiliado, mas ao contrário de seu quarto, esse era totalmente personalizado. Ela notou pelos quadros e esculturas dispostos em cada canto.
_Demy! Demy está aqui?
_Sim, meu senhor se aproxime por favor! Ela estava em sua cama onde um véu impedia-se de vê-la além de um vulto.
Sem cerimonias, Matheus se aproximou e afastou o véu com agilidade. Afhany recuou um passo surpresa. A primeira concubina era o que ela jamais poderia imaginar. Sua beleza era incontestável, Era uma mulher n***a com lábios carnudos! Seus olhos e por todo seu corpo haviam pinturas. Sem poder se conter, observou que além de muito bela, era alta e em seu rosto se via que era uma mulher difícil de se dominar. Como será que Moisés conseguira?
_Vou deixa-las a sós por alguns instantes, mas volto logo para busca-la, Afhany.
Matheus saiu achando divertido ver as duas se estudando. Pareciam que estavam próximas de se gladiarem.
Assim que ele fechou a porta Demy se levantou e se aproximou de Afhany.
_Entendo sua surpresa... Você acha que por ser branca é melhor que eu... E que conseguirá tirar a atenção do amo de mim facilmente... - Ela disse, fitando Afhany de cima.
_Não! Eu...
_Outras já tentaram, mas não tiveram sucesso... Vai ser divertido vê-la tentar...
Ela não parecia intimidada e nem rancorosa de verdade.
_Esta enganada senhora! Não pretendo tentar toma-lo, ao contrário, preferia que ele não me visitasse...
Ela arregalou os olhos.
_Devo confessar que me intriga mocinha, mas não posso confiar em ninguém além de mim.
_Por que diz isso? Tem segredos?
_Sim, mas jamais saberá.
_Gostaria que fossemos amigas.
_Talvez sejamos... Já visitou a segunda concubina?
_Não... Há algo de especial nela?
_Quero ouvir de você a impressão que terá dela. Por isso não direi nada que possa influencia-la.
_Então falemos da senhora... Quantos anos tem?
_Na verdade quer saber a quanto tempo estou aqui, não é?
Afhany sorriu.
_É muito perspicaz...
_Sou. Estou aqui há dez anos... tenho vinte e seis anos.
_De onde veio?
_Nasci e cresci no país do Dosso. Fui vendida ainda criança e nem me lembro dos meus pais...
Afhany se assustou ao perceber o quanto suas histórias se pareciam.
_Foi assim comigo também... Não se revoltou ao ser tirada de seu pais para servir a um senhor tão c***l?
_Meu amo não é c***l! E como poderia me revoltar se no meu país enquanto milhares de crianças morriam de fome e peste, estava a salvo tendo vida de rainha? Só o que me preocupava era ele ser um homem muito velho e asqueroso, mas quando o vi e descobri que minhas aflições não tinham fundamento me apaixonei imediatamente.
_Teve que passar pelo ritual?
_Oh sim! Aquilo sim foi horrível... Mas é um m*l necessário... E só acontece uma vez com cada uma de nós.
_Tem ciúmes da outra concubina?
_Quando ela chegou aqui tive medo de que meu amo perdesse o interesse por mim, então cheguei a odia-la. Mas depois que percebi que ele jamais me abandonaria ficamos amigas. É tudo uma questão de tempo. A vida aqui é muito boa, apesar da monotonia que as vezes sentimos. O amo sempre nos recompensa pelas horas vagas. Nos leva ás compras, a outras partes do reino e as vezes nos surpreende com um presente. Você vai acabar gostando dessa vida.
_Acho difícil...
Nesse instante Matheus retornou trazendo consigo uma mulher trajada como se fosse uma rainha. Era linda. Loura, olhos verdes e alta como Demy.
_Achei melhor trazer a outra companheira das senhoras aqui, pois o tempo se escoa e Afhany terá que voltar para seus aposentos. Afhany te apresento Louise e as deixo para que possam conversar á vontade.
Matheus disse e saiu novamente. A outra mulher observou Afhany dos pés a cabeça e foi se sentar numa poltrona perto da cama.
_Oh Demy! O que vamos fazer com mais uma concubina para nos disputar a companhia de Moisés? Ela se lamentou num tom de brincadeira.
_Segundo ela, não precisamos nos preocupar. - Demy respondeu no mesmo tom e ambas começaram a rir. Afhany permaneceu séria e calada.
_O que foi Afhany? Estamos apenas brincando. - Disse a loura. - Na verdade nós duas somos como irmãs e esperamos que seja assim com você também.
_Agradeço. É que tudo aqui esta sendo muito difícil para mim, mas acho que com a ajuda de vocês, meus dias aqui não serão tão horríveis assim... Só fico a imaginar quantas mais virão...
_Acho que posso lhe responder. - disse Louise - As escolhidas para concubinas pelo rei, pai de nosso amo somos apenas nós, há ainda a escolhida para esposa que já esta para vir. Essa Moisés buscara pessoalmente.
_Porém -disse Demy -Ele pode escolher quantas concubinas quiser.
_Como sabem disso tudo?
_Querida... Não pense que somos tão insignificantes assim! Nosso amo nos participa de todas as suas coisas.
_E quando ele buscará sua esposa?
_Logo que terminar a semana com você.
Matheus entrou novamente.
_Temos que ir Afhany! Moisés já chegou e quer que cumpra suas obrigações agora.
Afhany se despediu das duas e saiu com Matheus.
_Essa ai vai dar trabalho para o amo. Disse Demy assim que saíram.
Louise se aproximou curiosa.
_Teve mais uma premonição?
Demy apenas balançou a cabeça.
Na mata do Redô, havia um palácio de cristal, que nenhum mortal jamais encontrou apesar de saberem sua existência. Lá morava o deus da mata, Tolar. E uma reunião se fazia lá dentro, com todos os conselheiros do deus e sua filha Liã.
Liã adentrou no grande salão, o grande burburinho de voz cessou assim que notaram sua presença. Sua beleza era grande e era admirada por todos. Todos os profetas de seu pai se encontravam ali. Usavam vestes brancas com adornos de ouro. Liã além do vestido branco, usava um pingente com formato de poney, que simbolizava a vida eterna, na testa. Seu pai se encontrava sentado ao trono mas se levantou para recebe-la assim que se aproximou do trono.
_Minha linda menina! Tolar a saldou dando-lhe um beijo na testa.
_Estou curiosa, meu pai... Jamais tive permissão para acompanhar as reuniões.
O deus riu-se.
_Desta vez, você deve fazer parte dela. O destino da humanidade está sendo discutido aqui.
_E o que posso fazer para acrescentar sabedoria aos mais sábios do mundo?
_Terá que se aliar com um deus. É chegada a hora de cumprir sua missão.
Liã fitou-o pensativa. Sabia que era esse seu destino. E jamais o temeu. Era apenas curiosa. Pois todos os deuses já tinham suas amantes.
_Quando poderei conhece-lo?
_Ele está a caminho... Dou-lhe permissão para observa-lo na água sagrada da tina.
Liã se aproximou da grande tina de ouro que ficava em uma almofada do lado do trono.
Mas ao observar a água ficou surpresa.
_Mas o homem que vejo aqui é um mortal!
O pai se aproximou e pôs a mão em seu ombro.
_Não será mais por muito tempo.
_Não entendo...
_O deus theo, vai lhe passar seus poderes e ele se transformara em um deus.
_Mas, porque deus theo vai fazer isso?
_Ele não quer mais viver entre os mortais. Irá embora com sua amada e Moisés foi o escolhido para substitui-lo. Caberá a você prepara-lo para essa função.
_Como poderia? Ele vai se casar e já tem várias concubinas. Não irá me ouvir jamais. Ficarei em segundo plano. Sera-me impossível prepara-lo. Serei para ele apenas mais uma concubina!
_Não. Ele á amará mais que as outras. Você será sua rainha, mesmo que para os outros, outra tenha esse título.
_Como pode saber que ele me amara? Os deuses não podem interferir em sentimentos.
_Se ambos não se apaixonarem, então ele não poderá ser o escolhido. Pois a profecia não terá se cumprido.
_Quando ele se tornará um deus?
_Assim que estiver pronto. Agora vá e se prepare. Não temos mais muito tempo, ele se aproxima.
Moisés cavalgava já há mais de dois dias. Seu corpo estava dolorido e cansado. Seus homens o acompanhavam a uma certa distância, também muito cansados da longa viagem.
Ao longe já podia se avistar o castelo. Moisés esporeou o cavalo o incitando a ir mais depressa, quando viu que o castelo não estava mais tão distante. Na sua galopada avistou um lago prateado. Olhou em sua volta procurando seus acompanhantes para convida-los a um mergulho, mas não havia nem sinal deles. Imaginou que devia ter sido muito rápido e desmontando do cavalo, foi logo se despindo e pulando na água, não sem antes perceber a beleza do lugar .Era como um oásis no deserto. Assim que seus homens o alcançasse lhes daria uma hora de descanso naquele lugar. Foi até a margem e deitou-se para tirar um cochilo enquanto eles não chegavam.
Quando acordou viu uma bandeja, feita de folhas, com algumas frutas. Olhou em sua volta. Com certeza seus homens já estiveram ali e deixaram algo para alimenta-lo sem acorda-lo. Abriu um sorriso. Gostava deles e de suas mostras de grande respeito. Mas gostava mais ainda da camaradagem e amizade que existia entre eles. Comeu tudo agradecendo ao seu deus por tão bela refeição e descanso. Reinava uma grande paz ali e já há muito que ansiava por paz. Para completar o paraíso só uma bela donzela.
Ouviu um sorriso, e virou-se apressado. Seu desejo se materializou na sua frente. Sorriu quando ela começou a cantar. Os deuses estavam do seu lado. Reconheceu imediatamente que a música que cantava era o hino das fadas. A lenda daquele lugar dizia que as fadas, em seu período de fertilização, seduzia os homens com aquele canto. Dizia-se que aquele que conseguisse aprisionar uma delas teria todos os seus sonhos e desejos realizados. Porém, sabia-se que somente o escolhido poderia aprisiona-las, mas também seria aprisionado se ousasse querer provar de seus prazeres. Moisés não dava atenção aos avisos que seu conhecimento lhe enviava. Sabia que estava tendo a visão mais impressionante de toda a sua vida e era isso que o importava naquele momento... Ela se banhava totalmente nua, e a luz do luar emprestava a seu corpo perfeito, um brilho de pérola. Seus cabelos longos eram negros como a noite e assim que ela o encarou pode perceber que seus olhos eram cinzas. Se não fosse por seu corpo de mulher, diria que não passava dos quatorze anos, pois seu rosto transmitia a inocência de uma criança. Ela lhe lançou um sorriso carregado de promessas sensuais e começou a vir em sua direção. Antes de alcança-lo parou e ergueu a mão num mudo convite. Moisés aceitou e teve a experiência mais inebriante de toda a sua vida. Nunca gostara tanto de acariciar uma mulher, como naquele momento. Ela lhe correspondia e suas mãos inexperientes tentavam dar a ele o mesmo prazer que recebia. Moisés ficou contente quando no ato da penetração, descobriu que era virgem. Foi a primeira vez que a fera não tomara uma mulher em sua primeira vez. Ele estranhou, mas estava por demais saciado e satisfeito para se preocupar com a voz implacável da fera que gritava feroz de dentro de si reclamando o prazer que era seu por direito e lhe fora negado. E foi com essa indiferença que a levou para margem e se deitaram sem nada a dizer, apenas se contemplando um ao outro. Moisés sabia que aquela era uma experiência única em sua vida, e jamais se repetiria... se a deixasse escapar... Ela pareceu ler sua mente e com um salto pôs-se de pé e tentou fugir. Mas Moisés foi mais rápido e a capturou.
_Onde pensa que vai?
_Por favor, me solte! Preciso ir... Seus olhos eram de súplica.
Moisés fechou os olhos. Era a voz mais linda que já ouvira.
_Voltarei a vê-la?
_Provavelmente não...
_Qual seu nome?
_Liã. Ela respondeu olhando assustada para os lados. Mas voltou a encara-lo. - Por favor tem que me soltar! Seus amigos se aproximam, e eles não podem me ver.
Ele a ignorou.
_Onde mora?
_Não sabe? – Ela arregalou os olhos.
_Não. Deveria?
Ela o olhou desconfiada.
_Se banhou nas águas dos deuses, comeu sua comida e me desejou! Como pode dizer que não sabe onde moro?
Moisés estava sério e incrédulo.
_O que quer dizer?
_Pisastes em solo sagrado, onde nenhum outro mortal pisou antes. Provou que era o escolhido, e o deus da mata querendo agradar-lhe concedeu-te seus desejos.
_Mas porque eu?
_Já disse! É o escolhido.
_Escolhido para que?
_Será um deus. Tão imortal quanto qualquer deus. Me sinto honrada em tê-lo servido...
_Cale-se! Como ousa tentar me enganar, dizendo que serei um deus? Não vai me enrolar! Pagarei seu preço a seus pais e levarei-a comigo para meu reino.
_Mas é verdade! A profecia se cumpriu quando um mortal que já era um deus entre os seus, nadaria no lago sagrado que nenhum mortal pode ver. Comeria da comida dos deuses como se tivesse direito á ela...
_Pare! Não acredito! Porque o deus da mata precisaria de um mortal para transforma-lo em deus?
_Ele não precisa... Apenas, descobriu o deus que foi deixado na terra por vingança de uma amante furiosa. E mesmo que não queira acreditar, não podera fugir do seu destino por muito tempo...
_E nem você ao seu! Moisés disse e saiu arrastando-a tirando-a daquele lugar. Assim que encontrou seu cavalo seus homens também o encontraram.
_Majestade! Onde estava? Estamos há horas o procurando... Disse Leal. O homem de Moisés que fazia jus ao nome. Mas se calou a ver a donzela que o acompanhava.
_Estava me banhando no lago.
Os homens se entreolharam.
_Que lago, senhor?- Perguntou Leal temeroso da resposta que ouviria.
Moises olhou novamente e o lago havia sumido. Olhou assustado para Liã.
_Que feitiçaria é essa sua bruxa? Onde esta o lago?
Ela apenas o olhou desafiante.
Os homens se entreolharam.
_E essa dama, quem é?
_Encontrei-a no lago e vou leva-la comigo!
Mas uma vez os homens se entreolharam.
_Porque vai leva-la senhor? Vai se casar daqui á alguns dias e já tem três concubinas...
_Eu sei Leal... Tenho muitos motivos para não leva-la, mas...Não poderia viver sem ela.
Leal abaixou a cabeça. e os outros homens o acompanharam. Não precisavam trocar palavras. Conheciam a lenda daquela feiticeira. Ele se apaixonara por ela. Logo, não teriam mais Moisés como seu senhor.
Liã abriu um sorriso ao ouvir a declaração de seu amo. Mas não queria que ele sofresse. Amava-o também. E precisava impedi-lo de se destruir levando-a consigo.
As folhas das árvores começaram a balançar e seus troncos faziam barulhos apavorantes. Pareciam se comunicar entre si. Liã começou a entoar um canto, e do meio da mata surgiu um tigre dentes de sabre no caminho deles. Ele rodeou a todos e parou no caminho por onde deviam seguir.
Moisés ficou deslumbrado, mas estranhamente não o temia como seus homens. Fizeram menção de fugir, mas Moisés com um gesto os impediu.
_Deixe-nos passar em paz! Ordenou Moisés. Mas era só no pensamento, seus lábios não se moviam. E foi assim que a fera o respondeu.
_Deixarei, se não levar Liã. É minha por direito.
_Porque diz que é sua?
_Porque você não cumpriu sua palavra. Não realizou o ritual com ela. Lembra-se do que combinamos. Era a primeira vez! Tinha que ser minha e depois a teria para sempre. Até o deixaria passar se ela não tivesse me invocado para tira-la das suas mãos. Iria perdoa-lo, mas já não posso mais.
_É mais fiel á ela que a mim? Que já lhe saciou com as mais belas mulheres de todo o mundo? Mas diga ingrata criatura, se lhe oferecer algo que o interesse me deixará passar?
_E o que seria? Se verdadeiramente me interessar faremos um trato.
_Tenho três concubinas e uma noiva. Escolha uma e a tomará na sua forma, quantas vezes quiser.
_Poderei escolher a que quiser?
_Somente Liã , não permitirei.
_Pois então escolho Afhany.
Moisés recuou.
_Não pode ser outra?
_É essa que quero, ou não o deixarei passar.
_Meu irmão a pediu para a compartilharmos e aceitei. Sabe bem que não posso voltar atrás na palavra dada.
_Pois então compartilharemos os três.
_Se aceita essa condição então estamos de comum acordo.
_Nunca mais repita essa traição. Da próxima vez não terá acordo. - A fera disse e desapareceu na mata. Moisés olhou para seus homens que estavam assustados e ordenou que continuassem a viagem.
_Leal, poderá cuidar dela? Não posso chegar ao castelo de minha noiva levando uma escrava. Seria uma afronta ao seu pai.
_Pode deixar senhor. Levarei-a para a vila e alugarei um quarto. Prometo cuidar bem dela.
_Faça isso Leal... Ela é muito importante para mim.
Leal tirou de sua trouxa uma roupa das como usava e a cobriu.
_Não papai! Não pode me obrigar a casar! Eliza se desesperava.
_Será que preciso lembra-la de que é minha filha?! Dom João bateu com o punho na mesa, fazendo com que Eliza, desse um pulo involutário. Seu pai estava irredutivel. Iria casa-la com um homem dez anos mais velho que ela, tinha a fama de ser muito duro com todos, principalmente com seus escravos e tinha várias concubinas. Precisava convencer seu pai a mudar de ideia. Não imaginara que seria tão difícil.
_Mas papai, nem o conheço...
_O que está dizendo? Moças descentes só conhecem o noivo no altar, assim que este levanta-lhe o véu. Portanto, está muito certo que não o conheça. Eu mesmo tratei de seu casamento com o pai dele há muito tempo atrás.
_Isso foi no seu tempo! As coisas mudaram...
_Por favor! - Ele ergueu a mão para silência-la. - Não quero mais discutir o que já é fato. Se casará e devia estar feliz com isso.
_Como poderia estar feliz? Quer me obrigar a casar com um homem que nunca vi! Não sei nada sobre ele... Não o amo! Como poderia? Pois tu me negaste o prazer de conhece-lo.
_Sabe tudo que precisa saber. Ele é um rei, muito rico e próspero, dono de muitas propriedades e muitos escravos. O pai dele á escolheu quando ainda era uma criança para ter a honra de ser a rainha! O que mais poderia querer? É o sonho de toda moça! E o amor vem com o tempo.
Eliza se irritou e se aproximou mais da mesa a passos lentos, mas que decididamente revelavam sua determinação e fúria contida.
_Isso é tudo que o "senhor" precisa saber! Pois lhe afirmo que se não o conhecer antes do casamento, quando o sarcedote me fizer a pergunta, direi não! E não me importo com o castigo que irá me impor. – Ela disse e se encaminhou para a porta, mas não saiu. Não ousava. Virou-se para o pai e ficou o fitando, esperando que desse a permissão para que se retirasse.
Dom João torceu os lábios nervoso. Sabia que Eliza cumpriria sua ameaça. Olhou para suas mãos onde seus dedos brincavam nervosamente com o colar em seu pescoço. Era óbvio que ela esperava uma resposta.
Não podia correr o risco de passar por uma vergonha assim... Seria uma ofensa ao rei. Poderia até provocar uma guerra. Não sabia a quem aquela menina puxara... Sua mãe era tão doce... Fitou o rosto impaciente da filha. Tinha grandes olhos azuis, seu rosto de maças salientes e lábios rosados. Tão parecida com a mãe... Mas o gênio definitivamente não era herança da mãe.
Dom João soltou um suspiro de derrota.
_Está bem. Lhe darei uma festa de boas vindas no sábado para que o conheça...
Eliza ergueu o rosto feliz e orgulhosa, com sua vitória. Já ia de encontro a seu pai para lhe dar um abraço, quando ouviu suas próximas palavras.
_E no domingo se casará.
_Tão rápido? Eu...
_Chega, Elisa! Já lhe concedi uma vontade. Se se recusar ainda assim a se casar, lhe entregarei a ele como concubina!
Eliza sabia a hora de se calar e aquela era uma. Pediu licença e saiu fazendo uma reverência debochada.
Foi até o quarto de sua mãe que repousava e contou a conversa que tivera com o pai. A mãe como sempre permaneceu neutra. Elisa arrumou suas cobertas e deu-lhe um beijo na testa e saiu. Sabia que seu pai planejava se casar novamente, contando com a morte de sua mãe. Mas para seu desespero, já fazia dois anos que sua esposa estava acamada. Mas, Eliza sabia que ele estava procurando uma jovem esposa para substitui-la, e quem sabe, até lhe gerar um herdeiro. Eliza realmente desejava sair de casa para não ver aquilo tudo acontecendo. Seu pai já estava perdendo a paciência e acabaria por se casar antes que sua rainha partisse com os deuses. E sua única chance de sair do palácio seria casada. Mas ela preferia se casar com um criado a um homem que não lhe inspirasse amor.
Chegando ao seu quarto foi até a janela de onde podia observar o enorme jardim em labirinto, os pássaros e as flores trepadeiras do muro do castelo. Talvez depois de casada, nunca mais viria ali, se o futuro marido fosse tão r**m como todos diziam, não permitiria que visitasse o pai. Odiou-o desde já. Como seu pai dizia que a amava e ao mesmo tempo á entregava á um desconhecido? O que ele ganharia com isso? Sabia que era um acordo entre os deuses de ambos, mas porque negociara a felicidade dela? Podia ter oferecido outra prenda para seus deuses. Ela saiu da janela e sentou-se em sua cama. Estava revoltada. Ela também servia aos deuses. Era uma injustiça que a tratassem como moeda de troca. Seu pai, com certeza deve ter recebido um grande favor dos deuses para aceitar casa-la. Contudo, isso não mais importava. Seu destino estava traçado.
Durante a semana que antecedeu seu casamento, pensara várias vezes em fugir. Mas sua consciência não permitia. Foi justamente no sábado, quando se arrumava para a festa com a ajuda da criada que teve a ideia. Faria com que esse homem, não a quisesse como esposa. Passou-lhe como um relâmpago a ideia de se vestir como mucama, mas a descartou ao imaginar a vergonha e a fúria do pai. Tinha que ser algo que seu pai não percebesse.
Assim que a mucama terminou de abotoar seu vestido, mandou que essa corresse até a cozinha e lhe trouxesse um pedaço de carvão. A mucama estranhou o pedido, mas como era acostumada a obedecer ordens, saiu para executar a tarefa sem fazer perguntas.
Eliza ficou andando ansiosa de um lado para o outro no quarto até ouvir a batida na porta.
_Entre, entre! Era a mucama. - Trouxe o que pedi?
A mucama abriu um sorriso e lhe depositou a encomenda nas mãos.
_Obrigada Maria! Pode ir agora.
Correu para frente do espelho e pôs-se a pintar os dentes. Ficou a observar seu sorriso no espelho. Deu um pulo quando ouviu a batida na porta.
_Quem é? - Perguntou preocupada. Ninguém a podia ver assim, além é claro, de seu noivo.
_Sou eu, querida! – Ao reconhecer a voz do pai sentiu-se pressionada. Ele não podia ver seus dentes. Mas ela não podia negar-lhe que a visse. Afinal de contas, ele que a entregaria a seu marido. Pensando, resolveu que não falaria nada olhando para ele. Se ele estranhasse, diria que estava muito confusa e desejava ficar sozinha até o momento em que deveria descer para conhecer seu noivo.
_Papai? É... Pode entrar!
Ele abriu a porta e a olhou orgulhoso. Estava num vestido rosa, feito da mais fina seda e com babados adornando o colo. Ela lhe lembrava os bons anos de sua acamada esposa... Esperava que sua filha tivesse mais sorte que a mãe...
_Está linda minha filha! – Ele disse com sinceridade.
Eliza abaixou a cabeça fingindo embaraço, embora sua preocupação era não deixa-lo perceber o que fizera com seus dentes.
_Obrigada, papai. – Ela disse emprestando timidez ao seu tom de voz.
_Vamos? O salão está cheio e seu noivo já chegou.
Eliza sabia que essa hora chegaria, mas não pensou que seria tão rápido.
_Claro papai! - Estou ansiosa por conhecê-lo. – Ela disse mantendo baixo seu rosto, para que ele não a descobrisse. – Ela disse colocando a mão entre seu braço e saíram.
O pai a olhou curioso, mas não fez comentário algum. Não distinguiu a ironia na sua voz e nem sequer pode ver seu sorriso de rebeldia. Apenas ficava contente por ela não começar uma nova briga para não aceitar seu noivo. Só essa paz, já lhe era suficiente no momento.
A música parou de tocar assim que Eliza apareceu no alto da escada que dava para o salão, onde acontecia o baile. O salão estava repleto, o que a impossibilitou de reconhecer algum rosto. Desceu as escadas acompanhada de seu pai, enquanto todos voltavam-se para olha-la. Olhou novamente para o salão repleto de gente que ela não conhecia. Quem seria seu noivo? Prendeu a respiração quando olhou para o fim da escada. Parado ali a admira-la, estava o homem mais lindo que já vira. Seus cabelos lhe caiam pelas costas e eram negros como os olhos que a encaravam. O nariz era reto e aristocrático. Ele se parecia com uma obra perfeita de algum artista. Sua boca cheia e convidativa sustentava um meio sorriso, Elisa se pegou pensando em como seria beija-la. Ele era alto. Pôde notar pelas outras pessoas a sua volta. Estava trajado impecavelmente e ricamente. Usava um brinco de ouro, o que a fazia pensar em um pirata rebelde.
Sempre guiada por seu pai, acabou de descer as escadas. O estranho lhe ofereceu a mão e Eliza sentiu que corava por tamanho atrevimento. Fitou o pai a procura de reprovação, pois sabia que ele ficaria louco de raiva se outro homem a tocasse. Mas o que encontrou foi um sorriso cordial.
E foi com esse sorriso que os apresentou.
_Á sua majestade, o rei de Dales, seu noivo minha filha. – Ele disse tirando a mão dela de seus braços e entregando-a a Moisés.
Eliza fitou-o surpreendida. Não era como imaginava. Seus olhos se encontraram e Eliza acabou por fazer uma mesura e aceitar a mão que oferecia. Dando um leve aperto, já que seu pai já a tinha entregado a ele.
_Vamos dançar. - Ele comunicou. Não era um pedido e ela o acompanhou. Apesar de se mostrar contrariada, resignada foi para o meio do salão. Não pôde deixar de notar que ele dançava bem. Pensou então em tudo que diziam dele e seu ódio voltou com força total. Resolveu colocar seu plano em ação. Entortou os olhos e levantou a cabeça para encara-lo. Abriu um sorriso assim que se viu observada. Ele a fitou chocado, principalmente ao olhar para seus dentes. Mas após o instante da surpresa, recomeçou a dança sem fazer nenhum comentário.
Eliza se irritou, e com toda falsa educação, perguntou-lhe;
_Então, meu noivo? Não me considera muito bela? Não sou como esperava?
_É muito mais bela que podia imaginar... Estou impressionado.
_Vejo que não se importa com detalhes! Desde que tenha um corpo, não importa o rosto! – Ela disse deixando cair sua máscara de falsa educação e irada por ele nem mesmo ter caído em sua armadilha.
_É muito perspicaz, minha noiva. – Ele disse sem se abalar com seu comportamento grosseiro.
Eliza não estava mais conseguindo conter sua fúria. Ele conseguia fazê-la se sentir uma louca. E naquele momento, ela se sentia mesmo uma louca.
_Então diga-me meu adorado "noivo", ousará me beijar após casarmos? Ou apenas se saciará com meu corpo? – Ela perguntou entre dentes.
_Não devia estar a falar assim com um homem. Não é de bom tom. Ainda não nos casamos.
_É covarde! Teme responder uma dama com a mesma sinceridade com que é tratado. – Ela disse tentando deixa-lo furioso.
Moisés parou a dança e a levou para um canto. A encostou na parede e olhou bem fundo em seus olhos.
_Não sou covarde, apenas queria adverti-la de seus maus modos. Vou satisfaze-la. A beijarei quantas vezes quiser se não passar carvão nos dentes, é um costume muito estranho. E como não estou no meu habitat, por enquanto eu prefiro ficar quieto, pois acima de tudo respeito costumes e não sei quais são os daqui. Entendeu? – Ele disse e se afastou um pouco.
_Como sabe...? Lisa passou a mão involuntária nos dentes, e começou a rir, no que Moisés a acompanhou. Achando ela mais bela ainda quando sorria. Pois não tinha se agradado de ver seu rosto m*l humorado. Não desejava de forma alguma ter uma rainha assim.
E assim ficaram á conversar amigavelmente e Eliza se apaixonou por seu futuro marido. Ele era inteligente e engraçado. Gostava de cavalgar e nadar. Tudo que ela também gostava. Naquele dia descobriu que seria muito feliz do lado dele. E esperou ansiosa pelo dia seguinte quando se casaria.
Mas esse dia não foi tão feliz quanto ela imaginou, pois a sombra de uma mulher se interpôs entre eles.
_Está linda minha filha... – O pai lhe disse com voz embargada, tentando conter o choro. Sabia que estava fazendo um bem para sua filha, mas ia sentir sua falta. De suas conversas inteligentes. Antes era sua mãe que lhe fazia companhia, mas agora ficaria só, a não ser que tomasse uma segunda esposa. E vinha pensando nisso com muita frequencia ultimamente.
Lisa virou-se do espelho onde se mirava, ao ouvir seu pai.
_Ah papai! - E correu a dar-lhe um abraço. – Você é o melhor pai do mundo! Vou sentir sua falta...
_Calma Eliza, não deve amassar seu vestido. - Brincou, mas ao olha-la mais atento, notou lagrimas em seus olhos.
_Não chore... Tenho certeza de que será muito feliz. Não o aprovou?
_Sim, papai e desde já o amo. Essas lágrimas são por saber que nos separaremos.
_Poderá vir me visitar quando quiser.
_Eu sei.
Ambos riram, e Dom João se retirou.
Eliza se mirou mais uma vez no espelho. Estava realmente se superando. Nunca se sentira tão bonita e feliz.
No grande salão havia muitos convidados. Moisés já estava um pouco impaciente. Não gostava desses rituais, nem mesmo do ritual de seu deus ele gostava. Apenas cumpria por obrigação.
A música parou e começou a tocar uma música de arpa indicando que a noiva estava se apresentando. Moisés olhou para o fim do salão e prendeu a respiração. Estava linda. Usava um vestido vermelho vaporoso e seu véu também vermelho, era todo chamuscado de pequenos brilhantes assim como o próprio vestido. Agora o silêncio reinava ali. Apenas o som da arpa se ouvia.
Ao levantar-lhe o véu descobriu sem muita surpresa, que seu pai lhe soubera escolher sua rainha, pois esta mulher nascera para ser rainha.
A cerimônia teve inicio. O deus de Eliza estava representado por uma estatueta de touro. E era celebrado junto. Todos assistiam comovidos, o casamento dos jovens. Houve uma grande festa após o casamento, onde os noivos ficaram sentados á uma grande mesa com os parentes, enquanto vários artistas se apresentavam para diverti-los. Mas a noite chegou e todos se retiraram. Restando aos noivos subirem para seus aposentos, para terem a noite de núpcias. Pelo menos era assim que Eliza imaginava que seria.
Eliza subiu na frente para se aprontar. Vestiu uma camisola creme e um robe da mesma cor, e ficou aguardando ansiosa a entrada de Moisés. Já ficara horas ouvindo sobre as noites de núpcias de suas criadas, mas agora, ela mesma teria sua história.
Moisés não se demorou. Ao chegar e notar que sua noiva havia se aprontado sentou-se na cama e pegando sua mão, deu-lhe um beijo casto.
_Sabe que estava linda?
Ela apenas abaixou a cabeça. Gostava de saber que ele a admirava.
_Vou lá fora tomar mais um pouco de vinho. Durma bem. - Moises disse se dirigindo a porta.
_Mas... Não vai... Dormir aqui?
Ele se virou, mas não se aproximou.
_Não posso, Eliza. Ainda não participamos da cerimônia no meu reino. Seria um desrespeito aos meus súditos, e ao meu deus. Já participei de sua cerimonia para seu deus, agora é a vez do meu.
_Podemos consumar o casamento aqui, e depois participariamos da cerimônia lá como costume.
_Então não seria mais virgem. – Ele disse balançando a cabeça.
_É importante que chegue lá virgem?
_É vital para o ritual.
Ela ergueu a cabeça. Por um momento imaginou que ele não a desejava. Mas se aliviou ao saber que se tratava de seus costumes. Desde já, odiava ao deus de seu marido.
_Então vá. Amanhã temos que acordar cedo para a viagem. – Ela dispensando-o, como se tivesse muita maturidade, mas no fundo do seu ser, uma brasa ardente lhe queimava os sentidos.
Ele sorriu satisfeito e saiu. Era bela e esperta, mas não podia contar-lhe que o verdadeiro motivo era a fome da fera. Pelo menos esse era o motivo que ele acreditava.
Passou pelos corredores do castelo e encontrou-se com Leal, que o aguardava na cozinha e sairam em silêncio. Pegaram seus cavalos e galoparam a toda. Chegaram á vila e Moisés entrou na pensão. Perguntou algo ao dono da hospedaria e esse lhe entregou uma chave. Saiu novamente e foi para trás da hospedaria, onde havia um quarto, entrou e ao ver Liã, correu para seus braços e não pensou em mais nada e nem se lembrou de fechar a porta e nem notou quando uma mulher em trajes de dormir o obsevava enquanto grossas lágrimas caiam por seu rosto. E um ódio mortal pousava em seu coração.
Eliza voltou para casa, e seu pranto ainda não cessara. Uma transformação se passava em seu coração. Fora traída e desejava vingança. Mas, por mais ferida que estava não poderia causar dor ao homem que amava. Procuraria saber quem era aquela mulher e a mataria. Foi bom tê-lo seguido. Apesar da dor, não seria enganada. Eliza se deitou, mas não conseguia dormir. Quando fechava os olhos, apareciam visões de corpos suados se entrelaçando e fazendo coisas que era para ela estar fazendo. De madrugada, quando estava quase raiando o dia, ela pegou no sono.
Foi o próprio Moisés quem veio acorda-la dando-lhe um beijo na testa. Ela sentou-se na cama e o fitou com as lágrimas voltando-lhe a nublar os olhos.
_O segui ontem a noite. – Ela disse simples, sem emoção.
Ele levantou-se da cama.
_Não devia ter feito isso...
_Me deixou para se deitar com outra! – Agora ela elevou sua voz irada.
Moisés suspirou.
_Sinto muito que tenha presenciado.
Eliza levantou-se.
_É tudo que tem para me dizer? Me fez de tola. Fez com que me apaixonasse e na nossa noite de núpcias me abandona para... Como pôde agir assim? Causo lhe repulsa? Acaso ela é mais bela e sensual que eu?
_Não. Não me causa repulsa Eliza. É muito desejável. Mas não pedirei desculpas, pois já lhe expliquei que tem que chegar ao meu reino virgem.
_E isso lhe dá o direito de se deitar com outra?
_Tenho direito de fazer o que quiser! Sou um rei! E tem que se acostumar, pois tenho minhas concubinas e não vou abandona-las por um capricho t**o seu!
_Capricho t**o?! Não me disse que tinha concubinas, e muito menos que havia trazido uma para se divertir na noite de núpcias!
_Porque esse assunto não entrou em nossas conversas. Seu pai era o responsável para lhe colocar a par das minhas condições. Cobre a ele, já que não sabia! E desde já lhe aviso que não tolero atitudes como a que está tomando! Como minha esposa deve se calar diante de minhas decisões!
_Pois desde já lhe digo que não irei com "vossa majestade" para lugar algum. Vou agora mesmo até meu pai pedir que anule esse casamento! Afinal meu "noivo" não foi capaz de assumir seu papel e consumar o casamento. – Ela disse e cruzou os braços.
_Faça isso. – Moises disse e saiu do quarto a passos largos.
Eliza bufou. Claro que ela sabia que ele tinha concubinas. Mas jamais imaginara que ele fosse tão insaciável ao ponto de trazer uma para suprir suas necessidades! Isso era uma afronta. Trocou de roupa e saiu do quarto apressada. Poderia anular seu casamento, mas perderia o homem que ama.
Encontrou seu pai na grande mesa da sala de refeições. Sorriu-lhe e sentou-se como se nada de errado houvesse acontecido. Mas seu sangue fervia por dentro. Se ele pensava que poderia trata-la da mesma forma que tratava aquelas plebeias que eram suas concubinas, estava muito enganado.
_Dormiu bem querida? Dom João perguntou satisfeito ao notar suas olheiras. A última coisa que deve ter feito foi dormir. Logo teria seus netinhos brincando pelo castelo todo. Isso lhe serviria de balsamo por não ter tido um filho homem.
_Não meu pai. Não preguei os olhos. Fiquei a esperar em vão que meu marido chegasse de sua aventura noturna. – Ela disse como se não se importasse. Como se achasse que aquilo era noemal.
_O que me diz? O casamento não foi consumado? – Ele disse confuso.
Dom João estava perplexo.
_O que aconteceu? Vocês brigaram? Se desentenderam? Pareciam tão felizes na festa...
_Ele preferiu uma de suas concubinas, que trouxera as escondidas á mim. – Ela disse, ainda disfarçando seu ódio.
_Não pode ser verdade... Vou agora mesmo tomar-lhe satisfações, não tem o direito de me ofender dessa forma! – Dom João disse irado, levantando-se para confrontar Moises.
Dom João levantou-se chamando alguns guardas para o acompanhar, enquanto Eliza continuou á tomar seu desjejum, agora sim, tranquilamente.
Moisés estava preparado quando Dom João adentrou o curral, onde conversava com Leal, com seus homens armados.
_Filho do cão! Veio até minha casa para me desfeitear e ofender. Dei-lhe o que tinha de mais precioso e me retribui assim? Vou mata-lo e dar-lhe de comer aos jacarés, para que nem sua alma suja sobreviva! – O rei gritou e o atacou com a espada.
Os dois começaram uma luta de espadas e os guardas de Moisés vieram correndo. Mas ficaram estupefatos ao vê-lo numa injusta luta, pois o rei era o melhor espadachim daqueles tempos, com seu sogro. Os homens de Dom João não participavam, apenas ficaram observando, por ordem de seu senhor. Leal também nem se saiu do lugar em que se encontrava e assistia divertido a luta entre os dois.
A luta terminou com a espada de Moisés ameaçando o pescoço de seu sogro.
Depois de se encararem por um instante Moisés recuou, guardando sua espada.
_Nunca mais se atreva a me desafiar. Não pouparei sua vida novamente. – Moisés disse tranquilo.
_Porque não me matou? – Dom João perguntou exausto.
_Porque estou hospedado em sua casa. Não seria de bom tom m***r o anfitrião. Mesmo que esse mereça. Agora vou pegar meus pertences e ir me.
_Não levará minha filha.
_Fique com ela.
Dom João o fitou furioso.
_Nunca a quis não é mesmo?
_Á quis no momento que a vi, mas não se porta como uma verdadeira rainha. Não lutei contigo por ela, mas pelo meu deus.
_Como ousa? Quem não cumpriu com suas obrigações foi o senhor!
_Expliquei á ela o motivo.
_Se incomoda de explicar-me também?
_Pelo nossos costume ela tem que chegar lá donzela, pois no meu reino não estou considerado casado se lá não entrar com uma virgem. E acredito que você saiba que é preciso uma cerimonia com o meu deus para que ela se torne rainha no meu reino. Quando meu pai a negociou contigo, já sabia que era em nome do nosso deus. Agora vou me embora pois não devo demorar-me onde não sou bem vindo.
_Espere! Se não á levar estará desonrando seu pai.
Moisés que já havia se virado para ir embora retornou com um sorriso nos lábios.
_Sua preocupação na verdade não é essa. Está falido e precisa do dinheiro que lhe darei por ela, e dos benefícios que terá como sogro do rei de Dales... Pois bem, levarei-a. Mas avise-a para se manter calada ou teremos uma rainha sem língua. – Moisés disse e pulando em seu cavalo, saiu a galopar.
Dom João, apesar de ofendido nada disse pois ele tinha razão, mas odiou-o e prometeu a si mesmo que se vingaria. Por enquanto era importante que ele acreditasse na sua boa vontade. E na sua aceitação.
Voltou onde deixara Eliza, e a encontrou ainda lá.
_E então? Ela perguntou assim que o vira.
Ele se sentou a expressão desanimada.
_Vá arrumar suas coisas. Partirá com ele.
Liza se levantou.
_Quer dizer que ele lhe pediu desculpas?
_Não, minha filha. Quer dizer que estou falido e sem condições de armar uma guerra contra ele.
_Mas papai...
_Não adianta minha filha. Ele é o rei de Dales. O reino mais poderoso. Não podemos lhe contrariar. Ou ele poderia declarar guerra contra nós.
_O odeio! – Ela disse com fúria, mas sabia que não era verdade.
_Eu também... Mas precisamos tirar vantagem do seu casamento.
_Como?
_Deve lhe pedir muitas joias, muito ouro até que fiquemos tão poderosos quanto ele. Deve também lhe dar um herdeiro. Vamos fingir um sequestro e colocar a culpa no rei de Balmar. Ele partirá para a guerra e vai ficar fraco. Então tomaremos o poder.
_Ele vai voltar.
_Não. Mandarei um homem de confiança que o matará em batalha.
_Entendi meu pai. Peço licença para poder me retirar.
Dom João se levantou e se aproximando abraçou sua filha.
_Faça como lhe disse e se verá vingada.
Eliza apenas concordou com um aceno e saiu. Não sabia se desejava vê-lo morto, mas o restante da vingança lhe era acolhedora. Depois que tirasse tudo dele, o faria implorar por seu amor e piedade. Seria uma boa rainha, mas acabaria com ele.
Na viagem de volta ao seu reino, Moisés se sentiu recompensado pelo silêncio de Eliza. m*l sabia que Elisa não o estava incomodando, porque estava ocupada em fazer perguntas aos vassalos do rei sobre seus costumes e principalmente sobre suas concubinas. Ficou perplexa ao descobrir que a mulher que viu deitada com ele, era uma fada capturada da mata do Redô. Desde já á temeu, pois conhecia suas histórias de feitiços e suas maldições. Com certeza ela se deixou capturar, pois são criaturas livres e jamais se deixariam apanhar se não tivessem uma razão para isso. Só desconhecia o que o povo da mata podia querer com um mortal... Ou então ele não passava de uma ponte para algo maior. Então ela não era uma de suas concubinas do palácio. Essa seria mais uma na coleção dele. Por um instante seu coração se esfriou. Como pôde se apaixonar por um homem que saia pegando e tomando posse de mulheres com o se fosse o dono do mundo? Talvez seu pai estivesse certo em querer mata-lo. Mas seu coração lhe perguntava se deixaria que fizessem m*l para o pai de seus futuros filhos? Não. Mata-lo seria demais. Mas pensaria num castigo que o fizesse desejar estar morto. Eliza pensava enquanto observava o deserto a sua volta. Achou a paisagem muito tediosa. Com certeza a localização do castelo de seu pai, era muito mais convidativa a contemplação.
Depois de alguns dias de viajem, finalmente chegaram ao palácio. Eliza se admirou da imponência. Era maior que o castelo em que vivia e bem mais luxuoso. Moisés era um rei próspero, sem dúvida. Como disse seu pai; O mais poderoso rei de todos os reinos. E ostentava isso bem com aquele majestoso palácio. No jardim da frente viam-se estátuas de ouro enfeitando cada canto do jardim, entre elas a de duas mulheres. Um dos vassalos que a acompanhava explicou que era cada uma de suas concubinas. Percebia-se que eram lindas. Mas havia uma terceira que ainda não havia sido terminada. Quem seria? Será que ele a homenagearia com uma estátua também? Claro que a dela teria que ser maior e ficar no melhor lugar do jardim. Afinal, era a rainha e lhe daria herdeiros.
Assim que colocaram os pés no enorme saguão, um homem pequenino veio ao encontro do rei todo esbaforido. Estava visivelmente desesperado.
_Majestade! Ainda bem que chegaste! - E fez uma reverência.
_Calma Onis, o que aconteceu? – Moisés perguntou temendo que alguma calamidade tenha se abatido sobre o reino. Seu coração deu um salto.
_Senhor, uma de suas concubinas nos fez viver um tormento na sua ausência. Meu senhor Matheus tentara controla-la, mas foi em vão. Não pôde lhe impor castigos pois temia represália. Ela fingia ouvi-lo mas assim que virava as costas aprontava de novo.
Moisés respirou aliviado. Lidar com suas concubinas não era mesmo tarefa fácil, nem mesmo para ele.
_Espere! Jefed, - disse para um de seus guardas. - Leve minha esposa para seus aposentos e Liã para meu quarto até que lhe preparem um outro quarto. Onis, venha comigo.
Moisés deu as ordens já se afastando com seu vassalo.
_Me diga agora que foi que ela fez . - Moisés já sabia sem que ele dissesse que se tratava de Afhany. Não imaginava Demy ou Louise aprontando em sua ausência, mesmo reconhecendo que elas tinham traços fortes de personalidade. Elas o amavam e o respeitavam. E eram plenamente correspondidas. Contudo, se começassem a se rebelar, ele teria um grande problema. Afhany tinha um lugar especial no seu coração. Moisés não sabia se era por sua inocência por causa da idade, ou por seu jeito afrontoso de ser.
_Tentou enforcar a camareira com um lençol quando esta tentou entrar no quarto para limpa-lo – Onis começou a contar. - Tentou e quase conseguiu, afogar a dama de companhia que selecionei para ajudar-lhe com o banho e se vestir, Jogou a comida da bandeja na cozinheira, quando esta foi levar-lhe comida alegando que estava muito apimentada. Pediu uma garrafa de vinho e se embriagou vomitando em todo o quarto, só para se divertir, fez suas necessidades num jarro de flor e jogou na cabeça do soldado que guardava seu quarto. Ele queria mata-la por tal atrevimento, e teve que ser contido, ou senhor estaria com uma concubina a menos agora, o que lhe causou um acesso de riso que foi ouvido em todo palácio. Rasgou todas as vestes do seu armário, dizendo que eram lixo e finalmente colocou fogo no colchão, incendiando o quarto. Tivemos que muda-la de recinto, pois nada se aproveitou. Começou a andar totalmente nua pelo palácio e não permitia que nos aproximassemos para cobri-la, nos ameaçando com uma adaga. E ninguém sabe explicar onde ela conseguiu uma. – Onis terminou o relato respirando fundo. Como se agora estivesse livre desse problema.
_Onde a colocou? – Moisés perguntou curioso de até onde eles iriam para acalmar a fera que existia dentro daquela menina. Pensou consigo mesmo que devia estar acorrentada nas masmorras. Não o agradaria, mas entenderia.
_Vossa majestade a de me perdoar mas o único lugar que não ousaria fazer bagunça seria em seus aposentos, então mandei que a trancassem lá.
_Vocês a colocaram onde? – Sua voz esbravejou.
Onis se encolheu e não respondeu. Sabia que era uma pergunta retórica.
Moisés fechou os olhos e respirou fundo. Depois fitou seu assustado vassalo.
_Fez bem, Onis. – Ela não se atreveria a tocar em minhas coisas por mais louca que seja. Não sei bem ainda, mas tenho a impressão que alguma fera habita aquele corpo de criança.
Ao ouvir isso Onis, que esperava por um sermão soltou um suspiro aliviado. Moisés pediu que se retirasse com ar carrancudo e zangado, mas assim que se viu sozinho começou a rir. Afhany era geniosa e o divertia. Não se enganou. Com ela ali, cada dia seria uma surpresa, não haveria rotina. Como conseguira fazer tantas desordens em apenas duas semanas? Ninguém podia negar que era original. E agora seria a primeira que conheceria Liã. Gostaria que fossem amigas, pois já não podia mais negar que eram suas preferidas. Amava-as. E não podia sentir o mesmo por sua esposa... Uma batida na porta o obrigou a se recompor. E disse com ar sério;
_Entre!
Era Otávio. Um homem com expressão bruta e rosto barbado. O olho esquerdo era cego e não se abria. Moisés nunca teve vontade de saber o porque do seu olho ser assim.
_Senhor, não queria incomoda-lo, pois sei que deve estar cansado...
_Fale de uma vez á que veio!
Otávio ergueu a cabeça ao ouvir o som de censura. Odiava o rei. E este sempre o tratava com desdém.
_Sua esposa insiste em falar-lhe...
_Irei assim que tomar um banho... Mande que me preparem um.
_Sim majestade.
Como o homem continuava parado ali, o rei o olhou interrogativo.
_Mas alguma coisa Otávio?
Ele fez um trejeito para dizer algo, mas desistiu.
_Não, majestade...
_Então pode se retirar.
Ele saiu pensando em como gostaria de cuspir na cara desse homem. Um dia, que não se tardaria a chegar teria essa oportunidade. Esse rei, nem imaginava o que lhe estava por vir. E Otávio esperava ansioso que os planos que se faziam, descem certo. Logo teriam um outro rei. E sem saber, Moisés ia acumulando inimigos que desejavam ver sua destruição. Ele sabia que isso ia ocorrer porque seu pai o orientara sobre isso, portanto, não se preocupava muito com isso, pois além de ter bem mais fiéis do que inimigos, ainda tinha o seu deus. Ele jamais permitiria que outro deus vencesse uma guerra, pois era muito orgulhoso. E gostava dos tributos dados a ele.
No entanto, assim que Otávio saiu, Moisés se sentiu m*l. Não gostava dele. Era um sujeito de aparência imunda e sem caráter. Só o admitia ali por ser homem de confiança de seu irmão, á quem amava e não queria motivos de desentendimentos. Tomou seu banho e foi até os aposentos de sua esposa. Entrou sem bater e a encontrou a observar o jardim pela janela. Ainda estava com o mesmo traje com que chegara e tinha o ar cansado. Virou-se assim que percebeu a entrada de alguém.
_O que houve? Fiquei preocupada com a expressão desolada de seu vassalo quando o interpelou. - Eliza disse já se aproximando.
_Apenas um problema com uma das concubinas.
_Creio que devia manda-las embora...
_Não desiste nunca?
_Não se trata disso! Agora que seu reino terá uma rainha, elas são dispensáveis.
Ele a olhou divertido.
_Apesar de ser a rainha, minha vontade é que vigora. E o que a faz pensar que me será suficiente? Sou um homem insaciável.
_Serei-lhe suficiente porque o amo e gerarei seu herdeiro. E estou disposta a saciar-lhe.
_Não discutirei. Será tudo como sempre foi. Quanto ao herdeiro, está enganada. Qualquer uma delas pode me dar o primeiro filho homem. E seja de quem for, esse será meu herdeiro.
Eliza arregalou os olhos surpresa. Não sabia desse costume. A ira subiu-lhe ao peito.
_Então o que me diferencia de suas concubinas? – Ela perguntou cuspindo as palavras.
_Se sentará ao trono, do meu lado. Coisa que nenhuma delas jamais fará. Não podem, pois não tem sangue nobre. – Ele disse e olhou para os lados. – Ninguém veio lhe preparar um banho para que se trocasse e ficasse mais a vontade?
_Quanta honra! - Elisa era sarcástica. - Mas é muito pouco! Como rainha desejo algo mais. Quero que me dê um presente de casamento. – Ela disse ignorando a preocupação dele com seu bem estar. Ela não quis lhe dizer que ofereceram seus serviços a ela, mas que recusara até saber o que houve no palácio de tão grave.
_O que quiser lhe darei... Joias? Ouro? – Ele disse a pegando pela cintura. Ela não ofereceu resistência.
_Na noite do ritual segundo seus costumes, lhe direi. – Ela disse colocando as mãos em seu rosto.
_Não deve me pedir que despeça minhas mulheres ou que as mate. Pois é a única coisa que não lhe concederei.
Ela se desvencilhou dele e sorriu-lhe suavemente.
_Estou de acordo.
_Agora devo me retirar.
_Espere! Eliza pediu assim que ele começou a se afastar. No que foi atendida prontamente. Ele se voltou e a fitou com olhar cansado.
_Quando será o ritual?
_Breve. - E sem mais explicações saiu.
Liã foi deixada nos aposentos do rei e sem cerimônias fecharam a porta a deixando sem muita gentileza. Provavelmente não sabiam de quem se tratava, ou o que ela se tornaria, pois o rei gostava que tratassem todas as suas mulheres com carinho e atenção.
Achou que estava sozinha até ver a sombra de alguém através do véu que cobria a imensa cama.
Se aproximou e descobriu ali uma bela mulher adormecida. Essa, parecendo sentir a sua presença acabou por despertar. De principio a fitou surpresa, depois com um ar entediado sentou-se na cama.
_Quem é você? – Afhany perguntou sem interesse algum na resposta.
_Liã.
Afhany a observou novamente, dessa vez mais demoradamente. Era bela, como todas as concubinas rei. Na verdade, não fazia diferença para Afhany, mas ela já estava ha muito tempo trancada naquele quarto sem conversar com ninguém. Precisava ouvir outra voz, que não fosse a de seus pensamentos, qualquer voz seria bem vinda.
_E o que faz aqui... "Liã"?
Liã não respondeu. Mas ficou vendo. Afhany a observou. Vestia apenas uma tanga e algo para lhe cobrir os s***s. Sem dúvida era uma vestimenta bem ousada, mas original.
_É a esposa? – Afhany perguntou se lembrando de repente que estava no quarto de Moisés e que ele havia viajado exatamente para buscar sua esposa.
_Não. Sou como você. – Liã disse tranquila e se sentou do lado de Afhany.
_Pensei que eu era a última... Ele chegou?
_Sim.
_Trouxe a futura rainha?
_Sim.
_É sempre assim comunicativa, ou esse é um momento raro?
Liã sorriu, mas nada disse.
_Já conheceu as outras?
_Não.
_São umas marionetes. Sem personalidade alguma... Aceitam qualquer ordem, por mais absurda que seja para agradar ao rei e assegurar seu alimento e suas vestes caras e as migalhas que ele lhes concede... Talvez você seja igual...
_Não. Não sou assim.
_Espero. Talvez tenhamos assuntos em comum. As outras duas só pensam em fazer compras e no que vão usar quando o grande rei resolver dar o ar da sua graça. Até que tentei ser amiga delas, mas são muito entediantes.
_Vim para reinar.
Afhany se levantou. Estava totalmente nua, mas não mostrou constrangimento. Foi até o armário e se cobriu com uma túnica masculina.
_Pensei que disse que não era a esposa.
_E não sou... Ainda.
Afhany a encarou. Será que era uma louca e colocaram ela ali no quarto para puni-la das coisas que andou aprontando?