➳ Letícia Amorim, Leth.
Desde o momento em que Lucas decidiu se apresentar no escritório do meu pai mesmo com minha oferta para ter o resto do dia de folga, as horas pareceram passar voando. Isso me agradava bastante, pois não era a melhor fã da espera, e m*l podia esperar pelo momento em que estaria subindo o morro do alemão em busca de nada mais além da bagunça. Isso seria algo para ficar registrado na minha história, possuía essa certeza gritando dentro de mim.
Perto do horário combinado com Carlos e o restante do pequeno grupo montado, corri para ajeitar algumas coisas antes de seguir direto pra casa dele. Encontraria Lucas por lá, havia sido o acordo fechado mesmo contra a vontade dele. A desculpa da vez era por minha conta, já havia enviado um pedido de permissão para a tia Marcela. Assim como dito para os meus pais, teríamos um fim de semana de estudos na casa dos amigos. Não era algo difícil de fazê-los acreditar, uma vez que nossas notas sempre foram muito boas. Era mesmo a desculpa perfeita.
Dispensando o jantar que não estava muito longe de ser servido, me despedi dos meus pais e saí em busca do meu carro. A mochila em meu ombro continha tudo, menos materiais de estudo. E com as coisas do Lucas no banco de trás, podia fazer o percurso programado sem muitos impedimentos. Os Soller não moravam tão longe assim, seriam apenas vinte minutos na direção. Algo que acabou saindo um pouco do esperado devido a mensagem recebida de meu querido primo. Ele precisava de carona.
Frente a casa da irmã do meu pai, cedi um leve toque sobre a buzina do carro e esperei pela aparição de Lucas, o que ocorreu em poucos minutos. Mas como era de esperar, ele não apareceu sozinho. Em sua cola vinha a sombra de sua mãe. Tia Marcela era alguém muito desconfiado, e isso claramente explicava o porquê de ele ter precisado me chamar para o buscar.
— Tia, boa noite. — Abrindo a porta do carona para que Lucas pudesse entrar, a cumprimentei com um leve sorriso no canto dos lábios. Gostava muito dela, mesmo que não fosse a maior fã da suas atitudes tão parecida com as de minha mãe. Elas eram muito iguais, enquanto papai pouco se parecia com a irmã. Chegava a ser irônico, mas quem ligava?
— Qualquer problema, não deixem de me ligar. — Deixando um leve beijo nos cabelos do filho, ela pediu olhando pra mim. — Entenderam?
— É um grupo de estudos, tia. Não teremos problemas. — Virando a chave para engatar a primeira marcha, a vi apenas negar tudo com breve sorriso de canto. Então acenou enquanto nos afastávamos. Lucas não parecia muito feliz com o ocorrido, mas também não abriu uma reclamação formal. Sabia que talvez eu estivesse certa sobre tudo, ou só não queria entrar em uma discussão que não podia vencer.
Cerca de quarenta minutos depois que deixei minha casa, finalmente estava estacionando em frente a casa dos irmãos Soller. Carlos nos esperava na entrada indicando a garagem para que pudesse guardar o meu carro. Parecia que não precisaria mais dele por hoje, então fiz exatamente o que me foi sugerido.
Fora do meu carro e com minha mochila e as coisas de Lucas em mãos, me perguntei o que meu primo teria trago na bolsa pendurada em seu ombro. Mas quando bisbilhotei não consegui não rir da cara dele. Aquilo devia ser uma de suas brincadeiras sem graça. Estávamos indo para uma festa, buscávamos por curtição longe das asas dos nossos pais. Porque raios ele foi trazer seu caderno de anotações?
— Sério isso? — Devolvendo sua bolsa para dentro do carro, perguntei baixo. Não queria que os outros pegassem no pé dele, mas não deixei de sorrir com o ocorrido.
— Você conhece a minha mãe, Leth. Ela insistiu em me ajudar com a mochila. — Entendo que ele não disfarçava tão bem quanto eu, também entendi que era a única forma dele conseguir me acompanhar em mais essa aventura sem se encrencar com a tia Marcela.
— Não canso de dizer isso. Ela devia ser irmã da minha mãe, não do meu pai. — Ganhando o seu primeiro sorriso da noite, me pendurei em seu ombro ao ser recebida por Carlos ao deixar a garagem pelo portão principal. Não entraria pela sala, não correria o risco dos seus pais verem a gente. Eles eram conhecidos dos meus pais, e eu já estava no limite com as atuações. E também duvidava que seus filhos tivessem comentado algo sobre a minha presença esta noite.
— Pensei que não fossem mais vir. — Me cedendo um forte abraço, tocou seu punho com o de Lucas. — Quase que não convenço meu irmão e o resto da galera a esperar por vocês.
— Sabia que seu irmão era um babaca. — Observando a negação de Lucas, olhei para o ponto mostrado pelo Soller. Diego nunca teria uma chance comigo, e Carlos estava ciente disso. Meu primo devia estar delirando quando me disse aquilo pela manhã. — Dez minutos para terminar de me arrumar?
— Dez minutos. — Ele repetiu indicando o caminho por trás da casa. Seus pais talvez não estivessem, mas como falei, melhor não correr o risco. Se avisassem aos meus pais ou a tia Marcela, estava certa de que não sairia do castigo esse ano. Mamãe não facilitaria em nada a minha vida, e não precisávamos passar por isso.
Ao lado de Lucas, entramos no primeiro quarto mostrado pelo nosso colega de faculdade e cuidamos de ser rápidos para retornar o quanto antes para o lado de fora. Não era necessário um espaço distinto, sabíamos bem o que queríamos, e não era possível encontrar nada disso um no outro. Éramos primos, melhores amigos. Eu o consideraria para sempre um irmão.
— Ainda não acredito que está me fazendo passar por uma prova dessas. — Ajeitando sua camisa frente ao espelho, reclamou levando as mangas até a altura do cotovelo. Estava um gato naquela roupa.
— É só mais uma festa como tantas outras para quais já te arrastei, não sei pra que tanta reclamação. — Me pendurando eu seu ombro para também analisar o meu look, sorri deixando meu batom marcado em sua bochecha. — Vem, devem estar cansados de esperar pela gente.
— Como eu ainda te amo é um mistério até mesmo pra mim, Leth. — Agarrada ao seu braço, me limitei a um sorriso divertido e o arrastei pelo mesmo caminho que nos foi apresentado minutos atrás. Não tinha o que dizer sobre seu comentário.
Quase vazando pela janela da caminhonete 4x4 do seu irmão, Carlos faltava pouco para vir nos arrastar pelos cabelos. Deviam estar enchendo seus ouvidos há algum tempo, mas ele não diria claramente, não com todas as letras. Com isso, praticamente o chutei para o canto e pulei ao seu lado puxando Lucas logo atrás de mim. Ao lado de Diego no banco da frente estava uma loira qualquer, provavelmente sua nova "peguete". Isso não era da minha conta, então não perguntei nada, mas fui educada ao cumprimentá-la com um divertido sorriso em meus lábios. Era uma moça muito bonita, precisava admitir. Mas não era o meu tipo.
Durante o percurso a ser traçado, uma playlist bem aleatória nos acompanhou desde o início. Era mais cantar do que buscar por assuntos que agradassem a todos. O clima era leve, o grupo de cinco pessoas fazia parecer que uma amizade reinava desde tempos passados. As aparências enganam mesmo, era essencial afirmar isso com a visão que apresentamos quando deixamos a caminhonete no momento em que chegamos ao morro.
A entrada daquela subida era guardada por dois homens, os quais pararam a gente quando alcançamos a metade do que ainda faltava do percurso até o espaço responsável por levar o audível som da música até aquele ponto. Não era nada demais, só queriam fazer uma rápida averiguação. Isso me lembrou aos seguranças da associação de advogados do meu pai. Em menos de um minuto fomos liberados para completar o nosso caminho.
Haviam liberado uma área de estacionamento, e apesar do tumulto já aparente, ainda existiam algumas vagas por ali. Deixando o carro junto aos outros, meus olhos me levaram logo a uma discussão que obviamente não tinha nada haver comigo. Mas ainda sim, minha atenção havia sido roubada.
— Ei, o que está fazendo? — Eu já seguia na direção do que acontecia a poucos metros da entrada daquele ambiente. Mas o toque de Lucas em meu ombro parou os meus passos.
— Carlos, você não disse que esse seria o primeiro evento em muito tempo a ser aberto para qualquer um? — Me lembrando de ser essa a sua desculpa para não faltarmos, chamei por sua atenção.
— Foi isso que alguns colegas me disseram, porque?
— Porque ela está prestes a fazer alguma burrada sem pensar nas consequências. — Negando o meu sorriso travesso, Lucas respondeu cruzando os braços.
— Encontro vocês do lado de dentro. — Os deixando para trás, ajeitei minha postura e tirei o celular da pequena bolsa em meu ombro e caminhei de cabeça baixa até o homem que impedia a entrada da bela moça cheia de argumentos. Com isso, firmando meu corpo colidi com força contra o seu deixando meu celular cair no chão com a tela acesa. — Me desculpa, estava distraída falando com um amigo que se atrasou. — Parada em sua frente, aleguei abrindo um sorriso maroto. — Pode pegar pra mim? — Indiquei o aparelho.
— Claro. — Poupando sorrisos ou qualquer coisa do tipo, disse simples se abaixando. Então, me virei para a moça e fiz sinal para que ela saísse logo dali. A entrada estava livre. — Aqui está.
— Obrigada, meu pai me mata se precisar me comprar outro celular. — Recebendo o aparelho em minhas mãos, o vi vasculhar o lugar com o olhar. — Aconteceu alguma coisa? — Nada ele me disse, apenas me deixou sozinha e saiu em busca do que julguei ser a moça que estava aqui. Sorri com o sucesso da missão. Foi uma boa primeira impressão.