No dia seguinte, Samy olhou para Liane e viu o sofrimento dela estampado em seus olhos. Chamou-a e a Tomás, para tentarem uma nova conexão com Mentor antes do desjejum. Mas novamente não conseguiram. Então conversaram e de comum acordo, decidiram que pediriam ao pai para leva-los até Mentor para saber o que estava acontecendo.
Na mesa do desjejum, correu tudo em paz. Louise disse que tivera uma experiência maravilhosa com Matheus, mas foi interrompida pelo mesmo por causa dos jovens presentes e também porque o assunto o constrangia. Ela ficou toda risonha, enquanto que Matheus ficara vermelho. Mas assim que acabou o desjejum, as mulheres se reuniram e ela contou com detalhes tudo que se passara na noite anterior.
_ Quando você era concubina, Moisés nunca havia feito isso em você? – Afhany perguntou curiosa. Só Cleuza que ouvia tudo para repetir com Otávio.
_ Não! Louise respondeu estupefata. – Ele fazia com você?
_ Sempre fez. A única vez que ele não fez, foi no ritual... E com você Demy?
_ Nem Moisés e nem Simas fizeram comigo. Mas vou cobrar isso de Simas. – Demy respondeu pensativa.
_ Será que ele fazia com Liã? – Louise perguntou ainda chocada por Moisés ter proporcionado esse prazer para Afhany durante anos e ter negado a elas.
_ Acho que nunca saberemos... – Afhany respondeu tranquila.
_ Você não acha injusto que ele tenha dado esse prazer somente para você e ter nos deixado só com o comum? – Demy perguntou, expressando a inconformidade de Louise também.
_ O que eu acho é que vocês devem reclamar com ele. Eu não tenho culpa. – Afhany disse e se retirou para a sala do trono, onde estava Moisés sentado ao trono e la foi se sentar do seu lado.
_ Estou ansiosa pelas visitas que teremos para saber quando minha filha vai voltar para casa.
_ Espero que seja em breve que nossa filha esteja de volta conosco. Também sinto muito a falta dela.
_ Eu tenho medo do que ela vai pensar de mim, pois tenho a aparência de uma menina de dezesseis anos, e ela está chegando aos dezenove... Não vai conseguir enxergar em mim, sua mãe.
_ Ela vai se lembrar. Vão colocar as lembranças dela de volta. Fique tranquila.
_ Quando penso que ela não conhece seu irmão, me dói o coração.
_ Tudo isso vai estar resolvido daqui há alguns dias...
_ Porque eu tenho a sensação que não? Existem muitas perguntas sem resposta. Eu não sei o que foi feito de minha mãe e isso as vezes me tira o sono. Ela disse que voltaria para me visitar, mas não o fez. Ela não participou da guerra, então não precisaria hibernar...
_ Klainer disse que a libertaria e a levaria para seu lar... Ela deve ter tido seus motivos para não aparecer mais...
_ Jamais deixaria de ir ver minha filha, e nem deixaria passar a oportunidade de conhecer meu neto...
_ Sei disso querida. Mas nem todos tem as mesmas prioridades... E além disso, pelo que conheci dela, ela não deixaria de vir lhe ver e conhecer o neto, se não tivesse alguma coisa a impedindo.
_ Klainer pode ter prendido ela.
_ Ele não faria isso. Porque pensa isso dele?
_ Não sei. Não vejo outra razão para minha mãe não ter vindo me ver em todos esses anos...
_ Klainer selou o reino dele para que ninguém pudesse ir até lá. Pode ser que também não aja uma forma de sair...
_ Isso é verdade. Mas será que nem uma comunicação pela mente ela consegue?
_ Creio que não. Klainer não deixaria nada feito pela metade. Provavelmente cortou todas as ligações.
_ Mas ele falou com Lenda... E pelo que entendi, sempre fala.
_ Klainer está no lugar secreto dele, e não no reino dele.
_ Pensei que ficasse lá no reino dele...
_ Creio que não, mas de toda forma, pelo que me consta, Klainer tem poder maior que os outros ceifeiros. Ele pode conseguir manter uma conversa mentalmente com outra pessoa. Mas você pode tirar sua dúvida e tentar conversar com sua mãe.
_ Não. Prefiro deixar assim. Ela... Se quiser que me procure. Logo minha felicidade vai estar completa com a volta de nossa filha...
_ Também estou ansioso...
Afhany pulou para o trono do rei e sentou-se em seu colo lhe dando um beijo caloroso no qual foi correspondida e se amaram ali mesmo.
Liane estava parada com o olhar vago para lugar nenhum, enquanto Tomás e Samy discutiam sobre falar com o pai deles para visitarem Mentor. Acreditavam que algo de muito grave estava acontecendo para que ele não respondesse. Samy parou a discussão de repente quando percebeu que sua irmã estava alheia a tudo que acontecia ali.
_ Acorda Liane! – Samy falou num tom mais alto enquanto estalava os dedos na frente de seus olhos. Ela pareceu despertar de algum pensamento na mesma hora.
_ Oh! Me desculpem... Vocês sabem que a conversa que tive com Thelis me deixou arrasada. Ainda estou tentando superar... Mas é tão difícil! Nosso amor era tão grande...
_ Como foi mesmo que vocês se conheceram? – Tomás perguntou curioso, mas preocupado também. Tinham que arrancar o m*l pela raiz para que sua irmã parasse de sofrer por aquele maldito ceifeiro.
_ Eu estava no jardim... Ele apareceu e disse que sempre vinha para nosso mundo, pois as pessoas o encantavam por sua simplicidade no agir e no pensar, e disse que eu era a moça mais bonita que ele já tinha visto. As visitas dele começaram a ficar mais frequentes e sempre que ele vinha me chamava mentalmente Começamos a conversar e nasceu uma amizade ali... Ele me pedia que não contasse a ninguém pois o pai dele não sabia das vindas dele... Depois de alguns meses, ele se declarou para mim. Disse que amava, e eu respondi que o correspondia. Então começamos a namorar... Ele me mostrou a energia dele. E contou que ela mudava quando estava comigo. Que o preenchia de uma forma que ele nunca havia sentido antes. Ele me fez sentir essa energia e realmente era muito boa. Me envolvia, me aquecia o coração. Combinamos de contar para meu pai assim que eu tivesse idade para namorar... Mas tudo mudou agora. – Liane disse com seu pranto molhando seu rosto.
Samy e Tomás de princípio ficaram mudos, um pouco por ficarem constrangidos com as lágrimas de Liane, e um pouco por ela ter se abrido totalmente com eles pela primeira vez.
_ Não chore Liane. Se não for ele, será alguém bem melhor no seu destino. – Tomás disse para consola-la.
_ Eu só acho que tem alguma coisa que não se encaixa nessa história. Se fosse você, parava de sofrer e ia vivendo a vida da melhor maneira possível. Pois ele vai voltar. E nesse dia você pede explicações para ele.
_ Ele não vai voltar... – Disse Liane secando as lágrimas com a palma da mão.
_ Eu não teria tanta certeza. Pelo que você conta, é uma mudança muito radical vinda dele. Nem dá para supor que ele encontrou outra pessoa, pois ele estava hibernando... Tem algo de muito estranho. Parece que você fala de duas pessoas completamente diferentes. Como que antes de adormecer veio se despedir de você todo amoroso e de repente acorda e já fala essas coisas horríveis para você. Pelo que sei, para ele, foi como se tivesse te visto ontem e acordado hoje. Não faz sentido algum essas palavras que ele te disse. – Samy disse desconfiada. Pensou se devia consultar o pai, mas descartou a ideia, pois havia prometido segredo para Liane. Mas ela descobria algum jeito de conversar com Thelis, e, se fosse preciso, dar um soco no nariz dele.
Na hora da refeição da noite naquele dia, todos comiam em paz, exceto Samy, que estava ansiosa e olhava de um para outro, na esperança que alguém a notasse, e foi justamente quem ela mais desejava que reparou no seu anseio.
_ Não vai comer Samy? Não diga que entrou em uma competição com Liane para ver quem fica mais magra... – Moisés disse com um sorriso, mas a avaliando secretamente.
Liane, ao ouvir seu nome, pareceu despertar de um transe e começou a comer. Tinha prometido a si mesma que voltaria a ser a Liane de sempre. E tinha convicção que chegaria novamente ao seu peso normal em pouco tempo. Porém ficou calada com a frágil tentativa de seu pai de a perturbar.
_ Papai, acho que devemos ir visitar Mentor. – Samy disse depressa, antes que ele mudasse seu interesse para Liane que começou a comer, como se tivesse ficado muito tempo presa em um regime e agora a tivessem soltado para devorar a comida do mundo todo.
_ Porque deseja visitar Mentor? Não tem muito tempo que eu o trouxe aqui.
_ Mas tem algo de muito errado. Não conseguimos mais nos comunicar com ele. Temo que os singates tenham atacado o palácio de seu avô e Mentor não tenha conseguido derrota-los sozinho. – Samy disse séria, com o coração doendo só de pensar nessa possiblidade.
Moisés largou o talher na mesa e fitou longamente Samy. Como se pensasse como devia dar-lhe a noticia. Respirou fundo e tomou um gole de vinho.
_ Samy, a conexão entre você, Tomás, e Liane com Mentor está cortada. Não aconteceu nada a seu irmão. Ele está bem, apenas vocês passarão alguns dias sem poderem se comunicar com ele.
_ Como assim? O que fizemos? – Tomás perguntou com os olhos brilhando em ira.
_ Vocês não fizeram nada. Não é um castigo. É que... Bem, vocês vão entender quando formos visitados. Por enquanto, contentem-se em saber que ele está bem.
_ Foi Klainer não é mesmo? Ele cortou a nossa conexão? Tem alguma coisa que ele não quer que fiquemos sabemos. – Tomás avaliou a situação desconfiado.
_ Não sei se foi Klainer. Mas a questão não é que vocês fiquem sabendo, pois logo saberão. A questão é que Mentor não deve saber.
_ Bastava nos dizer o que não era para ser contado a Mentor... – Samy opinou.
_ Vocês não iam entender nada. Melhor que fiquem sem noticias um do outro por enquanto. Daqui há alguns dias vocês poderão conversar normalmente com ele e até visita-los. Até lá, se contentem em conversar somente entre vocês três. – Moisés disse voltando a pegar o talher e começando a comer novamente.
_ Calisto está de acordo com isso? – Liane perguntou corajosamente.
Moisés a fitou estupefato. Havia meses que ela não dizia nada a mesa. Ele acabou de engolir a comida e tomou outro gole de vinho sem parar de fita-la.
_ Não sei minha filha. – Moisés respondeu sincero. – Porque acha que ela não estaria de acordo?
_ Não disse o que acho ou não. Só sei que meu irmão e todos nós estaríamos melhor sem a intervenção desses ceifeiros! São todos uns hipócritas! Não acredito em nada do que sai da boca deles! E se Calisto estiver envolvida com esse impedimento de falarmos ao nosso irmão, eu mesma a matarei com minhas próprias mãos! – Liane disse com ódio e saiu da mesa as pressas.
Todos se entreolharam. Mas ninguém estava mais aterrorizada que sua própria mãe, que sempre considerou sua filha uma criatura meiga, doce e gentil. Incapaz de fazer m*l a uma abelha. E agora ameaçava m***r? Sabia que o silencio dela não era normal, mas nada pôde fazer pois ela se recusou a falar com Ade ou outro médico de outro mundo. E achou que não devia ser algo muito grave pois continuava com a mesma personalidade de sempre, mas agora... Louise sentiu seus olhos se encherem de lágrimas. Se levantou em silencio e também se retirou.
Os que ficaram na mesa ainda se entreolhavam assustados. Matheus não fez nada para impedir Louise, pois sabia que ela precisava de um tempo com a filha. E também porque viu a expressão de seu rosto. Samy e Tomás e se olhavam entendidos. Eles sabiam o porque de Liane ter agido daquela forma e isso não passou despercebido por Matheus. Moisés ficou parado e todos na mesa pareciam paralisados. Ninguém mais parecia ter apetite para continuar comendo. Um clima r**m se instalou ali. Moisés se levantou e foi para a sala de estar. Afhany aproveitou e foi também. Cleuza olhou para Otávio, desejosa de se retirar também, e assim que ele percebeu, se levantou e esperou que ela fizesse o mesmo e foram para junto de Moisés e Afhany. Demy e Simas acharam melhor dar um tempo por ali, assim como Matheus. Samy e Tomás não sabiam que direção tomar e ficaram algum tempo em silencio, apenas trocando olhares. Matheus percebeu que eles conversavam mentalmente.
_ Samy! – Matheus chamou autoritário e ela voltou-se para ele assustada.
_ Sim, tio? O que houve?
_ O que está acontecendo com Liane? E não tente me enganar! Sei que você e Tomás sabem de tudo. Sabem até porque ela se tornou triste de uns anos para cá! Podem ir dizendo.
_ Tio, me desculpe, mas são coisas dela. Então não compete nem a mim e nem a Tomás falar algo da vida dela. Se ela quiser, ela mesma vai compartilhar com você, mas nós não podemos trair a confiança dela dessa forma. Papai não aprovaria isso.
_ Está certo. – Matheus concordou. – Mas se for algo grave, que coloque a vida dela em risco, vocês não podem se prender a esses princípios.
_ Não é nada desse tipo. Pode ficar tranquilo. – Tomás disse se levantando. – Vamos Samy. É melhor ver como papai está pois saiu daqui parecendo que estava cego. Ele ficou totalmente traumatizado com... O ocorrido.
Samy o acompanhou até a sala de estar e logo apareceram também Matheus, Simas e Demy. Moisés estava sentado em uma poltrona, e lágrimas corriam como a vertente de um rio. Não parava, ele não tentava conte-las e não respondia a ninguém. Estava inconsolável. Olhava para o nada, e todos a sua volta ficaram tristes com o que aconteceu com Liane, mas também por ver Moisés fragilizado daquela forma. Ele só ergueu o olhar, quando Tomás se aproximou.
_ Porque isso está acontecendo justo com Liane? O que eu fiz de errado? Eu não protegi vocês o suficiente? Me diga Tomás, por acaso eu a ignorei? Eu a preteri? – Moisés perguntou sem mudar a expressão de seu rosto, mas com a voz embargada.
Tomás ajoelhou a sua frente e pegou suas mãos.
_ A culpa não é sua. Você sempre agiu muito corretamente, não só com ela, mas com todos nós. Em momento algum você a desamparou. Só que há assuntos, que quando tornamos adultos, não a como mais se proteger, não a como impedir... Temos que enfrentar sozinhos.
_ Ela não precisa enfrentar nada sozinha, ela tem a mim... – Moisés se interrompeu e olhou desconfiado para Tomás. – São assuntos do coração?
_ Acho que isso, você deve perguntar diretamente para ela.
_ Sim. Mas deixarei que a mãe dela converse com ela primeiro. Talvez ela se abra com Louise. Ela pode ficar constrangida de me dizer algo, se o problema for assunto do coração. – Moisés falou e todos perceberam que o ar mudou. Havia alivio nos olhos de Moisés e ele liberava energia boa para todos presentes ali.
Assim que ele acabou de falar, As babás e Lenda vieram trazer as crianças. Lukas fora deixado com Matheus e as outras crianças foram deixadas com suas mães. Elas iam saindo, quando Samy chamou por Lenda., que pensou em ignorá-la, mas por sentir uma certa urgência na voz da menina, se voltou para ela.
_ Me acompanhe até a cozinha. Lá nós conversaremos. – Lenda falou gentilmente. Moisés não gostou, mas nada fez para impedi-la. Talvez Lenda lhe revelasse alguma coisa que tirasse todo peso dos ombros dele.
Samy a acompanhou até a cozinha e ainda havia várias criadas lá. Ela não gostou.
_ Eu precisava falar com você a sós... Se for possível...
_ Falaremos com a mente. Ninguém precisa escutar.
_ Está bem. – Samy disse na mente de Lenda, sentindo que ela fizera aquilo como um desafio. – Minha irmã está sofrendo muito. Eu queria saber se você pode me levar até o reino de Klainer. Há alguém lá, que disse coisas horríveis para ela. E eu gostaria de entender para poder ajuda-la.
_ Não. – Lenda disse em sua mente serenamente.