O jantar estava pronto, torta de frango. Havia acabado de sair do forno e todos se sentaram ao redor da mesa. Rufus cortou os pedaços colocando nos respectivos pratos.
— Como a mamãe era? — Emma perguntou ao pegar o prato com a torta.
Eles não discutiam muito o assunto mãe naquela casa, provavelmente era dolorido para Rufus e ele evitava ao máximo tocar na ferida. Mas diante do olhar de Emma, um olhar triste, curioso, cheio de saudades, ele deixou a própria dor de lado para contar à filha o que ela queria saber.
— Sua mãe era como o sol de verão, ela chegava em um lugar e parecia iluminar tudo, quando ela sorria para você, você se sentia a pessoa mais especial do mundo. Totalmente espontânea e também um pouquinho desengonçada, mas muito charmosa. Gentil com todos sempre. Mas ela também se irritava facilmente. — o rosto dele parecia se iluminar ao falar da falecida esposa — Infelizmente ela tinha problemas de imunidade e era muito comum ficar doente, uma hora o corpo dela não conseguiu mais combater e ela veio a falecer quando você tinha cinco anos.
— Ela parecia ser incrível. — Emma comentou.
— Eu lembro de um dos primeiros invernos em que nos conhecemos, eu estava voltando da biblioteca da faculdade e estava nevando, logo as aulas entrariam em recesso, mas eu precisava dos livros para um trabalho. Cruzei com sua mãe no caminho, ela me seguiu tranquilamente conversando. Quando coloquei os livros no meu quarto e a segui para tomar um café, ela surgiu com uma bola de neve e jogou bem na minha cara.
Ambas as jovens começaram a dar risada, Emma cobriu a boca para esconder que estava rindo, mas Rufus apenas balançou a cabeça afirmando que tudo bem rir enquanto ele mesmo ria diante da lembrança.
O jantar continuou cheio de memórias boas a respeito da falecida Elisa. As jovens ajudaram a tirar a mesa e lavar os pratos antes de subir para o quarto. Rufus disse que iria corrigir algumas provas, mas que elas poderiam chamar caso precisassem de algo.
Emma entrou com Anaïs no quarto e fechou a porta antes de caminhar até o calendário. Ela tentou tirar a chave da fechadura da primeira porta, mas estava emperrada ou presa. Abriu o fecho da estrutura de madeira e mostrou para a amiga a história escrita.
Anaïs segurou parte do calendário para ajudar Emma com o peso. Passava os dedos pelas palavras talhadas e também as figuras, era bizarro como eram tão parecidos com as pessoas da vida real.
— Tem uma parte sobre você, Em.
— Ontem não tinha. — ela comentou estranhando o fato.
Deixou os olhos seguirem para onde o dedo de Anaïs apontava e então leu:
— A Rainha Emma voltou para seu povo e todos estavam muitos felizes, contavam com ela para fazer a grandiosa festa de Natal do reino e impedir os bruxos que tentarão destruir tudo. — ela terminou de ler e observou seu retrato entalhado na madeira, suspirou antes de acrescentar: — Sabia que lá eu tenho poderes?
— Isso você não comentou!
— Vamos entrar no calendário e você vai ver.
Emma fechou o calendário e abriu a porta de número dois, naquele dia, aparentemente ela abriria. Seria realmente uma porta por dia, tudo bem, ela podia ser paciente. Dentro da porta de número dois havia uma guirlanda do tamanho da palma de sua mão, o calendário era grande, então seus objetos também.
— No segundo dia de Natal aparentemente vamos trabalhar com decoração. — Anaïs comentou.
A ruiva assentiu e encaixou a guirlanda no espaço, intuitivamente ela foi para a chave na primeira porta e a girou. Como na vez anterior houve um momento de pausa e expectativa antes que o portal se abrisse, Emma segurou a mão de Anaïs para que fosse com ela ao reino mágico.
***
Dessa vez, Emma não caiu de b***a no chão e nem no meio da floresta. Estava em seu quarto no castelo, um olhar para o lado e viu que Anaïs havia caído sentada, mas ao menos havia sido na cama.
— Que quarto enorme. — comentou a morena enquanto se colocava de pé.
— Nem me fale. — entoou Emma — Viu suas roupas?
Anaïs imediatamente olhou para baixo a fim de verificar sua roupa. Ela se levantou e correu para o espelho virando de um lado para o outro querendo ver todos os detalhes da maravilhosa túnica que ela usava.
— Eu adorei esse reino, mudam automaticamente para uma roupa fashion da moda local. — comentou a jovem.
Emma riu e abriu a porta do quarto, não tinha ideia de que horas eram, talvez precisasse andar com um relógio para quando entrasse nesse reino, saber o horário. Uma olhada pelo corredor revelou que estava totalmente vazio. Ela cruzou o quarto e parou diante da janela, olhou para fora, pela posição do sol, chutaria que ali ainda era de tarde.
— Vem Ana, vou te apresentar as coisas por aqui.
As jovens seguiram juntas para fora do quarto e caminharam pelo corredor até as escadas, desceram dois andares até o principal.
— Frederick, Dorothea, James? — Emma chamava esperando que alguém se apresentasse.
— Majestade.
Emma virou-se junto da amiga em direção da voz e se deparou com os familiares cabelos pretos da noite anterior.
— Senhor Fallace, que bom que te encontrei, eu fiquei devendo a você ver seus trabalhos.
— Ficou mesmo majestade, se você tiver tempo agora, adoraria mostrar.
— E eu adoraria ver. — Anaïs disparou.
— Veremos em breve, primeiro devo encontrar Frederick e Dorothea.
— Estão nos jardins majestade, se quiser, posso levar você e sua dama de companhia até lá.
— Dama de companhia?! Eu sou a melhor amiga dela! — Anaïs esbravejou.
Emma escondeu a v*****e de rir, ao invés disso arrumou a postura.
— Dante Fallace, artesão e convidado real desde ontem. E Anaïs Benoit, minha melhor amiga desde a infância e também convidada real.
Ela fez as apresentações e logo indicou com a mão que Dante liderasse o caminho para os jardins, precisava saber o que iriam fazer naquele dia para os preparativos de Natal. Dante tomou a frente do caminho com um leve sorriso.
— Que horas são? — ela perguntou enquanto o seguia.
— São duas horas da tarde, minha rainha.
— Mais ou menos o que pensei, obrigado.
— Se me permite perguntas, você esteve esse tempo todo em seu quarto, majestade?
Emma deu uma leve risada e negou.
— Eu estava em outro reino, mas já voltei para minhas obrigações como rainha. — ela explicou.
— Outro reino? Como isso funciona?
— Eu não sei bem, eu só sei que dormi aqui e de repente eu estava de volta ao meu reino. E então vivi meu dia lá e usei um calendário mágico para voltar para cá e trouxe Anaïs comigo. — Emma explicou com simplicidade.
Ela podia apenas contar o que já sabia, como não sabia como a magia funcionava, infelizmente não podia entrar nessas questões com Dante. E antes que ele pudesse fazer a próxima pergunta, Frederick cruzou as portas já caminhando para Emma.
— Minha rainha. — ele fez uma reverência ao se aproximar.
— Esse é o Lorde Frederick, eu chamo ele de Fred. E essa é Anaïs, minha melhor amiga desde criança.
— É um prazer, milady.
Anaïs retribuiu a reverência e sorriu com gentileza antes de sussurrar no ouvido de Emma.
— Você deve viver um pesadelo cercada com tantos homens bonitos ao seu redor.
— Tadinha de mim. — Emma sussurrou de volta com ironia, voltou-se para Frederick — O que temos programado para hoje?
— Precisamos ver a decoração de Natal para o castelo e para a festa.
— Certo, eu prometi ao senhor Fallace que veríamos as criações dele, então vamos começar com isso e depois podemos continuar com a lista de afazeres.
— Como quiser, majestade. — Frederick concordou — Senhor Fallace, onde deseja nos mostrar suas criações?
— Me deem 15 minutos e então podem entrar na sala de jantar.
— Precisa de alguma ajuda? — ofereceu Emma.
— Não majestade, obrigado. — ele respondeu com suavidade
***
Na sala de jantar Dante abriu a mala que estava com ele, ela na verdade não tinha nada além de algumas pinhas, bolotas, gravetos e um livro. Ele colocou as pinhas em cima da mesa e também o livro antigo com capa de couro. Abriu o livro na página que ele precisava e com a voz pouco mais alta que um sussurro, declarou:
— Pinhas, bolotas e natureza, agora se transformem em enfeites de Natal em cima dessa mesa.
Uma a uma, as pinhas e todo resto se transformaram em enfeites de Natal diversos. Os gravetos haviam se transformado em bengalas doces esculpidas na madeira, assim como pequenos anjos e uma estrela para a árvore. As pinhas haviam se transformado em guirlandas, outras pareciam ter sido feito vidro e eram agora bolas decoradas para enfeitar as árvores.
Em pouco tempo, toda a mesa estava cheia dos mais diversos enfeites. Dante guardou o livro de volta na bolsa, fechou e colocou embaixo da mesa para que ninguém mexesse. Ao olhar para o relógio, notou que ainda tinha tempo, começou a organizar os objetos em cima da mesa e aproveitou os minutos finais para chamar seu corvo.
— Preciso que leve uma mensagem para Madelyn.
Dante pegou um pedaço de papel e uma caneta na mala embaixo da mesa, apoiou na mesa e escreveu: por enquanto ninguém desconfia de nada, estou tentando ganhar a confiança da rainha, hoje escolherão enfeites para o castelo e para a festa. 16h na cidade, espero sua grande entrada.
Enrolou o papel e amarrou com um pedaço de barbante tanto o rolinho quanto a mensagem na perna do corvo. Deixou que ele voasse e quando teve certeza de que ele não podia ser visto, abriu a porta da sala e chamou por Emma e os demais.
Um por um eles foram entrando e observando as coisas que achavam que Dante havia feito à mão. Frederick se mantinha sempre ao lado de Emma, o que irritava Fallace, como poderia se aproximar da rainha se o fiel escudeiro não saísse de perto?
— Você também sabe mexer com vidro? — Anaïs perguntou.
— Ah não, eu tenho uma amiga, ela era afilhada do meu falecido pai, ela sabe a arte de soprar vidro. Eu sou bom esculpindo madeira e pintando.
Não era totalmente mentira, os feitiços que usava, eram todos de Madelyn. Se tivesse que tentar soprar vidro, iria causar ferimentos a si mesmo e a qualquer um ao redor, nem mesmo sabia como funcionava. Esculpir, ele também não se garantia muito, mas pintando, ele realmente se saia bem.
Anaïs sorriu e caminhou pela mesa observando o resto das coisas, ela havia adorado um pequeno soldado quebra nozes que estava em cima da mesa. Quebra-Nozes sempre a lembrava o Natal.
Emma conversava distraída com Frederick enquanto examinava com cuidado cada um dos enfeites. Ela ergueu uma das bolas de vidro tão belamente pintadas.
— Olhe, eu acho que poderíamos encomendar algumas para colocar nas árvores, elas são bonitas e contanto que tenhamos cuidado ao pendurar, creio que não deve ter problemas.
— Daqui a pouco vai querer elas penduradas em seu quarto, cabelo, roupas…
— Seria uma ideia maravilhosa, não?!
Ambos deram risada e ela colocou de volta a bola de vidro na mesa. Emma sentia que havia se conectado rapidamente com Fred, não como um par romântico, mas um bom amigo e protetor. Arriscou um olhar de canto de olho para Dante e percebeu que ele a observava, provavelmente querendo saber o que ela havia achado de seus enfeites.
— Acompanhe Anaïs pela sala, eu vou falar com o senhor Fallace.
— Não quer minha companhia, majestade?
Ela percebeu que ele parecia quase magoado. E por isso acrescentou:
— De forma alguma quis dizer isso, apenas me parece que ele está esperando meu parecer e você o intimida.
— Apenas não confio nele.
— Escute, pode ficar de olho enquanto caminha com minha amiga, não posso depender de você para tudo sempre. Algumas vezes vou precisar resolver algumas coisas sozinha.
— Eu sei, eu sei. É que ficamos sem um governante por tanto tempo que tenho medo de que algo aconteça a você, majestade.
— Eu compreendo e aprecio o cuidado. Vou ficar o tempo todo aqui dentro e em seu campo de visão, tudo bem?
— Certo, mas acho que deveríamos incluir treinamento com armas no seu dia a dia, é bom que saiba se defender além da magia.
— Eu concordo com essa ideia.
Eles se afastaram em direções opostas. Frederick oferecia o braço para Anaïs e ela fazia alguma gracinha que arrancava uma risada do lorde. Emma sorriu ao observar e então continuou seu caminho até Dante.
Dante arrumou a postura e sorriu enquanto fazia uma reverência para a rainha. Ele mantinha a postura aberta indicando que confiava completamente em Emma, precisava que ela o lesse como alguém fiel e gentil, precisava da confiança dela.
— O que achou?
— São todos muito lindos, senhor Fallace. Ainda irei conversar com os decoradores para saber quais dos seus enfeites poderiam ficar pendurados em nossas árvores sem que sejam um risco para as crianças, mas definitivamente iremos encomendar alguns.