CARLA
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Ela hesitou do outro lado da linha. Caramba, essa era a chance dela! Mesmo que o chefe fosse um carrasco e que poucos funcionários durassem ali, eu sabia que Isabella se sairia bem. Ela era profissional e dedicada, exatamente o que ele esperava. Era uma oportunidade em um milhão.
— Calma, Carla... Como assim? — a voz dela soava confusa, tentando entender o que eu queria dizer.
— Não tem tempo para explicação, só vem! Só... vem, Isabella.
Falei, desesperada para que ela não perdesse essa chance. Não dava para pensar em mais nada além disso. Sabia que ela precisava desse trabalho, e essa era uma oportunidade única. Desliguei a ligação e olhei para o outro lado da sala, onde a secretária continuava a conversar com a assistente. A conversa delas me deixou ainda mais curiosa.
— A funcionária do meu chefe vai fazer a seleção hoje. Ele é muito exigente, nada pode dar errado. Tem que ser perfeito.
Meu coração apertou. Para Isabella, esse trabalho significava mais do que um emprego. Era uma chance de recomeço. Eu só esperava que ela estivesse pronta para enfrentar o desafio, mesmo com todos os fantasmas que ainda a atormentavam.
— Vai dar tudo certo. Tem que dar!
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ISABELLA ROTH
Cheguei à empresa sentindo um nó no estômago. A expectativa misturada com o medo de não ser boa o suficiente me consumia. Respirei fundo e entrei, tentando manter o controle. O prédio era enorme, mas o que me chamou a atenção foi o barulho vindo de uma sala próxima.
Curiosa, me aproximei e, ao virar a esquina, vi duas crianças brigando. O menino puxava uma barra de cereal com força, enquanto a menina, mais velha, gritava:
— Larga isso! Você nunca divide nada!
A cena me fez rir por dentro. Era um reflexo de tantas outras brigas que eu já presenciei. Me aproximei com um sorriso suave, tentando desviar a atenção deles para algo mais positivo.
— Ei, por que não dividem a barra? Tem o suficiente para os dois.
O menino me olhou desconfiado, mas em vez de continuar puxando, ficou em silêncio. A menina, ainda irritada, resmungou:
— Ele nunca divide nada, é egoísta!
Ele não disse nada, nenhuma defesa. Me abaixei para ficar na altura deles e falei com paciência:
— Não é isso. Ele só não sabe como fazer. Vamos lá, você também pode aprender a dividir.
A conversa os acalmou, e pela primeira vez senti que estava criando uma conexão com eles. Foi nesse momento que ouvi meu nome sendo chamado. Carla acenava para mim com desespero nos olhos.
— Não briguem mais, ok? — me despedi com um sorriso e corri até Carla.
Mas então, ao me aproximar, vi uma mulher entrando na sala. Meu coração afundou.
— Não, não, não... — murmurei, sentindo o desespero tomar conta de mim.
Carla praguejou ao meu lado.
— Eu te falei que tinha que ser rápido! — disse, frustrada.
Me joguei em uma cadeira ao lado dela, derrotada.
— Era minha única chance... — sussurrei, sentindo os olhos queimarem.
Carla me olhou, sem palavras por um momento, depois perguntou:
— O que você estava fazendo?
Suspirei profundamente, sentindo a frustração crescer dentro de mim.
— Fui ajudar duas crianças... Me atrasei.
Carla balançou a cabeça, desaprovando.
— Eu não posso ficar muito tempo aqui. Se souberem que te contei dessa vaga, quem será demitida sou eu.
Olhei ao redor. Não podia ficar ali por muito tempo. Respirei fundo e tentei me convencer de que talvez ainda houvesse uma chance.
— Talvez ainda haja uma possibilidade... Eu espero.
Carla acenou com a cabeça e, antes de sair, desejou-me sorte.
Quando me virei para ir embora, senti um pequeno toque em meu braço. Era a menina de antes, segurando metade da barra de cereal.
— Acho que você precisa mais do que eu. Você parece triste.
Fiquei surpresa, mas sorri, pegando a barra.
— Obrigada. Você se preocupa mais com os outros do que eu imaginava.
— Está melhor assim? — perguntou ela, rindo. Peguei a barra e dividi com ela.
— As duas merecem, certo? — disse, tentando fazê-la se sentir bem.
A porta da sala se abriu de repente, e meu coração disparou. Levantei de imediato e me virei para ver quem era. Uma mulher entrou, me olhando de forma desconfiada.
— Posso ajudar? — perguntou, visivelmente surpresa.
Eu engoli em seco antes de responder:
— Eu vim para a seleção de babá.
Ela me lançou um olhar confuso e hesitante.
— Seleção de babá? — repetiu.
Houve um silêncio antes dela continuar:
— Não há seleção alguma. A babá já foi escolhida.
Meu rosto esquentou de vergonha.
— Me desculpe... Deve ter acontecido um engano.
Estava prestes a sair quando uma voz firme e imponente ressoou pelo ambiente:
— Algum problema aqui?
Meu corpo congelou. O homem que entrou exalava autoridade. Seus olhos castanhos claros e sua barba bem feita lhe davam um ar de seriedade. Vestia uma camisa social impecável, calça bem alinhada e sapatos elegantes. Não pude evitar notar como sua presença dominava o ambiente. Meu coração bateu mais rápido.
A mulher que havia me negado a vaga rapidamente tentou acalmar a situação:
— Está tudo bem. Apenas um m*l-entendido.
Mas eu não sabia o que fazer. Meu estômago revirava, e meu instinto me mandava sair dali o mais rápido possível.
— Com licença... — murmurei, me virando para ir embora.
— Espere.
A voz grave me fez parar no lugar. Virei lentamente, sentindo o calor subir pelo meu rosto. Ele me olhou intensamente antes de dizer:
— Me acompanhe.
A secretária pareceu surpresa com a ordem, mas acatou.
— E assegure-se de que, desta vez, essas crianças não saiam andando pela empresa conhecendo desconhecidos.
Meus olhos se arregalaram. Então, era ele...
Ele era o pai das crianças.
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