Alessandro Volkov
Ela entra no quarto com os ombros eretos, mas o olhar hesitante. A postura é de quem tenta parecer forte, mas já reconhece que há algo maior que ela dentro daquele lugar — dentro de mim. E eu vejo isso. É ali que mora o poder. E é ali que mora o meu vício.
— Tire os saltos. — minha voz ecoa com precisão, cada sílaba pesada.
Olivia obedece em silêncio, apoiando-se na parede, descalçando os sapatos com delicadeza. Há algo nela que é insuportavelmente elegante, mesmo quando está à beira do colapso. E talvez seja exatamente isso que me enlouqueça.
Ela é um enigma, uma força da natureza contida em um corpo delicado. Desafiadora, sim, mas com uma inteligência afiada que a impede de cair na insolência. Ela resiste, mas sua resistência não é a da rebelião cega, e sim a de uma mente que questiona e analisa. Submissa, no entanto, é a palavra que ecoa, um termo que, para ela, é um limite a ser testado, uma linha tênua que pode ser cruzada a qualquer momento. Mas até quando essa submissão durará?
Meus passos são calculados, cada um deles uma declaração silenciosa de poder enquanto me aproximo dela. Meus olhos estão fixos nos dela, um duelo de vontades que se desenrola sem palavras. Por um breve, quase imperceptível, segundo, os olhos dela desviam, uma confissão tácita de que ela sabe. Ela sabe o que está prestes a acontecer, a dança de poder que se inicia. E ela sabe, com uma certeza fria, que neste cômodo, entre estas quatro paredes, sou o arquiteto de seu destino, o juiz de seus medos mais profundos, e o monstro que ela tanto teme, e talvez, secretamente, deseja. Aqui, eu sou Deus.
— Você sabe por que está aqui, Olivia?
— Porque você gosta de me controlar? — rebate com um leve sorriso sarcástico.
A insolência me arranha por dentro. E me excita.
Me aproximo mais, prendo seu queixo com firmeza entre meus dedos.
— Porque você precisa entender que existe uma linha. E está cada vez mais perto de cruzá-la.
Ela engole seco. Mas não se afasta. A respiração acelerada denuncia o nervosismo que ela tenta esconder. Seus olhos ardem com uma mistura confusa de medo e desejo.
— Ajoelhe-se.
Ela hesita.
Dois segundos.
Três.
Longos demais.
— Olivia… — murmuro, com a voz mais baixa, mais cortante — Não me faça repetir.
E então ela cede.
Lenta, relutante, quase orgulhosa em sua rendição. Mas ajoelha.
Um arrepio percorre minha espinha, elétrico e inebriante. É isso. É esse o momento que eu ansiava, o instante em que ela finalmente se dobra. Não é uma submissão ditada pelo medo ou pela fraqueza, mas sim pela tensão palpável que vibra no espaço entre nós, uma corrente invisível que nos conecta. É parte do jogo, do embate de vontades, da dança sedutora do não-dito, das promessas silenciosas que pairam no ar pesado. Seus olhos, antes tão firmes e desafiadores, agora carregam um brilho diferente, um reconhecimento tácito do poder que eu exerço. Seus lábios, antes apertados em uma linha fina de resistência, parecem ligeiramente separados, como se um suspiro estivesse prestes a escapar. Eu observo cada detalhe, cada micro expressão que denuncia a capitulação de sua vontade. É uma vitória lenta, deliciosa, conquistada não pela força bruta, mas pela intriga, pela paciência, pela percepção aguçada de seus desejos mais profundos. O ar está denso, quase sufocante com a expectativa. Sinto o cheiro sutil de seu perfume, misturado ao calor que irradia de seu corpo, e isso só intensifica a minha certeza: ela é minha, neste momento, e por um tempo indeterminado. Apenas o som de nossas respirações, um ritmo sincopado que preenche o silêncio, serve como testemunha dessa rendição velada, desse ponto de inflexão em nossa complexa dinâmica.
Coloco a coleira de couro preto entre meus dedos. A mesma que usei com Liandra. Não por nostalgia. Mas porque quero que Olivia entenda que há regras, há lugares — e há consequências.
— Vai colocar isso em mim? — ela sussurra, os olhos fixos na peça.
— Vou mostrar quem você é aqui dentro.
Ela estreita os olhos, firme.
— E o que exatamente você acha que eu sou, Alessandro?
— Minha.
Essa palavra silencia tudo. Até mesmo o ar. Até mesmo o medo.
Mas é curta demais. Pequena demais. Frágil para conter o que sinto. Eu a quero inteira. Querendo ou não. Entendendo ou não. Cada fibra do meu ser anseia por sua presença, por sua entrega total. Não é um desejo passageiro, um capricho, mas uma necessidade profunda que me consome. Quero seus pensamentos, seus medos, seus sonhos. Quero que ela se perca em mim da mesma forma que me perdi nela.
Mas Olivia não é Liandra. E isso começa a doer. A cada toque que não é o dela, a cada olhar que não reflete a mesma paixão insana, sinto a pontada da realidade. Olivia é suave, delicada, talvez pura demais para a escuridão que habita em mim. Liandra... Liandra era um incêndio, uma tempestade que me arrastava para o abismo, e eu a amava por isso. A doçura de Olivia me assusta, pois não sei como lidar com ela, como não a quebrar com a minha intensidade. A comparação é inevitável, e a dor, uma consequência amarga.
Amarro a coleira em volta de seu pescoço devagar, como um gesto sagrado. Mas quando tento conduzi-la até a almofada no centro do quarto, ela trava. As mãos no chão, os joelhos firmes… mas os olhos voltam a me enfrentar.
— Não sou um cão. — ela cospe, com a voz baixa, firme.
O sangue sobe quente. E quando percebo, minhas palavras saem como uma lâmina:
— Você nunca vai ser como a Liandra.
Assim que falo, vejo o impacto bater nela como um soco no estômago. Os ombros dela encolhem, mas não por submissão — por dor. A ferida aberta. A comparação maldita.
Merda.
Olivia se levanta com rapidez, arranca a coleira do pescoço e a joga no chão.
— Agora ficou claro, não é? Eu sou o rascunho da mulher que você perdeu! — sua voz treme, mas não cede — Tudo isso não é sobre mim. É sobre substituir o que se foi.
— Não diga o que você não entende — rebato, seco, a mandíbula travada.
— Eu entendo o suficiente, Alessandro. Entendo que você quer uma mulher que obedeça sem pensar. Que abaixe a cabeça sem hesitar. Que aceite ser chamada de “minha” como se isso fosse sinônimo de respeito. Mas eu não sou essa mulher. Eu não sou ela. E nunca serei.
A porta bate atrás de si com força. Fica o cheiro do perfume, da raiva… da minha frustração.
Sozinho no quarto, com a coleira caída no chão, sinto o silêncio pesar como uma punição imposta por ela, ou talvez por mim mesmo. Cada segundo sem a sua presença é uma lembrança dolorosa da minha falha, da minha incapacidade de domar a força que emana de Olivia. E, no fundo, uma parte de mim sabe: ela não será moldada tão facilmente. Seu espírito é indomável, e essa certeza, em vez de me afastar, só me atrai ainda mais.
Ela me desafia.
Me quebra.
E é exatamente por isso que não consigo parar.
Mais tarde, fico observando as câmeras de segurança. Ela aparece saindo do prédio, apressada. A tensão em seus ombros ainda visível. Mas há outra figura na gravação… uma mulher, de capuz, parada na esquina.
Minha mente acende.
A mesma mulher que Olivia descreveu. A mesma que ela não reconheceu.
Mas eu reconheço.
E o passado cobra caro.
A obsessão que sinto por Olivia já não é apenas desejo. É necessidade. É sobrevivência. E se ela continuar resistindo... terei que mostrar a ela que fuga não é uma opção.
Ela pode não ser como Liandra.
Mas será minha.
Nem que precise sangrar para aceitar isso.