No anoitecer e após o capitão Gulian cuidar de todos os assuntos pendentes do Dergo, voltamos a mesma taverna. Lá, só estava o capitão, alguns marujos e eu. Vitto estava em outro lugar, nos ignorando.
Chovia lá fora e relampejava forte. Dentro também pingava em alguns lugares, onde bacias de barro estrategicamente posicionadas não permitia que a água escorresse pelo chão.
Enara, a garota que trocava olhares com o capitão Gulian desde que chegamos a Andorra, havia marcado com ele de ambos saírem juntos para conversarem
Ela parecia ser delicada, mas de olhares fortes; doce, ainda que andasse e agisse com certa firmeza; algo nela fez com que o capitão Gulian ficasse doido. Ele gostava de mulheres com traços fortes, de decisão, de ação; até de mulheres que tentassem mudá-lo, para que ele se vangloriasse depois de que nem aquela conseguiu mudá-lo, o que faria o restante delas imaginar que conseguiriam? Mas ao mesmo tempo ele gostava de mulheres que seguiam seu estilo de vida, que de alguma forma desse incentivo para ele continuar a ser o garanhão dos mares.
Se minha mente inferior e de costumes medíocres permitisse, eu aproveitaria melhor a situação, tirando proveito desses humanos medrosos. Alguns sumos conseguiriam, mas a grande maioria, incluindo a mim, seria incapaz de tal ato.
Mas existia uma contradição. Jado dizia que não é de nossa natureza saber que sabemos das coisas; de saber que podemos algumas delas, até tentar. Mas tentar sem experiência, onde um erro custa a sua vida, é muito arriscado.
O capitão Gulian estava com seu cabelo solto e molhado sobre seus ombros, com seus olhos e toda a sua atenção voltada para o corpo daquela jovem que provavelmente tentaria mais tarde devorar.
— Senhor — eu disse.
Percebi que ele forçou a vista para me olhar. Os simples movimentos da garota pela taverna eram atrativos a ele de uma forma peculiar.
— Fale. — E tomou finalmente um gole de sua cerveja.
Pensei em falar sobre o que fiz durante o fim da manhã e até poucas horas atrás, antes de anoitecer; pensei em lhe mostrar minhas novas anotações do livro de bolso. Mas de guardar segredo eu era capaz.
— Fale, Telo! — vozeou irritado pela minha hesitação, finalmente me fazendo acreditar que eu era digno de seu olhar.
— Amanhã poderei voltar à biblioteca?
Ele hesitou em responder, mas não por ter dúvidas. Seu cérebro parecia que processava muitas coisas ao mesmo tempo, percebia isso no seu olhar pesado. Ele tinha coisas mais importantes a resolver mentalmente do que direcionar a palavra a mim.
O capitão Gulian era o tipo de humano inteligente que, mesmo tendo um sumo, gostava de pensar por si próprio e de absorver os conhecimentos necessários para o seu ramo. Me ofendia ele não dividir sua carga comigo, mas eu aprendia o máximo que podia para estar pronto, quando ele precisasse de mim.
A minha ajuda era muito mais nas traduções. Ao longo de minha vida eu aprendi vinte e três línguas. Em doze delas eu era fluente, em outras cinco eu estava quase lá e no restante eu estava em níveis diversificados de aprendizagem, chegando à última de todas elas, que eu ainda estava aprendendo o básico. Eu tinha uma noção em medicina, era bom em cálculos, geografia e alquimia. E era ótimo em astrologia e história.
— Vai precisar de outra autorização? — o capitão indagou, desviando o olhar de mim outra vez e tomando o restante da cerveja que tinha no copo grande de cristal, empurrando tudo goela abaixo.
A cantoria, ainda que mais fraca, não parecia alegrá-lo. Tinha outra coisa o incomodando além do fato de não poder fazer o que queria com Enara naquele momento.
— Não, senhor — balbuciei. — Só... gostaria de saber se não tem outros planos para mim amanhã.
— Ei! — Ergueu o copo vazio ao gritar para o taverneiro, inferiorizando a necessidade que eu tinha de obter aquela resposta e me forçando a olhá-lo enquanto agitava o copo até repararem nele. — Acabou aqui.
Enara olhou para o capitão e mais do que contente veio em nossa direção. Ao nos alcançar, encheu o copo dele enquanto o taverneiro mantinha um olhar torto à distância.
— Enara! — o homem a chamou num ar autoritário.
Ela, que sorria para o capitão Gulian ao falar com ele um pouco acima de sussurros, desmanchou a sua expressão de felicidade e a pesou ao virar o corpo a modo de ficar frente ao taverneiro.
— Sim, meu pai.
Assustei-me com suas palavras. Era a filha do taverneiro e ainda assim o capitão dava em cima dela na frente de seu pai? Pensava que mulheres deveriam ser recatadas ao menos na frente de seus pais, ainda que já antes eu tivesse notado a aparência indisciplinada da garota.
— Venha cá — ordenou secamente o velho.
Enara virou o rosto e logo desmanchou a expressão pesada para animação. Deu uma olhada no capitão, sorriu e disse na língua möomomesa.
— Quando marcar no seu relógio uma hora que sumi, me encontre no lugar onde combinamos. — E saiu de perto quase aos pulos.
O capitão sabia Möomo. Nem tinha como não saber. Era a língua mais falada no mundo. O Möomo descendia também da mesma língua que a nossa descendia, o Abeui, fazendo-as soarem bem parecidas.
Não demorou nada para que ela passasse por uma porta e dela não voltasse mais. Seu pai a procurava por todos os cantos e encarava bastante o capitão Gulian, mas ele não podia afirmar nada, já que o capitão estava ali e ela não. Visivelmente meu senhor não tinha envolvimento algum.
Ele esperou um pouco mais do que uma hora, sendo este um jogo de tática, como me explicou algumas vezes. A sua estratégia era deixar a mulher esperar, se sentindo inferior e se perguntando se ele gastaria seu precioso tempo, que poderia estar com qualquer outra melhor, com ela.
Sei que assim que ele julgou ser a hora certa, reagiu:
— Vamos, Telo.
Me levantei sem fazer perguntas, embora eu me questionasse: ele vai me levar para o seu encontro com a garota?
Passamos por ruas movimentadas e com luzes geradas por meio de eletricidade, penduradas em ferros fixados ao chão; por vielas escuras e por pessoas indignas, num bairro bem afastado da região da taverna. Assim, logo chegamos numa casa afastada de várias.
Assim que o capitão bateu pela segunda vez na porta, Enara a abriu com sorrisos largos no rosto delicado.
Entramos rápido na casa, e Enara já foi logo beijando o capitão Gulian nos lábios. Ele a comprimiu em seus grandes e fortes braços que a fez soltar os ombros tensionados.
— Pensei que não viria — ela queixou com sua voz afável, que de inocente não tinha nada.
— Eu vim, não vim? — ele disse ao desvencilhar seu corpo do dela.
Enara arfou e olhou para mim.
— O que ele faz aqui? — Depois voltou a olhar para o capitão.
— Ele é meu sumo, o levo para onde vou — mentiu.
— Hmm... — Ela abriu a mão que estava no ombro do capitão e acenou para mim. Respondi a sua educação à altura, sorrindo ainda.
Vai acontecer o que imagino que vai acontecer?
A casa era antiga, tinha apenas uma mesa velha de madeira, com três cadeiras também de madeira e duas portas que levava a outros cômodos. Todo o lugar fedia a mofo e à madeira úmida.
O capitão Gulian avançou na garota, pousou suas mãos selvagemente sobre as nádegas dela e, ao apertá-las e ao comprimir forte seus lábios nos dela, lhe deu beijos ofegantes. Eu olhava atentamente a cada movimento. Havia um motivo para ele ter me trazido, e agir como se não estivesse ali era parvoíce.
O contato entre os dois começou a esquentar, até que Enara hesitou e levou seu corpo para trás, tentando se livrar dos braços que a enlaçava feito um animal ao ser dominado brutamente por seu dono malvado. O rompante recuo da moça fez o fim do beijo estalar.
— Gulian, quero que antes me prometa outra vez que me levará com você quando sair da cidade. — Seus olhos, agora sérios, fixaram-se nos dele. — Não posso me deitar com você sem a garantia de que deixarei Andorra. — E concluiu numa entonação mais forte: — E também não poderei me casar com o filho do ferreiro do porto depois de hoje.
Meu coração doeu de pena dela à medida que via o capitão assentindo positivamente com a cabeça. Ele não mentiria. Levava muito a sério a verdade, mas quando lhe convinha, ele dava um jeito de não mentir e de não falar a verdade ao mesmo tempo:
— Juro que você não se casará com o filho de nenhum ferreiro de Andorra ou de outra cidade. Te apresentarei o mundo, minha querida. Te apresentarei ele agora mesmo. — E voltou a beijá-la, fazendo-a se perder em seus braços brutos e selvagens que ela parecia adorar.
Logo Enara começou a despi-lo e a beijar partes de seu peitoral, barriga e pescoço, aos intervalos de beijos calorosos nos lábios. Ela parecia estar contemplando cada parte do corpo dele, assim como fiz com o livro de magia ao apossá-lo. Ela o beijava com tanta paixão, ainda que com certa inexperiência, forçando-me a comprovar que era virgem.
Em seguida Gulian começou a despi-la também, enquanto beijava seu corpo com paixão. Seus lábios e suas mãos devoravam aquela garota como eu normalmente devorava as páginas dos livros.
As partes que ela mais delirava era quando ele chupava seu pescoço e passava a barba m*l feita por sua pele. Os dois suspiravam profundamente enquanto se abraçavam, passavam suas mãos em áreas particulares e se beijavam enlouquecidamente.
Eu estava ali parado, olhando tudo e não sendo notado, ou era inferior o suficiente para que mesmo notado, não fizesse eles ficarem incomodados com minha presença. Eu estava petrificado. Minha mente cogitava coisas e meus músculos inebriavam-se a modo de eu precisar me controlar instintivamente para não fazer algo, com todo aquele envolvimento à minha frente. Sentia prazer em ver aquilo. Meu coração agitava todo o meu intelecto. Senti sensações pouco sentidas, sensações que eu não tinha nome para descrevê-las.
De fato não era de nossa natureza saber que sabemos as coisas; de saber que podemos sentir coisas, até sentir.
Após completamente despidos e envolvidos, o capitão Gulian a ergueu com seus braços e ela enlaçou suas pernas na cintura dele. Em seguida, ele começou a carregá-la dali para um dos cômodos.
Ficaram lá por alguns segundos, até eu ouvir um urro entre as ofegantes respirações:
— Telo!
Corri mais do que depressa, precisava saber para que estágio iriam partir, e entrei no quarto, com Gulian já em cima dela enquanto ainda se beijavam. Eu deveria anotar algo? Resolvi que não, pois ao olhar para o livro perderia certas partes.
Enara olhou para mim, depois olhou para o capitão. A moça não teve tempo de falar nada, pois ele a beijou e a apertou na cintura. Percorreu a boca pela sua face, pelo seu queixo, seu pescoço e beijou-a ao longo de toda a sua clavícula esquerda. Ela gemia.
Mas gemeu ainda mais quando o capitão a invadiu.
Os movimentos que tomaram seguimento foram lentos, enquanto Enara mais parecia sofrer do que ter prazer. O corpo do capitão não estava de todo em cima do corpo dela, ele usava seus cotovelos e as pernas para não machucar aquele corpo pequeno e frágil com o seu grande e forte.
Entre chupões e movimentos, que se tornaram mais vertiginosos, Enara gemia menos e demonstrava gozar do mesmo prazer que o capitão Gulian a alguns intervalos longos.
Logo ele se desvencilhou dela e a girou na cama selvagemente, deixando-a de barriga para baixo enquanto a montava e se movimentava quase como se estivesse galopando sobre um animal. Ele me olhava com sorriso no rosto, enquanto brilhava de suor. Em seguida, pegou ela por seu cabelo e puxou. Enara gemia com mais intensidade e, a essa altura, eu já não sabia novamente se era de dor ou prazer.
Após os três termos nossos corpos inebriados de prazer, tomamos cada um o seu rumo. Eu, é claro, segui o capitão Gulian.