Chegamos na padaria da Lilly com as compras. Alba e John estão absortos nos seus telefones. Não fizeram nada, nem limparam um pouco a área de trabalho. Mary não está aqui, ela saiu se desculpando, que estava com dor de cabeça.
Larissa fica furiosa, mas eu a contenho. Explico a Alba e John que entendemos a frustração deles, mas realmente precisamos que eles nos ajudem. Mais tarde retribuiremos o favor. Eles dão lugar a sua apatia e retomamos o trabalho.
As horas passam e o cansaço acumulado durante o dia afeta a todos. Os ajudantes já estão cansados e Larissa também. É quase meia-noite, então digo a eles que posso terminar sozinho.
Sinto-me cheia de energia do trabalho, então estou no modo automático, não penso em mais nada a não ser terminar e tudo ficar bem. Quero corrigir o meu erro.
Uma hora depois de todos terem saído, quando termino a parte mais difícil do trabalho, percebo que estou sozinha no local.
Sozinha no espaço tranquilo da noite, com a maioria das tarefas já concluídas, encontro-me mais uma vez cara a cara com os meus medos do passado.
Nesta escuridão que envolve o meu cantinho em Denton, os medos associados a Richard ganham nova vida. As sombras daquelas
memórias desconfortáveis são projetadas com mais intensidade na minha mente.
Só falta terminar de assar mais uma fornada de bolos.
Enquanto isso, começo a limpar a bagunça para manter a minha mente ocupada. Eu freneticamente limpo e pego os utensílios. É uma tarefa que poderia deixar para oa ajudantes que chegam amanhã cedo, mas prefiro fazê-la eu mesmo para retribuir o favor pelas horas extras e sobretudo para não ficar sem atividade e pensando.
Saio da cozinha para o balcão onde há algumas mesinhas.
Tudo é tão calmo dentro e fora daqui. Certifico-me de que a porta da frente está trancada.
De repente, através do vidro vejo duas luzes, como dois olhos amarelos, quase brancos, primeiro as luzes são fracas e depois me ofuscam. São os faróis de um veículo, mas a iluminação é tão potente que não consigo ver mais nada. O carro liga o motor e dá ré como a van preta da loja. Não tenho certeza se é o mesmo veículo. O meu coração quase pulou pela boca.
A rua está escura novamente, levemente acariciada pela luz amarela das lanternas. Volto tremendo em direção à cozinha, onde acho que estarei mais segura. Será que é? Mas, quem é?
Quando passo pela porta da cozinha, lá está o homem, parado bem ao lado da saída de emergência.
Continuo paralisada. Ele tira o capuz e revela o seu cabelo preto brilhante. Acho que vou morrer naquele momento. Porém, a minha vida não passa em câmera lenta diante dos meus olhos. Várias vezes com Richard experimentei essa sensação, quando o infeliz me fez sentir como se me tivesse à beira da morte nas mãos. Talvez com ele eu já tenha esgotado esse recurso, ou é só que a minha mente não quer ver aquele filme novamente.
O intruso se aproxima com voz suave, na tentativa de acalmar os meus nervos, mas a minha inquietação persiste. Tenho mais motivos para estar inquieta, angustiada: um homem desconhecido e forte, de presença imponente, surge na escuridão da noite num lugar onde eu me encontro sozinha.
Embora a suas palavras pareçam conciliatórias, o meu instinto grita que estou em perigo.
Com gestos apaziguadores, ele pede desculpas pela chegada prematura e menciona o incidente no estacionamento. Então é ele.
A sua explicação não consegue dissipar completamente a tensão no ar. Na verdade, isso torna a cena mais perturbadora.
Apesar do seu pedido de desculpas, a minha determinação ressurge e exijo que ele vá embora, expressando a minha perplexidade com a sua presença naquele momento e local.
Digo a ele com firmeza, ajustando os meus óculos: eu não entendo o que você está fazendo aqui, mas você precisa ir embora. Agora mesmo.
A minha voz, embora cheia de determinação, treme ligeiramente. O sentimento de vulnerabilidade persiste, mas as minhas palavras ressoam na escuridão como um eco de resistência. Espero que tenham servido a algum propósito para mostrar ao sujeito que independentemente das suas intenções, não sou uma presa fácil.
O intruso se aproxima de onde estou. Os passos das suas botas pretas ecoam no silêncio. A minha preocupação redobra.
Tremo como se um balde de água gelada tivesse sido derramado sobre mim.
Com gestos apaziguadores, ele pede desculpas pelo seu aparecimento prematuro e reitera o incidente no estacionamento.
— Eu não queria assustar você. Você estava distraída e também me distraiu e...
— Bem, você me assustou e está fazendo isso agora também. Eu interrompo.
— A minha intenção não era que você ficasse assim. Desculpe minha falta de jeito. Ele diz, com a sua voz rouca acompanhada de um sorriso.
— Ah, e o que você esperava? Se você quisesse falar comigo, não poderia fazer isso normalmente, sem tentar me atropelar com a sua caminhonete ou se esgueirar pelo local onde trabalho como um ladrão? Digo a ele.
— Eu não queria atropelar você. E você tem sorte de ser eu e não um ladrão quem percebeu que a porta dos fundos não estava fechada corretamente. Ele responde calmamente, como se acreditasse seriamente que estava certo.
— Ah, então você não é um ladrão. Que sorte eu tenho! Você é a polícia então.
Ele permanece em silêncio.
— Eu era policial. Mas já não sou mais. Eu deixei isso. A polícia é a pior. Mas não se preocupe, isso é passado.
Não sei o que responder. Ainda me sinto intimidada mas também me dá alguma confiança, como se nos conhecêssemos de outro lugar, de outra vida. De alguma forma eu acredito nele.
Ficamos em silêncio até o forno apitar. Anunciando que os últimos bolos estão prontos.
Volto ao meu papel de chef. Não insisto mais para que ele vá embora, mas, peço que me dê permissão para trabalhar.
Mesmo que pareça uma loucura, me sinto segura com ele aqui. Pelo menos não Foi Richard quem me encontrou.
— Meu nome é Mark. Ele diz de repente.
Não respondo, tento me concentrar na tarefa que tenho em mãos.
— Você vai se encher de farinha. Eu o aviso.
Ele está vestido todo de preto com calça e um moletom justo que destaca seus músculos. Portanto, qualquer poeira restante irá sujá-lo. Ele sai de onde está e eu começo a decorar um bolo.
— Você está certa. Ele diz pelas minhas costas.
A sua voz atrás de mim me faz pensar o quão imprudente ele era.
Sou a favor de não retirá-lo do local e chamar Larissa ou a polícia.
— Pronto, não vou sujar a roupa com farinha. Diz ele no meu ouvido. Sinto a vibração da sua voz fazendo cócegas dentro do meu ouvido. Eu me viro pronta para dizer novamente que é melhor ele ir embora.
Mas, para minha surpresa, vejo que ele tirou o moletom, revelando o peito musculoso e o abdômen de aço.
— Mas o que é isso? Pergunto a ele, embora em parte o tom da minha voz É mais surpresa do que desconforto.
Ele percebe a minha admiração. Ele não diz nada, ele apenas deixa eu olhar como se fosse uma orgulhosa escultura clássica que ganhasse vida.
Um instinto infantil se ativa, e a primeira coisa que me ocorre não é correr para a saída, nem discar 911 do telefone que tenho no bolso, mas jogar um punhado de farinha que tiro de uma tigela.
Não sei se queria cegá-lo ou apenas brincar, mas o que cai na cara dele não o cega, só o deixa um pouco sujo. A farinha branca contrasta com a pele levemente bronzeada pelo sol.
Começamos a rir como loucos. Parte da minha risada é nervosa, mas também autêntica, divertida. Eu não ria de nada há anos.
Pego outro punhado e jogo no seu peito. Ele se aproxima de mim e eu penso quem vai fazer a mesma coisa: isto é, tirar a farinha da tigela e jogar em mim.
Mas não.
Ele se aproxima até me deixar presa na bancada. Eu ponho o palmas das minhas mãos no seu peito enfarinhado, empurrando-o em vão.
Ele sopra no seu rosto uma rajada de farinha no meu rosto e suja as lentes dos meus óculos. Fiquei cega por um momento.
De repente ele me pega e me senta no balcão enquanto levanta a minha saia. As minhas nádegas estão cheias de farinha e sinto que escorregaria do balcão de aço inoxidável se não fosse por mim agarrada aos seus ombros poderosos. Ele passa a língua nos meus óculos para limpá-los um pouco. Ele olha para mim com os seus olhos verdes e sinto medo novamente. Mas desta vez é um medo diferente. O medo de uma sensação que não experimentava há anos.
Tudo se ativa por dentro. Quero correr, mas também ficar e ver o que acontece. Paro de oferecer resistência. Passo os meus dedos sobre o seu abdômen enfarinhado.