Minha mãe foi quem me convenceu a mudar, mais uma vez. Conversamos sobre isso pessoalmente, sentadas em um café, quando fui visitá-la em sua cidade, semanas atrás.
Ela me disse que dessa vez eu deveria ir para mais longe, sem nem dizer onde estaria, sem contatá-la por telefone ou e-mail, ou por qualquer rede social. Nada de nada.
Ambos chegamos à conclusão de que é através das minhas ligações e e-mails para conhecidos que Richard descobre o meu número e a minha localização.
Minha mãe está convencida de que, se Richard não conseguir me contatar ou localizar por pelo menos um ano, ele se esquecerá de mim. E então eu posso ter de volta uma vida normal.
— Ele vai procurar outra vítima… ele vai se esquecer de você. Disse-me minha mãe. Não acredito, mas tento. Tento acreditar que esta será a última vez que fugirei de Richard.
Talvez minha mãe esteja certa. Embora eu acredite sinceramente que a minha ausência e invisibilidade total devam durar mais de um ano: um período de cinco anos, uma década, um século...
Então, sem contar a ninguém, pego primeiro um trem e depois dois ônibus até chegar a Denton, uma pequena cidade insignificante no centro do país. Escolhi ela como destino aleatório, depois de descer do primeiro ônibus.
Quando cheguei na Penn Station, nem eu sabia qual seria a minha última parada nessa viagem.
Depois de passar algumas noites em motéis com dinheiro, chego a Denton numa manhã de quinta-feira.
O centro da cidade é muito tranquilo,, alguns carros, algumas famílias, algumas com seus animais de estimação. Apesar do silêncio da cidade, há sons que na cidade são imperceptíveis entre tanto barulho. Aqui ouço o balançar do vento, o chilrear dos pássaros, o movimento das copas das árvores.
Eu, que sempre morei em lugares do litoral leste, agora me sinto muito longe. E isso é um alívio. Também me sinto nua porque não tenho telefone nem cartão de crédito, apenas uma identidade antiga de anos atrás, caso me peçam em algum lugar. Mas a minha ideia não é usar, não mostrar para ninguém.
Também não tenho acesso aos meus e-mails, muito menos às redes sociais. É como se eu fosse uma viajante do tempo que veio do século XIX e acabou de chegar a esta sociedade.
Agora uso o meu cabelo curto, na altura do pescoço, pintado de um vermelho profundo que parece natural por causa das minhas centenas de sardas. Eu uso óculos de armação grossa e sem prescrição.
Eu me sinto como outra pessoa.
Sou uma pessoa diferente, repito.
Na medida em que acredito nisso, Vou me sentir mais segura e longe de Richard.
Aqui decido não me chamar de Emma Wilson, que é o meu nome verdadeiro e meu nome de solteira.
Aqui serei Olivia Jones. Olivia é o nome da minha bisavó, fato que ninguém, exceto a minha mãe, sabe. E Jones, por ser um sobrenome muito comum, a camuflagem perfeita.
Olivia Jones, não parece r**m.
Quando eu era pequena, a minha boneca preferida se chamava Olivia, nome que gostei muito pela forma como soava e pelas imagens que evocava: minha bisavó nascida na França, e da cor do azeite.
Presumi que esta nova identidade neste lugar seria como um amuleto.
Significou alguma coisa, pelo menos para mim.
Meu celular aqui é descartável, comprado em uma das cidades onde troquei de ônibus. Mas não vou ligar ou escrever para ninguém do meu passado, nem mesmo para minha mãe. Eu sou outra e estou sozinhs.
Começo a acreditar com fé no que minha mãe disse sobre me manter invisível por um ano, até que Richard fique frustrado e cansado de não ter me encontrado.
Denton não é tão terrível quanto eu esperava.
É uma cidade com ruas de paralelepípedos, iluminação charmosa que iluminam as noites com um encanto especial. As lojas, embora pequenas, estão bem conservadas e o ambiente é de autenticidade e tradição.
Caminhar pelas suas ruas transporta-me para uma época em que a simplicidade e a comunidade eram a essência da vida.
As famílias reúnem-se em parques, onde as crianças correm e riem e os adultos partilham conversas animadas. É um lugar onde a vida parece fluir num ritmo diferente, mais lento e mais reconfortante. A quietude do entorno contrasta com a agitação que ele vivia na cidade.
Essa atmosfera acolhedora começa a desvanecer a sombra que Richard, meu antigo perseguidor, que começo a acreditar que ficou na minha antiga vida.
Desde o meu primeiro dia em Denton comecei uma busca ativa por oportunidades de emprego.
Apesar da minha experiência e talento no mundo da panificação, decido ser flexível e explorar vários espaços comerciais em busca de qualquer oferta de emprego disponível.
A cidade, porém, parece não ter muitas lojas com vagas abertas, o que me leva a considerar a opção de oferecer meus serviços de panificação de forma independente.
Mas, admito que embora saiba que poderia ter sucesso aceitando encomendas personalizadas, o problema é que ninguém aqui me conhece, nem tenho referências.
Portanto, não tenho escolha senão persistir até encontrar um emprego que me permita me estabilizar. Minhas economias, embora me dêem alguma margem de paz de espírito, não vão durar a vida toda.
Compreendo também que esta fase não se trata apenas de garantir uma fonte de rendimento, mas também de integração na comunidade e de construção de uma identidade nesta cidade.
Minha primeira semana em Denton é uma sucessão de horas monótonas em um quarto de hotel barato. Falta de respostas aos meus pedidos o trabalho começa a minar meu entusiasmo.
A ansiedade começa a assombrar os meus pensamentos, mas eu sei que o desespero não é meu aliado neste momento de transição.
Exploro as ruas adjacentes ao Centro, onde se concentra a maior parte do comércio local.
É durante um desses passeios que meus olhos pousam em um cantinho especial: a Casinha da Lilly. É uma pequena pastelaria que parece saída de um conto de fadas, com a sua decoração que emula uma encantadora casa de bonecas. Cores pastel e molduras adornam o interior e o exterior do local.
Embora não haja nenhum sinal visível anunciando que procuram um funcionário, sinto uma ligação instantânea com este recanto pitoresco.
Decido entrar com determinação, sentindo que este é o lugar onde quero trabalhar. A campainha anuncia minha chegada enquanto meus olhos examinam o local em busca de alguém.
Lilly usa um avental rosa com o seu nome bordado no peito. Não tenho dúvidas de que ela é dona do lugar.
Embora ela pareça um pouco m*al-humorada no início, sinto a doçura por trás dessa primeira impressão. Decido quebrar o gelo sendo amigável e fazendo algumas perguntas sobre os produtos que oferecem na padaria.
Enquanto conversamos, não resisto à tentação de comprar e experimentar uma das suas sobremesas.
Seus produtos são bons, mas, o meu paladar especialista vê oportunidades de melhoria. Compartilho educadamente algumas sugestões, enfatizando que são apenas a minha opinião e que estou disposto a ajudar no que puder.