1 longa noite (Elena)

3043 Words
Eu nunca havia de desejar tanto um descanso como essa noite, meus saltos me matam, e esse vestido, o que me deu na cabeça em colocá-lo. Desde que me mudei para cá e decidi seguir minha carreira de policial, a cidade, ou melhor, o bairro Branco, nunca mais foi o mesmo, não que o crime por essas ruas não aconteça mais, mas sim que diminuíram significativamente. Durante anos eu nunca havia me sentido tão bem, esses quase seis anos que vivi aqui me fizeram uma pessoa menos desumana, porém não me fizeram esquecer-se de meu objetivo nessa vida, colocar todo ser que não merece a liberdade, atrás das grades, essa é a maneira fácil nem queira saber a difícil. Finalmente consigo avistar mais á frente à luz de um táxi. Aliviada em sentir já o descanso de meus pés, eu caminho em sua direção, porém ouço meu celular tocar sobre a bolsa, e assim que vejo o nome sobre a tela eu suspiro pedindo que não fosse nada que me tirasse o conforto de minha cama. — Sim, Beto. — Digo ainda caminhando pela rua escura. — Está em casa? — ouço algumas vozes e passos logo após nosso silêncio. — Infelizmente, não. — informo aos suspiros. — Ótimo precisamos de você aqui! — Sem me deixar dizer uma palavra a mais, ele apenas diz que irá me enviar o endereço em breve, desligando logo em seguida. — d***a! — digo alto após desligar o celular, e como se já não fosse o suficiente eu vejo o táxi se afastando rapidamente. Desesperada eu começo a gritar tirando em seguida meus saltos e correndo em direção ao mesmo com a falsa esperança de que ele iria me ouvir. — m***a! — agora estou eu aqui, desorientada sobre essa rua escura e com um caso nas mãos. MENSAGEM DE BETO. CASA B, CONDÔMINO A1 (RUA DAS FLORES). Andando sem rumo eu penso bem em ligar para Beto e dizer que não poderia está indo o quão rápido quando eles precisavam, ou pior, dizer que eu não poderia está indo porque já era tarde e eu tinha acabado de perder meu táxi. Que d***a de desculpa é essa? É meu trabalho, meu dever, e nem que eu tenha que ir a pé eu vou comparecer. Atenta a qualquer sinal de movimento sobre a rua, eu caminho segurando firme minha bolsa e sapatos, mas nunca perdendo a postura e a harmonia sobre minha silhueta. Cantarolando uma melodia qualquer para que eu não me sentisse tão só do que eu realmente estava, eis que vejo um clarão bater mais à frente e o som de pneus pouco mais calmos do que parecia de estar, segundos atrás. Era um carro destrambelhado, não se dava para ver muito pela falta de luz sobre o local, já que pouco dos postes ainda faziam seu bom trabalho. Ao parar sobre a calçada e acena por ajuda, o velho carro diminui mais ainda sua velocidade me dando então a visão de um velho Chevette, e a grande fumaça que sai de seu interior assim que uma das janelas é aberta. — Fala ae chefa! — disse o jovem camuflado por grande quantidade de fumaça sobre seu veículo. É claro que eu não o deixaria dirigir em minha presença naquele estado, afinal tenho um trabalho a fazer, e morrer em um acidente não é meu propósito. Dando a volta pela parte da frente do carro, eu abro a porta o pedindo sem muita formalidade que passe para o outro estofado. — Meu Deus, garoto. — disse indignada por tal odor sobre o automóvel. Abaixando não uma, mas ambas as janelas sobre o carro ao máximo, eu coloco meu cinto pouco frouxo sobre o corpo e dou partida. Aos poucos o odor ia se dispersando deixando então uma enorme nuvem de fedor por toda a pista. — E então chefia, para onde vamos? — perguntou ele me vendo revirar os olhos e arrancar em seguida o enrolo de sua mão, o jogando pela janela. — Se eu fosse você colocaria o cinto, mas como não sou. — disse aumentando a velocidade segundos antes que ele pudesse abrir sua boca, para se queixar de tal ação que acabara de presenciar. Com as mãos firmes sobre o volante e beirando quase os 100 km por hora eu pude ainda assim, escutar as lamentações do jovem ao meu lado que apertava fortemente o estofado abaixo de seu traseiro enquanto eu sofria com suas garrafas de cerveja ao baterem em meu calcanhar. — Por favor, Deus, eu prometo ser um bom garoto se me deixar sair vivo desse carro. Eu prometo nunca mais vender as coisas de minha mãe e arrumar um emprego assim como ela pede todos os dias. — Ao ouvir suas palavras eu seguro meu riso e continuo minha trajetória. Felizmente assim que o celular toca eu vejo mais a frente meu destino. — Onde você está? Precisa que eu a busque? — bem que ele podia ter feito essa pergunta minutos atrás. — Chego em dois minutos. — disse desligando em seguida. I — Obrigado Deus! — exclamou ele exaltando o mesmo. Tirando o cinto segundos depois de nossa parada, eu procuro eufórica por minha bolsa logo mais ao meu lado, e então após finalmente ao encontrá-la eu retiro meu bloco de notas da mesma e rabisco algo sobre uma das folhas a desfalcando e entregando em seguida nas mãos do jovem. — É sério que você vai me multa?! — reclama ele estendendo o papel a frente. — Não seja tão reclamão, isso não é nada. A final você infringiu a lei. — Digo vendo sua cara f**a enquanto eu abria a porta. — Mas você também fez isso. Você também infringiu a lei! — disse ele levantando sua voz. — Eu sou a lei. — Informei em um tom baixo. — Ah já ia me esquecendo. — Sem delongas eu juntei meus saltos assim como fiz com as garrafas de cerveja sobre o tapete. — É sério vai levar minhas cervejas? — perguntou arregalando seus olhos castanhos. — A noite hoje vai ser longa. — Sorri me retirando em seguida e escutando um palavrão saltar da boca do rapaz n***o e magrelo. Caminhando mais a frente consigo notar o porte de Beto, que agora me olha confuso reparando em meus pés descalços. Sem hesitar eu caminho em sua direção o vendo fazer o mesmo até que finalmente está próximo o suficiente de meus olhos. Com suas mãos grandes ele tira as garrafas de meu corpo sorrindo e evitando olhar novamente para mim. — É só seguir em frente, não tem como se perder. Eu vou por isso no carro. — Assenti o vendo partir em seguida. Realmente não havia como se perder, as viaturas e carros particulares estavam amontoados tudo em um só lugar. A faixa amarela ao redor me dava logo mais a frente à visão de uma casa de luxo. Afinal nada mais justo para esse condomínio de alto valor. Parando um momento para colocar meus saltos eu observo um dos agentes a levantar a faixa já a minha espera, e como sempre, Felipe me aguardava com seu sorriso sem dentes e sua barriga gorda que cismava em ficar para fora de seu avental. — Que bom que chegou chefe, a senhorita vai se surpreender. — disse nos guiando. — Nada mais nessa vida me surpreende. — Declarei observando a grama bem aparada e úmida graças ao aspersor. — Ei! — gritei correndo até o jardineiro ao lado. — O que pensa que está fazendo? — perguntei o vendo soltar a bucha das mãos. — Ele não estava aqui antes chefe, eu juro. — Informou Felipe pegando as coisas do rapaz a nossa frente. — Vá! — ordenou ele fazendo em seguida o mesmo obedecer a suas palavras em completo silêncio. — Que isso não se repita mais. — Digo o vendo assentir e seguir juntamente a mim até o cômodo claro mais a frente. O sangue sobre o piso branco faltava pouco escapar para o lado de fora, a bagunça sobre o quarto e objetos jogados ao chão, era o que mais me chamava atenção, até mesmo antes do corpo. Após uma boa volta sobre o cômodo eu me locomovi até o rapaz sobre os lençóis brancos, estava nu. Um pequeno furo sobre a testa. — Seu nome é Marcos da Silva... — Antes que ele pudesse continuar eu me aproximei mais do mesmo o olhando bem. — Ele por um acaso é... — O irmão de Bruno? — completou entrando sobre a porta. — Sim é ele. — Nesse momento eu me agacho o observando com mais atenção. — Encontraram algo? — eu apenas o vejo assentir e dizer o básico do básico. — Já chamamos o legista. — Informou. — Sente esse cheiro? — pergunto a Beto o vendo se aproximar. — Sangue? — Não, quer dizer, sim. — O peço para se abaixar. — Cheiro de sangue, rosas e... s**o. — Digo o vendo levantar delicadamente sua sobrancelha. Após o encara por um curto tempo, eu me viro sendo atraída por uma lixeira logo mais ao lado. Logo mais acima de alguns papéis amassados e a ponta do lençol, uma c*******a me chama a atenção, com um sorriso firme sobre os lábios eu levo minha mão até ela a segurando com um dos papéis sobre a lixeira. — E então? — digo a mostrando para o mesmo. — Para quem não tem namorado, está experiente demais em relação ao cheiro do s**o. — Pelo menos eu não fico por aí procurando alguém pra me fazer companhia à noite. — Digo me levantando e caminhando à frente. — Mas eu não faço isso! — seus passos firmes me seguiram até o corpo gordo de Felipe. — Leve isso para análise. — Elena de onde tirou isso? Quem te contou essa mentira? — ele me olhava nos olhos, seus pequenos olhos escuros se encontravam sérios. — Fique tranquilo, ninguém aqui é mais criança. — A verdade era que eu sabia que sobre minhas palavras, nem uma delas havia um pingo de veracidade. — Estou exausta. — Declarei. — Ainda não posso acreditar que algo assim está acontecendo no meu bairro. — Uma hora alguém se vingaria pelas mortes que ele cometeu junto ao irmão. — Informou. — Acho que ele mereceu nada mais justo para alguém que tirou vida de mulheres e crianças. — Você acha que isso foi vingança? Então por que nem um dos guardas reagiu? — Talvez tenha sido uma p********a. — p********a? — retruco. — Então não era verdade que ele iria se batizar? — Bem ele é humano, provavelmente queria aproveitar seu último dia de pecados. — Ei! Vocês dois — disse sobre a porta. —, acho melhor virem aqui. — Sem delongas caminhamos à frente o seguindo até mais ao fundo da casa onde encontramos sobre a piscina um mar vermelho e corpos a flutuarem sobre a mesma. — Ainda acha que foi vingança? — o interrogo vendo os buracos de bala sobre a testa dos homens abaixo. — E os vizinhos? Alguém viu algo? — Não, exatamente nada. — d***a. — disse me retirando. — Quero todos eles o mais rápido possível na logística. Como algo assim pode está acontecendo em meu bairro, desde quando as pessoas aprenderam a m***r assim? Que diabos eu estou lidando? — Eu vou te levar para casa. — Sem o questionar, eu apenas caminho ao seu lado o vendo desativar seu alarme e abrir a porta ao lado do passageiro para mim. Estendendo sua mão a frente ele me estimula a sentar-se e fecha a porta em seguida. Ao passar o cinto sobre o corpo, não pude deixar de notar seu jeito descolado e jovem de sempre, sua camiseta solta sobre o corpo e seus antebraços firmes... Um suspiro me corrói o pulmão me fazendo apertar o cinto sobre mim, mas infelizmente todo aquele caos some em questão de segundos assim que ouço o som da porta ao se abrir. — Tudo bem? — eu apenas assenti me colocando em meu lugar. Posso sentir uma leve hesitação de sua parte, ele pausa com seu toque sobre a marcha e se mantém assim até que eu junte minhas pernas uma próxima a outra. Eu tinha certeza que ele estava olhando para elas, e de certa forma eu não me sentia desconfortável. O carro avança nos tirando enfim da companhia daquela casa e dos agentes. Com a janela aberta, eu me coloco a tomar um bom fôlego, a noite que eu havia planejado para hoje havia mudado totalmente de rumo. — Beto, me leve para a sede. — disse como se quase o desse uma ordem. — De maneira alguma. Eu disse que a levaria para casa, e é isso que vou fazer. — Não temos tempo para isso, temos um caso importante para trabalhar. — Seu sono também é importante. — Ele me olha pelo espelho. — Se isso for a deixar mais tranquila, eu vou passar a noite na sede hoje, vou ficar a par de tudo do caso, e amanhã bem cedo você saberá desse "tudo". — Mas... — antes que eu pudesse dizer algo mais ele liga o rádio em um volume que minha voz não fizesse eco algum em seus ouvidos. — Não me ignore, Beto. Beto! — após isso eu tento levar uma de minhas mãos até o rádio, porém uma das suas me segura o pulso. O olhando firme eu me solto da mesma me curvando até o banco de trás e pegando uma das cervejas quentes sobre o banco. Sentir o líquido forte caminhar por minha garganta até finalmente chegar ao meu estômago, era algo que eu sentia constantemente, isso me anestesia por alguns minutos, e nesse momento me anestesia da voz rouca de Beto ao tentar fazer sintonia com a música sobre o rádio. — Vamos, canta comigo. — Ele estava eufórico, batia com suas mãos grandes sobre o volante e chacoalhava seu corpo. Como ele conseguia ser assim com tal coisa acontecendo sobre o bairro, como pode ser tão i****a a esse ponto... De certa forma eu queria ser como ele, mas..., Mas algo em mim me mantém o que sou agora, e tudo isso graças há um algo muito maior. — Você precisa se soltar mais, vamos, cadê a Elena que conheci há seis anos? — Há cinco anos, onze meses, três semanas e um dia. — Informei. — Certo o que está acontecendo? — ele para o carro sobre a rua escura e me observa. — E então? — me perguntou após retirar a garrafa de minhas mãos e a virar sobre os lábios. — Apenas não consigo com essa pressão toda sobre mim. Isso não deveria está acontecendo, eu amo esse bairro, amo meu trabalho. Mas eu não sei se posso dar conta, não com o pouco tempo que me resta. — Bem podemos ligar, podemos pedir alguns anos a mais. — Não! — exclamei sem intenção o vendo franzir a sobrancelha. — Eu já fiz isso. — disse retirando a garrafa de suas mãos e virando o pouco líquido que ainda havia nela. — Eles disseram que não poderiam fazer mais nada, passei muito tempo fora da cidade e é como se eu não fizesse mais parte dela, entendi? — Não. — Ele ainda me observava. — É como se eu fosse uma estrangeira, como se esse trabalho aqui não me pertencesse. Como se tudo que um dia eu criei aqui não fosse meu. — Eu o vejo me fitar, parecia pouco desentendido, ou melhor, parecia não entender exatamente nada. Sorrio. — Mas não importa, desde quando deixei de resolver um caso? — ele permanece em silêncio. — Exatamente. Nunca. — Isso quer dizer que eu nunca mais vou te ver. — diante a suas palavras eu reparo sua tensão sobre o maxilar. — Hm... — sobre meu interior eu caçava bem lá no fundo um único rastro de conforto para minhas palavras. — Não seja i****a. Isso quer dizer que finalmente vai subir de cargo. — Essa não foi minha pergunta. — De certa forma. — disse me virando para frente. — Podemos ir agora? Eu estou exausta. — Diante a nosso silêncio, eu o vejo da partida, essa é a primeira vez que eu havia tirado o bom humor e o sorriso alarmante de Beto, mas não era a primeira vez que o tratava assim. Finalmente depois de alguns minutos nós paramos, e sem uma palavra sequer abrimos à porta nos deslocando para fora. Ele então se aproxima, seus olhos estão fissurados em mim e automaticamente minha pele se arrepia. Com um sorriso sem jeito sobre o rosto eu o vejo passar direto sobre mim se colocando sobre o banco do carona. Que i****a eu sou, é claro que o que aconteceu há anos atrás, não voltaria a acontecer novamente, afinal fui eu... — Aqui está. — disse me entregando as cervejas. — Eu já havia esquecido. — disse o agradecendo e dando as costas para si. — Elena. — Sinto um de seus braços rodear minha cintura me virando então em seguida para si. — Boa noite. — ele me deposita um beijo lento sobre uma das bochechas e se afasta em seguida fechando a porta atrás de nós e dando a volta pelo carro escuro. — Boa noite... Beto. — Digo baixo antes de o ver sumir sobre a curva mais a frente. Já sobre a frente de minha porta, eu me agacho ainda com as cervejas sobre a mão. Insistente eu caço logo mais abaixo do tapete camuflado perante a grama, minha chave. Finalmente. Minhas mãos estavam livres assim como meus pés. Sem a mínima vontade de guardar as coisas, eu as deixei ali mesmo, sobre o canto da porta. Com meu traseiro preguiçoso eu caminhei até mais ao sofá e me joguei sobre si, esquecendo a pilha de roupas sobre o mesmo. Eu havia mentido sobre descansar, na verdade descansar era o que eu menos sentia vontade no momento. Com meu notebook sobre as mãos, eu pesquisei sobre a vida de Marcos, e não foi surpresa alguma encontrar seu nome sobre o registro policial. "Marcos da Silva Conceição, nascido em 13/02/1978, com exatamente 39 anos. Preso duas vezes por porte ilegal de drogas. Filho de Maria Teresa da Conceição, ex-presidiária, nascida em 15/07/1960, falecida em 01/10/2011. Maria Teresa era conhecida como a Mulher das joias. Ladra das mais belas pedras e relíquias, mãe também de Bruno da Silva Conceição, nascido em, 17/01/1975 com exatamente 42 anos de idade. Bruno é conhecido como o maior t******************s, armas e dinheiro do bairro, preso sete vezes por; venda de drogas, três por agressão domiciliar e uma por agredir um policial. Filhos também de Carlos da Silva Duarte...". Diferente de todos os membros de sua família, Carlos não havia nem um antecedente criminal, um idoso de aproximadamente 65 anos de idade, todos o conhecia pelo bairro, havia ficado inválido após um acidente na estrada. Pode se dizer que sua vida também não foi uma das melhores.
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