Entre a Paixão e o Perdão

1182 Words
O beijo no corredor havia sido um erro delicioso e devastador. Ele quebrou a trégua profissional e mergulhou Daniel (38) e Helena (36) no terreno instável da atração reprimida. Na manhã seguinte, o ar entre eles era espesso, carregado de silêncios tensos e olhares roubados. Eles se esquivavam um do outro, voltando aos diálogos estritamente sobre Lucas (18). A nova fase da recuperação de Lucas, que envolvia fisioterapia em uma clínica especializada, exigiu que eles saíssem do isolamento da suíte. Era a primeira vez que Daniel e Helena eram vistos juntos em público, fora do ambiente hostil do tribunal ou do hospital. Na clínica, eles tentavam manter uma fachada de pais civilizados e distantes, mas a faísca era incontrolável. Enquanto Lucas fazia seus exercícios, Daniel e Helena esperavam na área de observação. — A clínica exige que assinemos o termo de responsabilidade conjunta. — Helena disse, passando a prancheta. — É apenas um protocolo. — Entendo. — Daniel pegou a caneta. O contato de seus dedos sobre a prancheta de plástico foi breve, mas suficiente para reacender a memória da noite anterior. — Não podemos deixar que isso aconteça de novo. — Daniel murmurou, sem tirar os olhos do documento. — O quê? — Helena fingiu inocência, embora seu coração estivesse acelerado. — Aconteceu ontem. O beijo. — Ele assinou com uma letra firme. — A paixão não pode mascarar dezoito anos de mentiras. Eu não te perdoei, Helena. E não vou te usar para aliviar a minha dor. — Eu sei. — Ela pegou a prancheta de volta. — Mas não foi só a dor que nos fez fazer aquilo, Daniel. Foi o que sempre houve. E o medo de ter sentimentos por você, é a razão pela qual eu fiz Minha Escolha daquela época. — E você continua fazendo escolhas. — Ele a olhou com intensidade. — A minha escolha é focar em Lucas e em como construir o futuro dele. Não no nosso. O tom era duro, mas Helena viu a dúvida em seus olhos. A atração era um inimigo mútuo, mais perigoso que Viviane. A exposição pública do relacionamento forçou Daniel e Helena a trabalharem juntos para gerenciar a imprensa e proteger a reputação de Lucas, que agora era uma celebridade indesejada. Helena organizou uma reunião com um especialista em relações públicas. Daniel, como Promotor e pai, insistiu em participar. No escritório do especialista, eles discutiram a melhor forma de reverter a imagem de Lucas de "filho secreto" para "jovem herói". — Vocês precisam mostrar estabilidade. — O especialista explicou. — Fotos de família, vocês em um evento de caridade. O público quer ver que o Promotor e a Doutora estão reconstruindo a vida. — Fotos de família? — Daniel ironizou. — m*l conseguimos sentar à mesma mesa sem discutir sobre a marca de café. Helena ignorou o comentário de Daniel e dirigiu-se ao especialista. — Estamos dispostos a fazer um evento de caridade. Daniel tem uma ligação forte com instituições de apoio legal. Podemos fazer uma doação e uma aparição pública como pais que estão unidos pelo bem do filho. Daniel a observou, impressionado com a sua capacidade de pensar estrategicamente sob pressão. Ela era uma força da natureza. A raiva dele começou a se misturar com o respeito. — Concordo com a iniciativa de caridade. — Daniel disse. — Mas não haverá manipulação. Seremos honestos sobre o nosso status: somos pais dedicados que estão aprendendo a ser família. Nada mais. — Combinado. — Helena concordou, sentindo uma pontada de decepção. A noite do evento de caridade chegou. Era o primeiro compromisso social de Daniel e Helena como um "casal" público. Lucas, já caminhando com mais facilidade, ficou em casa, supervisionado por uma enfermeira. Helena vestia um longo vestido azul, que realçava sua postura e seu poder. Daniel estava impecável em um terno escuro. Eles pareciam o casal perfeito, rico e poderoso. Mas a tensão sob a superfície era palpável. No evento, eles foram abordados por colegas de Daniel e antigos amigos de faculdade. Um deles, um juiz aposentado, parabenizou Daniel. — Daniel, meu rapaz, fiquei sabendo. Meus parabéns. Ele é a cara do seu pai. Lembro-me de como você estava desesperado quando Helena fugiu. Foi um choque para todos. Daniel sorriu, forçando a cordialidade. — Obrigado, Juiz. Quando se afastaram, Daniel se virou para Helena. — Ele viu a sua dor, Helena. E a minha. Você nos fez sofrer em público e em particular. — E eu fui a única a carregar a verdade, Daniel. — Ela revidou, os olhos faiscando. — Você podia ter se casado, ter tido outros filhos. Eu não podia. Eu era a mãe solteira que abriu mão de tudo. A briga foi cortada por um pedido de foto. Eles foram forçados a sorrir, ombro a ombro. Naquele momento, Daniel viu o brilho de um diamante no dedo anelar de Helena. — Você está noiva? — Daniel sussurrou, a voz tensa, o ciúme o atingindo como um choque elétrico. — Não. — Helena respondeu, ainda sorrindo para a câmera. — É um presente de mim para mim mesma. Um símbolo de que eu não preciso de ninguém para validar a minha vida. O fotógrafo se afastou. Daniel a agarrou pelo braço e a levou para um canto escuro. — Você não pode brincar assim comigo! — A formalidade havia desaparecido. — Eu estou tentando perdoar você, e você aparece com isso? — É só uma joia, Daniel! — Ela se defendeu. — Não é um anel de noivado. Pare de ver traição em cada passo que eu dou. — Eu só paro quando você me provar que vale a pena confiar em você! A proximidade, a raiva, a paixão. Era demais. Daniel a puxou para si, beijando-a com uma urgência que superou a do beijo anterior. O vinho, o ciúme e a mágoa explodiram. Ele a beijou como um homem que estava tentando recuperar dezoito anos perdidos. Helena revidou o beijo, a luta interna entre o orgulho e o desejo travada em seus lábios. Ela sabia que ele não a perdoaria completamente até que ela se humilhasse, mas a paixão era irresistível. Eles se afastaram, ofegantes, a maquiagem de Helena borrada, o nó da gravata de Daniel frouxo. — Eu não aguento mais isso, Helena. — Daniel ofegou. — Você tem que decidir. Você quer que eu seja o pai do nosso filho? Ou você quer que eu seja o seu amante proibido? Você não pode ter os dois até que a mágoa acabe. — E quando isso vai acontecer, Daniel? — Ela sussurrou. — Quando você me disser a verdade sobre por que realmente fugiu. Você escreveu no diário que era para me proteger, mas eu sinto que havia mais. Eu sinto que você estava fugindo de algo que te assustava. Helena olhou para ele, o medo voltando aos seus olhos. Ele estava perto demais da verdade completa. A verdade que não envolvia apenas Daniel, mas a outra escolha que ela teve que fazer naquela época. — Eu não sei se posso te contar. — Ela disse. — Isso destruiria tudo.
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