Isabella Mendes
— Não, não e não! — Balancei o dedo negando e meu pai me olhou com cara de tédio. — Eu não vou, já disse!
Se ele estava pensando que iria me levar para o Rio de Janeiro à força, podia se considerar enganado.
— Já faz... — ele olhou em seu relógio de pulso — exatamente quinze minutos que você não para de inventar motivos para não ir embora comigo. — Leandro suspirou e se levantou da minha cama vindo até mim. — Fizemos um trato, Isabella. Você moraria aqui e nas férias iria para casa ver sua família. Você quebrou o trato e agora ele não existe mais. É bem simples de entender e eu sei que você é inteligente o bastante para isso. — Meu pai segurou meus ombros e encarou meus olhos — Eu não vou mais ceder as suas vontades, você vai embora comigo e ponto final.
— Mas pai... Eu não quero voltar! — eu disse sentindo meus olhos marejarem.
— Já faz quatro anos, Isabella. Ninguém mais lembra disso. — Ele sorriu com ternura para mim. — E ninguém é maluco de tocar nesse assunto.
— Por favor, paizinho, eu juro que não viajo mais sem sua permissão. Me deixa ficar aqui? — Juntei as mãos implorando.
— Desculpe, querida, mas você vai ter que voltar para casa com o papai. — Ele beijou minha testa e sorriu. — Arruma suas malas, vou te esperar lá em baixo.
Meu pai era o tipo de cara que te deixa sem argumentos, ele decide uma coisa e pronto, é aquilo.
Eu sempre quis morar aqui com meu tio, desde pequena, mas meus pais nunca deixaram, até que aconteceu algo que os fez mudar de ideia. Eu tinha um namoradinho quando era mais nova, ele era uns anos mais velho que eu. Me entreguei a ele cedo demais, nova demais. E dias depois o morro todo sabia disso, porque ele havia tirado fotos íntimas minha e mostrado para todos os amigos, orgulhoso do que fez comigo.
Depois desse trauma meus pais concordaram em me deixar morar com meus tios, mesmo que fosse doloroso para eles.
Quando eu vim morar em São Paulo percebi que tudo aqui era diferente, eu tinha uma vida perfeita. Meu tio e minha tia nunca me negavam nada, eles sempre permitiam que eu fizesse o que desejasse, me mimavam, faziam de tudo para que eu fosse feliz, talvez isso se devesse ao fato de que eles não podem ter filhos, sendo ou não, posso dizer que esses quase quatro anos que passei aqui foram os melhores da minha vida.
Eu sabia que tinha a possibilidade de ter que voltar para a casa dos meus pais, mas pensei que talvez pudesse enrolar até que fosse maior de idade.
— Querida? — Tio Alberto bateu duas vezes na porta antes de entrar. — Será que eu posso conversar com você?
— Vai deixar ele me levar? — Me sentei na cama de cabeça baixa.
Drama funciona as vezes, é sempre bom tentar.
— Eu queria poder fazer alguma coisa, mas ele é seu pai. — Ele se sentou ao meu lado.
— Eu não quero ir, tio. — Deitei o rosto no colo dele.
— Vai ser melhor para você. — Tio Alberto disse acariciando meu cabelo. — A Sílvia vai te ajudar a arrumar suas malas e eu vou pegar seus documentos para entregar ao seu pai — ele disse e eu assenti deixando uma lágrima escapar.
Não há nada que eu possa fazer, o jeito é aceitar que não posso mudar meu destino e voltar para o Alemão.
...
Abracei tio Alberto pela última vez e suspirei olhando em volta e me despedindo mentalmente da casa e do condomínio, já tinha me despedido da tia Sílvia e da Lívia.
— Precisa mesmo fazer isso, irmão? — Ouvi o tio Alberto dizer ao meu pai enquanto eu entrava no carro. — Talvez Isabella possa ficar mais um tempo, não sei se uma mudança tão repentina faria bem para ela. Isabella é muito sensível, você sabe.
— Isabella passou tempo demais aqui, é hora dela voltar para casa e passar algum tempo com os pais e os irmãos — Meu pai disse e os dois se abraçaram. — Obrigada por cuidar dela, irmão.
Meu pai entrou no carro e deu partida saindo do condomínio, cruzei minhas pernas e desbloqueei meu celular.
— Tem algo para me falar? — papai perguntou e eu o encarei erguendo a sobrancelha. — Alguma novidade ou sei lá. — Ele deu de ombros, sem jeito.
— Não tenho muitas novidades, pai. — Encarei o vidro escuro. — Temos mesmo que ir de carro? Não podemos pegar um avião?
— Não tinha voo para cá quando eu vim e eu não queria esperar para te buscar, então vim de carro e tenho que o levar de volta. Se estiver cansada, pode dormir — ele disse e eu assenti.
— Por que o senhor fez todo esse sacrifício de vir até São Paulo de carro para me buscar? — Indaguei encostando a cabeça no banco.
— Porque você é minha filha e eu a quero perto de mim. — Ele acelerou ultrapassando alguns veículos. — Sua mãe sente sua falta, Isabella. Todos nós sentimos, é como se uma parte de nós estivesse faltando.
— Eu também sinto falta dela e de todos, mas não queria voltar para o Alemão.
— Isso não é algo discutível, filha. Por favor, vamos encerrar esse assunto.
Depois que me mudei para São Paulo fui apenas algumas vezes na casa dos meus pais, e todas essas vezes eu ficava em casa, sem nem pôr o pé na rua, tudo isso por vergonha do que aconteceu há anos atrás e medo de topar com aquele infeliz em algum beco.
Eu sei que meus pais vão fazer o possível para eu me sentir bem lá, e talvez seja até bom voltar e viver junto da minha família. Eu realmente sentia a falta deles.