1 CAPITULO
Por Marcela
5 Anos atrás
– E então Marcela... – Renata começou falar enquanto me ajudava em finalizar minha mala. – Já decidiu o que vai fazer a respeito da especialização em Portugal?
– Não sei Rê, estamos iniciando agora nossa sociedade, acabamos de abrir nossa empresa e você sabe que todo começo é complicado. Eu não quero deixar você sozinha nessa.
– Eu sei de tudo isso Marcela, mas você deveria pensar bem na oportunidade que pode perder. Sem falar que você fazendo essa especialização vai enriquecer ainda mais nossa empresa, isso seria um diferencial no mercado. Eu posso cuidar de tudo enquanto você estiver fora e você me auxiliar com o que for necessário pela internet.
Aquela ideia de Renata não era tão absurda, mas o que ela não sabia era a existência de outras coisas que me impediam de seguir adiante.
– Eu sei! – Falei meio sem animo. – O fato é que estou bastante confusa em relação a isso tudo, então por enquanto quero apenas curtir nossa viagem de final de ano com a galera e depois pensamos nisso, ok?
– Ok! – Quando pensei que ela encerraria o assunto ela continuou. – Mas me tira só uma dúvida. Essa sua dificuldade toda em decidir se vai ou não para fora do Brasil é apenas pela empresa ou existe uma certa pessoa dificultando sua escolha? – A garota se jogava na minha cama sorrindo bagunçando toda a roupa que eu já havia separado.
– Você quer fazer o favor de parar de bagunçar tudo que eu já arrumei? E pode parar de besteira, eu não tenho nada com a Hanna além de amizade. Quantas vezes vou precisar repetir isso?
Falei sem muita certeza se eu estava transmitindo a confiança necessária para minha amiga que me conhecia tão bem.
– É nossa amiga e vocês estão tendo um troço muito louco. – Ela afirmou com convicção. – Vocês já ficaram?
– Pelo amor de Deus Renata, claro que não! – Por mais que eu não quisesse meu desespero era gritante. – Ela é... Irmã da Micaela e eu não quero morrer, estou jovem demais ainda para isso.
Micaela era irmã mais velha de Hanna e uma das minhas melhores amigas. Era incrível o ciúmes que Mica tinha da irmã mais nova, eu achava lindo a parceria e cuidado que as duas irmãs tinham uma com a outra.
– Digamos que a Mica fosse tranquila em relação a você pegar a irmã caçula dela, você pegaria?
– Rê, eu não paro para pensar nisso!
Tentei passar uma sensação de pouco caso, mas a verdade é que eu estava mentindo descaradamente, porque tudo que eu fazia nos últimos tempos era pensar na mais nova da família Prados.
– Há para Marcela... – A indignação na voz de Renata me deixava em pânico com aquela pressão psicológica. – Todo mundo ver como vocês duas se olham, além disso ela não é tão nova assim. Se brincar aquela lá sabe de mais coisas do que eu e você juntas. Só tem um problema...
– Ela é hetero! – Falamos juntas e então me sentei.
– Quer saber a verdade? – Ela acenou em concordância então prossegui. – Eu me sinto atraída por ela desde aquele dia que ela se perdeu naquele acampamento e eu a encontrei no meio daquela chuva. – Renata me olhava com atenção. – A vontade que eu tive de protegê-la e não soltar mais... – Respirei profundamente. – Eu não sei quando ou como, mas acho que me apaixonei a partir daquele momento, mas como você disse ela é hetero e eu não quero problemas para meu pobre coração.
A verdade que ninguém sabia era que desde o dia que encontrei a Hanna perdida na mata durante um acampamento que fizemos entre amigos o ano passado nós acabamos nos envolvendo, porém durante todo esse tempo vivenciando uma relação indefinida Hanna me pediu para mantermos tudo em segredo, pelo menos enquanto ela conseguia preparar a família para nos assumir.
Eu estava completamente apaixonada por Hanna e por isso tentei entende-la e respeitar seu pedido, afinal ela tinha apenas 20 anos e eu tinha 24. Eu estava bem resolvida em todos os aspectos da minha vida, por sua vez Hanna ainda estava no primeiro ano de faculdade e se descobrindo sexualmente. Até então todos a viam como hétero. O fato da sua irmã ser uma das minhas melhores amigas e morrer de ciúmes da irmã mais nova foi também um fator que levei em bastante consideração quando me convenci que realmente seria melhor ir com calma e preparar todos para a noticia.
O único problema é que era muito difícil está perto de Hanna e não poder tocá-la ou agir como sua namorada, mas difícil ainda era conseguir esconder a tensão que existia ente nós duas sempre que estávamos entre amigos e talvez por isso todos começaram a fazer piadinhas sobre um possível envolvimento entre nós. Nesses momentos Hanna fazia questão de mostrar o quanto era hétero, o que depois acabava gerando brigas entre nós duas quando estávamos a sós, afinal eu me questionava como ela queria preparar todos para nossa relação se ela continuava pagando status de heterotop? Ainda assim, entre brigas e paixão estávamos nessa situação há quase um ano.
– É uma situação complicada! – Renata falou séria. – Eu não posso afirmar nada para você com uma certeza que não tenho, mas olhando de longe eu vejo que apesar dela se afirmar como hétero ela te olha diferente. Talvez você pudesse conversar com ela sobre isso, apenas siga seu coração e tente não se machucar, certo?
Renata era sem dúvidas a amiga mais sensata do nosso meio, na verdade esse era um posto que ela dividia com Micaela, porém ao contrario de Renata, Micaela era extremamente explosiva e só perdia para mim nesse quesito. Daniela era a s*******o de todas nós, a maluca sem filtro que eu não conseguia não amar.
– Certo! – Afirme com um sorriso amargo. – Agora vamos que já estamos atrasadas e temos um réveillon para curtir.
Pegamos nossas malas colocamos no carro e seguimos para Canoa quebrada.
Estava quase anoitecendo quando chegamos à casa de praia da família prado que Micaela pegou emprestado com os pais para passarmos o réveillon. Estacionamos o carro e percebemos que todos os outros já haviam chegado ao lugar. Eu e Renata havíamos ficado para irmos mais tarde já que precisávamos finalizar a analise de uma empresa que havia nos contratado para realizar um EIA- Estudo de impacto ambiental.
Estávamos em um grupo de oito pessoas: Eu, Hanna, Renata, Micaela e Robson seu namorado, Daniela e Henrique um dos seus ficantes fixos como ela costumava descrever. E por último um amigo do Henrique que por sinal eu ainda não conhecia.
Ao entrarmos na casa logo vimos às meninas na beira da piscina enquanto os meninos estavam afastados preparando um churrasco. Descemos do carro e ouvimos Micaela se pronunciar quando se aproximou de nós.
– Finalmente vocês chegaram, já estávamos começando ficar preocupadas.
Cumprimentou-nos beijando nossos rostos com carinho. Essa era mais uma característica de Micaela, ela era praticamente a mãezona do grupo, sempre muito preocupada e cuidadosa com todas nós.
– Culpa sua amiga ai que não pode vê uma loja de conveniência que quer parar e comer. – Rê falou me fazendo lhe mostrar a língua.
– Vocês duas não mudam né? Sempre tão kids
Olhei para o lado e vi Dani aproximando-se de nós, logo a abracei. Daniela era implicante e curiosa, mas eu amava aquela garota, na verdade, amava todas minhas amigas. Olhei para trás de Daniela e vi que Hanna continuou a beira da piscina sem vir nos cumprimentar, além disso, a garota parecia está envolvida em uma conversa animada com aquele que deduzi ser o tal amigo do Henrique. Aquilo me incomodou, mas tentei não deixar transparecer nada naquele momento, afinal era sempre assim quando estávamos na frente de alguém, Hanna sempre me tratava com indiferença e causalidade. Nada de contato ou demonstração de carinho entre nós, eu era apenas uma das amigas da sua irmã.
– Sabe, Bettencourt. Eu acho que você poderia tentar no mínimo disfarçar a forma que come minha irmã com os olhos, vou acabar sendo obrigada a te deixar cega, garota!
– Credo, eu nem fiz nada. – Me defendi na maior cara de p*u. – E quer saber? Você bem que gostaria de ter uma cunhada maravilhosa como eu, meu bem.
– Tá ousada! Perdeu o amor à vida, Marcelinha? – Robson se aproximou de nós fazendo graça fazendo sua namorada revirar os olhos.
– Robson meu querido, você não tá dando conta do recado não? Sua namorada anda muito m*l humorada nos últimos tempos – Falei arrancando risadas de todos, mas logo senti um ardor do tapa que lei de Micaela.
– Eu tento Marcelinha, mas essa garota é difícil!
Dessa vez foi Robson que levou um tapa e todos sorriamos ainda mais.
– Posso saber do que estão Sorrindo? Quero sorrir também!
Ouvi a voz animada de Hanna e senti como se meu chão fosse sumir. Era impressionante como aquela garota mexia comigo sem fazer o menos esforço. Me sentia uma boba! Olhei para trás vendo-a aproximando-se de nós junto com o Henrique e o outro garoto.
– Estamos falando o quanto sua irmã é difícil e do quanto seu cunhado não dá conta dela. – Renata respondeu cumprimentando os três recém-chegados ali.
– Meninas esse é o Guto, meu amigo. Guto essas são Renata e Marcela amigas da Dani.
– Olá, prazer em conhecê-las!
O garoto apresentava ter pouco mais de 20 anos, além de ser muito bonito e aparentemente educado.
– Estávamos falando também do quanto a Marcela está prestes em ficar cega por te comer com os olhos, maninha.
Micaela provocou falando debochada e me olhou com uma expressão de “você me paga assim”, eu obviamente gelei diante daquela brincadeira de Micaela, porque sabia que Hanna não gostava dessas brincadeiras, então já previ o que iria acontecer...
– Mana, entre olhar e pegar existe uma diferença muito grande.
Sempre o tom de voz usado por Hanna era puro desdém. Normalmente a dor que eu sentia era tão intensa que eu costumava silenciar, mas ali naquele momento eu me senti humilhada e então devolvi na mesma moeda.
– E entre sua irmã falar e ser verdade também existe uma diferença enorme, mas talvez você seja tão esnobe que ao menos consegue perceber isso.
Eu me sentia magoada com toda aquela situação que de certa forma era humilhante. Hanna me olhou com surpresa e até vi ensaiando para responder algo, simplesmente a cortei antes que começasse.
– Vamos subir Rê... – O clima tinha ficado tenso e um silêncio se fez presente no ambiente. – Precisamos colocar as coisas para dentro. Eu quero tomar um banho!
Renata apenas me seguiu ainda parecendo chocada com minha resposta a Hanna.
– Ok, aquilo foi muito estranho – Ela finalmente falou quando chegamos ao quarto que ficaríamos.
– Eu responder a altura? Renata, eu estou cansando de silenciar a petulância dessa garota, mas também não quero estragar nosso feriado, então se você puder não tocar no assunto eu agradeço.
Nunca senti tanta raiva das respostas que a Hanna dava nessas situações como naquele momento.
– Ok, amiga! Bom eu vou te deixar tomar banho e vou descer. Depois retiro as coisas da mala. – Renata me beijou o rosto e saiu do quarto.
Depois que minha amiga saiu do quarto eu deitei um pouco e me permiti soltar algumas lágrimas, eu não sabia mais o que fazer para aquela situação acabar, eu gostava dela, mas não sabia até quando eu seria capaz de aguentar aquele tipo de coisa.
Depois de alguns minutos resolvi tomar um banho que durou mais tempo do que eu esperava, precisava deixar aquela dor escoar junto com a água que passava pelo meu corpo. Precisava me sentir renovada antes de olhar nos olhos da garota que me fazia ir do céu ao inferno.
No entanto para minha surpresa quando sai do banho ela estava lá, sentada na cama aparentemente me esperando.
– O que está fazendo aqui? – Perguntei seca
– O que está acontecendo com você?
Devolveu a pergunta me encarando com um olhar de acusação o que me irritou ainda mais.
– Você tem problemas ou o quê? – Já me exaltei. Minha paciência estava esgotada demais para medir palavras com Hanna. – Como tem coragem de me olhar dessa forma acusativa como se eu estivesse errada? – Comei caminhar pelo o quarto. – Hanna, eu cheguei e você sequer foi me cumprimentar porque estava ocupada demais com esse garoto que acabou de conhecer e quando finalmente se aproximou de onde eu estava foi para mais uma vez me humilhar na frente de todos. O que você esperava que eu fizesse?
– Marcela as coisas não são assim. Tudo bem, eu posso pegar um pouco pesado nas brincadeiras, mas você sabe que eu faço isso para que ninguém perceba... – Interrompi a garota
- PARA! Eu não aguento mais essas desculpas, não aguento mais essa situação, não aguento mais fingir e mentir. Eu simplesmente não aguento mais! – As lágrimas já escorriam pelos meus olhos sem que eu permitisse.
– O que está querendo dizer com isso?
Nesse momento vi que ela também segurava o choro, mas seus olhos estavam brilhando pelas lágrimas que estavam prestes a caírem.
– Estou querendo dizer que cansei! Você tem que decidir, ou estamos juntas e assumimos isso ou simplesmente não posso seguir assim.
A garota a minha frente me encarava espantada e parecia tão perdida quanto eu, mas eu não poderia voltar atrás do que falei, eu tinha que seguir adiante por mais doloroso que fosse o final daquela história.
– Ok, me dá um pouco de tempo. Não muito, mas até a noite de réveillon será o suficiente para tentar me preparar, você sabe que não é fácil para mim.
– Do que você tem medo, Hanna? Já parou para se perguntar se seu medo realmente é da reação da sua família ou você mesmo não se aceita? – Ela não respondeu minha pergunta. – Você tem o tempo que pediu, mas até lá somos apenas amigas, e, por favor, contenha-se nas suas respostas ofensivas, pois caso contrário receberá uma resposta à altura.
A garota apenas assentiu com a cabeça, tentou ase aproximar do meu rosto, mas não permiti. Ela me encarou alguns segundo, mas saiu do quarto em silencio deixando uma sensação de vazio no meu peito.
O restante do feriado estava passando normalmente, muitas brincadeiras e animação... Todos estavam se dando super bem naquele ambiente. Eu e a Hanna agíamos naturalmente sem nenhuma alfinetada e até conseguíamos conversar com naturalidade.
A noite do dia 31 de dezembro estava chegando ao fim e todos estávamos animados na praia fazendo a contagem regressiva para o inicio do novo ano. Logo vimos um show de faíscas brilhantes e coloridas tomarem conta daquele céu escuro e estrelado e nos abraçamos felicitando uns aos outros. Naquele momento éramos apenas um grupo de amigos felizes festejando um novo ciclo de vida.
Senti uma mão já tão conhecida por mim e nesse momento meus olhos cruzaram com aqueles olhos verdes da Hanna, ela sorriu me puxando para nos afastarmos de todos e eu apenas me deixei ser levada por ela sem ao menos questionar para onde iríamos.
Seguíamos em silêncio pela areia da praia por um caminho desconhecido, o barulho das pessoas estava ficando cada vez mais distantes, dando espaço apenas ao som das ondas. Depois de um tempo caminhando em silêncio de mãos dadas paramos em uma cabana que ficava de frente para o mar, olhei para ela sem entender nada e ela sorriu lindamente.
– Bonito não é?
– Muito, mas como conhece isso aqui?
– Bom, outro dia estava caminhando de tarde quando passei por aqui e pensei que era o lugar ideal para te trazer. Eu sabia que iria gostar!
– É realmente muito bonito. Obrigada por me trazer! – Sorri para ela que pareceu ainda mais feliz
– Vem, entra!
Fiz o que ela pediu e quando entrei pude observar que o local estava preparado com algumas velas e um jantar que parecia ter sido colocado ali não há tanto tempo. Fiquei bestificada e sem compreender nada.
– Digamos que eu tive uma ajudinha da nossa querida amiga Renata Albuquerque – Ela falou e olhei surpresa em sua direção. Ela apenas sorriu!
– Você... Você contou?
Ela concordou e um misto de felicidade com surpresa invadiu meu coração.
– Você pode não acreditar Marcela, mas mesmo com esse meu jeito sem jeito eu te amo e quero poder te mostrar isso todos os dias da minha vida.
Se existia significado para a palavra felicidade certamente era o que eu sentia naquele momento. Curtimos a noite ali naquela cabana só eu e ela. Jantamos, namoramos, conversamos e pela primeira vez em nossa relação conturbada fizemos amor ali mesmo em meio as almofadas que tinham sido improvisadas.
Ter Hanna tão entregue para mim daquela forma foi algo inexplicável, foi maravilhoso e acima de tudo foi mágico.
No dia seguinte olhei para o lado na esperança daquela noite não ter sido um sonho e para minha completa felicidade ela ainda estava ali nua ao meu lado me trazendo flashes da noite que tivemos.
Acordei Hanna com beijos e carinho, pois apesar de querer passar o resto da vida ali com ela eu sabia que precisávamos voltar para a casa onde estávamos hospedadas, nossos amigos já deviam está preocupados.
Depois de muita relutância da garota nós voltamos para casa conversando animadamente sobre a noite anterior, ela me disse que estava decidida e que iria contar para sua família assim que voltássemos para Fortaleza, concordamos que por enquanto apenas a Renata ficaria sabendo.
Ao chegarmos em casa, obviamente fomos metralhadas por muitas perguntas nos deixando sem saber o que responder, mas logo Renata tomou conta da situação dizendo que nós teríamos participado de uma festa e que avisamos a ela, mas que ela esqueceu de avisar aos outros.
Apesar de não querer me afastar de Hanna , subi para tomar um banho com uma felicidade que não se continha dentro de mim. Quando sai do banho acabei deitando e pegando no sono. Acordei e já era tarde naquele dia ensolarado do Nordeste, percebi que estava com fome então troquei de roupa e fui para cozinha. Notei que todos estavam na piscina, então comi meu sanduiche e em seguida fui para a área externa da casa e mais uma vez fui do céu ao inferno.
– Há confessa pirralha, você não dá uma chance para o Guto porque está apaixonada pela Marcela, todo mundo vê como seus olhos brilham quando ver ela.
Robson parecia implicar com a cunhada enquanto estavam todos dentro da piscina, eu não conseguia olhar nos olhos de Hanna porque ela estava de costas, porém somente sua voz foi o suficiente para me fez sentir a pior das dores.
– Claro que não Robson, eu não sei de onde vocês tiram um absurdo desses. Eu não gosto de mulher e mesmo que gostasse jamais ficaria com a Marcela ainda que fosse a última mulher da terra. Ela é irritante e muito sem sal, não faz o meu tipo! Na verdade eu só a aturo porque é amiga da Mica. Vem cá garoto...
Vejo Hanna puxando o tal Guto pelas mãos e deu um beijo no menino que até então ouvia tudo sem dizer nada.
A dor era cortante, mas tentei juntar o pouco de dignidade que me restava e lutei para não permitir que nenhuma lágrima caísse dos meus olhos, não ali, não na frente dela, ela não merecia ver nenhum sofrimento meu. Percebi que todos olhavam espantados para mim e eu apenas me aproximei mais de onde estavam e então vi a garota soltar o menino rapidamente e olhar para trás quase em desespero quando falei...
– Pessoal, apenas queria me despedir de vocês, estou voltando agora para Fortaleza e logo em seguida vou para Portugal, resolvi aceitar o convite para minha especialização.
Todos me olharam surpresos, espantados e confusos. Renata parecia mais atordoada do que todos e Hanna pareceu se desesperar.
Sem dizer mais nada dei um passo para trás e virei em direção à porta de entrada, pois eu temia que se ficasse ali por mais algum tempo a minha armadura iria cair e virar mil pedaços. Voltei para dentro da casa para arrumar minhas coisas quando escuto ela gritando por mim.
- Marcela espera... Nós precisamos conversa!
Seu desespero não me comovia nenhum pouco, muito pelo contrario, eu estava com tanto ódio que não me importei com nada e nem com ninguém, apenas me virei e perdi a cabeça.
- O QUE VOCÊ QUER COMIGO AINDA GAROTA? DEVERIA ESTÁ FELIZ PORQUE AGORA VOCÊ NÃO PRECISA ME ATURAR, ESTOU INDO PARA LONGE DE VOCÊ! ESQUECE A NOITE QUE TIVEMOS ONTEM, ESQUECE TODO O TEMPO QUE NAMORAMOS, ESQUECE QUE EU EXISTO! – O choro contido já não me permitiu controla-lo por mais tempo – Esquece tudo Hanna, porque eu vou fazer questão de te esquecer.
Aquela altura todos já estava a nossa volta e ouvindo cada palavra que falei, mas não me importei com nada, apenas queria sair dali e foi isso que fiz... A deixei chorando e segui para arrumar minhas coisas e ir embora daquele lugar para nunca mais voltar.
Dias atuais
Cinco anos haviam se passado desde que sai do Brasil, muita coisa mudou, eu mudei, mas agora aqui estou eu arrumando as malas para voltar ao local do qual tanto fugi.
Depois que eu sai do Brasil, retornei ao país poucas vezes e em todas elas fiz questão de não encontrar com Hanna. Minha especialização durou apenas dois anos, porém quando finalizei sempre arrumei um jeito de prolongar ainda mais minha estadia e retardar meu retorno definitivo ao Brasil, mas a pequena empresa de consultora e serviços ambientais que há anos atrás eu abri em sociedade com a Renata, hoje tornou-se referencia não apenas em Fortaleza, mas em cidades e Estados vizinhos. Agora eu não podia apenas continuar auxiliando a distância, Renata resolveu que era hora de passar o comando da empresa para mim já que ela pretendia se casar em poucos meses e precisava de tempo para organizar tudo, eu seria a nova presidente da MR serviços e consultorias ambientais.
Durante esses cinco anos sempre ajudei nos serviços e administração da empresa, mas com um tempo a Micaela e a Daniela assumiram os cargos de administração e marketing, e isso me deu mais liberdade para ficar longe atuando apenas como vice-presidente e precisando ir poucas vezes ao Brasil, não que eu fosse irresponsável, mas eu sabia que nossa empresa estava em boas mãos e eu não me sentia preparada para voltar.
No entanto, agora era diferente, Renata sempre foi muito paciente com o tempo que precisei para superar tudo aquilo do passado, mas agora era minha vez de dar um tempo para que ela pudesse organizar seu casamento. Eu estava mais madura e sabia que não poderia fugir para sempre e por mais que de fato eu não tivesse superado a minha história com Hanna, eu estava voltando e essa seria a hora de conviver próximo ao meu passado.