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791 Words
Tentei esquecer o café. Tentei colocar Jace Maddox em uma daquelas gavetas mentais onde a gente esconde tudo que é bonito demais, intenso demais, ou perigoso demais pra lidar de frente. Mas ele não cabia ali. No dia seguinte, ele não me mandou mensagem. Nem uma palavra, nem um emoji, nem uma provocação. E, por mais que eu odiasse admitir, isso mexeu comigo. Eu me peguei olhando o celular a cada meia hora como se estivesse esperando por algo que nem sabia se queria de verdade. Na aula, Cassie notou meu silêncio. — Ele sumiu? — ela perguntou, sem precisar dizer o nome. Assenti com um leve movimento de cabeça. — Talvez ele esteja jogando aquele joguinho de "finge que não liga pra ver se ela vem atrás". — Eu não corro atrás de ninguém — rebati. Mesmo sabendo que já estava correndo... por dentro. Cassie me olhou com carinho. — Só toma cuidado. Jace é mais fundo do que parece. E nem todo mundo sobrevive ao mergulho. Antes que eu pudesse perguntar o que ela queria dizer com aquilo, um bilhete foi colocado sobre minha mesa. Não uma mensagem no celular. Um bilhete. Escrito à mão. "Não confie em tudo o que você sente. E, principalmente, não confie nele." — alguém que já esteve no seu lugar Olhei em volta. Ninguém parecia prestar atenção. O papel era pequeno, sem assinatura. Um arrepio percorreu minha nuca. Quem teria mandado aquilo? E... sobre o que exatamente? Dobrei o papel com cuidado e guardei na mochila. Era fácil dizer que eu não ligava. Difícil era ignorar a pontada de dúvida que começava a se instalar no peito. Naquela noite, fui até o terraço do alojamento. Era onde eu costumava ir quando precisava pensar — ou fugir de pensar. O vento soprava forte, e a cidade lá embaixo parecia menor. Quase suportável. E então, como se o universo me testasse, ele apareceu. Jace. De novo. — Tá me seguindo? — perguntei, sem virar o rosto. — Na verdade, achei que você podia estar precisando de um pouco de silêncio. Ou de barulho com sentido. Ele se sentou ao meu lado. As luzes da cidade refletiam no rosto dele. Parecia cansado. Ou talvez... mais real. — Recebi um bilhete hoje — falei, encarando o horizonte. — Sobre mim? Assenti. — Dizia pra não confiar em você. Ele não reagiu por alguns segundos. Depois suspirou, longo, como se carregasse aquilo havia muito tempo. — E você? — Eu ainda estou decidindo. — Então deixa eu te ajudar. — A voz dele soou mais baixa, mais dura. — Não sou o cara certo pra você. Não sou o tipo que manda flores, nem que faz planos pra daqui cinco anos. Eu vim de lugar nenhum e carrego mais bagagem do que você pode imaginar. Virei o rosto, finalmente o encarando. — E por que me chamou pra sair? Por que aparece em todos os lugares, Jace? — Porque você me faz esquecer. Por um instante. De tudo. Aquilo me desmontou. Ele estava sendo honesto. Cruelmente honesto. E isso era pior do que qualquer mentira. — Eu não sou uma cura, Jace. — Eu sei. Mas por algum motivo... você alivia a dor. O silêncio caiu entre nós, pesado, íntimo. O tipo de silêncio que grita. — O que você está escondendo? — perguntei, quase sem querer. — Coisas que não cabem em uma conversa de terraço. — Ele sorriu, sem graça. — Mas talvez um dia eu te conte. Ele se aproximou, devagar, com cuidado. Como se não quisesse me assustar, mas também não quisesse mais se conter. Sua mão encostou na minha, quente apesar do vento frio. — Eu não vou te prometer nada, Ellie. Mas também não vou mentir: desde que você apareceu, as coisas não param de mudar aqui dentro. Toquei o rosto dele, como se algo me puxasse pra isso. A pele era quente, firme, real. E ele fechou os olhos ao sentir meu toque, como se guardasse aquele momento com a alma. — E se eu quiser descobrir quem você é de verdade? — sussurrei. — Então você é ainda mais corajosa do que eu pensava. Ele se inclinou. E por um segundo, tudo ficou suspenso — respiração, tempo, mundo. Mas não nos beijamos. Ele parou a poucos centímetros dos meus lábios, os olhos nos meus, e sussurrou: — Quando eu te beijar, vai ser de verdade. E nada vai ser igual depois. Então se levantou, caminhou até a porta e desapareceu. E eu fiquei ali, com o vento cortando o rosto, o coração disparado, e a certeza de que estava entrando em algo muito mais profundo do que esperava. Algo que nem mesmo um bilhete anônimo podia me impedir de sentir.
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