6

780 Words
Acordei com uma sensação estranha. Como se meu corpo tivesse dormido, mas minha mente tivesse passado a noite acordada. Cada vez que eu fechava os olhos, via o rosto dele. O quase-beijo. A respiração dele misturada com a minha. A frase que ficou martelando na minha cabeça: "Nada vai ser igual depois." E ele tinha razão. Não estava sendo. Tentei manter a rotina. Aulas. Biblioteca. Café. Mas tudo parecia carregado. Como se o ar estivesse mais denso desde que Jace entrou — ou invadiu — minha vida. O problema era que eu já não sabia se queria que ele saísse. Foi no final da tarde que tudo começou a mudar. Estava na fila do café dentro do campus quando ouvi duas garotas conversando atrás de mim. Uma delas falava rápido, com raiva. A outra só ouvia, balançando a cabeça. — Eu te disse. O Maddox é só fachada. Ele quebra tudo o que toca. Meu primo foi parar no hospital por causa dele. Meu coração travou. Tentei disfarçar, mas minhas mãos tremeram ao pegar o café. Me afastei, mas fiquei por perto, fingindo que procurava uma mesa. — Ele era diferente no começo, sabe? — continuou a garota. — Atencioso. Charmoso. Mas depois... meu primo descobriu que ele estava envolvido com umas paradas pesadas. Briga de rua, apostas, dívidas. Ele não é só rebelde. Ele é perigoso de verdade. Fiquei parada, os dedos apertando o copo de papel com tanta força que senti o calor atravessar a pele. Não sei quanto tempo fiquei ali. Mas a voz dela ficou ecoando na minha mente como um alarme. Voltei para o alojamento sem lembrar do caminho. Cada passo parecia mais pesado. Cada memória dele vinha com uma interrogação nova. Jace nunca me contou nada. Só sugeriu que carregava um passado complicado. Mas agora... era mais do que isso? Horas depois, decidi fazer algo que eu sabia que podia me arrepender. Pesquisei o nome dele no Google. Jace Maddox + Seattle As primeiras páginas não tinham nada. Só quando fui mais fundo, encontrei uma notícia antiga. Pequena. De dois anos atrás. "Adolescente envolvido em briga violenta em evento clandestino de lutas. Jace Maddox, de 17 anos, foi detido por agressão física após uma disputa ilegal na zona industrial de Tacoma. A polícia investiga possíveis ligações com apostas ilegais." Meu estômago virou. As peças começaram a se encaixar. O jeito como ele se defendia, a força nos gestos, os olhares carregados. Ele sabia como machucar. E já tinha feito isso antes. Fechei o notebook e fiquei sentada no escuro, olhando para o nada. Minha mente girava. Parte de mim gritava para me afastar. Outra parte só queria entender por quê. E então, como se o universo tivesse senso de humor, meu celular vibrou. Jace Maddox: "Ainda pensando em mim?" Meus dedos pairaram sobre a tela. Eu não sabia o que responder. Não sabia se queria responder. Mas respondi. Eu descobri. Sobre Tacoma. Ele visualizou. E por longos minutos, não respondeu. Finalmente, veio a mensagem: "Era uma questão de tempo." "Se quiser conversar... me encontra no estacionamento de trás. Daqui a meia hora." Peguei o casaco. E fui. Ele estava lá, encostado no carro preto que eu nunca tinha visto antes, com as mãos nos bolsos e o olhar preso no chão. Quando me viu, não sorriu. Só suspirou. — Então... você sabe. — Por que não me contou? — Porque contar é como reviver. E eu não queria que você me olhasse como tá me olhando agora. — E como eu tô olhando? — Como se eu fosse um risco. — E não é? Ele não respondeu. O silêncio gritou por ele. — Eu era outro naquela época — ele disse. — Me envolvi com pessoas erradas, em momentos errados. Meu pai tinha acabado de sair de casa, minha mãe surtou. Eu queria ter controle sobre alguma coisa. As lutas foram isso. Um lugar onde a dor fazia sentido. Onde eu era alguém. As palavras dele vieram carregadas de vergonha e saudade. — Eu bati em pessoas, Ellie. Por dinheiro. Por raiva. Por nada. E tem noites que eu ainda acordo com o gosto disso na garganta. A honestidade dele me desmontou. — E agora? — Agora eu tento não ser aquele cara. Mas ele ainda vive aqui dentro, às vezes. E você... você é a primeira coisa boa em muito tempo. Mas eu entendo se quiser correr. Me aproximei. — Eu não sei o que fazer com isso, Jace. Mas eu também não consigo me afastar. Ele ergueu os olhos, e havia ali algo cru, quebrado. Real. — Então fica. Mas fica sabendo que isso aqui... vai te mudar. — Já está mudando.
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD