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608 Words
— Você ainda toma café com açúcar? — minha mãe perguntou da cozinha, enquanto eu colocava as almofadas no sofá. — Desde sempre. E ainda acho errado quem põe adoçante — respondi, rindo. — Eu ponho adoçante, mocinha — gritou meu pai da sala ao lado. — E tá errado mesmo! — provoquei, ouvindo ele rir. A casa cheirava a bolo de fubá recém-saído do forno, aquele tipo de cheiro que parece abraçar a gente por dentro. Estar ali depois de tanto tempo me fazia sentir pequena de novo — segura, protegida, como se o mundo lá fora fosse apenas um pesadelo distante. Minha mãe apareceu com duas canecas fumegantes. — Aqui. Um café do jeito que você gosta e um pedacinho de bolo pra acompanhar. — Você tá tentando me mimar, é isso? — É claro — ela respondeu, sentando ao meu lado. — É o que mães fazem quando a filha some pra faculdade e só manda mensagem de "tô viva". — Exagerada — revirei os olhos, mas encostei a cabeça no ombro dela. Meu pai surgiu na porta com o jornal dobrado e os óculos na ponta do nariz. — E então? Como estão os estudos, os amigos, os... romances? Minha mãe deu um leve cutucão nele, mas eu ri. — Estão... movimentados. Vamos dizer assim. — Isso é bom ou r**m? — ele perguntou, puxando a poltrona. — Depende do dia. Às vezes sinto que tô bem. Em outros, parece que tô me afogando. Minha mãe acariciou meu cabelo devagar. — Mas você tá vivendo. Isso já é mais do que muita gente consegue. Suspirei. Queria congelar aquele momento. A voz da minha mãe, o sorriso do meu pai, o sofá velho, o bolo simples. Longe de Jace, de Theo, de Kayle, de Liv, de todos os olhares que pareciam pesar em mim o tempo inteiro. ⸻ Mais tarde, depois de jantarmos juntos — lasanha com salada e muita conversa sobre a vida — fui para o quarto. Meu quarto. Ainda do mesmo jeito: paredes claras, livros empilhados na prateleira, o abajur que meu pai me deu no meu aniversário de quinze anos. Deitei de lado, mexendo no celular enquanto ouvia o som abafado da televisão da sala. Paz. Fechei os olhos, pronta pra dormir. Mas não demorou nem uma hora para a paz acabar. Plim. A tela do celular acendeu. Uma notificação do i********:. Depois outra. E então... Mensagem de Kayle. Meu corpo gelou. "Ellie, me desculpa por mandar isso, mas preciso que você vá atrás do Jace." "Ele tá numa balada no centro, totalmente bêbado." "Ele saiu dizendo que ia atrás daquele cara que vendia d***a pro irmão dele. Disse que vai 'resolver tudo'." "Se alguém pode impedir ele... é você." Demorei pra reagir. Olhei a mensagem por minutos, o coração batendo tão alto que parecia ecoar no quarto inteiro. O nome do irmão de Jace era algo que ele nunca falava. Nunca. Tudo ao redor daquela história era como um terreno minado. Mas agora... ele estava indo atrás do passado que destruiu a própria família. E completamente bêbado. Fechei os olhos. — m***a. Me levantei, vestindo o primeiro casaco que encontrei. Peguei o celular, o carregador e um pouco de coragem. Na cozinha, minha mãe me encontrou colocando os tênis. — Vai sair agora? — Preciso resolver uma coisa. Ela me olhou com preocupação. — Vai voltar? Assenti, mas sem muita certeza. — Cuidado, filha. — Sempre. E saí. A noite estava fria. Mas o calor no peito era o que me fazia correr. Jace estava prestes a se perder. E, mesmo depois de tudo, eu não conseguia deixar isso acontecer.
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