DOUGLAS
Mano, a parada tá estranha. Tô aqui na madrugada, naquele silêncio pesado do morro, e vejo um vulto conhecido subindo a ladeira. Era a minha mãe. O que ela tá fazendo na rua essa hora? Fiquei na moita, curioso. Ela parou bem na frente da casa do Ben. Na hora, meu coração deu um alívio.
"A véia veio me ver", pensei.
Ela deve tá com saudade, preocupada se tô me cuidando direito, comendo direito, essas coisas de mãe.
Até aí, suave.
Mas aí, ela fez uma coisa que me pegou. Antes de chegar perto do portão, ela parou, abriu a bolsa e arrumou o vestido. Não foi um ajuste qualquer, não. Foi ajeitando o decote, passando a mão no tecido, daquele jeito que mulher faz quando quer se arrumar pra alguém.
Estranhei viado.
Se ela tava vindo me ver, pra que se arrumar? Eu sou o filho dela, p***a.
Ela entrou.
E eu fiquei esperando ela sair. Dez minutos, vinte... uma hora se passou e nada. Fiquei na esquina, fumando um, a cabeça começando a ferver. O que caralhos ela tá fazendo lá dentro tanto tempo? Conversando com o Ben sobre mim? Não faz sentido. O Ben não é de ficar de papo furado não, ainda mais de madrugada.
A desconfiança foi crescendo, um negócio frio na barriga. Decidi vazar dali antes que me vissem, era meu dia de ficar na contenção. No outro dia, fui direto encarar o Ben. Ele tava no QG, organizando umas paradas, com um ar mais de boa que o normal.
— Irmão — cheguei junto, na maior cara de p*u. — Cê tá diferente, tá ligado? Some alguns dias à noite, fica sorrindo à toa sem motivo... tá namorando, é? Finalmente perdeu esse cabaço com alguma gostosa?
Ele nem olhou direito pra mim, virou o rosto, fingindo que tava concentrado numa planilha de celular.
— Não é nada, cara. Virou meu fiscal agora? — a voz dele saiu meio embargada, e isso me deixou mais desconfiado ainda.
O Ben é direto, olho no olho.
Quando ele evita, é porque tem coisa.
— É só que tu tá estranho, mano. E falando em estranho, minha mãe tá me evitando, sei lá. Tá estranha pra c*****o. Esses dias, reparei que sumiram as fotos do pai da casa toda. Até da mesinha de cabeceira dela. Que p***a é essa?
Ele continuou evitando meu olhar, ficou quieto por um segundo.
— Sei lá, Douglas. Ela deve ter guardado, né? Depois do término...
— É, deve ser — cortei, mas não tava convencido. — Olha, se você souber de algo sobre ela, me fala, tá ligado? Confio mais em você que em qualquer um nessa p***a. Somos irmãos.
Ele finalmente me olhou, e eu juro que vi um bagulho estranho no olho dele.
Uma mistura de lealdade e culpa.
— Pode crer, brother. Suave.
Mas não tava suave não.
A parada tava me incomodando.
Ele nem falou que minha mãe colou em casa, parada ta estranha demais viado. Fui pra casa dormir e acordei no fim da tarde.
Resolvi dar um pulo lá em casa, de surpresa, pra jantar. Cheguei e ela tava... diferente. Toda arrumada com um vestido vermelho curto pra c*****o, nem sabia que minha mãe tinha uns panos assim tão sensual. Tava cheirosa, com aquele perfume bom, e fazendo uma comida daquelas que ela só faz no domingo: feijoada completa, farofa, a p***a toda.
Num dia de semana, a noite.
— Nossa, mãe, tá recebendo visita importante? — perguntei, tentando disfarçar a desconfiança.
— Não, filho, é que tava com saudade de cozinhar algo especial — ela disse, mas a voz tava meio afobada, os olhos não paravam em mim.
Aí, do nada, a campainha toca.
Ela foi abrir, e quem entra?
O Ben.
Com uma garrafa de vinho e uma de Ballena. Ele olhou pra mim, ficou surpreso.
— Opa, Douglas, sabia que você tava aqui. Passei na frente, vi você entrando, fui na adega e quando voltei vi o portão aberto e resolvi colar. Tô com uma fome do c****e, vim comer na sua mãe também.
O clima ficou gelado.
Eu cumprimentei ele, mas na minha cabeça o alarme tava tocando alto.
O Ben, o cara mais ocupado do morro, "passando na frente" e resolvendo "colar" pra jantar? E ainda trouxe vinho?
O Ben não bebe vinho.
Ele bebe cerveja ou whisky.
Ele nem tem ido na madrasta dele pra comer, do nada vem aqui na minha mãe?
E a minha mãe, em vez de estranhar, deu um sorriso e foi pegar mais um talher.
Durante o jantar, foi pior.
Eu via eles.
Trocando olhares rápidos, discretos.
Um sorriso que sumia assim que eu virava pra eles. A mão dele perto da dela na mesa, se afastando rápido quando eu olhava.
Eu não sou burro, mano.
Tava na minha cara.
Mas minha mente não queria acreditar.
Não pode ser.
Aí, pra piorar a situação toda, minha mãe solta:
— Filho, senta aqui. Tenho uma notícia. Seu pai vai ser solto. Em menos de um mês.
Aquela notícia foi um baque. Fiquei tão feliz que quase chorei ali mesmo. É tudo que eu sempre quis, minha família completa de novo.
— Sério, mãe? Meu Deus! — falei, a voz embargada. — Então é por isso que você tá tão animada! Tudo faz sentido agora! Meu pai vai voltar pra nós. Eu vou voltar pra casa amanhã mesmo, pode?
Ela ficou quieta, olhou pro Ben. E o Ben, do nada, bateu a mão na mesa, fazendo os pratos tremerem.
— Não quero o Matemático nesse morro — ele falou, a voz gelada, o olhar aquele de chefe que não discute.
O clima, que já tava estranho, ficou pesado como chumbo. Eu olhei pra ele, depois pra minha mãe.
A felicidade pela volta do meu pai deu lugar a uma confusão danada. Por que o Ben não quer meu pai aqui? E por que a minha mãe não falou nada, só ficou olhando pro prato, com a cara fechada?
Mano, a parada tá muito errada. E eu tenho medo do que vou descobrir.
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