Gisele sentia cócegas no baixo ventre, pois finalmente alcançaram a base de encontro. Uma estação espacial ligava a conexão que fariam com a outra espaçonave e isso a estava deixando nervosa, ansiosa e quase explodindo por dentro. Caminhando em filas, todas as mulheres trajavam seus trajes de cor metalizada, sentiam-se enjoadas, fracas e um tanto desestabilizadas.
Starian era, terrivelmente, uma novidade para todas. Sim, terrível, porque ninguém de bem com sua própria vida desistiria de sua casa, suas coisas e seus parentes para se aventurar num mundo diferente. Exceto alguns casos raros, como trabalho ou paixão pelo mundo oposto… Enfim, ao menos era isso o que Gisele pensava. De alguma forma, todas elas estavam fugindo de alguma triste realidade sem medo das consequências.
Correção, elas pensavam que não tinham medo das consequências. Quando se está num ato de desespero, você realmente não tem medo de nada, mas agora… As pernas de Gisele ficavam cada vez mais bambas, seu coração palpitava e o medo estava fumegando desesperadamente em suas veias. Ler sobre os alienígenas era uma coisa, mas estar próximo do desconhecido era totalmente diferente.
— Porque se candidatou? — Gisele ouviu o sussurro baixinho de uma humana na fila, caminhando devagar e acompanhando o abate das terráqueas para o desconhecido. — Não vem com aquele papo de que apoia a causa, ninguém aqui acredita nisso.
— Ninguém aqui realmente conta seus verdadeiros motivos. — Uma outra mulher sussurrou ao ouvir a pergunta da moça, calando o burburinho no qual o oficial não dava importância.
Os passos metálicos soavam como uma nota dramática, os olhos esverdeados da menina brilhavam de expectativa, nervosismo e muitos outros sentimentos que não podia explicar. Sua visão era formada por cabeças em fila, alguns soldados vigiando o processo e uma porta bipartida de forma geométrica, cinza e automatizada.
— Aqui, é exatamente o nosso ponto final. Inicial, para vocês. — Trent virou o corpo no calcanhar dos pés, olhou firme para a fila de mulheres e deu as últimas instruções. — Boa sorte.
— Os alienígenas estão do outro lado da porta? — Uma mulher perguntou, mas a porta abriu no exato segundo da pergunta, mostrando apenas alguns humanos dentro do compartimento metálico.
Havia várias cadeiras nos cantos metálicos da parede, um enorme visor de vidro, e vários instrumentos sorteados pela sala, muito semelhantes a um laboratório. Elas observaram o espaço, entraram seguidas de mais alguns soldados e ouviram a porta se fechar atrás de si.
— Senhoras. — Um homem de óculos visor, traje branco e botas pesadas lhes sorriu com gentileza e apontou a fila de cadeiras na qual elas poderiam se sentar. — Este é o último passo para que possam se conectar com Starian. — Um outro homem se aproximou, mostrou uma maleta acinzentada de centro veludo e com várias ampolas dentro do objeto.
— O que é isso? — perguntou uma das mulheres.
— É um dispositivo inteligente, feito pelos próprios starianos. — Ele pegou uma pistola de porte médio e acoplou uma ampola no dispositivo de saída, enquanto elas eram guiadas a se sentar e entender do que se tratava. — Os starianos entendem qualquer língua que esteja dentro da mesma órbita galáctica que Starian, no entanto, não provemos do mesmo sistema de inteligência. Então isso foi criado para que possamos entendê-los de forma clara.
Gisele ouviu a explicação ao mesmo tempo que sentiu a picada em seu pescoço. Um leve sabor amargo desceu por sua garganta, mas não sentiu nada além disso. Ela observou as outras colegas receberem o produto e por algum motivo, sentiu o coração saltar um pouco mais ansioso.
A humana respirou fundo, olhou para a porta metálica do lado oposto ao qual entraram e teve certeza de que estava pressentindo algo estranho.
— Acho que estou nervosa… — murmurou.
— Fique calma. — Kelly segurou a sua mão e roubou sua atenção. — Elaine me garantiu que Starian não é um lugar hostil. Vamos ficar bem lá.
No segundo seguinte, um tremor se fez presente, cambaleou a estrutura da sala e piscou o foco de energia. O oficial imediatamente olhou para os companheiros na sala e segurou o coldre que carregava nas pernas.
— Fechem as portas, protejam as mulheres!
Infelizmente não houve tempo de atender o comando, uma explosão aconteceu, o calor acumulado pelas ondas quentes abriu uma parte do centro espacial e abriu um buraco de grande significância ao lado da porta, na qual deveriam passar somente os Starianos.
Elas gritaram. Foi tudo o que elas conseguiram fazer diante da morte iminente e o seu fim à beira do caos e um buraco estelar na base.
Os capacetes de supressão foram automaticamente acionados, protegendo a vida e o oxigênio de todos, mas o ar passou a ser sugado com força o suficiente para fazer com que a força humana fosse colocada em dúvidas. As mulheres estavam presas em suas cadeiras, mas os outros estavam segurando em hastes, aço ou qualquer parte firme que não os levassem diretamente para as estrelas. O compartimento de aço tremia e estava abaixando a temperatura de um modo brusco e o oficial, no meio do caos, tentava encontrar uma saída.
— Vou atirar no receptor de entrada, a porta irá se abrir e vocês precisarão tentar passar! — gritou o tenente, na esperança de salvar algumas vidas. — Não penssem duas vezes! Tentem passar assim que a porta se abrir!
— E se formos sugadas? — gritou uma mulher.
— Vão morrer se ficarem aí de qualquer forma!
O fato é que ele não esperava a invasão alienígena que estava para acontecer, pois no exato minuto em que conseguiu sacar sua arma, o peso e os passos pesados de Starianos se jogando através do buraco foi assustador.
Amarelos, roxos, azuis e vermelhos e muitos prateados. Eles escalaram, agarrando-se no metal e dobrando-os como se fossem papéis, adentrando o compartimento com a própria força de seus músculos. Ele não usavam trajes espaciais, apenas uma máscara para proteger o que precisavam para respirar. Usavam roupas comuns para quem estava no espaço.
O alarme soava cada vez mais alto, a voz do comando central anunciava a falta de oxigênio e o tremor estava cada vez maior. Gisele arregalou os olhos quando viu aquele monte de alienígenas gigantes adentrar o local, e passou a berrar com força total. Ela realmente não sabia se estava com medo de morrer, ou com medo daquele monte de Stariano aglomerado, adentrando um buraco que deveria matar todo mundo, não fazer um monte de E.T.’s surgir no meio do caos!
— Senhor, Isso vai ceder a qualquer momento! — gritou um Eliddium prateado, apoiado por outros Starianos, olhando Darius em busca de uma ordem.
— Do outro lado da porta, estaremos seguros! — gritou o oficial, enquanto Darius, em meio a bagunça, tentava raciocinar.
— Tirem os humanos daqui! — gritou imediatamente, enquanto se colocava contra a lufada de vento forte e arrancava uma mesa de ferro acoplada no chão metalizado. Ele tacou o objeto contra o buraco sugador, que conteve boa parte do vento estabilizando momentaneamente a supressão no ambiente. — Não vai aguentar por muito tempo.
— Você viu aquilo? Ele tirou aquilo do chão como se não pesasse nada! — Uma mulher piscou boquiaberta, enquanto observava o Stariano dourado atravessar o compartimento, bater com força no botão de saída e ver a porta emperrar.
A porta metalizada se dobrou levemente, anunciando que seria sugada a qualquer momento, o compartimento balançou novamente e Darius ouviu mais uma vez.
— Senhor, não temos tempo!
Ele se colocou no meio da porta de ferro, enfiou os dedos entre as brechas emperradas, respirou fundo e enrijeceu os músculos abrindo a porta. Não foi necessário nenhum comando, os Stariano pegaram os humanos soltos e passaram a jogar um por um no corredor para dentro. Era um trabalho desesperador, e faziam como se os humanos não pesassem nada.
Dois Starianos começaram a soltar as mulheres presas, enquanto elas olhavam com medo e desespero, gritando no meio do caos.
Aos olhos de Gisele, aquilo se tornou uma tortura viva de como enxergar a morte lentamente. Uma outra explosão aconteceu. Seus ouvidos captavam o som de forma abafada, enquanto ela observava as faíscas saltarem por todo lado e um pedaço do centro espacial se desfazer em fogo, num céu n***o cheio de estrelas.
Ela observou as amigas sendo tiradas da cadeira, o gigante dourado segurando a passagem enquanto elas eram acolhidas do outro lado, e nem mesmo notou quem foi que a tirou da cadeira. Tudo parecia um filme de som não identificado e de câmera lenta ao seus olhos, mas estava vendo a luz do outro lado. Gisele conseguia ver sua passagem, e sentia que sairia daquela com vida, e quando chegava cada vez mais perto da passagem da porta, sentia as batidas do coração voltar ao normal.
Grande engano.
No momento em que fora atravessar, a mesa de metal que supria a ventania para fora foi engolida, seu corpo fora puxado dos ombros do Stariano e enquanto ele caia do lado de dentro ela caia para o lado de fora, tacada no meio da escuridão estelar, olhando a distância da luz do centro espacial lentamente. Uma vez que ela estava lá fora, ela apenas sentiu o frio, o vidro do capacete rachar e o corpo flutuar no meio das estrelas do espaço.
Gisele, que antes estava apavorada, simplesmente parou de sentir medo. Ela simplesmente aceitou as batidas lentas do seu coração, sentiu uma lágrima escorrer pelos seus olhos e levantou a mão, como se pudesse tocar em algo e entregar sua vida de vez. Mas o que mais a surpreendeu durante o seu processo de aceitar sua morte, foi ver um gigante dourado mergulhando a escuridão e saltando da base, em sua livre direção.
Ela não sentiu medo dessa vez, apenas o observou se aproximando cada vez mais de si.
Vestido com vestes negras, ele não usava trajes espaciais. Estava de coturnos, parecia machucado, tinha duas argolas prateadas em cada ponta da orelha e os cabelos bagunçados. Eles não passavam de sua orelha, mas o seu rosto era difícil de enxergar, uma vez que sua máscara era de um tom esverdeado e escondia parte dos seus traços.
Flutuando no espaço, o capacete de Gisele terminou de se rachar, e ali ela sentiu o peito doer com a falta de ar. E com gentileza, Darius tirou o capacete da humana, puxou todo o ar que podia no peito e tirou a própria máscara. Grande para a moça, mas boa o suficiente para dar a ela tempo de ser resgatada.
Com frio, Gisele não falou nada. Abriu a boca, puxou o ar no peito e viu Darius segurando sua respiração enquanto ele olhava para cima.
— Mas… e você? — Giselle sussurrou fraca, olhando as feições de um Stariano de perto, dando sua vida por alguém que a segundos atrás estava morrendo de medo da aproximação alienígena.
Darius notou o tremor da humana, a baixa temperatura ainda iria matá-la e fez a única coisa que podia fazer. A abraçou, sentindo o tremor do corpo pequeno se juntar ao seu, torcendo para que seu plano desse certo, e alguém ainda pudesse salvá-la. Ele soltou uma dose de ar, prendeu seus braços ao redor do corpo e fechou os olhos.
“Então é assim que um Stariano se sente perto de uma humana?”
Ele sabia que iria morrer, e assim que o frio congelasse seu corpo, ela ainda estaria presa em seus braços, flutuando na escuridão estelar. Mas ainda assim, com tempo o suficiente para ser resgatada… Assim ele esperava. Assim ele pedia. Antes que seu corpo inchasse, ainda dava tempo de salvar a humana. Aquela humana.
— Obrigada… — Ela sussurrou novamente.
E Gisele o abraçou, se encolheu em seu peito e lembrou dos motivos pelo qual a fez se voluntariar naquilo. Ela tinha medo do sobrenatural, tinha medo das coisas estranhas. Era normal que um humano não aceitasse as coisas diferentes… Mas ela só estava bêbada e fazendo uma aposta no meio de alguns amigos, que ela sabia que eles jamais morreriam por ela. Eles riram sobre seu medo, sobre Starian e o quanto ela não gostava de saber sobre a vida alienígena.
Era só um medo. Sua família não era do tipo segura, acreditava que coisas de fora não eram bem vindas. Superstições que impregnava em suas raízes. E só. Então Gisele não levava a vida Stariana a sério, agora… Não sentia ser merecedora da vida de nenhum deles. E mesmo assim, eles estavam lá. Ele estava lá.
Nenhum humano mergulhou o espaço por ela, mas aquele Stariano sim.