A Predestinada do Alfa

Capítulo 15 - Ecos do passado

O quarto de Mia estava mergulhado em um silêncio espesso e opressor, um cobertor pesado que abafava até o próprio ar, tornando cada respiração um esforço consciente. Cada objeto – a escrivaninha com seus livros de Alquimia Lunar, a poltrona junto à janela, a foto emoldurada na estante – parecia sussurrar a mesma pergunta, ecoando a ausência que preenchia aquele espaço. Dez meses. Dez meses desde que Bryan havia partido para a Inglaterra, cruzando o oceano com a mesma frieza que agora mantinha um silêncio absoluto. Nem uma mensagem, nem uma ligação perdida. Nada. Apenas o vácuo, crescendo a cada dia e corroendo as bordas do coração de Mia. Antes de Bryan partir, muita coisa já havia mudado entre eles. Desde o luau, grandes mudanças moldaram e amadureceram o relacionamento deles; o que antes parecia fechado e intransponível agora se tornara aberto, e cada gesto, cada silêncio, cada olhar parecia se multiplicar. A partida repentina dele deixou Mia completamente sem chão, perdida em um mundo que antes parecia seguro. Ela suspirou, amarga: tudo entre eles era assim — em um momento parecia que tudo ia dar certo, e no outro, Bryan tirava o chão debaixo dela com uma rasteira inesperada.

O som do pincel de maquiagem deslizando sobre a pele da irmã soava quase irrelevante diante daquela quietude sufocante.

— Você acha que ele vai gostar? — a voz de Zoey, carregada de nervosismo doce e palpável, cortou o ar. Ela mordia o lábio inferior, os olhos refletindo uma expectativa juvenil e pura que fez o peito de Mia apertar.

Mia forçou um sorriso, concentrando-se nas delicadas pinceladas de iluminador no rosto da irmã. — Com toda a certeza do mundo — disse, tentando imbuir suas palavras de confiança que não sentia. — Mas o que importa mesmo é você se sentir incrível, Zoey. É a sua noite.

— Mas você acha que vai dar certo? — Zoey insistiu, virando-se levemente na cadeira, ansiosa. — Será que eles vão me notar?

Zoey falava dos gêmeos de Gabriel Blackwolf. Os meninos a cercavam com devoção natural, como se cada gesto e sorriso dela fossem sagrados. Mesmo com bolhas na pele ou cabelo rebelde, eles a adorariam. Mia quase riu ao imaginar a cena.

— Vai dar certo, garota. Confia na sua irmã mais velha — Mia acalmou, em tom suave, escondendo a tempestade que fervilhava por dentro. Seus dedos ajeitaram uma mecha rebelde do cabelo de Zoey, mas sua mente estava a quilômetros dali, perdida nas lembranças que insistiam em não se calar.

O silêncio do quarto, traiçoeiro, permitiu que as memórias invadissem com a força de uma maré. De repente, ela não estava mais ali, mas na Ilha do Crepúsculo. O ar quente cheirava a sal e jasmim selvagem, o céu se pintava em tons de dourado e púrpura refletidos nas águas calmas. O calor do corpo de Bryan a envolvia como um escudo protetor durante seu Cio. Ele fora inteiro, completamente dela. Protetor, atento, um Alfa que parecia tê-la esculpido nas estrelas. A lembrança daquela devoção foi tão intensa que uma pontada de dor atravessou o estômago de Mia.

Zoey virou-se, séria, seu reflexo no espelho captando a nuvem de tristeza que pairava sobre Mia. — Tá pensativa, né? — observou, como se tivesse lido a mente da irmã mais velha.

— São só… lembranças — Mia admitiu, a voz rouca. — Coisas do passado que insistem em me atormentar.

Foi então que Mika, sua loba, despertou. Não com um uivo, mas com um estremecimento profundo que percorreu toda a espinha de Mia. Um impulso primitivo, urgente e inquestionável. COMPANHEIRO, ecoou na sua mente, uma afirmação visceral que não permitia questionamento. Era um chamado de sangue, um lembrete brutal de que o vínculo que a prendia a Bryan não era apenas memória — era corrente viva, pulsante e dolorosamente presente, mesmo após dez meses de abandono. Se Mika o chamava, significava que ele estava perto.

Mia respirou fundo, tentando afastar as memórias com esforço quase sobre-humano. — Tá pronta, Zoey? — disse, a voz deliberadamente mais leve, controlada. — Vai lá e arrasa, meu amor.

Zoey levantou-se, um raio de luz e esperança, e deu um beijo rápido na bochecha de Mia antes de sair, sua energia juvenil iluminando brevemente o quarto antes que a porta se fechasse.

E então, o silêncio retornou. Mas agora era diferente. Mais pesado, mais pessoal, mais opressivo. Um silêncio que sussurrava a ausência de Bryan nos cantos mais escuros do quarto. Mia deixou-se cair na cama, o corpo pesado como chumbo, mas a mente acelerada, relutante em descansar. Dez meses de perguntas sem respostas, de saudade transformada em ferida surda e constante, esmagavam-lhe o peito, tornando cada respiração um esforço consciente.

Ela fechou os olhos, tentando desligar-se do filme involuntário que passava em sua mente: os dedos de Bryan entrelaçados nos dela, o sabor dele, o som da respiração próxima ao seu ouvido na Ilha do Crepúsculo. Mas Mika recusava-se a se calar. O instinto da loba crescia, um uivo interno e incessante que era pura ânsia, uma exigência física e esmagadora para que ela respondesse ao chamado do Alfa.

E então, no auge da madrugada, quando o mundo parecia parado, o celular vibrou sobre a mesa de cabeceira.

O som estridente cortou a quietude como uma lâmina. Mia acordou de um salto, o coração disparado contra as costelas, antes mesmo de sua mente compreender. Com mãos trêmulas e frias, agarrou o aparelho. A luz azul da tela iluminou seu rosto na escuridão, revelando uma única sentença que incendiou seu mundo:

Bryan Blackwolf: Encontre-me no Resort Blackwater.

O ar parou nos pulmões. Ele estava ali. Na mesma cidade, depois de meses de um silêncio que doía mais que qualquer grito. Nenhum “oi”, nenhum “como você está?”. Apenas uma ordem. Seca. Direta.

E então, Mika RUGIU. Um som primal, ensurdecedor dentro da alma de Mia, afogando toda a razão, mágoa e dúvida. COMPANHEIRO. VAMOS.

O coração de Mia disparou, uma mistura tóxica e indomável de raiva, medo e desejo antigo e profundamente enraizado explodindo dentro dela. Dez meses não importavam. As lágrimas não importavam. O orgulho não importava.

A loba tinha decidido. Ela iria.