Aos Poucos

Teste de atuação

No dia seguinte eu me encaminho para o hospital como todas as manhãs passadas. Chegando lá, vejo a Poly mais abatida do que o normal.

Coloco um sorriso no rosto e vejo ela me olhar com cara de tédio.

— Que sorriso ridículo é esse? — Ela me pergunta.

— Tenho uma novidade que você não vai acreditar.

Conheço-a o bastante para saber que está curiosa só de olhar em seus olhos. Mas como está rabugenta, não dá o braço a torcer. Fico calada só esperando ela ceder. Ela bufa e se ajeita na cama.

— Ah conta logo! — Se exaspera, odiando suspense desde que nos conhecemos.

Quando tomei essa decisão, eu devo confessar que não gostei muito, não gostei nada para ser sincera, mas convencer a Poly será meu verdadeiro teste como atriz, se eu conseguir mentir para ela, sei que vou conseguir convencer qualquer pessoa. Comprimi meus lábios como uma adolescente apaixonada, tentando fingir que meu constrangimento era amoroso e não a vergonha de toda essa desonestidade entre nós.

— Eu estou namorando.

De alguma forma o rosto dela se ilumina e um sorriso surge em sua face. m*l posso terminar a frase antes de ser bombardeada por suas perguntas.

— Quem? Como? Quando?

Ri. Tentando me concentrar na escolha de palavras.

— Você não vai acreditar em quem é.

— Fala logo. — Ela fecha a cara de novo. Ok, nada de suspense.

Olho pelos lados e vejo que algumas pessoas prestaram atenção em nossa conversa, por isso eu me aproximei dela e sussurrei para que apenas ela me ouvisse. Não precisava desse tipo de atenção tão cedo.

— Rafael Nero.

Ela me empurrou e fez cara feia novamente, estava começando a se irritar.

— Deixa de brincadeira Lara, fala logo quem é.

— Eu estou falando sério Poly, Eu e o Rafael estamos namorando.

— Aham, então me diz como se conheceram.

Tomo fôlego e me preparo para o amargor de, primeira vez na vida, mentir para a minha amiga. Tomara que um dia ela me perdoe por isso. Que me compreenda. As palavras da história que eu decorei saíram em fluxo, depois de uma noite em claro lendo e relendo o pdf que Pietro enviou.

— Coisa louca amiga, eu saí daqui quando descobri sobre você completamente desolada, não conseguia trabalhar e o Pietro percebeu. Então ele me chamou para conhecer o Rafael. Você sabe, ele é o chefe dele. Por acaso ele estava na cidade. Daí nós fomos apresentados e, contra todas as expectativas, ele gostou de mim, e eu... _ Suspirei tentando ser convincente e não dramática. — Ele mexeu comigo Poly, de um jeito diferente. Então nós ficamos.

— Peraí, ficamos tipo... — Ela ofereceu-me um sorriso malicioso. — Ficaram mesmo?

Ela puxou a palavra “ficaram” numa entonação sugestiva o suficiente para eu entender a conação s****l. Contorci minha boca em um sorriso reprimido e fiz que sim com a cabeça.

— Não acredito! Que vaca sortuda você é.

Eu é que não acredito que estou fazendo isso, amiga. Minha cabeça zonza me lembra de sentar ao lado dela e encostar minha cabeça em seu ombro. Olhar e mentir estava ficando difícil.

— Pois é. Fomos a um hotel e dormimos juntos. No outro dia quando acordei, ele estava me olhando. Ele disse que nunca tinha sido tão bom para ele e... Combinamos de nos ver da próxima vez que ele viesse.

Ela está tão animada que nem parece a garota doente que vi quando cheguei. Engano a minha consciência alegando que pelo menos a minha mentira resultou em uma melhora para seu quadro atual.

— Ah Lara te juro que se estiver mentido...

Ah como odeio o fato de estarmos ligadas assim. Parece que ela consegue ler meus pensamentos. Tento controlá-los ao máximo.

— Não estou Poly, você vai descobrir muito em breve que não estou.

— Mas e como pularam disso ai para o namoro?

— Ele me ligou por Skype e disse que não conseguia pensar em outra coisa a não ser à noite passamos juntos. — Nesse momento meus olhos já estavam marejados, e eu não me preocupava com os que estavam ao meu redor, não sabem qual Rafael estou me referindo, e também vão acabar sabendo mais cedo ou mais tarde. — E então me pediu em namoro. Eu disse que estava passando por muita coisa e que talvez não fosse a melhor companhia para ele, mas ele disse queria passar por tudo ao meu lado e eu não resisti. Você acha que fiz m*l?

— De jeito nenhum, ai meu Deus!

Ela estava tão animada que não pude deixar de rir toda feliz, e realmente estava por vê-la assim, a voz da minha consciência foi abafada pelo som gostoso de seu riso.

— Agora diga-me uma coisa — Ela começa com aquele sorriso safado, já imagino o que vem por aí. — Ele faz gostoso?

Ri alto. — Você não faz ideia.

Estávamos rindo quando um doutor chegou para nos interromper.

— Sinto interrompê-las, mas o horário de visitas acabou.

Concordo com o médico que já é hora dela descansar, começo a temer que tenha agitado ela demais, porém nos despedimos com um sorriso e uma cor em seu rosto que há dias eu não via.e volto para a pensão.