De um quartinho à um apê de luxo

1707 Words
No caminho para o hotel recebo uma ligação do Pietro dizendo que já vem me buscar para irmos para o novo apartamento. Arrumo as coisas que estavam fora da mala o mais rápido possível e desço para acertar a diária na recepção. Assim que termino de ser atendida, o Pietro entra a minha procura. — Preparada para conhecer seu apartamento? — Ele me pergunta. — Meu apartamento, que loucura! Saio com Pietro e conto tudo que aconteceu no hospital, a maneira que me senti ao enganá-la daquela forma. Ele me escuta tudo calado, enquanto andamos pelo trânsito caótico da cidade, olhando para mim vez ou outra, apenas para que eu saiba que ele está me escutando. Quando termino de contar ele olha para mim, não com pena, mas com compreensão e dúvidas. — E porque contou para ela? — O que você acha que eu deveria fazer? Contar a verdade? — Claro que não. E ela notaria algo estranho se soubesse que você está namorando com o Rafael pelos noticiários. — Exatamente isso que pensei. E também... Estava me testando. Nunca consegui mentir para a Poly, sempre travava ou não conseguia fingir direito. Sei que se eu tive estômago suficiente para mentir para ela, conseguirei mentir para pessoas que não conheço. — É, era o melhor. — Ele para o carro e vira para mim. — Chegamos! Os meus chefes estão te esperando no apartamento para te darem as boas vindas, não estranha. Senti um certo medo disso. Eles não terão a chave do meu apartamento, não é? Vou me certificar com o Pietro que isso não aconteça. O edifício em que o apartamento fica é bem pertinho da faculdade mesmo, uma quadra mais ou menos. É muito bonito e aparentemente muito caro. Entro e sou apresentada para o porteiro como a "Dona do apartamento 922" e o mesmo me cumprimenta com um sorriso no rosto. Entramos no elevador e Pietro aperta para nono andar. Olho para ele imediatamente. — Por que tão alto? — Pergunto. — Porque era o que tinha disponível e você tem que ter uma boa posição. — Quero saber qual a explicação para tanto dinheiro, nem emprego eu tenho. — Vamos dar um jeito nisso, não se preocupe. — Pietro, Pietro. Não decidam nada por mim! — Não se preocupe Lara. Mas eu estou achando que eu devo me preocupar sim. Estou começando a achar que eu entrei em uma bela de uma enrascada. Chegamos ao apartamento de porta branca e com uma plaquinha dourada escrito 922. Pietro toca a campainha e esperamos até que um dos senhores de ontem o abra. Assim que entramos sinto meus olhos se deslumbram com a bela sala de estar que encontro. Ela é bem ampla e lindamente decorada. Uma estante branca, cheio de espelhos e enfeites de ótimo gosto, ostenta um painel com uma televisão enorme. Há um tapete branco entre a estante e um sofá lindo de uns quatro lugares. Um arranjo está localizado no canto e as flores que nele contém são tão belíssimas que parecem naturais. No outro canto da sala, há uma mesa de vidro e inox linda, com cadeiras que mais parecem poltronas. Adorei tudo, inclusive o lustre que chega a ser ainda mais bonito que o da sala de jantar de Dona Lorena. — Meu Deus, tudo é muito lindo! — Exclamo. — Mas muito mais do que eu acho que deveria. Não posso optar por algo mais simples? — Pergunto sentindo-me desconfortável em um ambiente como aquele. Estou acostumada a entrar em lugares assim para limpá-los, não para morar. — De forma alguma Senhorita, irá receber aqui, amigos influentes de Rafael e precisa ter um ambiente apresentável para recebê-los. Acredite, isso foi o mais simples que consegui. Se ele diz eu acredito. Meio desconfortável, sigo olhando para a sala e vejo uma mulher que não tinha visto ainda. Ela é bonita e bem vestida, os cabelos castanhos tingidos e ondulados passa um pouco do meio das suas costas, ela me olha com certa avaliação e eu não me contenho de curiosidade. — Eu ainda não a conhecia, você é... — Paola Lira. Serei sua companheira na reforma do seu guarda-roupas. Eles não podem ter contratado alguém para isso. Olho para a minha roupa e não vejo nada demais na minha calça jeans preferida e uma camisa polo preta. — Qual o problema com as minhas roupas? — Problema nenhum senhorita Pinheiro, apenas é simples demais para a namorada de Rafael Nero. — Pode me chamar apenas de Lara. E achei que quanto menos pessoas soubessem melhor. — Paola é minha filha e mais confiável para a função, fora que escolheu fazer moda, contra minha vontade, mas fez, portanto acho que ela pode lhe ajudar. Achei o comentário desnecessário, mas a garota não pareceu se importar. — Vocês assustam a garota, que clima. Por que não vão fazer as coisas chatas que vocês sempre fazem e deixem a garota curtir o apartamento dela? Pode deixar que a levarei hoje mesmo para repaginar. Atendendo a ordem da garota, isso nem de longe foi uma sugestão, eles saem do apartamento, inclusive Pietro que me balbucia um "boa sorte" antes de sair. Assim que eles batem a porta, Paola cai sentada no sofá. — Você não tem cara de ambiciosa, deve ter um bom motivo para ter aceitado essa loucura. Sempre desconfiei do Rafael, ninguém é tão perfeitinho. Fora que homens educados geralmente são gays, vai por mim, conheço muito de homens para saber disso, portanto, desconfie desse seu amiguinho viu. Louca, é isso que ela é. Não precisei de muito tempo para perceber, mas quer saber, acho que gosto dela. Sento-me ao seu lado. — É, realmente tenho, e se não fosse um motivo bom o bastante, jamais teria aceitado tal loucura. E sobre o Pietro, ele é hetero, pelo menos até onde eu sei. — Até onde eu sabia o Rafael também era. — Ela se levanta e eu tenho que rir. Será que o Pietro é bi? Não... — Agora vem conhecer o seu apartamento, eu gostei, é bem aconchegante e acredite neles quando dizem que foi o mais simples que conseguiram. A sigo e entramos numa cozinha muito arrumada, estilo americana. Entrando por um corredor ela me guiou até onde seria meu quarto e não acreditei no quão grande ele era. Uma cama king size enorme com uma belíssima cabeceira estava no centro e em frente a ela uma TV igual a da sala. Paola me guiou por uma porta anexa ao quarto que dava para um banheiro de abrir a boca. Uma banheira! Nossa, eu nunca tomei banho de banheira antes. Ouço o riso de Paola e viro-me para ela. — Oh céus, você e Rafael poderia fazer tantas coisas nessa banheira. — Não resisto e coro com o pensamento. Dá para acreditar? Poly riria dessa situação. — Eu não me conformo, não consigo me conformar que um homem tão lindo... Ah são sempre os melhores partidos. Ainda me perguntam por que estou solteira! Os bons partidos ou estão comprometidos ou são gays! Ri e sou obrigada a concordar, pensando na fila de homens merdas que já conheci disponíveis para nós. — Você tem sorte, que mesmo ele sendo gay, vai poder tirar uma casquinha... Reviro os olhos e evito muitos comentários enquanto ela me mostra o restante do apartamento, que descubro ter ainda mais dois banheiros, dois quartos, uma área de serviço e uma varanda com uma vista impressionante. Chegamos a sala de estar e ela me manda pegar a bolsa para sairmos para repaginar. Uma nova, de uma marca que eu nunca ouvi falar. Ela mesma foi tirando os meus pertences da minha antiga para a nova, depois a jogou no lixo com uma careta de desaprovação. Tenho a leve impressão de que ela nunca tinha tocado numa bolsa de qualidade tão duvidosa. Primeiro fomos a várias lojas de roupas e ela me deu várias dicas de como me vestir de forma simples e, simultaneamente, elegante; como preservar o meu estilo com roupas mais sofisticadas e de grifes conhecidas. Depois de um longo dia, fomos ao salão, precisava cuidar dos meus cabelos também, pelo visto. Até que nessa parte eu concordei, não me lembro da última vez que entrei num salão de beleza. Meus cabelos negros foram muito bem tratados, antes batiam na altura do meu bumbum e agora passam um pouco do meio das costas, um pouco maior que o da Paola. Quase um palmo de corte e quase infarto meu. Ele também havia ganhado um Ombre hair bem de leve, apenas alguns fios dourados para iluminar o cabelo e posso dizer que foram bem felizes na escolha por que ficou irreconhecível, não apenas pela cor e o corte, mas pela hidratação profunda, dando aos meus cabelos um brilho que nunca existiu. Nunca imaginei que um cabelo poderia chegar a uma textura como essa. — Adorei! — Paola grita ao ver o resultado. — Agora onde está a maquiadora? Vamos fechar esse visual lindo! Nem tentei contestar, apenas nas horas em que já a conheço percebi que é perda de tempo. Ela sempre acaba me convencendo com um argumento ou outro e quer saber? Queria sentir-me linda hoje e iria fazer isso. Fechei os meus olhos e entreguei a minha pele aquela mulher. O resultado não poderia ser outro, surpreendi-me outra vez com a mulher que me encarava no reflexo do espelho, parecia poderosa, pronta para encarar qualquer problema. Talvez essa coragem, essa força exterior, possa encorajar a interior que está bem mais fragilizada. Os meus olhos que no momento adquiriram um castanho mel, - e sim os meus olhos têm vida própria, assumem a cor que quiserem e quando quiserem, mais parecem camaleões - foram reforçados com delineador e sombra cobre com um leve esfumado preto. A minha boca parece maior e mais sedutora, com uma cor de vermelho intensa. Parecia outra pessoa e poderia me acostumar a vê-la. — Impressionante. — Murmuro e vejo o sorriso enorme de Paola atrás de mim. — Impressionante é uma boa palavra. ____________________________________________ Eu sou uma página em branco Escrevendo a minha história As consequências dos meus rabiscos Definirão a minha trajetória. – Rabiscos (Rafael Nero)
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