Entrei na minha sala e caminhei direto para a minha mesa, onde eu me sentei e esperei meu pai entrar com mais uma reclamação do senhor Guerra sobre a filha que já não estava no meu arranjo e nem queria. A história havia se complicado demais.
Passou meses e ele ainda insistia que aquilo não iria ficar assim, que eu engravidei a filha dele e agora estava saindo fora, que o divórcio foi a facada no coração dele e blá, blá!
Chegava a ser cômico e engraçado demais. Preferi não citar o ato em si que levou a isso, apenas que era melhor para os dois ela ficar na dela e eu na minha, no caso o divórcio de ambos. Mas o pai dela não devia ser bobo e nem nada, já devia desconfiar ou constatar que era algo sobre a criança que ela esperava.
Ao longo desses meses, eu passei a não querer ouvir sobra nada dela, mas, como percebem, meu pai insiste, não por ele, mas por mamãe. Que parecia estar sofrendo uma dor terrível por não poder acompanhar a chegada do primeiro neto, isso pelas palavras dela.
- Quando vai poder falar da garota, Charlles?
- Nunca, isso é passado. Acabou pra mim.
- Sua mãe...
- Por que ela não vai falar com meu querido irmão, aquele filho é dele. Assim ela consegue ser a avó do ano.
- Pare de ser assim, você sabe que não é, as coisas...
- Já está apoiando a coisa toda da armação? Que lindo. Eu não acredito nessa teoria, aconteceu, pronto, eu não quero passar por isso.
- Sua mãe está sofrendo em não poder saber dela e quando a criança nascer, já está próximo, precisa fazer um teste se tem dúvida. O que vai fazer se o filho for seu? Se você estiver errado? Não dá pra voltar atrás depois que esse teste sai.
- Papai - Fiz uma pausa, tentando não soar tão ofensivo ou algo do tipo. - Você está duvidando da minha palavra ou do outro filho?
- Essa criança pode ser nossa, seu irmão não parece ligar, você muito menos. Se essa menina se envolveu ou não, isso não me importa, mesmo acreditando que tudo isso é uma mentira do seu irmão, o que me importa agora é saber se a criança tem meu sangue ou não. Se é um Pacini.
- Pode até ser neto de vocês, mas eu não sou o pai - Me levantei. - Eu não ligo pra ela e para criança, ela parece estar se virando bem também, sorte e sucesso pra ela - Ironizo, lembrando dela, com um gosto amargo na boca e no peito.
- Ela está morando em um galpão, pelo amor de Deus, Charlles! O que ela vai poder dar pro filho em um galpão? Ela não quer saber do pai e nem de ninguém.
- Ela não está morrendo e não vejo nada de r**m nisso, não foi lá que foi concedido? Então. Deve gostar muito do lugar. Além disso ela conseguiu ser livre, livre de todos que ficavam no pé dela.
- Não sei se fico mais assustado com seu irmão ou você, não sei onde essa história vai parar. De verdade.
Meu pai ergue a mão e coça a barba, suspirando fundo.
- Não posso fazer nada pela mamãe.
- Conversar ou atender o telefone já ajudaria. Ela quer esse neto, mas ela pelo visto vai observar de longe isso e também o resto da relação sua e do seu irmão se acabar, não sei como chegaram a esse ponto nessa rixa de vocês.
- Ele começou.
- Não se trata de quem começou, se trata de quem está envolvido e o que está em jogo.
- Pra mim nada, o senhor quer falar de um filho que não é meu?
- Você manchou a honra daquela menina se separando e deixando ela grávida tão rápido, independente do arranjo ou do que tenha ocorrido. Sujou seu nome e da nossa família.
- Eu não sou o errado da história.
- Garanto que é sim o errado, não foi você que aprovou o arranjo? Mas claro, era a garota que parecia outra.
- Eu tenho mais coisas pra fazer.
- Quer saber Charlles, eu não vou mais perturbar você, nem muito menos o seu irmão pra tentar tirar essa história a limpo, saber quem mentiu ou não. Eu não vou ver sua mãe triste por algo. Esperei desde o começo uma posição, mas que decepção foi, não é mesmo? Farei por sua mãe e por mim, vocês dois já estão grandes para saber sobre o certo e o errado. Mas não quer que você diga que não avisei e nem o seu irmão.
Antes que eu responda, ele sai.
Não sei o que ele pode fazer nessa situação toda, um receio me toma de mamãe se magoar e até ele, mas eu não podia fazer algo agora e nem queria também.
Fico parado no meio da sala, observando o vazio do lugar.
Tem sido assim em casa agora também.
Vazio.
Na maioria do tempo que passo lá e silencioso, quieto e não tem a chance de eu chegar em casa e ter alguém dançando na minha sala, se tornou impossível isso. Nem conversando ou fazendo nada. Apenas eu, como antes.
Ela havia pego as coisas dela, meses atrás, junto com uma amiga, foi tão fria que nem ao menos olhou na minha cara ou falou nada, nem tentou se justificar ou falar que aquilo era uma mentira. Embora não soubesse se queria ou não isso.
Apenas isso já me fazia sentir raiva, uma raiva bosal e sinistra da situação toda, não só dela, mas de mim, por tentar fazer um arranjo de m***a com uma estranha.
Me aproximei da mesa e me sentei, pegando o celular e olhando a única foto dela que ainda restava.
Ana Luiza podia ser linda demais.
Devia admitir que não havia um dia que eu não pensava nela, não de uma forma bonita como boas lembranças.
As vezes tinha vontade de quebrar meu irmão ou até mesmo eu, por ser e******o e ingênuo.
Talvez isso fosse sina, me aproximar de uma mulher e ser traído.
Devia saber que relacionamento não era uma boa ideia para mim.
Eu não queria também pensar na minha mãe, sabia o quanto ela poderia gostar de um neto ou até meu pai.
Mas eu não poderia fazer nada.
Era sobre ela e não eu.
Se ela quisesse afastar os dois eu não faria e nem poderia fazer nada.
Fechei os olhos e Íris veio na minha cabeça, quase a mesma história, mudando tão pouca coisa.
Íris havia me traído, em uma das nossas brigas ruins, ela se envolveu com um amigo de trabalho na semana que nos afastamos, não sei se foi raiva ou não, ela era uma publicitária incrível e brilhante, foi em uma dessas campanhas que nos conhecemos e nos gostamos. Nosso relacionamento era bom, suave, mas brigávamos, eu sempre tive ciúme e até mesmo era r**m pra relacionamento, mas eu era dela, queria ter ela cada vez mais perto, eu era o apressado da relação. Eu lembro da briga, eu estava insistindo pra ela ir morar comigo e ela falou pra eu parar de insistir, eu perdi a linha da forma que ela falou e pareceu não gostar da minha insistência. Mas eu completamente apaixonado e doido nela.
Pensando bem, talvez aquilo já era um sinal que ela não queria dar um passo diferente.
Ela saiu sem falar comigo e disse que não, não queria ir pra lá, mesmo tendo de tudo e ficando mais perto de mim. Nosso relacionamento já tinha uma duração de três anos nessa briga.
Ficamos três dias sem nos falar naquela semana.
No terceiro dia meu irmão apareceu, como uma praga, falando o que havia acontecido, com a astúcia do dia que ele falou sobre Ana Luiza também.
Eu perdi o chão e a razão, ela confessou naquela tarde o que havia acontecido e pedido perdão. Me fazendo perdoar ela pelo deslize e vendo ela mudar de postura, até que três meses depois eu vi que ela aceitou ir pro meu apartamento pelo meu perdão e não pela gente.
A briga daquela noite deixou claro que ela não queria estar ali, chovia tanto aquela noite, era inverno.
Dói tanto lembrar disso.
Uma culpa e um remorso por ter brigado e não conversado. Aquela noite não foi eu e ela contra o problema, foi eu contra ela e ela contra mim.
Por amor aceitei ela de volta, mesmo não sendo mais a mesma coisa.
Então, no auge daquela bagunça toda ela chorava e eu estava a ponto de estourar.
Eu sabia como era a sensação agonizante de pensar que algo r**m saiu do relacionamento.
Eu a mandei embora, joguei a traição e a forma que ela não adiantava nosso relacionamento, culpei ela por tudo e a chamei de r**m, que ela não tinha coração e não merecia meu amor, que eu daria um mundo inteiro pra ela, mas ela não queria nada daquilo.
Mandei ela embora.
Ela riu de forma irônica, limpou o rosto e sorriu, parecia irônica e brava.
Ela disse apenas dias coisas: Com prazer!
Íris sempre foi afrontosa e não abaixava, só que eu nunca havia falado ou a tratado daquela forma.
Acontece que depois de uma traição até as brigas mudam, a forma que você vê a pessoa ou todo o resto.
Eu poderia ter resolvido de outra forma.
Mas não fiz isso, fiz foi mandá-la embora.
Quando ela saiu eu fui atrás dela e tentei fazer ela mudar de ideia, voltar e esperar as coisas se acalmar, mas, como eu disse, ela não abaixava. Pegou as coisas dela e entrou no carro, eu pensei na chuva e pensei em tudo aquilo.
Mas ela foi adiante, algumas horas depois chegou a notícia que me abalou por dois anos inteiros.
Alguns dizem que ela não sentiu nada, que foi instantâneo. Mesmo assim dói pensar nela, dói pensar que eu vi ela no hospital antes de levar ela, foi pensar na forma que ela ficou.
Não dava pra mudar o que aconteceu.
Me senti um lixo, senti um vazio e um enorme buraco.
Até em uma noite ver o rosto de Ana Luiza, parecia tanto, mas tanto, que quando foi atrás descobri a história da garota e uma forma de chegar perto.
Foi ai que eu fiz um arranjo.
Guiado pela aparecia e vontade de ter isso por perto.
Até que tudo ficou r**m e descobri que eu era um burro, que aquele arranjo foi uma furada com ela pelo meu motivo e ainda pior pela atitude dela.
Agora estávamos separados, ela grávida e eu pensando todos os malditos dias nela, em como as coisas foram diferente quando ela estava perto.