Capítulo 5

1860 Words
Estava no refeitório, com minha bandeja na mão, procurando uma mesa quando alguém esbarrou em mim. A bandeja quase virou em cima da minha blusa. - Opa! – era o garoto loiro que andava com Dorian. Ele me segurou pelos braços para eu não perder o equilíbrio – Calma, gatinha. Cuidado para não manchar a blusa – ele piscou – Ela fica bem em você. Antes que eu processasse o que ele havia dito, ele se virou e saiu em direção a uma mesa cheia de garotas. Revirei os olhos e saí andando. Sentei na mesa do refeitório lotado e fiquei esperando por Sophie. Ela chegou algum tempo depois e se jogou na cadeira à minha frente, parecendo cansada. - Você não gosta de socializar, não? – ela disse, olhando ao redor para as mesas cheias de pessoas. - Na verdade, não – eu disse. - Vamos mudar isso – ela se curvou para a frente – Você tem que ter amigos. - Você já é o suficiente – eu disse. - Não mesmo, garota – ela balançou a cabeça – Hoje na hora do almoço vou te apresentar alguns amigos meus. Quem sabe você não se interessa por alguns dos garotos – ela levantou uma sobrancelha e deu um sorriso malicioso. Apenas sorri e balancei a cabeça. Resolvi que não iria falar que só havia me envolvido com um garoto uma vez na minha vida, no primeiro ano do Ensino Médio. - Ah, você não vai acreditar... – ela disse – Eu tive que voltar ao meu quarto no primeiro horário para pegar o livro que eu havia esquecido lá, e quando eu estava voltando para cá, eu vi você não sabe quem entrando na floresta. Olhei para os olhos ansiosos dela e depois dei uma olhada em volta do refeitório, vendo apenas o garoto loiro por ali, com mais garotas, mas nada dos outros dois. Dorian não tinha dado as caras na sala de aula novamente desde que o professor havia mandado ele sair e, embora eu já esperasse que ele não fosse para a sala da diretora, eu estava um pouco surpresa ao descobrir que ele havia entrado na floresta depois de tudo que tinha acontecido. Não achei que ele fosse tão insano assim. - Dorian – eu disse. - Quem? – ela enrugou a testa. - O garoto alto de olhos pretos que te dá medo – expliquei – O nome dele é Dorian. - Dorian? – ela curvou uma sobrancelha em descrença – Esse nome não é brasileiro. - É inglês. - Espera... – ela me encarou – Como você sabe disso tudo? - Porque ele está na mesma turma que eu. Ela fez uma careta. - Fala sério... Que azar o seu. Eu não queria ter que sentar ao lado daquele cara durante cinco horas, cinco vezes por semana. - É, nem eu... – terminei meu hambúrguer – Ele me causa calafrios. - Não é só em você, benzinho – ela roubou um pouco da minha batata frita – Falando nisso, o outro amiguinho dele estuda na minha sala. O loirinho que usa o medalhão sexy no pescoço. O nome dele é Alex. Olhei para Alex. Ele ria e brincava com algumas meninas sentadas duas mesas à minha frente, sendo o oposto de Dorian. Isso me fez perguntar o que os mantinha unidos. Será que eram irmãos mesmo? - O outro com cara de executivo careta é do terceiro ano também – Sophie dizia, ainda comendo minhas batatas – Só que acho que não é da mesma sala que você, né? – ela me olhou. - Não – respondi. O sinal anunciando o término do intervalo percorreu o refeitório e todos se levantaram para voltar às suas salas. Peguei o papel com meu horário enquanto saía ao lado de Sophie. - Meu próximo horário é biologia – eu disse – Ouvi umas meninas comentando que o professor dá aula no laboratório. - Sim, o de química também – ela respondeu. - E onde fica o laboratório? – perguntei. Tinha certeza que ela havia me mostrado onde ficava no nosso tour naquele primeiro dia, mas não me lembrava como chegar lá. - Ah, então agora você precisa de mim? – ela sorriu e puxou meu braço – Vem, eu te levo até lá. Ela me puxou por um corredor estreito que eu sabia que levava até os banheiros, depois virou à direita e, mais a frente, à esquerda. Avistei algumas garotas que reconheci serem da minha turma entrando em uma sala com portas duplas de vidro fosco. - Bem ali – Sophie apontou para a sala. - Obrigada – eu disse e me dirigi até lá. A sala era toda branca, e suas paredes eram revertidas de armários. Em um canto, havia duas pias para que os alunos lavassem as mãos e, ao meu lado direito, um quadro branco com a mesa do professor em frente. De frente para o quadro, havia várias bancadas altas de mármore que serviam para duas pessoas. Cada uma tinha recipientes pequenos em cima. Me dirigi até o fim da sala e me sentei sozinha em uma das bancadas. Fiquei observando o que havia dentro dos recipientes enquanto os outros alunos chegavam. Não era nada demais, apenas letras impressas coladas na tampa de cada recipiente. Em um deles havia escrito O-. No relatório havia instruções para você simular a mistura de sangues de um indivíduo com sangue O- e A+, ou A- e O+. Então aquele sentimento estranho me invadiu de novo, chamando minha atenção para a porta da sala, como se me puxando naquela direção. Eu não precisava olhar para saber que Dorian havia acabado de entrar, mas olhei do mesmo jeito. Era difícil resistir a isso.  O garoto de olhos pretos entrou com a mesma cara fechada de sempre, mas acabou deixando um pequeno sorriso escapar quando as pessoas perto da porta se afastaram dele. Ele estava se consumindo em prazer sombrio com aquilo, deixando visível que ele gostava do que causava nas pessoas.  Ele gostava de intimidar. O garoto sentou em uma das bancadas a frente, e todos que estavam sentados por perto pegaram suas coisas e saíram de fininho, se mantendo afastados o máximo possível. Revirei os olhos. Será que eles não enxergavam que o jogo dele era fazer exatamente isso: brincar com eles? O professor entrou na sala e jogou suas coisas em cima de sua mesa. - Bom dia, pessoal! – ele se dirigiu a nós – Primeiramente, sejam bem-vindos de volta. E agora vamos ao trabalho, já passaram tempo demais descansando. Ouvi alguns murmúrios brincalhões vindo de alguns alunos, mesmo que ainda estivessem com a postura tensa. - Vamos lá, pessoal! – o professor continuou – Eu quero que formem duplas agora mesmo para fazer a atividade em cima das bancadas – ninguém se mexeu por um segundo – Vamos! – ele gritou e todo mundo começou a se movimentar, indo atrás de um parceiro. Quando o tumulto acabou e todos se sentaram, eu pude ver que só havia duas pessoas ali sem dupla: eu e Dorian. Que ótimo! Engoli em seco quando o professor olhou para mim. - Acho que ficou faltando vocês dois. Dorian virou o rosto na minha direção lentamente, o olhar penetrante me medindo como se ele pudesse enxergar minha alma. Meu primeiro impulso foi engolir em seco novamente e me esconder daqueles olhos, mas eu não fiz isso. Eu podia ver em seus olhos que isso era exatamente o que ele esperava. Peguei meus cadernos em cima da mesa e levantei de cabeça erguida, como se aqueles olhos em cima de mim não me causassem nenhum efeito. Em vez de desviar o olhar, encarei ele enquanto me dirigia até sua mesa. Sentei nela normalmente, como sentaria com qualquer outra pessoa, e coloquei meus cadernos em cima da mesa com um baque pesado, como se eu o desafiasse a tentar mexer comigo. Não sabia de onde vinha toda essa coragem diante daqueles olhos frios que ameaçavam me engolir viva, mas eu sabia que não o deixaria me intimidar. O que ele poderia fazer contra mim, afinal?  - Ótimo – o professor sorriu – Agora mãos à obra. Olhei para Dorian ao meu lado. Ele ainda me encarava sombriamente. De repente, toda aquela coragem havia desaparecido e eu não sabia o que fazer, mas não deixei isso transparecer em meu rosto.  - Ágata – eu estendi a mão para ele com o sorriso mais forçado que eu conseguia dar – Prazer. Ele olhou para minha mão durante um longo tempo e depois voltou a me encarar. Havia um misto de surpresa e curiosidade nos olhos dele. Parecia intrigado com o meu comportamento. O sorriso no meu rosto se tornou verdadeiro quando senti uma pontinha de orgulho no peito ao reconhecer que eu o tinha pegado de surpresa. Mas então ele se desmanchou quando ele fez algo que eu não esperava. Ele segurou a minha mão com uma delicadeza que eu não o julgava ser capaz, então a levou até sua boca, se curvando para depositar um beijo bem ali, nas costas da minha mão. Ele levantou os olhos para mim e sorriu. Meu corpo todo estremeceu. - O prazer é todo meu. Encarei ele por longos segundos, tentando digerir o que havia acabado de acontecer enquanto sua voz rouca preenchia minha mente. Eu não sei porque ele fez aquilo, mas eu não gostei nada. Olhando aqueles olhos, eu sabia que ele era capaz das coisas mais horrendas e bizarras do mundo. - Com licença – a voz do professor entrou pelos meus ouvidos, me despertando do que pareceu ser um transe – Vocês podem deixar isso para mais tarde e voltar ao trabalho? Olhei ao redor da sala. Todos nos encaravam com uma espécie de assombro no rosto, como se perguntassem se eu era louca por chegar tão perto dele. Por um segundo, apenas por um segundo, eu havia me esquecido que estava em local público, com um milhão de pessoas ao redor. Voltei a olhar para Dorian, que ainda me encarava com aquele sorriso gélido no rosto. Puxei minha mão da sua e me endireitei na cadeira, olhando para o professor e pedindo desculpas educadamente. Meu rosto estava ardendo de vergonha. Abaixei a cabeça e apertei com força a borda da mesa, fazendo as juntas dos meus dedos ficarem vermelhas. Alguns segundos depois, levantei a cabeça e soltei a borda da mesa lentamente. Olhei de lado para ele, que ainda me encarava. Por que ele despertava essa sensação em mim? O que ele tinha, afinal de contas? - Espero que não esteja envergonhada – ele disse. - Não estou – minha voz saiu mais firme do que eu esperava – Você vai precisar fazer um pouco mais do que isso para me incomodar. Achei que ele iria ficar surpreso novamente, mas os olhos dele não demonstraram nem uma pitada de surpresa. Em vez disso, ele apenas ampliou o seu sorriso, como se tivesse gostado da minha reação. - Ainda bem que nós temos tempo, então – ele disse. Prendi a respiração. Aquilo não era o que eu queria dizer.
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