Kadu O morro nunca dorme, mas naquela madrugada ele gritou. O som dos tiros rasgou o alto da Rocinha como trovão sem aviso, e o eco das rajadas trouxe o gosto metálico da guerra. Levantei antes que o rádio confirmasse o que já sabia: o ataque era no posto de cima, o mais importante, o que guardava as armas novas e o dinheiro do mês. Corri pelo corredor, ainda com o sangue latejando nas têmporas. A casa estava em silêncio — Anna dormia, ou fingia dormir, protegida pelo conforto que o medo não permite aproveitar. Puxei a pistola, engatei o carregador e desci os degraus com a pressa de quem sabe que poder se mantém com ferro, não com súplica. O ar da rua estava pesado de fumaça e pólvora. Cada beco parecia conter um vulto, e cada sombra podia ser o último erro. Assim é o morro em guerra: n

