O despertador com toda certeza é meu inimigo natural, e acordar atrasado em dia de prova não era coisa desse mundo. Eu teria prova de química, os cálculos eram a minha paixão, entretanto, para o meu professor, só o amor não bastava. Tinha que ter pontualidade. Meus pais já tinham traçado todo meu futuro, e por mais que isso parecesse estranho, era o futuro que eu queria. Queria algo grande, e ser além do que um dia eu pudesse imaginar. Crescer e evoluir. De um lado química e do outro lado da balançava pela física.
— Querido, seu café está pronto! — gritou minha mãe. Terminei de tomar meu banho e colocar minha roupa básica de invisibilidade e desci para tomar café.
— Bom dia, mãe. — falei beijando o topo da sua cabeça.
— Bom dia querido, não se esqueça de que você vai ajudar seu pai a pintar a cozinha hoje. — disse ela pondo as panquecas na no meu prato, e jogando a calda de chocolate por cima. O cheiro estava maravilhoso.
— Não tem como eu fugir dessa parte? — perguntei fingindo preguiça — Acordar é a pior parte do dia, e pintar a cozinha é a pior parte do final.
— Daniel, seu pai está adiando isso há mais de uma semana. Não me venha com essa cara de preguiçoso. — falou puxando minha orelha, com seu olhar divertido.
— Tudo bem, mãe. — falei beijando sua mão que tinha puxado minha orelha. Dona Penélope era a mulher da minha vida. Uma mãe exemplar e cheia de sabedoria. Tinha traços hispânicos, e um cabelo longo e preto, o qual, ela tinha muito orgulho.
— Como vai aquela sua amiga? — perguntou enchendo meu copo com suco de maçã e se juntando a mim, puxando uma das cadeiras, se sentando para tomar o café da manhã também.
— Elle está bem. — respondi tomando um gole generoso do suco.
— Ah... Daniel — suspirou me olhando triste — É uma pena que ela não saiba a joia que ela tem ao lado dela. Um dia meu filho, um dia ela vai perceber...
— Obrigado mãe. — agradeci me levantando e pegando a mochila para ir para escola — Tomara que isso seja uma das suas previsões. — disse rindo e beijando novamente o topo da sua cabeça — Ando precisando de muita ajuda. Muita mesmo.
Como sempre, perdi a hora do ônibus, e como sempre sai correndo atrás do maldito e amarelo ônibus escolar. Parecia que o motorista se divertia com o meu atraso, ou era ele que passava mais cedo e passava direto, me fazendo correr metros e mais metros. Quando parava, me olhava com um olhar debochado, e eu esbaforido, não tinha nem condições de rebater ou falar algo. Mas, aquele dia foi diferente, na hora que entrei no ônibus, ao invés de todos me xingarem, eles me olhavam de um jeito estranho. Os olhos de cada aluno presente naquele ônibus, estavam voltados para mim. E isso me deixou muito incomodado.
Por que eles estavam me olhando daquela forma?
No colégio não foi diferente. Passando pelos corredores, todos me olhavam e cochichavam do ouvido do outro alguma coisa, e depois soltavam um risinho de desdém para mim. Pessoas que nem sabiam da minha humilde existência, naquele dia, estavam prestando mais atenção em mim.
O dia mais estranho da minha vida.
Na aula de inglês, o silêncio se rompeu apenas por minha entrada na sala. E lá estava ele, Edward. Alguém que nunca tinha prestado bem atenção na minha existência, por ter mais coisas a serem feitas na vida, do que perceber que eu exista no mundo, estava me encarando f**o. Ele me observava como um caçador que tinha acabado de ter sua presa roubada. Segui pela lateral da sala, para minha falta de sorte, ele pôs o pé na frente dos meus, me fazendo cair ruidosamente no chão, porém, apenas o professor se levantou para saber o que estava acontecendo, enquanto os outros permaneceram em um silêncio nada comum e bizarro. Edward me olhava com jeito de quem iria me engolir vivo, se eu me atrevesse a contar o que tinha acabado de acontecer. Mas, os anos de perseguições naquele colégio me ensinaram que quando acontece uma coisa dessas, o melhor era dizer que eu tinha tropeçado nos próprios pés. Eu nunca tinha observado Edward. Mas no momento em que eu soube que ele estava começando a sair com Elle, prestei mais atenção no crápula que era ele.
— Você está bem, senhor Valdez? — perguntou o professor Brad preocupado a situação.
— Sim senhor. — respondi apenas —, tropecei nos meus próprios pés. Sabe como é né, eu sou um desastre da natureza. — de cabeça baixa, me levantei e me sentei na minha cadeira.
— Mais cuidado da próxima vez. — disse o professor se virando e voltando para frente da sala — O diretor vai fazer um comunicado em alguns segundos... — foi só ele terminar de falar, que os alto-falantes da sala zumbirão alto.
— Senhoras e senhores — temperou a garganta — Hoje teremos a escolha dos candidatos a rei e rainha do baile. O resultado sai no intervalo. Não deixem de participar, e já podem escolher seus pares para o baile. O tema será inspirado no filme James Bond, então preparem as armas e vistam-se a caráter para essa missão. Tenha uma boa aula.
Baile era igual a um pesadelo na minha vida. Nunca tinha ido, mas tinha certeza que não era uma coisa boa para uma pessoa como eu. Virgem, coberto por acnes e considerado pelos outros o nerd da sala. Seria como o colapso de Wall Street de 1929, acontecendo na minha frente, porém em forma de baile de formatura.
No intervalo, as coisas ficaram ainda mais estranhas. Estranhas ao ponto de me deixar constrangido e sem saber o que fazer, pois eu não tinha a mínima ideia do que estava acontecendo. De longe, vi que Estevan estava sentado ao lado dos seus colegas habituais, e se alguém sabia de alguma coisa, essa pessoa era ele.
— Estevan. — interrompi a conversa frenética que havia entre eles. — podemos conversar?
— Podemos — respondeu ele sem jeito e com jeito que estava me escondendo algo.
Estevan era o tipo de cara que não era popular, mas fazia bastante sucesso entre as estrelas daquele sanatório. Se alguém precisasse de alguma coisa, era com ele que se podia conseguir. Acho que até coisas ilícitas, entretanto, ela era um bom primo, e tinha uma coisa que ele não conseguia esconder de mim: era quando ele estava escondendo algo. E isso era evidente.
Estevan se levantou e me puxou para o canto do refeitório, com urgência.
— Desculpa — começou ele —, me desculpe mesmo... — implorou.
— O que foi que houve? — perguntei sem entender.
— Lembra a garota do cinema, a Jess? — perguntou passando a mão nos cabelos.
— Sim, lembro. — franzi o cenho — O que foi que houve, Estevan? — já estava preocupado.
— Ela vazou que você é apaixonado pela Elle... — meu coração foi parar no meio da garganta com aquela informação.
Definitivamente o chão se abriu nos meus pés.
— Como assim...? — perguntei aumentando a voz — d***a! — esbravejei com ódio — Culpa sua, que não consegue ficar de boca fechada. p***a, Estavam!
— Desculpa, hermano. — implorou.
— Não. — falei irritado — Não desculpo. Agora a Elle já deve estar sabendo disso, e é bem provável que ela não queira nem olhar mais na minha cara...
— Daniel... Cara, desculpa... — pediu com a voz baixa. Estevan estava claramente se sentindo culpado, mas aquele momento eu não estava propício para perdoar qualquer coisa que saísse da boca dele.
— Elle é tudo que tenho. E a amizade que eu tinha com ela vai de ralo a baixo, por sua culpa.
— Eu falei para Jess não comentar...
— Pelo jeito não deu muito certo você pedir a ela para ficar calada. — rebati com o tom ríspido, olhando para ele — Agora sei por que todos estão me olhando estranho. — disse olhando ele. Se Estevan pudesse morrer apenas com um olhar, esse olhar seria o meu. Ele estaria morto, ou melhor, morte e tostado.
Novamente os alto-falantes da sala zumbiram alto, e a voz do diretor mais uma vez ecoou por toda a escola.
— Senhoras e senhores... — temperou a garganta como sempre fazia o diretor Ahern, quando ia fazer algum anúncio — Os candidatos para rei e rainha do baile já foram escolhidos. — fez uma pausa e começou — Para rainha serão: Catherine Way... Jess Scorsese e Elle Austin, o que não é nenhuma surpresa. — brincou ao falar o nome de Elle no final. — e para rei serão: Josh Wheaton... Edward Morrow... E... — fez uma pausa — Isso é sério? — cochichou baixo para alguém, mesmo tendo ciência que todos estavam ouvindo. — Temos uma surpresa este ano, e até eu que já vi de todo, estou sem acreditar que uma coisa dessas pudesse acontecer. — fez outra pausa e respirou tão alto, que mais parecia um tornado nos alto-falantes — Daniel Valdez.
Meu mundo definitivamente tinha parado de vez. E tudo que eu não queria que acontecesse na minha vida, estava acontecendo de forma catastrófica.
Eu estava fodido.
Não sei como me concentrei na prova de química daquele dia, mas com certeza usei todo o cérebro para fazer ela. Roberto Boyler estaria orgulhoso da minha proeza. A ideia de ter todos me olhando por saber meu segredo, me deixava cada vez mais perturbado e desconfortável. E a minha maior preocupação era com o que Elle poderia estar pensando sobre mim.
Já havia se passado duas semanas desde o ocorrido, e tudo permanecia na mesma. A única diferença era que Elle não apareceu no colégio nesse período. Era óbvio que ela não tinha ido à escola. Com certeza fugindo da vergonha de ter um amigo f**o, malvestido e cheio de acnes gostando dela. Por falta de algo melhor para fazer, quem iria comigo para o baile seria a Catherine Way, mas tecnicamente não foi opção dela, e sim do diretor, que teve um pingo de dó do monstro que eu era. Ela tinha aceitado tão facilmente, que nem me importei, já que as coisas estavam estranhas mesmo. Podia sentir o nojo disfarçado de Catherine quando soube, e isso ainda custaria a metade da nota dela, já que ela não era tão boa aluna assim em algumas matérias, e eu era o que eles chamavam de gênio da química e física.
No caminho para casa, quando o carteiro passou por mim, um frio na espinha tomou conta da minha barriga. Estava nas mãos dele, a resposta de admissão em uma das mais conceituadas universidades dos Estados Unidos, e isso seria uma vitória: uma resposta positiva. Na minha família, eu seria o primeiro a ingressar em uma universidade. Tudo que eu queria, era ser o melhor químico.
Estevan, ao contrário de mim, queria ser mecânico, mas eu nunca pensei diferente. Desde que conheci os cálculos, nunca mais quis outra coisa, e além deles, Elle era uma coisa diferente na minha vida. Era ela que eu queria para ser a mulher da minha vida, mas estava bastante difícil.
— Onde está? — perguntei entrando em casa, quase caindo e sem ar nos pulmões.
— Em cima da bancada. — falou minha mãe apreensiva.
— Quero abrir, mas tenho medo do que possa estar escrito... — falei segurando a carta que poderia conter meu futuro.
— Mi hijo... — começou me acalmando, entretanto, eu sabia que ela estava tão nervosa quanto eu — Deus vai guiar você...
— Vou abrir. — falei olhando para ela, e bem devagar e tremendo, fui rasgando o envelope. E aos poucos, as letras formaram as palavras.
Palavras que me fizeram ainda mais felizes.
Universidade de Cornell 12/10/1994 Ithaca, NY 14850, Estados Unidos
Parabéns! Você foi aceito para uma das universidades mais prestigiadas do mundo. Ao participar Universidade de Cornell, haverá inúmeras oportunidades e desafios emocionantes para você aqui. Como Cornellian, você estará vivendo e aprendendo com pessoas incríveis de todo o mundo - estudantes, professores e acadêmicos. Você vai criar amizades e lembranças que irá conectar Cornell a você, para o resto de sua vida.
Seja bem-vindo, Daniel Valdez.
— O que diz na carta mi hijo? — perguntou torcendo o pano de prato que estava em suas mãos.
— Mãe... — comecei sem fôlego, com os olhos repletos de lágrimas.
— Sim... — falou ela de olhos arregalados — Não mate sua mãe do coração, diga logo o que tem na carta, hijo!
— Fui aceito. — gritei abraçando e girando pela sala com ela ainda em meus braços. — Fui aceito! Aceito! — gritei ainda mais alto — Eu tenho uma bolsa integral na Cornell!
Dia do baile - 1994.
Tinha que me apresar, a limusine estava do lado de fora, e não que eu pudesse pagar por ela, mas o momento pedia por uma coisa mais arrumada que o meu Ford f150 modelo 87, que por sinal estava todo remendado devido aos maus cuidados do antigo dono. Eu m*l saia com o carro por não ter dinheiro para gasolina, mas o baile era uma ocasião especial. Mesmo sendo estranho.
Minha mãe insistiu em tirar uma foto minha com um terno azul claro do meu pai, eu sabia que não era muito bonito, mas precisava economizar para universidade. John Travolta nos Embalos de sábado à noite estava naquele terno. A pior parte era os babados na lapela do terno e no meio da camisa na linha vertical. Apenas os sapatos, preto social, escapavam. Desastre. Meu cabelo foi repartido metodicamente da esquerda para direita. O gel se transformou no meu cabelo em tipo de capacete do Darth Vader, e minhas acnes estavam piores, mais vermelhas e inchadas, pois meu nível de estresse e ansiedade não deixava meu organismo em paz.
Quando a limusine parou na frente da casa de Catherine, os pais dela estavam esperando junto a ela do lado de fora, e tomaram um susto quando me viram saindo, e por um segundo achei que a mãe dela segurou o riso, e o pai, tenho a certeza que gostou de mim, mas ainda assim, não foi educado comigo. Catherine estava em um vestido verde cheio de coisinhas brilhosas na alça única e poderia dizer que era um vestido digno de uma princesa. Ela parecia mais satisfeita em estar ao meu lado, o que me pareceu muito estranho.
A quadra estava decorada bem no estilo James Bond. Cartazes e balões em preto e branco com imagens da sombra do agente estavam dando o toque de minerva no ambiente. Eu poderia até me divertir, e me esquecer de tudo que aconteceu.
Poderia tentar, mas não iam me esquecer.
A música alta, de uma batida forte e pulsante deixou todos alucinados e prontos para dançar. Estava sendo bom não ser tão invisível para os outros, apenas alguns olhares ainda me seguiam me fazendo lembrar-me daquela manhã medonha. Os olhos não eram os de Elle, e sim de Edward no canto da quadra com Josh e Shane, um garoto que m*l aparecia no colégio. Catherine me puxou para o meio do salão e começou a seguir o ritmo da música em uma dança de passos diferentes do que eu estava acostumado. Já que o único lugar que eu dançava, era debaixo do chuveiro.
Levantava os braços e pulava e depois começava a rebolar ao som de Michael Jackson. Os cabelos negros presos perdiam o seu brilho natural apenas pelas luzes vermelhas e azuis que se alternavam na pista. De olhos fechados e de sorriso largo, me fez esquecer que eu não era o Daniel que todos estavam habituados, e até eu estava acomodado comigo mesmo. Foi bom me soltar um pouco, mesmo que minha dança fosse algo vergonhoso.
Já passava da meia noite, e parecia que todos tinham tomando algum tipo de energético e as pessoas só foram interrompidas pelo diretor que pediu para o Dj baixar a música para anunciar:
— Hoje é a noite da juventude. — começou — Hoje é dia de eleger o rei e rainha do baile de 1994. A votação foi acirrada e de tirar o fôlego. — do lado do palco uma garota baixinha de salto alto, até bonita, foi na direção do diretor com um envelope pardo — Então vamos conhecer o rei do baile. — falou puxando o primeiro papel de dentro do envelope. — e o rei do baile deste ano é... — fez uma pausa. — que rufem os tambores... Daniel Valdez... — anunciou incrédulo ao ler o primeiro papel e depois olhou para os alunos com uma expressão fria.
Todos se viram para mim, e abriram o caminho para que eu passasse. Meu corpo estava petrificado, ainda me lembro de Catherine me empurrando para frente, para que eu começasse a andar. Senti cada olhar, em cada passo que eu dava na direção do palco, sem acreditar no que estava acontecendo.
Olhar todos de cima, era como ser igual a eles, mesmo que os olhares lançados a mim, não fossem bem uma energia positiva. Tentei procurar Estevan com os olhos, ele tinha me dito que não perderia esse baile por nada, mas até aquele momento, ele não tinha aparecido. Todos aplaudiram quando me posicionei no centro do palco. Do meu lado, estava a garota baixinha de salto alto, segurando uma almofada vermelha contendo as duas coroas. Ela parecia feliz em estar ali, e ainda sorriu para mim quando acenei com a cabeça para ela.
— Muito bem. — o diretor olhou para mim — Um rei diferente. — brincou — Agora vamos para a rainha do baile. — falou puxando a ponta do segundo papel, de dentro do envelope. — que rufem os tambores... a rainha do baile é... Elle Austin! — gritou ao ler o nome, e não me pareceu nenhum pouco surpreso ao ler o resultado.
No fundo, eu a vi. Ela estava de vestido rosa e volumoso. Sem alça e com um laço no meio da cintura deixando ainda mais definida. Seu cabelo estava preso, apenas com uma mecha de cabelo caindo sobre o seu ombro. Uma visão de tirar o fôlego de qualquer um. Seus lindos olhos azuis não estavam brilhando da mesma forma. Não da mesma forma quando eu era apenas seu amigo cura dor de cotovelo. Não era o olhar da minha amiga. Não era o olhar da mulher por quem eu me apaixonei. Ela estava com um olhar distante e triste.
Quando ela se posicionou ao meu lado para receber a coroa, parecia ainda mais distante. Não olhou pra mim nem um segundo, o que fez com que meu coração apertasse ainda mais.
— Elle... — cochichei — Onde você estava? Você está bem? — perguntei como um boneco de ventríloquo.
— Dani, não... Por favor... — respondeu sem olhar para mim. Pude sentir uma dor na sua voz, que me fez ficar de coração partido.
— Elle... — choraminguei — Eu tenho que explicar tudo...
— Por favor, não faz isso. — fez o pedido fechando os olhos e virando a cabeça de leve para o outro lado do palco. Rejeição de todas as semanas, não era pior do que o jeito como ela havia me tratado naquela noite.
Olhei para ela e minha vontade era sair correndo e nunca mais voltar.
O diretor falou algo para os alunos e longo em seguida veio em nossa direção. A baixinha de salto alto, correu para ficar ainda mais perto dele. Ele habilidosamente colocou a coroa na cabeça de Elle e depois na minha.
— Agora vocês são o rei e rainha do baile. — falou em um sorriso forçado — Podem dançar.
Estiquei minha mão para Elle, e ela relutante a segurou e seguimos para o meio da quadra, onde ficava a pista de dança. Apesar dela não querer falar comigo e da mágoa, eu estava feliz em tê-la ao meu lado.
As luzes apenas acentuaram sua beleza incrível. Seus olhos azuis apesar de estarem distantes, eram os mais lindos olhos que eu já tinha visto na minha vida. Sua boca desenhada era um convite para que eu a beijasse, mesmo que eu não fizesse à mínima ideia de como fazer isso.
Quando estávamos no meio da pista em meio a uma dança lenta e cuidadosa, e eu com medo de pisar nos pés dela, mesmo com ela usando aquele vestido volumoso, ela soltou meu braço e me olhou com os olhos lacrimejados e vermelhos.
— Me desculpa. — pediu juntando a mão no meio dos seus s***s e balançou a cabeça freneticamente enquanto se afastava — Não tive outra escolha...
— Desculpa pelo o quê? — perguntei sem entender.
— Me desculpe. — repetiu com a voz sofrida e virou-se correndo segurando a borda do seu vestido.
E lá estava eu parado no meio da quadra a vendo partir chorando. Quando eu achava que não podia piorar, senti o cheiro da tinta vermelha, escorrer pelo meu corpo. Todos ao meu redor gargalhavam e apontavam para mim. O ódio tomou conta da minha alma, e nada tiraria da minha cabeça que a culpa daquilo tudo era de Elle. Por qual motivo ela me pediria desculpas? Limpando a tinta dos óculos, e do rosto, vi Estevan sem fôlego e com o olhar de surpresa. Eu sabia que ele não tinha feito parte daquilo, mas Elle sim. De uma maldade sem fim. As lagrimas brotavam e os meus olhos ardiam pela raiva que saia junto com elas.
Sem olhar para trás, corri.
Corri o mais rápido que pude e Estevan me seguiu.
— O que houve? — perguntou ele em choque puxando meu cotovelo, me fazendo virar para encará-lo.
— Me leve para casa, — falei ríspido, mas a vontade de chorar explodiu dentro de mim — Não fico mais um segundo nessa cidade. Não quero ver mais Elle...
— Daniel...
— Me tire daqui. — gritei com ódio.
Estevan deu partida no seu carro e arrancou para minha casa. No meio do caminho contei o que tinha acontecido, e ele não conseguia acreditar no ocorrido. Quando cheguei em casa, contei para os meus pais o que tinha acontecido e minha mãe ligou para uma prima, que morava em Nova Iorque, e pediu para que eu ficasse lá até que as aulas começassem.
— O que você vai fazer? — perguntou Estevan entrando no quarto.
— Vou embora dessa cidade, e nunca mais volto. — falei pegando a mala no canto do quarto.
— Dani, pense bem...
— Já pensei. — falei com todo ódio que existia dentro de mim.
— Vamos falar com Elle... — sugeriu andando como uma barata tonta dentro do quarto
— Não quero saber mais dela. Aliás, me faça um favor, nunca mais toque no nome dela perto de mim. Tudo bem? Quero que ela vá para o inferno.
— Daniel... — implorou. — Tome ao menos um banho. Quem sabe assim, você esfrie a cabeça.
— Não vou tomar banho. — disse olhando para ele, e colocando as roupas na mala — Quero sair daqui desse jeito. Só vou tomar banho, quando chegar em Nova Iorque.
— Dan...
— Amar sem ser amado, e ainda sofrer o que sofri... Não é fácil. — falei arrumando o resto das roupas nas malas — Isso destrói um coração bom. Eu vou mudar, e quem estiver na minha frente, vai sofrer. Isso é uma promessa!