Capítulo 6 - Pisos

2493 Words
Marie POV A mesa da sala de jantar era grande, comportava todos os membros da família que era tão grande quanto e também tinha espaço para adições como agora. Por algum motivo a família Zervas achou de bom tom me colocar próxima a Eros, entre ele e seu irmão do meio que me olhava como se eu fosse uma criatura de outro universo, ou melhor, um ET. Ele era muito parecido com Eros, com a diferença que tinha olhos castanhos profundos que eram acompanhados de duas olheiras leves e um cabelo livre que caia sobre seus olhos. O extremo contrário da irmã perfeita deles que tagarelava agora com o tio sobre sua mais nova matéria na faculdade. Pelo que eu entendi, os Zervas tinham uma dinâmica muito interessante de vida, sempre organizando esses almoços (ou jantares) para manter todos unidos. – A Malorie não vem? Dimitri, o pai de Eros, perguntou ao gêmeo que deu de ombros, mas logo seu esposo - um italiano de cabelos loiro-grisalhos e olhos claros - afirmou contundente colocando a grande travessa de macarronada no centro da mesa. – Ela tem um seminário hoje. Carlo, o italiano, explicou se assentando entre o marido e Marie. Dimitri, que se assentou à cabeceira da mesa, respirou fundo. – Tem certeza que ela ainda não está chateada com a situação do Niko? Comentou o patriarca com pesar, como se todos naquela mesa já estivessem totalmente a par da investigação sobre Eros. Esse que estava assentado calado ao meu lado de maneira incomum. Se nesses dois dias, quase três, que eu o conheço ele nunca se mostrou cabisbaixo ou calado, quer dizer que esse ambiente o causava algo que o afetava. – Que situação? Daphne, a única que parecia sempre alheia a tudo, perguntou e Eros finalmente se manifestou: – A m*l não engoliu muito bem o fato de eu estar sendo acusado de traficar drogas. Malorie. Gravei o nome em minha mente. Ela parecia ser de grande importância emocional para Eros e talvez ela soubesse de alguma coisa e por isso se recusava a vê-lo. – Ninguém aqui engoliu bem, principalmente depois que- Damon ia dizer algo mas foi interrompido por Marie que, sorrindo, mastigava a macarronada. – Vamos mudar de assunto?! A comida está maravilhosa, carlito! Elogiou ela fazendo todos na mesa mudarem automaticamente de assunto como se houvesse uma regra implícita de que não poderia se passar por aquele assunto que eu não sabia qual. – Não acredite em tudo o que você ouvir sobre o Eros. Meus pensamentos foram interrompidos por um sussurro. Linux, ao meu lado esquerdo, enrolava a massa no garfo calmamente. – O quê? Perguntei confusa olhando para ele, então os profundos olhos castanhos dele se ergueram para me encarar. – Ele tem muitos inimigos, dentro e fora do ringue. Ao ouvir isso eu não sabia muito bem como interpretar aquelas novas informações juntas. Linux era automaticamente suspeito por ser familiar de Eros, mas e se ele estivesse certo? E se Eros tivesse sido incriminado? Mas aparentemente Eros não era de todo inocente, ou a mãe dele teria deixado Damon terminar o que estava dizendo. Eu não sabia o que pensar, apenas que precisava pensar. [...] – Não... isso não é verdade. Sabe como a mídia é hoje em dia, certo? Nossa equipe jurídica já está agindo sobre isso. Simon falava ao celular com o que parecia ser um dos patrocinadores de Hades, já que a "instituição Hades, o invicto" estava claramente ameaçada com aquela investigação envolvendo o nome dele, e tudo o que sabíamos até agora era que toda aquela cocaína era boa demais para estar em um lugar como aquele. Me entenda bem, eu já vi todos os tipos de casos envolvendo tráfico que você pode imaginar. Inclusive era bem fã dos pais de Eros mesmo antes de conhecê-los pela operação "carne humana", tudo isso me intrigava e foi por isso que virei policial. Contudo, eu não conseguia entender o que levaria a tanta droga de tão alta qualidade estar sobre a mesa de um camarote em uma boate. Era como um sinalizador imenso sendo aceso com uma placa escrita "Eros é o culpado". Por mais que tudo indicasse que ele era realmente o culpado da situação, eu não conseguia deixar de ter essa sensação de que tinha algo de errado naquilo. – Estou indo, não se esqueça de estar em casa antes das onze. Especifiquei ao lutador que, por algum motivo, ainda parecia apático. Bem diferente da personalidade extrovertida e egocêntrica dele. – Pode deixar. Ele murmurou calçando de volta seus tênis ao que saíamos da casa de sua família. – Hey, espera! Maninho, você me dá uma carona pra esse endereço? Daphne nos interrompeu mostrando a Eros - completamente desinteressado - a tela de seu celular cor-de-rosa e ele rolou os olhos. – Não é caminho para mim. E você já sabe dirigir, Daphne, se manca. A maneira áspera com que ele disse isso me fez erguer minhas sobrancelhas. Aquele era um lado diferente dele que eu nunca tinha visto. A loira revirou os olhos e veio até mim instantaneamente com um sorriso grande e brilhante. – E você, delegada? Pode me deixar lá? Por favorzinho! Ela pedia me mostrando o endereço que, coincidentemente ou não, era bem próximo do meu bairro então eu apenas as afirmei sem pensar muito. Seria uma ótima oportunidade de interrogar um m****o da família de Eros. – Daphne, ela é uma policial e não sua motorista! Não dê ouvidos à ela Sophie, vai pra casa. Tive que piscar algumas vezes para assimilar que o lutador de olhos verdes em minha frente realmente tinha me chamado pelo nome pela primeira vez. Meu rosto esquentou e eu tinha quase certeza de que eu parecia uma i****a agora sob os olhos dos dois Zervas. – É caminho até o meu apartamento, não vai ser incômodo algum. Respondi finalmente conseguindo dizer algo e Daphne celebrou fazendo seus braceletes dourados chacoalharem em um som irritante. Ela era a típica patricinha de cinema, tudo dela era cor-de-rosa, usava minissaia jeans, gloss de morango, babyliss no cabelo loiro e sempre mascando um chiclete. Eros me olhou com espanto. Não, na verdade não era bem espanto, estava mais para confusão, me olhava como se quisesse entender o que estava se passando em minha mente. – Tudo bem então. Se precisar, já sabe onde eu moro. Ele disse e me deu as costas com indiferença de uma maneira que ele nunca havia feito comigo e eu senti uma pitada de decepção. Minha abstinência emocional era gritante demais para que alguém simplesmente decidisse me tratar com indiferença do nada, mas eu precisava ser profissional. E o que exatamente ele quis dizer com aquilo? – Vamos? Daphne me chamou e eu peguei minhas coisas - e as marmitas que Carlo me obrigou a levar - e saímos em direção ao meu carro. E por mais que Daphne fosse literalmente o que chamamos de patricinha mimada, ela não fez pouco caso do meu corsinha e muito menos da bagunça que estava dentro dele. – Obrigada por aceitar me levar! Sabe, eu não conto para eles mas eu tenho pavor de dirigir... Confessou ela no primeiro segundo em que pisamos dentro do meu carro e eu percebi que ela era uma garota boa apesar do exterior fútil. – Mas isso vem de algum trauma? Perguntei saindo com o carro da vaga onde ele estava estacionado e o colocando na estrada. A loira pareceu pensar um pouco antes de me responder, como se ponderasse bem se valia a pena ou não me contar sobre aquilo. – Certa vez um homem, inimigo dos meus pais, nos sequestrou. Eu, Linux e Eros. Quase me engasguei com a informação repentina sendo dita em uma tranquilidade quase que aterrorizante. Ou ela fazia muita terapia para estar falando com tal naturalidade, ou seus nervos eram de aço. – Eros já tinha uns quinze anos, Linux doze, mas eu tinha apenas sete anos. Comentou enquanto eu dirigia por osmose, já que todo o meu corpo parecia querer prestar atenção naquelas informações. Daphne respirou fundo algumas vezes e depois sorriu. – Passamos por coisas terríveis naquela época e nosso baba nunca se perdoou por ter deixado aquele homem escapar novamente. Novamente? Me perguntei, mas segurei minhas dúvidas para deixar com que o raciocínio dela fluisse naturalmente. – Mas por que o trauma com carro? Questionei dando continuidade ao assunto e ela deu de ombros. – No dia em que nos levaram aquele carro capotou, Eros pensava que seria a nossa salvação, tentou nos tirar de dentro do carro enquanto os sequestradores estavam tontos mas... Droga! Como eu queria poder ler mentes naquele momento. Havíamos chegado no endereço que ela me mostrou e ela me deu um sorriso tranquilo. – Eu te conto o resto da história qualquer dia desses. Obrigada pela carona, delegada! Tão confusa quanto saí de meu apartamento, eu voltei a ele. E como é de se esperar de filmes e livros de comédia romântica ou apenas de comédia mesmo, tudo começa a dar errado para a protagonista ao conhecer o segundo protagonista. E me sentindo em um filme de comédia eu encaro o porteiro, o síndico e os vizinhos que estavam em um amontoado de gente em pijamas diferenciados bem na porta do meu apartamento. Respirei fundo. Coisa boa não era, nunca era. – Ah, aí está ela! Senhorita Welsh seu apartamento está causando infiltrações nos apartamentos de baixo! O síndico, gordo como um porco (posso falar pois tenho local de fala) pronto para o abatedouro, veio até mim afrontado como se fosse infartar. Franzi as sobrancelhas e quase ri. Como ele sabia que era o meu? Bem, essa era uma pergunta um tanto quanto i****a, então apenas me dignei a passar pelos vizinhos curiosos e abri a porta do meu apartamento fazendo automaticamente com que víssemos o estado alagado de minha sala de estar e Nora miando desesperada sobre o sofá. – p**a merda... [...] Com Noradrenalina no colo - a gata - e uma mochila com meus pertences mais valiosos - documentos, remédios e ração de gato - eu agora estava sentada na escada de emergência do meu prédio decidindo como iria fazer para pagar a reforma do piso inteirinho do apartamento que acabou estufando por causa da água. Sem contar com os móveis, mas isso era desgraça demais para eu pensar agora. Eu havia levado a maior bronca do mundo vinda do síndico como se eu fosse culpada pelo cano do meu banheiro ter estourado, mas agora eu precisava descobrir onde eu dormiria já que dormir em uma casa com o piso todo levantado e cheirando a mofo não daria certo. Não tinha parentes nesse país, nem amigos e nem mesmo a delegacia me aceitaria por causa de Nora. Quis chorar, me descabelar, me jogar da escada, mas me concentrei em pensar em algo mais produtivo que suicídio. Afinal, mesmo que eu pense nele o tempo todo, eu sempre acabo optando por viver já que era bem menos trabalhoso e dramático. Se precisar, já sabe onde eu moro. A frase ecoou em minha cabeça e eu aceitei a ideia de bom grado. Se eu não tivesse saído tão cedo de casa eu teria visto o cano estourar e meu apartamento não teria inundado e dado prejuízos até aos vizinhos. Eu também não precisaria estar do lado se fora sem ter onde dormir e sozinha com Nora. – Vamos, Nora. Hoje vamos dormir em um lugar bem chique. Disse carregando minhas coisas escada a baixo junto com a gata que parecia estar bem contentada já com a vida de desgraça que ambas tínhamos. Ela era uma gatinha de rua quando eu a adotei, então ela também não pode exigir muito. E assim que chegamos ao Grécia, eu com aquela cara de cansada e furiosa pelo incidente no apartamento, com um animal no colo e uma mochila enorme em minhas costas, as atendentes esnobes se entreolharam. – Eu vou para a cobertura. Ditei sem nem mesmo pestanejar. Mesmo hesitando, uma delas levou o telefone ao ouvido interfonando para Eros, eu suponho. – Senhor Zervas, o senhor tem mais uma convidada, eu suponho... Mais uma convidada? Eu não era a única? E mesmo com aquilo, minha entrada foi permitida sem tantas ressalvas quanto da última vez. Fiz o mesmo processo, cartão magnético, elevador, último andar, única porta, e do elevador mesmo eu já podia ouvir uma batida grave de música pop, aquele gosto duvidoso que somente Eros tinha. Percebi que a porta estava entreaberta e saí entrando acabando por dar de cara com não só uma, mas muitas pessoas. Era uma festa, das grandes. Ao fundo tocava alguma música do repertório antigo da Nicki Minaj e logo eu vi o que apenas alguns amigos de Eros me contavam por alto. O lutador estava em um roupão de veludo vermelho, sunga, uma taça de vinho na mão e a garrafa na outra. Ele ria e soluçava enquanto gritava algumas palavras aos convidados tão bêbados quanto ele. E antes que você possa perguntar, sim, ele era o único quase desnudo. – Delegada! Gente essa aqui...- Soluço – É a melhor. Policial. De todas...- Soluço e passos desajeitados até a mim. – O que te traz...- Um gatinho! Ele pegou Nora no colo e eu quase me desesperei, mas ele pareceu bem responsável mesmo que duvidosamente bêbado. Entre todos os convidados que claramente não estavam a base apenas de álcool, eu não vi seu agente, mas acabei por ver muitas mulheres, a maioria sempre perto dele, concordando com ele e o embebedando mais. Ele é um atleta, como pode beber tanto?! Larguei minha mochila no chão, fui até um dos painéis na parede e, tentando descobrir como funcionava aos poucos, abri as janelas automatizadas e parei a música. – Acabou a festa! Circulando! Ordenei, e mesmo sendo vaiada pela maioria, ninguém ousou me contestar muito. – Isso... obedeçam a delegada! Dizia Eros tão bêbado quanto podia estar. As garotas permaneceram ao lado dele como sanguessugas e eu não me meti, apenas fechei a porta quando todos os outros convidados saíram. – Escuta, Zervas, vou precisar de um lugar para ficar por um tempo até eu ter dinheiro para consertar meu apartamento. Disse diretamente mesmo sabendo que ele poderia não estar tão consciente o quanto a situação demandava, mas ele ergueu a cabeça e me encarou com um sorriso cafajeste enquanto abraçava as duas garotas pela cintura. – Escolha um quarto... até o meu se quiser. Sinta-se em casa, princesa. Riu mostrando suas covinhas, não só a mim, mas as outras garotas e eu me senti um pouco enciumada ao perceber que não somente eu tinha acesso aquela visão. – Ótimo, obrigada. Peguei Nora em meu colo e escutei ele estalar a língua. – Mas não espere estadia gratuita, gatinha. Ouvi a risada dele mesmo após dar as costas e me enfiar em um quarto qualquer.
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD