Capítulo 27 – Sangue No Asfalto

735 Words
A quadra aplaudiu. O povo voltou a olhar pra mim com liderança.Mas eu sabia:a última cartada de um homem que perde no jogo… é o caos. E Darlan tava prestes a usar o que lhe restava: violência. --- Na madrugada de segunda, o bar do Seu Milton amanheceu com as portas quebradas. Garrafa no chão. Vidro pra todo lado. E na parede, pichado em tinta preta: > “Morre rainha, nasce rei.” Quando vi, o peito apertou. — Foi ele — falei pra Gabriel. — Não temos prova. — Não precisamos de prova. Precisamos de resposta. --- Mas minha resposta não seria bala. Ainda não. Ia ser exposição. Peguei meu celular e postei a foto da parede. Legenda: > “Quem destrói o que é do povo, nunca vai governar por ele. A rainha segue viva. E atenta.” Explodiu. Nos comentários, apoio. Nos compartilhamentos, ameaça. Mas uma coisa era certa: eu tinha a atenção de todos. Inclusive a do Darlan. --- No fim da tarde, ele me chamou pra conversar. Mensagem direta, sem rodeios: > “Amanhã. No alto da laje da Viela 6. Sozinha.” Gabriel não queria deixar. — Isso é cilada. Ele quer te encurralar. — E você acha que ele tem coragem de fazer isso comigo com o morro inteiro assistindo? — Você confia demais na sua fama. — Não é na fama. É no medo que eu construí com sangue. --- Na manhã seguinte, subi a viela. Sem escolta. Sem arma à vista. Darlan já tava lá. Sentado, de frente pro morro, como se fosse dele. — Você veio mesmo. — ele disse. — Você chamou. — Você é corajosa. — E você é burro. Ele riu. — Por quê? — Porque enquanto você pinta parede e quebra bar, eu p***o o povo contra você. — Cê acha mesmo que o povo te ama? — Não. Mas eles sabem que comigo, o caos não reina. Com você, nem a paz se atreve a ficar. --- — Sabe o que eu acho? — ele disse, levantando. — Você fala bonito demais pra uma rainha da favela. — E você age pequeno demais pra quem quer ser rei. Ele se aproximou. — O que me impede de te empurrar daqui? — O mesmo que te impede de ser líder: medo de não saber o que fazer depois. Silêncio. — Você é um incêndio, Darlan. E eu sou a água. Mas a diferença é que eu aprendi a queimar antes de apagar. --- Saí dali com as mãos frias. Mas o coração queimando. Porque eu sabia: ele ia agir. E rápido. --- No dia seguinte, o filho da Rosa — o pequeno Gustavo — foi atropelado. Não foi fatal. Mas foi grave. E a testemunha disse que o carro não parou. Nem diminuiu. Na calçada, um papel amassado: > “Aviso dado.” A mensagem não era pra Rosa. Era pra mim. Eles estavam tocando quem me cercava. Porque não conseguiam mais me derrubar sozinha. --- Fui até o hospital. Visitei a criança. Abracei Rosa. E no caminho de volta, falei pra Gabriel: — Agora acabou. — O quê? — A paciência. E o silêncio. --- Naquela noite, reuni o conselho comunitário. — A gente tentou paz. — Tentamos política. — Tentamos diálogo. — Mas tão tentando derrubar a gente na covardia. Nando completou: — Atacaram criança. — E isso não passa — eu disse. — Porque hoje… a rainha vai agir como o trono exige. --- No dia seguinte, Darlan foi cercado na viela 12. Pelos meus homens. Sem sangue. Sem escândalo. Apenas… exilado. — Vai descer o morro. — E não volta. — Porque se voltar… nem o povo que você tentou enganar vai te salvar. Ele não respondeu. Só cuspiu no chão e desceu. Sumiu. --- Mas ainda havia o estrago. Rosa chorava toda noite. O bar do Seu Milton só reabriu por insistência da comunidade. E eu? Perdi outra parte da minha paz. --- — Você venceu. — Gabriel disse, me abraçando. — Será? — Claro. — Ele se foi. — Mas e amanhã? — Amanhã é outro dia. — Exato. — E no morro… outro dia pode ser outro inimigo. — Outra queda. — Outro susto. Ele me beijou a testa. — E mesmo assim, você continua de pé. — Isso te faz rainha. Sorri. Mas por dentro… o trono seguia duro. E o coração, cansado.
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