Capítulo 28 – O Barulho do Silêncio

750 Words
Darlan se foi. Desceu sem gritar, sem atirar. Do jeito que covarde vai: calado. Mas o silêncio dele… é o pior tipo de barulho. Porque quando o inimigo some, você nunca sabe se ele morreu ou tá só esperando a próxima chance. --- No morro, ninguém falou dele depois da queda. Era como se nunca tivesse existido. Mas eu sabia: — Essa paz tá errada — falei pra Gabriel. — Por quê? — Porque ela veio rápido demais. — Talvez seja só alívio, Amanda. — Ou talvez seja medo do que vem depois. --- Na quarta-feira, recebi uma ligação da Dona Jandira. — Amanda… tem dois homens de terno aqui perguntando por você. — Como assim? — Disseram que são da polícia civil. Congelou tudo dentro de mim. — O que eles querem? — Não disseram. Só mostraram umas fotos do evento da comunidade. E uma da sua reunião na quadra. — Eu já tô indo. --- Cheguei na casa da Dona Jandira em menos de dez minutos. Vi o carro preto, os dois engravatados e o olhar deles… frio. Cansado. Calculado. — Amanda Rodrigues? — Sim. — Podemos conversar? — Aqui mesmo? — Aqui mesmo. --- Eles mostraram as fotos. Uma minha falando com o povo. Outra com Gabriel ao fundo. E uma terceira… com Darlan, antes da queda. — Você sabe onde ele está? — Não. — Vocês tiveram algum conflito? — Quem não teve com ele? — Dizem que ele sumiu por sua causa. — Dizem muita coisa. Mas vocês têm prova? Um deles sorriu. Frio. — Ainda não. — Então eu sou só mais uma cidadã. — Uma cidadã que virou líder num dos morros mais temidos da cidade. — Eu virei líder porque sobrevivi. Não porque pedi o trono. --- Quando foram embora, o peito apertava. Gabriel chegou logo depois. — Eles vieram aqui também — ele disse. — Eles vão voltar. Tão tentando achar rastro de crime na nossa sombra. — E acharam? — Por enquanto, só perguntas. — Então vamos dar respostas que não incriminam. --- Naquela noite, sentei na varanda. Olhei o morro. Tava calmo demais. E o problema do morro é que quando tudo tá calmo, é porque alguém tá armando. --- — Amanda — Rosa me chamou pelo zap. > “Precisa ver isso.” Era um print. Um post de uma página policial do i********:. > “Rainha do Morro investigada? Polícia abre inquérito sobre desaparecimento de ex-líder da comunidade após embate com atual liderança feminina.” E uma foto minha. De frente. Cabelo solto, olho duro. A mídia voltou. E agora… com sangue nos dentes. --- — A gente precisa se antecipar — falei pra Gabriel. — Fazer o quê? — Limpar tudo. Contar nossa versão. E começar a organizar saída se for preciso. — Você quer fugir? — Quero viver. --- Mas no fundo… eu não queria ir. Eu lutei demais pra conquistar o que tenho. Eu fiz guerra com mulher na frente. Fiz revolução com amor como munição. E agora… vão me pintar de vilã. --- No dia seguinte, recebi uma mensagem anônima: > “Você subiu demais, rainha. Tá na hora de cair.” Dessa vez não era bilhete. Não era ameaça no muro. Era aviso de gente que tinha acesso. Gente que tava dentro. --- Reuni Nando, Rosa, dois dos antigos aliados e Gabriel. — Tem dedo de polícia, de mídia e de traidor nisso. — E o que vamos fazer? — A gente vai mostrar o que sempre mostrou: que quem tentar apagar a rainha… acaba sendo queimado pelo trono. --- Postei um vídeo. Falei direto, sem gíria, sem corte. > “Eu sou Amanda. Sobrevivi ao fogo, à traição, à perda e à guerra. Não sou santa. Mas quem me julga… que tenha vivido o que eu vivi.” Explodiu. Mais de 30 mil visualizações em uma hora. Nos comentários: gente me defendendo, gente me atacando. Mas o mais importante: gente me ouvindo. --- — Isso pode te ajudar ou te ferrar mais ainda — Gabriel disse. — Eu não tenho mais o que esconder. — E se for pra cair… que seja de pé. --- Naquela noite, sonhei com meu pai. Ele sorria, no portão de casa, dizendo: > “Quem nasce pra ser vento… nunca se prende. E você, minha filha, é furacão.” Acordei com lágrimas no rosto. Mas com o coração mais firme. Porque mesmo que tentem tirar tudo de mim… ninguém tira o que eu me tornei.
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