A quadra aplaudiu.
O povo voltou a olhar pra mim com liderança.Mas eu sabia:a última cartada de um homem que perde no jogo… é o caos.
E Darlan tava prestes a usar o que lhe restava:
violência.
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Na madrugada de segunda, o bar do Seu Milton amanheceu com as portas quebradas.
Garrafa no chão.
Vidro pra todo lado.
E na parede, pichado em tinta preta:
> “Morre rainha, nasce rei.”
Quando vi, o peito apertou.
— Foi ele — falei pra Gabriel.
— Não temos prova.
— Não precisamos de prova.
Precisamos de resposta.
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Mas minha resposta não seria bala.
Ainda não.
Ia ser exposição.
Peguei meu celular e postei a foto da parede.
Legenda:
> “Quem destrói o que é do povo, nunca vai governar por ele.
A rainha segue viva.
E atenta.”
Explodiu.
Nos comentários, apoio.
Nos compartilhamentos, ameaça.
Mas uma coisa era certa:
eu tinha a atenção de todos.
Inclusive a do Darlan.
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No fim da tarde, ele me chamou pra conversar.
Mensagem direta, sem rodeios:
> “Amanhã. No alto da laje da Viela 6. Sozinha.”
Gabriel não queria deixar.
— Isso é cilada.
Ele quer te encurralar.
— E você acha que ele tem coragem de fazer isso comigo com o morro inteiro assistindo?
— Você confia demais na sua fama.
— Não é na fama.
É no medo que eu construí com sangue.
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Na manhã seguinte, subi a viela.
Sem escolta.
Sem arma à vista.
Darlan já tava lá.
Sentado, de frente pro morro, como se fosse dele.
— Você veio mesmo. — ele disse.
— Você chamou.
— Você é corajosa.
— E você é burro.
Ele riu.
— Por quê?
— Porque enquanto você pinta parede e quebra bar,
eu p***o o povo contra você.
— Cê acha mesmo que o povo te ama?
— Não.
Mas eles sabem que comigo, o caos não reina.
Com você, nem a paz se atreve a ficar.
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— Sabe o que eu acho? — ele disse, levantando.
— Você fala bonito demais pra uma rainha da favela.
— E você age pequeno demais pra quem quer ser rei.
Ele se aproximou.
— O que me impede de te empurrar daqui?
— O mesmo que te impede de ser líder:
medo de não saber o que fazer depois.
Silêncio.
— Você é um incêndio, Darlan.
E eu sou a água.
Mas a diferença é que eu aprendi a queimar antes de apagar.
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Saí dali com as mãos frias.
Mas o coração queimando.
Porque eu sabia:
ele ia agir.
E rápido.
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No dia seguinte, o filho da Rosa — o pequeno Gustavo — foi atropelado.
Não foi fatal.
Mas foi grave.
E a testemunha disse que o carro não parou.
Nem diminuiu.
Na calçada, um papel amassado:
> “Aviso dado.”
A mensagem não era pra Rosa.
Era pra mim.
Eles estavam tocando quem me cercava.
Porque não conseguiam mais me derrubar sozinha.
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Fui até o hospital.
Visitei a criança.
Abracei Rosa.
E no caminho de volta, falei pra Gabriel:
— Agora acabou.
— O quê?
— A paciência.
E o silêncio.
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Naquela noite, reuni o conselho comunitário.
— A gente tentou paz.
— Tentamos política.
— Tentamos diálogo.
— Mas tão tentando derrubar a gente na covardia.
Nando completou:
— Atacaram criança.
— E isso não passa — eu disse.
— Porque hoje…
a rainha vai agir como o trono exige.
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No dia seguinte, Darlan foi cercado na viela 12.
Pelos meus homens.
Sem sangue.
Sem escândalo.
Apenas… exilado.
— Vai descer o morro.
— E não volta.
— Porque se voltar… nem o povo que você tentou enganar vai te salvar.
Ele não respondeu.
Só cuspiu no chão e desceu.
Sumiu.
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Mas ainda havia o estrago.
Rosa chorava toda noite.
O bar do Seu Milton só reabriu por insistência da comunidade.
E eu?
Perdi outra parte da minha paz.
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— Você venceu. — Gabriel disse, me abraçando.
— Será?
— Claro.
— Ele se foi.
— Mas e amanhã?
— Amanhã é outro dia.
— Exato.
— E no morro… outro dia pode ser outro inimigo.
— Outra queda.
— Outro susto.
Ele me beijou a testa.
— E mesmo assim, você continua de pé.
— Isso te faz rainha.
Sorri.
Mas por dentro…
o trono seguia duro.
E o coração, cansado.