criando memórias

1073 Words
Mary sentiu seu coração bater mais rápido e sua respiração ficar curta, quase sufocada. Ela apertou o celular com mais força do que o normal. Suas mãos tremiam. — Ai, Mary, tá tudo bem? — perguntou Hana, que logo percebeu a mudança repentina na expressão do rosto da amiga. Mary piscou, tentando disfarçar. — É só… uma ligação. Depois eu atendo — disse, forçando um sorriso. Ela não atendeu. Apenas olhou para a tela até a ligação parar. Então, desligou o celular e o enfiou na bolsa, como se quisesse apagar aquele momento da sua vida. — Então vamos começar o ensaio, né? Porque temos muitas músicas pra escrever e muitas notas pra tocar — sugeriu Emma, animada, sem perceber o clima tenso. — Vamos — respondeu Mary, com a voz baixa, mas decidida. Ela respirou fundo. Estava cercada de novas amizades, com uma chance de viver algo diferente, sair da mesma rotina. Naquele pequeno espaço de música, risadas e apoio, ela começava a se lembrar de como era se sentir viva novamente. Mary pegou seu caderno de anotações, uma caneta e começou a rabiscar suas ideias enquanto ouvia as primeiras notas saírem do violão de Emma. — Isso pode ser um ótimo começo pra uma música — disse Emma, sem tirar os olhos do instrumento. Mary assentiu, olhando para o caderno. — Eu pensei em algo assim… — começou a ler em voz alta, mesmo com um pouco de vergonha: — “Guardei meus gritos, travei meu olhar, fingi que tava tudo bem só pra não pensar.” Hana, que estava ajudando a organizar os cabos perto do amplificador, olhou por cima do ombro e murmurou: — Legal. Gostei. Escreve isso. Yuri apertava algumas teclas do teclado, tentando encontrar o som certo para acompanhar as palavras de Mary. Aos poucos, a sala se encheu de sons, ideias cruzadas, risadas e energia. Era um pouco confuso, mas verdadeiro, vindo direto do coração. Emma sorriu ao ouvir as ideias de Mary. Seus olhos brilhavam com aprovação. — Exatamente o que a gente precisava. Isso é real. A gente vai transformar isso numa música linda! Mary sentiu o coração aquecer com aquelas palavras. Era estranho se sentir aceita pelas pessoas. Elas continuaram ali por horas, criando, testando sons, rindo dos erros e comemorando os acertos. Cada risada verdadeira parecia curar uma parte do coração de Mary. Quando o ensaio terminou, o sol já havia desaparecido, dando lugar à luz da noite que invadia as janelas. — Ai, gente, que tal a gente ir numa sorveteria aqui perto? — sugeriu Aurora, empolgada. — Sorvete depois dessa tarde produtiva? Eu topo! — disse Yuri, se levantando animado. Emma sorriu empolgada e pegou sua bolsa. — Eu tô dentro. A gente merece depois desse ensaio incrível, é o mínimo! Mary hesitou por um momento. Uma parte dela queria ir, mas o medo ainda falava mais alto do que seu coração. E se Theo descobrisse tudo? E se ele fizesse algo de novo? Ela sabia muito bem como ele era — ciumento, agressivo... imprevisível. Por um instante, quase disse que precisava ir pra casa. Mas então olhou para Emma, Aurora, Hana e Yuri — todos sorrindo, leves, sem pressão, sem medo. Pela primeira vez em muito tempo, ela se sentia parte de algo. Sentia que podia ser ela mesma. Ela respirou fundo. “Não posso deixar meu medo me vencer novamente”, pensou, já decidida. — Nós merecemos mesmo. Eu tô dentro — disse, com um pequeno sorriso. Aurora sorriu de volta, e só aquele olhar bastou para Mary ter certeza de que tinha feito a escolha certa ao confiar em suas novas amizades. Alguns minutos depois, chegaram à sorveteria. Era simples, mas cheia de charme. Luzes penduradas balançavam com o vento, e as mesas coloridas davam um ar descontraído ao lugar. Eles se sentaram todos juntos, rindo e experimentando diferentes sabores de sorvete. Mary estava ali, rindo junto, mas seu coração ainda carregava um peso. Enquanto experimentava um sorvete de açaí, olhou ao redor — Emma conversava com Aurora, Yuri tentava arrancar risadas de Hana. Aquele momento parecia saído de um filme, um instante perfeito entre amigos. Mas a angústia crescia dentro dela. Por mais que tentasse relaxar, o medo a cercava: e se Theo fosse até o apartamento de novo? E se ele tentasse agredi-la? Mary engoliu seco. Theo quase sempre aparecia de surpresa, e ela sabia que ele era imprevisível, controlador e sem remorso. Ela respirou fundo. Estava ali para se divertir com suas novas amizades, não para se preocupar. Emma olhou para Mary e percebeu que ela estava inquieta. — Tá tudo bem? — perguntou, preocupada. Mary forçou um pequeno sorriso. — Tá sim… eu só tô lembrando de umas coisas do trabalho, só isso — respondeu, tentando disfarçar. — Se tiver acontecendo alguma coisa, Mary, confia na gente. Não vamos julgar, só queremos ajudar. É pra isso que servem as amigas — disse Emma, com delicadeza. — Muito obrigada pelo apoio, Emma, mas não é nada, de verdade. Só umas preocupações de trabalho — insistiu Mary. Emma não insistiu. Apenas assentiu com a cabeça e deu um leve sorriso, como quem diz: “Tudo bem. Quando você estiver pronta, a gente tá aqui.” Aquilo confortou o coração de Mary, mesmo que ela não demonstrasse. Aurora tirou o celular da bolsa e olhou para a tela. — Gente, já tá ficando tarde, né? Melhor a gente ir pra casa. Mas antes, vamos tirar uma foto! Esse momento tem que ficar marcado pra sempre. — Ai, sim! — concordou Yuri, arrumando o cabelo. — Vai ser a primeira foto oficial do nosso grupo! Todos se levantaram e se reuniram, colados uns aos outros para tirar a foto. Aurora esticou o braço com o celular, enquanto Emma fazia careta e Yuri colocava o braço sobre a cabeça de Hana, fazendo um sinal com a mão. Mary tentou sorrir também, mesmo sentindo a angústia crescer em seu peito. Ao final da foto, todos riram e começaram a comentar os ângulos e expressões dos seus rostos. Mary se abaixou para pegar sua bolsa, que estava no chão. Nesse momento, sua manga subiu um pouco, revelando uma mancha roxa em seu braço. Hana, que estava ao lado de Mary, notou imediatamente. Seus olhos foram direto para o pulso da amiga e, por alguns segundos, franziu a testa. — Mary... o que aconteceu com seu pulso? — perguntou, desconfiada.
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