Capítulo 1 – O Início do Fim
Sicília, Itália.
Sob o céu tingido de cinza, a mansão de vidro e concreto se erguia silenciosa no alto de uma colina cercada por oliveiras centenárias. Nenhum som escapava de seus muros, exceto o sutil farfalhar das folhas ao vento. A propriedade era o retrato da modernidade e do poder silencioso — impenetrável, vigiada por olhos invisíveis, como seu dono.
Vincenzo Marino observava o horizonte do terraço, vestindo um terno preto perfeitamente ajustado. Os olhos verde-escuros, frios como pedra, analisavam o mundo como se fosse um tabuleiro de xadrez. Ele era o rei — intocável, absoluto, imune a emoções.
Era o Dom da máfia italiana, mas ninguém fora dos círculos sombrios sequer suspeitava. Ao público, era apenas o CEO brilhante da MarinoTech, a maior empresa de tecnologia e software do mundo. Um gênio recluso, de beleza c***l e elegância mortal. Nos bastidores, era um predador silencioso, moldado desde os oito anos para herdar o trono de ferro e sangue que seu pai, George, construíra.
Dentro da mansão, tudo era escuro e sofisticado. Mármore preto, aço escovado, vidros blindados. E sob seus pés, escondido no subterrâneo, o coração da sua máfia pulsava em segredo — onde os sussurros viravam ordens e os inimigos nunca mais eram vistos.
Vincenzo não amava. Não confiava. Não se importava. Apenas a mãe, Katherine, uma socialite elegante, a pequena Giulia de cachinhos dourados, e a avó Camilla recebiam migalhas da humanidade que restava nele.
Ao lado dele, seu primo
Lorenzo — seu conselheiro, seu único amigo verdadeiro — dividia o peso do impér
io. Criado como um irmão após a morte dos pais, Lorenzo conhecia cada camada da escuridão de Vincenzo... e ainda assim permanecia.
Naquela manhã, Vincenzo receberia uma notícia que, pela primeira vez em anos, fez algo estremecer sob sua fachada de gelo: a data do seu casamento foi marcada.
Em dois meses, ele se casaria com Sophie Miller. A filha escondida do Dom da máfia americana, uma jovem angelical prometida a ele desde os onze anos.
Ele nunca a vira. Mas sabia que ela existia. E agora, ela seria sua. Por obrigação. Por estratégia. Por poder.
Não por amor.
Amor era uma fraqueza.
E Vincenzo Marino não conhecia fraquezas.
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O gosto do café preto ainda amargo estava em sua boca quando o telefone vibrou sobre a bancada de mármore n***o. Era uma manhã silenciosa demais. As montanhas da Sicília estavam cobertas por uma neblina densa, e a mansão que reinava solitária entre as árvores parecia flutuar sobre um mundo morto.
Vincenzo Marino não gostava de surpresas.
Deslizou o dedo pela tela. A mensagem era curta, direta.
"A data está marcada. Dois meses. Ela chegará até você."
Assinada com o selo da máfia americana.
Ele não respondeu. Apenas fixou o olhar na paisagem através das janelas imensas, sentindo o peso daquela informação mergulhar lentamente em sua mente.
Sophie Miller.
A prometida.
A jovem que ele teria. Que pertenceria a ele. Que seria moldada, controlada, protegida — ou destruída — dependendo de como decidisse lidar com sua nova realidade.
Ele nunca a vira. Não precisava.
Para ele, era mais uma peça no tabuleiro.
Uma aliança com a máfia de Boston era estratégica, precisa, inevitável.
Mas havia algo inquietante nessa decisão.
Algo que ele não gostava de admitir.
Ela era... limpa demais. Inocente demais.
— Vincenzo... — a voz rouca e calma de Lorenzo o trouxe de volta. — Recebeu a mensagem?
Vincenzo assentiu devagar, sem tirar os olhos da névoa.
— Sim.
— E?
— E ela será minha. No tempo certo.
Lorenzo se recostou na parede de pedra polida da cozinha, cruzando os braços. Estava de barba por fazer, olhar atento. Sabia ler Vincenzo melhor do que qualquer um.
— Você parece mais tenso do que de costume.
— Não estou tenso — respondeu ele com frieza. — Estou me preparando.
— Para o casamento? — Lorenzo soltou uma risada breve. — Ou para não matá-la na primeira semana?
Vincenzo virou-se devagar, encarando o primo.
— Ela é uma aliança, Lorenzo. Não uma companheira. E eu não preciso gostar dela... apenas manter o controle.
Mas havia um desconforto sutil queimando sob a pele.
Uma lembrança antiga, enterrada, de uma noite silenciosa, quando o pai — George — lhe disse com voz grave:
"Algumas alianças não são forjadas com sangue, Vincenzo. São forjadas com paciência. E às vezes... com sacrifício."
Ele odiava sacrifícios.
Principalmente os que mexiam com a ordem perfeita da sua vida.
Girou a xícara entre os dedos antes de colocá-la sobre o balcão.
Olhou pela janela mais uma vez.
Dois meses.
A flor americana viria para o coração da escuridão siciliana.
E quando isso acontecesse...
Vincenzo não sabia se a transformaria.
Ou se ela o destruiria.
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Boston, EUA
O aroma de lavanda pairava no ar do jardim particular dos Miller. Sophie sentava-se no banco de ferro branco, com um livro de poesias no colo e uma xícara de chá de camomila entre as mãos. Usava um vestido azul claro, simples, com rendas discretas, e os longos cabelos negros estavam presos em uma trança frouxa. Ao seu redor, margaridas e lírios se inclinavam suavemente com a brisa da primavera.
Era o seu refúgio.
Era o único lugar onde se sentia livre... embora jamais tivesse experimentado a liberdade de verdade.
— Senhorita Sophie — a voz de Evelyn, sua ex-babá e agora empregada fiel, soou suave atrás dela — seu pai quer vê-la no escritório. Agora.
Sophie franziu o cenho, os olhos azuis brilhando com confusão.
— Aconteceu alguma coisa?
— Não sei, minha flor. Mas ele pediu urgência.
Levantou-se devagar, alisando o vestido com as mãos pequenas. Seu coração bateu um pouco mais rápido. O pai nunca a chamava para o escritório. Nunca.
Ao entrar na casa, cruzou o longo corredor até a porta dupla do escritório de carvalho. Sebastian Miller estava de pé, junto à janela, com as mãos nas costas. Liam, seu irmão mais velho, estava sentado na poltrona ao lado da lareira, olhando-a com uma mistura de pena e preocupação.
Ava, sua mãe, não estava ali. E Emma, sua irmã, provavelmente estava no shopping.
— Papai? — ela chamou, a voz baixa, quase infantil.
Sebastian virou-se lentamente. Seus olhos escuros e severos a avaliaram por um instante. Então ele respirou fundo.
— Sente-se, Sophie. Precisamos conversar.
Ela obedeceu em silêncio, apertando as mãos no colo.
— Você sabe que sempre fomos uma família com muitos inimigos, certo?
Ela assentiu.
— E sabe que tudo o que fazemos é para sua proteção.
Outro aceno de cabeça.
— Bem — ele suspirou, como se a próxima frase fosse um fardo — há onze anos, quando você tinha apenas sete, eu fiz um acordo com um aliado. Um homem poderoso. Um homem... perigoso. E esse acordo incluía você.
Os olhos de Sophie se arregalaram.
— Eu... não entendo.
— Você foi prometida em casamento, Sophie. A Vincenzo Marino. O Dom da máfia italiana.
O chão pareceu desaparecer debaixo de seus pés. A respiração ficou presa na garganta.
— O... quê?
— O casamento acontecerá em dois meses. Você irá para a Sicília.
Ela se levantou num salto, os olhos marejando.
— Isso é uma brincadeira? Um teste?
— Não é brincadeira — respondeu Liam, com a voz firme. — Eu também fui contra, mas papai tem seus motivos. Isso fortalece as famílias. E você estará segura com ele.
— Eu não conheço esse homem!
— E ele não conhece você. Mas conhecerá. Vincenzo é... complexo. Frio. Mas ele honra suas promessas.
— Ele é um mafioso — a voz de Sophie saiu falha, trêmula.
— E você é filha de um — Sebastian respondeu, sério. — Chegou a hora de crescer, Sophie. De assumir seu papel.
Ela recuou, o corpo leve tremendo inteiro.
Papel? Que papel?
Ela só queria cuidar das flores, ler seus livros, assar biscoitos com Evelyn.
Mas agora... agora ela era uma moeda.
Um acordo.
Uma peça sacrificada por algo que ela nunca pediu para fazer parte.
Quando saiu da sala, os olhos de Liam a seguiram com dor. Mas ele nada disse. Sabia que não podia protegê-la dessa vez.
Sophie subiu as escadas lentamente, cada passo mais pesado que o anterior.
Em dois meses, ela seria levada.
Entregue a um homem que nem sabia sorrir.
Um homem treinado para matar, não para amar.
E no fundo do peito, um medo gelado se enraizava.
Ela não sobreviveria a ele. Não inteira.