Entre o Luxo e a Tentação

1354 Words
A van sacudia levemente enquanto cruzava as ruas da cidade iluminadas, o ronco do motor misturando-se ao burburinho animado da equipe. Claire se apertou ao lado de Julie no banco de trás, observando os outros garçons e garçonetes recrutados para o evento. Todos pareciam habituados àquele tipo de trabalho — menos ela. Caio, sentado na frente, virou-se para encarar o grupo, seu olhar experiente varrendo cada rosto antes de começar a falar. — Como vocês sabem, essa festa é grande. O anfitrião é cheio da grana, e os convidados também. Vai ter outras equipes de garçons trabalhando com a gente, então é importante que ninguém vacile. Claire cruzou os braços, ouvindo com atenção. Sua postura era tensa, como se tentasse absorver cada detalhe sem deixar escapar nada. — O serviço é simples: servir bebidas, recolher taças e garantir que ninguém fique sem atendimento. Mas tem uma coisa que preciso avisar antes de chegarmos lá, para não serem pegos de surpresa — ele fez uma pausa significativa, varrendo o olhar pelo grupo. O tom dele mudou sutilmente, como se pesasse as palavras antes de soltá-las. — Alguns desses ricaços… gostam de fazer propostas particulares. Claire franziu a testa, seus dedos inconscientemente apertando a manga da blusa. — Que tipo de propostas? Julie se adiantou antes que Caio respondesse, um sorriso travesso brincando nos lábios enquanto cutucava a amiga. — Ah, Claire… — disse com um riso leve, mas perceptível. — Do tipo que envolve um quarto de hotel e muito dinheiro. Claire arregalou os olhos, a incredulidade estampada em seu rosto. — Você tá brincando, né? — Claro que não! — Julie riu, balançando a cabeça. — Você acha que esse povo milionário não tenta comprar tudo o que quer? Dinheiro abre portas, minha querida. Literalmente. Claire engoliu seco. Aquilo era algo que jamais tinha considerado. A ideia de ser reduzida a um objeto negociável fazia seu estômago revirar. — Relaxa — Caio interveio, sua voz calma, mas firme. — Ninguém é obrigado a nada. Mas é bom saber que pode acontecer. Não estamos aqui só para servir champanhe; precisamos estar preparados para qualquer situação. Julie ainda ria do choque estampado no rosto da amiga, claramente achando graça da inocência de Claire. — Olha aí, Claire… talvez seja a sua chance de perder a virgindade. E ainda com um bonitão cheio de grana! — Julie! — Claire sibilou, sentindo o rosto queimar até a raiz dos cabelos. Suas mãos subiram automaticamente para cobrir o rosto, tentando esconder o embaraço. — O quê? Se for bonito e pagar bem… que m*l tem? — Julie deu de ombros, ainda gargalhando. — É só um negócio, como qualquer outro. Claire escondeu o rosto nas mãos, completamente constrangida. — Você é impossível. — Só estou dizendo que dinheiro é dinheiro — Julie concluiu, dando um tapinha leve no joelho da amiga. — Pense nisso. Uma das garçonetes sentada mais à frente se virou, visivelmente interessada. — E… pode? Tipo, a gente pode aceitar esse tipo de proposta? Caio suspirou, como se já tivesse passado por aquela conversa inúmeras vezes. — Isso vai de cada um. Desde que não atrapalhe o serviço e fique no sigilo, ninguém tem nada a ver com isso. Claire permaneceu em silêncio, sentindo um leve desconforto crescer dentro do peito. A noite prometia ser muito mais complicada do que ela imaginava. O vento frio da noite batia contra as janelas da van enquanto o grupo se aproximava do local da festa. Claire ainda tentava digerir o que Caio dissera sobre os “convites íntimos”. A ideia era desconfortável — quase absurda —, mas ela não podia negar que os quinhentos reais oferecidos eram tentadores. Ainda assim, sabia que a situação era mais complexa do que parecia. Julie percebeu sua tensão e deu um leve tapinha em sua perna. — Relaxa, amiga. Isso não vai acontecer com você. Claire forçou um sorriso, mas não conseguiu esconder a apreensão. — Eu… eu não sei, Julie. Isso tudo é tão… estranho, sei lá. — Eu entendo — respondeu Julie, tentando aliviar o clima. — Mas pensa pelo lado prático: é só mais um trabalho até o fim do mês. Você já fez o que precisava pra sua mãe, né? Estamos aqui só pra ganhar uma grana e cair fora. Claire assentiu, ainda sem muita convicção. A van virou por uma rua mais afastada, onde mansões começaram a surgir em meio à escuridão. À distância, as luzes cintilantes denunciavam que o evento já estava a todo vapor. Claire podia sentir a energia do lugar — o luxo, a imponência, a sensação de que ela não pertencia àquele mundo. Quando a van parou em frente à enorme mansão iluminada, todos saíram em silêncio, absorvendo a grandiosidade do local. — Vamos, vamos! — disse Caio, batendo levemente no volante. — A festa não espera. E o dinheiro também não. Seguiram em fila até a entrada principal, onde um segurança imponente os aguardava. Sem dizer uma palavra, ele abriu a porta e fez um gesto para que entrassem. O interior da mansão era ainda mais impressionante que o lado de fora. Lustres de cristal pendiam do teto altíssimo, e o piso de mármore refletia as luzes de centenas de velas espalhadas em candelabros. Uma orquestra tocava suavemente, preenchendo o ar com notas elegantes, enquanto convidados vestidos com trajes impecáveis circulavam com taças de champanhe nas mãos. Claire sentiu como se tivesse atravessado um portal para outra realidade. Tudo era tão opulento, tão distante do mundo que conhecia, que por um instante se sentiu invisível. Ela observou os outros garçons se moverem com desenvoltura e agilidade. Já ela, precisava lembrar de respirar. Caio os conduziu até uma mesa preparada para o serviço de bebidas. — Fiquem atentos — disse em tom firme. — A festa tem seu próprio ritmo. Sirvam, recolham, sirvam de novo. E se alguém convidar vocês para “um momento mais íntimo”, lembrem do que eu disse: aceitem por conta e risco. Mas, acima de tudo, discrição. Sem escândalos. Nada de incomodar o anfitrião. Claire engoliu em seco. Um nó apertava sua garganta. Julie, ao seu lado, parecia se divertir com tudo aquilo. Aproximou-se e sussurrou: — Tá vendo, amiga? A grana aqui é boa. Pode até ser divertido. Claire olhou ao redor. O luxo estava em cada detalhe — da prataria aos arranjos florais. Sentia-se pequena, deslocada, como uma intrusa naquele universo reluzente. — Eu não sei se consigo, Julie. Não estou… — hesitou, buscando as palavras. — Não estou aqui pra isso. Só quero o dinheiro. Julie sorriu, com uma gentileza que raramente deixava transparecer. — Eu entendo. Mas ninguém tá te forçando a nada. Faz o teu, e o resto… você escolhe. As duas se dirigiram à mesa de bebidas, onde os outros garçons já organizavam taças e garrafas. Claire pegou uma bandeja, ajeitando-a nos dedos, e começou a circular entre os convidados, com um sorriso treinado no rosto e a mente longe dali. A cada olhar mais prolongado, sentia-se analisada, medida, avaliada. Como se não fosse uma pessoa, mas um objeto a ser adquirido. Foi então que um homem de terno escuro se aproximou, com um sorriso confiante. — Garçonete, traga-me mais uma taça de champanhe, por favor. Claire assentiu e foi buscar a bebida, mas ao retornar, percebeu que ele não havia se afastado. O olhar dele era firme demais. Invasivo demais. — Você tem um jeito muito elegante, sabia? Ela forçou um sorriso, tentando manter a postura. — Obrigada, senhor. Ele deu um passo à frente, ainda observando-a. — Gosto de mulheres que sabem o que estão fazendo. Você tem uma energia… diferente. Claire recuou discretamente, um arrepio percorrendo sua espinha. Procurou Julie com os olhos, mas a amiga estava ocupada em outro canto do jardim. Por um momento, sentiu-se sozinha no meio de uma multidão. Com a bandeja em mãos voltou a circular entre os convidados. A noite continuava, cada vez mais intensa. Música, risos, brindes e toques velados. Claire sabia por que estava ali — mas a realidade daquilo tudo era muito mais sufocante do que imaginava.
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