Dunas

1365 Words
Capítulo-XVIII. Dunas " Nas areias dessas Dunas não enterro o nosso amor, mas as incertezas que me impedem de ser feliz contigo " Varuna. O sol escorria dourado sobre as dunas quando o bugre arrancou em mais uma descida que me fez prender a respiração. Mas a verdade é que não era a velocidade que me deixava tenso — era ela. Camila. Ali, ao meu lado, com o vento bagunçando seus cabelos e aquele riso que parecia leve demais para caber na imensidão do mundo. Ela é bonita demais para caber nesse mundo Eu não estava preparado para tanto. A areia subia em nuvens ao nosso redor, o mar aparecia e desaparecia ao longe, e, ainda assim, era no rosto dela que meus olhos insistiam em repousar. Eu não me cansava de olhar para o rosto pequeno e angelical, não cansava de olhar para a menina delicada, dona de voz calma. O motorista parou em um ponto alto, onde as dunas se encontravam com o azul do horizonte, e anunciou que ali teríamos alguns minutos para apreciar a vista. Camila desceu animada, os pés afundando na areia quente. Eu a segui, tentando disfarçar o peso que o coração carregava só por estar próximo dela. Era estranho, ainda é estranho, porque perco-me de mim, encontro outro eu que não sou eu, mas sei que sou eu. Ela caminhou até a beira da duna, onde o vento soprava mais forte, e abriu os braços como se quisesse abraçar o mundo. Eu não aguentei. A cena era simples, mas havia algo de magnético em cada gesto dela. Puxei o celular do bolso e comecei a gravar. Queria registrar o sorriso verdadeiro e genuíno por provar de algo simples. O que é um passeio de Bugre ? O que é sentir os pés afundando na areia? O que é o vento colidindo contra o seu corpo? Para mim nada, mas para Camila ,dava para perceber, era tudo. — Você é linda demais… — murmurei, chegando por trás e envolvendo sua cintura, depois de guardar o celular no bolso. Camila se virou, surpresa, e foi nesse instante que roubei um beijo. Foi um toque suave, quase um pedido, que logo se aprofundou, roubando de mim qualquer equilíbrio. Senti o gosto salgado que o vento trazia do mar misturado ao doce da boca da menina, e pensei que talvez não houvesse lugar mais perfeito no mundo. Camila afastou-se devagar, o rosto corado, os olhos brilhando de timidez e alegria. — Você sabia… — começou, como se precisasse quebrar o silêncio que restara entre nós — que durante a Segunda Guerra Mundial, o Brasil quase foi invadido pelos Estados Unidos? Arqueei a sobrancelha, curioso com a mudança repentina de assunto. — Invadido? Como assim?- troquei o seu queixo e mais uma vez a abracei. Não queria distância alguma entre nós. Camila ajeitou uma mecha de cabelo atrás da orelha e falou com entusiasmo, mesmo que a voz soasse baixa por causa da vergonha. — É verdade. Durante a guerra, entre 1939 e 1945, o governo brasileiro estava indeciso se apoiaria as Potências do Eixo ou os Países Aliados. Os Estados Unidos já tinham um plano: invadir o Brasil justamente por aqui, começando pela praia de Genipabu. Mas, como o Brasil acabou se aliando aos Aliados, não precisou acontecer. Em vez disso, deixaram os americanos construírem uma base militar em Natal. Fiquei olhando para ela, fascinado. Não pela história em si, mas pela forma como ela a contava, os olhos acesos, a boca se movendo com paixão. — Então quer dizer que, além de passeio de bugre, eu ainda ganhei uma aula de história gratuita? — provoquei, sorrindo. Camila baixou o olhar, mordendo o lábio. — Desculpa, eu me empolgo. É que eu acho tão interessante conhecer as histórias escondidas por trás dos lugares. Para mim, não é só passeio… é cultura. Eu a admirei em silêncio, sem conseguir dizer nada. O vento brincava com os fios soltos do cabelo dela, e por dentro eu me perguntava como alguém podia ser assim: tão bonita, tão simples e, ao mesmo tempo, tão profunda. E então, sem pensar, as palavras escaparam da minha boca: — Eu te devo um banho de chuva… Não sei de onde veio aquela frase. Ela simplesmente surgiu, tão fora de contexto quanto verdadeira dentro de mim. Camila piscou, surpresa, mas logo um sorriso tímido desenhou-se em seus lábios. — Eu vou adorar. Mas só se você dançar comigo. — disse, a voz baixa, quase um sussurro carregado de coragem. Meu peito se apertou, expandiu-se, era como se eu aguardasse por essa resposta. A felicidade que brotou em meu inteiro ganhava o infinito. — Eu danço. — respondi, puxando-a mais ainda contra mim num abraço apertado. Por alguns segundos, fiquei ali, sentindo o calor do corpo dela contra o meu, como se a vida inteira se resumisse àquele instante. Depois, entre risos tímidos, tiramos fotos. Primeiro eu fotografei cada detalhe dela: o cabelo desalinhado, o sorriso espontâneo, o olhar sonhador. Ela fez o mesmo comigo, mesmo que eu odiasse fotografias minhas, me recordava sempre que foi através de uma pela qual descobri que sou um tipo de sósia do meu tio falecido. Por fim, tiramos apenas uma foto juntos, e essa eu fiz questão de guardar em uma pasta protegida por senha, inacessível a qualquer outra pessoa. Aquela lembrança era só nossa. Só minha. _ Envia para mim depois, por favor. Quero postar nas redes. Travei, um gosto azedo veio arruinar com o meu paladar. — Gosta de redes sociais? - indaguei com uma ardência no estômago. — Tenho algumas páginas, mas não me considero uma influence. Nem almejo isso, faço postagens de viagens porque gosto. Mas eu não gosto de exposição, minha vida social não permite. É todo caso isso não cabia ao momento, deixei de lado esse dissabor, foquei apenas na menina. Voltamos ao bugre e seguimos em direção ao restaurante à beira da praia. O passeio estava chegando ao fim, mas dentro de mim havia uma ânsia: eu não queria que terminasse ali. Cada minuto com Camila me fazia querer mais. Enquanto caminhávamos lado a lado até o restaurante, arrisquei: — Sai comigo hoje à noite. Ela me olhou, meio assustada. — Eu não posso… Meu pai não deixa eu sair sozinha à noite. Parei diante dela, firme. — Então espere ele dormir. Eu vou estar lá fora, na frente da pousada. Camila hesitou. — E… pra onde você vai me levar? Sorri de canto. — Segredo. Ela franziu o cenho, mordendo o lábio inferior, pensativa. Eu já sabia que ela estava prestes a ceder. — Vestido ou shorts? — perguntou, finalmente, os olhos tímidos, mas cheios de expectativa. Toquei seu rosto com a ponta dos dedos, acariciando de leve sua pele quente pelo sol. — Vestido. Porque a única pessoa que vai te ver… serei eu. Camila suspirou, e naquele gesto havia tanto quanto um “sim”. --- O retorno para Extremoz foi leve, regado a conversas banais, mas por dentro eu contava os minutos. Cada olhar trocado, cada riso, cada silêncio compartilhado me lembrava da promessa que pairava no ar: a noite ainda não havia começado. Enquanto Raul contava para Camila das minhas peripécias infantis, algumas sequer me recordava, surgia em mim um deleite inexplicável ao ver os dois conversando com tanta i********e, senti que algo dentro de mim se firmava: eu estava preso àquela menina de um jeito que não fazia sentido, mas que, de alguma forma, era a única coisa que importava. Genipabu não era mais apenas dunas, areia e mar. Era o cenário de um segredo compartilhado, de promessas sussurradas ao vento e de um desejo que crescia a cada instante. Eu sabia que esperaria por ela. Sabia que estaria debaixo daquela lua , diante da pousada, aguardando-a sair em silêncio, vestida como se fosse só minha. Vestida somente para os meus olhos. E quando isso acontecesse, não haveria guerra, passado ou barreira capaz de me impedir de viver cada segundo ao lado dela. Todos os beijos dela seriam reivindicando por mim e eu a devolverei somente ao amanhecer. Essa noite irei dormir ao lado dela. Ao lado da minha Camila.
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