Capítulo- LVI. Diamante
" Poucas coisas na vida tem o brilho do diamante, um sorriso sincero é uma dessas coisas."
Varuna
Um dia depois...
Acordo sentindo saudades da menina. Apenas um dia — um único dia — e já parece que minha carne está cheia de feridas. Sinto dor, muita dor. Não sei explicar a razão, nunca senti isso com ninguém.
Não perco tempo. Pego o celular e faço uma chamada para ela. Minhas mãos suam frias, o estômago pesa e uma leve palpitação toma meu peito.
— Oi... — ouvir a voz de Camila é como escutar notas suaves retiradas das teclas de um piano.
— Oi, menina... senti sua falta. Quero te ver.
O som gostoso do seu sorriso chega do outro lado, fazendo um sorriso se abrir no meu rosto.
— Também senti sua falta... também quero te ver...
— Hoje, agora, Camila. Vai para as Ruínas. Eu te encontro lá. Quero almoçar contigo numa praia perto daqui.
— Varuna, não posso! Tem o meu pai... ele não vai me dar permissão.
— Foge. Vem ficar comigo. Depois te deixo perto da pousada.
— Não posso fazer isso... se meu pai desconfiar, terei problemas.
— Camila... se você não for, vou parar o carro na frente dessa pousada e gritar o seu nome a plenos pulmões até você vir me atender.
Ela solta uma gargalhada gostosa.
— Para com isso, seu louco! Não pode fazer isso, vão chamar a polícia.
— Se eu tiver que prestar contas a um delegado só para ter um beijo seu, eu faço.
Outra gargalhada. Meu coração dispara.
— Eu amo o som do seu sorriso, da sua voz, a cor dos seus olhos, do seu cabelo...
— Também gosto de muita coisa em você...
O silêncio domina a ligação por alguns instantes.
— Está onde?
— Deitada na cama, lendo.
— Aceita, Camila. Vem pra mim. Ficamos muito tempo separados.
Ouço seu suspiro forte.
— Eu vou... é loucura, não gosto de inventar desculpas para o meu pai, mas quero te ver.
— Vá para as ruínas da Igreja. Tome um carro de aplicativo, eu te envio o dinheiro pelo pix.
— Não precisa, Varuna. Eu tenho dinheiro. O que eu visto?
— Shorts. Os vestidos, coloque apenas para mim, quando estivermos sozinhos.
Ela ri.
— Estou saindo agora de casa, Camila. Me espera, minha menina.
— Estarei te esperando.
Desligo a chamada e corro para escovar os dentes, dando uma última olhada no espelho.
Ao sair do quarto, encontro meu avô na sala, assistindo a um canal de política.
— Onde estão todos? — pergunto, estranhando o silêncio.
— Foram passear de barco. Eu não quis, fico enjoado. E você, para onde vai com tanta pressa?
Me aproximo, dou-lhe um beijo na cabeça coberta de fios brancos.
— Ver a Camila. Quero levá-la para almoçar num restaurante de Genipabu. Everaldo fala muito do lugar.
— O que sente por essa menina, meu filho?
— Não sei explicar, vô. É intenso, me domina... a sensação de que a conheço é avassaladora.
— Tem espaço para um velho cansado nessa jornada? Quero saber quem é essa linda menina que está abalando meu neto.
— Tem, vô. Mas vai segurar vela, estou avisando.
— Não ligo. Estou igual a um candelabro: antigo, velho e cheio de poeira.
Sorrio com a comparação.
— Deixa um bilhete. — aviso, indo até a cozinha para beber água gelada.
Minutos depois, saímos de casa rumo a Extremoz. Dirijo ouvindo música baixa, enquanto meu avô segura um livro lacrado cuja capa mostra uma caveira pedindo uma mulher em casamento.
— Vô, pra que esse livro? — pergunto, estranhando.
— Sou um cavaleiro, não um cavalo. Vou conhecer uma dama, tenho que levar um presente. Posso ser velho, mas tenho etiqueta.
Sorrio, balanço a cabeça em negação. Não digo mais nada. Pessoas vividas têm manias e uma educação diferente da atualidade.
Minutos depois, já em Extremoz, arrepios percorrem meu corpo. Uma sensação estranha cresce no estômago.
— Vai na hospedagem onde ela está?
Olho para ele.
— Combinamos em outro lugar.
— Onde?
— Nas ruínas, vô.
Acelero na direção das ruínas. Quando o carro se aproxima, vejo minha menina caminhando pelo espaço, olhos voltados para o chão. Usa shorts brancos largos, regata azul clara, cabelos soltos, e carrega uma pequena bolsa.
Ela olha na direção do veículo. Pisco os faróis. Vejo seu sorriso e meu coração dispara feito louco. Sorrio — não há como ser diferente. A presença dela parece fazer o sol brilhar mais.
— É ela... — ouço o sussurro do meu avô.
— Sim... é a minha menina, vô. Linda, não?
— Igualzinha... muito bonita.
— Me espera aqui, já volto.
— Não vou a lugar algum, Varuna.
Saio do carro. Meus passos me guiam até ela. A ansiedade me corrói.
— Camila. — chamo, saboreando seu nome.
— Estou aqui, Varuna. — responde, vindo em minha direção.
Nos encontramos. Nos abraçamos. Não espero mais um segundo: beijo seus lábios. A saudade implora por esse contato. Encerro o beijo puxando levemente o lábio inferior dela entre os meus.
Camila abre os olhos e sinto que o mundo desperta em mim — um mundo novo, desconhecido. Minhas memórias ganham cor, o silêncio feroz se quebra com o som delicado de sua voz. Parece que ela é a carne que faltava em mim. Agora, as palavras têm mais sentido. As tardes também. Ela não sabe por onde andei, desconhece que é a chave que abre mil portas dentro de mim.
— Você está linda. — elogio, pegando suas mãos e beijando uma de cada vez.
— Você também... te trouxe um presente. É simples, mas é de todo o meu coração.
Quero dizer que o maior presente é ela, que tê-la aqui é tudo o que eu desejava — mesmo sem entender a razão por trás disso.
— Não precisa, Camila.
— Como não? Você me presenteou com uma tarde incrível. Quero retribuir.
Ela tira da bolsa uma caixinha de veludo azul. Abre com cuidado e levanta uma corrente: um escapulário.
— Foi minha mãe que me deu. De um lado, a imagem de São Miguel Arcanjo, e na plaquinha, uma frase.
Pega minha mão e deposita o escapulário.
— É lindo. Obrigado, Camila.
— É de prata. Pode tomar banho com ele.
Seu sorriso é como céu aberto. Coloco o presente e o guardo dentro da camisa. Dou um beijo rápido nela.
— Quero que conheça alguém. — digo, segurando sua mão pequena.
— Quem? — pergunta, curiosa.
— Meu avô. Ele vai conosco. Tem algum problema?
— Nenhum. Vou gostar muito de conhecer alguém tão próximo de você.
— Você tem avós vivos?
— Sim. Sou muito apegada ao meu avô Everaldo. Ele que me ensinou a dançar.
Sorrio.
— Meu primo se chama Everaldo.
— Nossa, que coincidência.
— Muita.
Chegamos ao carro. Antes que eu abra a porta para ela, meu avô desce, o rosto vermelho como se tivesse chorado. Ele sorri.
— Então você é a menina que faz meu neto sorrir feito um bobo?
Camila fica sem graça, sorri tímida.
— Vô, por favor...
— Shiu! Deixa eu receber a atenção dessa bela jovem. — Raul me repreende.
— Prazer, eu sou...
— Camila. Eu sei, minha jovem. Te trouxe um presente. Gosta de ler?
— Sim.
— Esse livro vai aquecer suas noites e preencher seus dias.
Camila pega o livro, lê a capa.
— Paixão Póstuma... nunca ouvi falar. É bom?
— É divino. Vai mexer com seu coração e sua alma.
— Obrigada. Vou ler.
Ela sorri e meu avô a abraça, beijando o topo de sua cabeça, tomado por uma emoção que raramente vejo nele. Camila retribui o abraço.
— Vamos almoçar. — digo, quando eles se separam.
— Vamos, meu neto. Se eu respirar mais um pouco, vou passar vergonha na frente dessa moça linda, porque minhas calças vão cair.
Camila ri. Eu só consigo admirar o meu pedacinho de diamante.