Medo

1048 Words
Luísa Só quando entrei em casa, é que comecei a parar de tremer. - Lu, você é burra menina? - A Manu veio metade do caminho brigando porque eu recusei o dono do morro, e agora, ela brigava porque eu terminei de contar como eu o enfrentei. - Ele podia ter dado um tiro na sua cara por desafiar ele assim! - Ele queria me comer, não me matar! - Encarei a minha amiga, e senti os meus nervos em desespero. Ela percebeu o meu medo. - Ele não ia te obrigar. - Ela afirmou, vendo o meu medo. - Ele matou o antigo dono do morro por estuprö. Jack não sobrevive no morro. - Ela falou da lei mais absoluta do morro do Alemão. - Isso que me deu coragem, confesso! - Falei, mas a minha amiga ainda estava preocupada. - Não te violentar não impede que ele te mate, Luísa! Você poderia ter dito não sem ser, bem, você! - Eu fui normal, Manu! - Ela arregalou os olhos. - Exatamente! Você foi fria e desdenhou do homem mais poderoso desse lugar! Estou mesmo aliviada, mas ainda surpresa, que você esteja viva! - Eu também. - Respirei fundo. - Deveria ter mentido que era casada. Ou sapatão. Sei lá! - Ela sugeriu, mas eu não estava mais prestando atenção. Agora, na segurança da minha casa, eu me permiti confrontar o que eu fiz. Ele era um homem letal, todo mundo sabia disso. Em dois anos ele limpou o morro de tudo que era escória e agora reinava supremo. Ganhou o respeito dos moradores, e o único desvio de caráter, era o quanto desdenhava as meninas que comia. Ele era um homem de muitas mulheres, e metade das minhas vizinhas já foram para a cama com ele, para depois serem expulsas sem cerimônia. Essa marca era uma que eu não precisava carregar, não quando eu já carregava tantas. - Já que você não está mais me ouvindo, vou descer pra casa! - A Manu avisou, me deu um beijo e saiu pela porta. Ela continuava morando com a tia Rosa na casa debaixo. Depois que eu comecei a trabalhar, construí a minha casa com muito esforço, e ainda estava pagando pelos pequenos luxos que eu tinha. Depois de começar a trabalhar na boate, eu consegui viver com mais tranquilidade e comprei uma motinho, que era o meu xodó. E mesmo que eu não lembrasse de nada, antes de acordar no hospital, eu sabia que certos confortos eram indispensáveis. A minha cama king, que precisou de 3 homens, para colocar aqui em cima, era uma delas. Depois de dormir em lugares terríveis por 3 anos, esse foi o primeiro sonho que realizei, depois de ter 4 paredes minhas. Dormi muito mäl naquela noite, e quando desci para a mercearia da tia Rosa, na manhã seguinte, eu me sentia péssima! - A noite foi badalada, filha? - Ela serviu café e um pão na chapa para mim. - Acho que sim. - Respondi e passei a comer em silêncio, enquanto ela atendia alguns clientes que apareciam. Ela era o mais próximo de uma mãe para mim. Durante o meu tempo no orfanato, ela foi a única esperança que eu ousei ter. A tia Rosa trabalhava na cozinha, e eu soube depois, que ela adiou a aposentadoria por minha causa. No dia em que fui colocada na rua, com nada mais do que uma mochila de roupas, ela me enfiou em um ônibus e me trouxe para a casa dela, e estou aqui desde então. A Manu já sabia tudo sobre mim, e de lá para cá, eu nutri um amor intenso pelas duas. Eu teria deixado o Rei do morro fazer o que quisesse comigo, se elas estivessem seguras. Foi nisso que pensei quando enfrentei ele ontem. Queria que qualquer loucura dele fosse concentrada em mim, e apenas, em mim. - Bom dia tia! - A voz conhecida chamou a minha atenção e eu me encolhi quando vi quem era. O menino que me tirou do meio do baile para encontrar o dono do morro. Abaixei a cabeça, e por sorte, a pilastra me escondeu. - Jonathan, o que faz aqui tão cedo? - A tia perguntou. - Pegar pão pro Rei. - Ele contou. - Esse homem come alguma coisa além do que você compra aqui para ele? - Ela ralhou com o menino e eu quase implorei para ela vender o pão e deixar o menino ir embora. - Ele gosta da sua comida, tia. E c sabe né, o Rei feliz deixa o povo feliz! - Eles riram do comentário do menino e eu me encolhi mais. - Ele não está feliz hoje? - O menino deu de ombros, pegando o saco de pão que a tia ofereceu para ele. - Ele nunca me falou dos sentimentos dele, mas c ta ligada tia, que ele é solitário. - To ligada. - A senhora tentando usar as gírias dos cria do morro sempre me arrancava um sorriso. Por isso a mercearia era tão famosa aqui. Pessoas vinham do topo do morro para comprar as delícias que ela fazia, e isso incluía os homens do Rei do morro! Lembrei do homem, de como ele parecia certo de que eu me jogaria aos pés dele, e depois, como ele pareceu surpreso e até quase satisfeito por eu ter recusado. Ele é um homem bonito, e se fosse em outra situação, eu até consideraria conhecer ele melhor. Bem, se ele não fosse um criminoso procurado, um assassino e chefe do comando. - Leve esse doce pra ele, diga que quero ele sorrindo. - A Tia Rosa entregou um pacote, que eu sabia, que tinha sonhos de doce de leite, para o menino. - Todo dia tia, ele tá triste. - Ela deu uma risada alta para o menino. - Não sou burra, Jonathan! - A tia ralhou da tentativa de enganar ela. - Saia daqui! - O menino obedeceu e ela voltou a atenção para mim. O olhar dela parecia cheio de determinação e eu me encolhi de novo. - O que eu fiz? - Perguntei, prevendo uma bronca. - Vai me contar, ou vou precisar arrancar de você, porque você tremeu, quando o menino falou do Rei?
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