Delegacia da policia de Santa Rita do Trivelato.
Vicente está sentado na frente do chefe há mais de uma hora. O promotor Santos não está nada feliz e nem poderia, já que a exatamente três dias uma jovem foi sequestrada em público, no meio do discurso do próprio pai, o candidato a prefeito Hugo Soares. Ninguém conseguia entender o que acontecera, em um minuto a jovem estava lá, no outro havia sido levada sem nenhum aparente motivo. Todos esperavam um pedido de resgate, mas nada aconteceu e agora o governador havia informado que o caso se tornara problema da policia federal.
A cidade era pequena e ninguém estava acostumado a ver tanta policia pelas ruas, na verdade eles não gostavam, pois se sentiam expostos demais.
Verônica era conhecida por se meter em confusão. Bebendo no cemitério ou invadindo o sistema da polícia para copiar dados de seriais kilers. Metade do departamento achava que ela era uma maluca ou era uma criminosa perigosa. Mas o promotor sabia que tudo aquilo era uma tremenda baboseira. Ela era de família rica e ele há tempos tentava fazer com que a jovem se interessasse por seu filho, mas ele era um "banana”, viu a garota sendo sequestrada e não vez nada:
– Eu não quero nem saber se temos ou não policiais disponíveis! Esse caso é nosso. – O promotor grita quando Vicente tenta argumentar que seus policiais não podem dar conta de tudo. – Já faz três dias e não temos nenhuma pista, droga!
– O senhor sabe que não há muito que se fazer. Os sequestradores não fizeram nenhum contato. Todas as testemunhas tem uma discrição diferente do homem, já prendemos cerca de cinco pessoas que não passavam de meros traficantes.
– Mas também não encontramos um corpo. Ela ainda pode estar viva.
– Sinto muito promotor, mas as chances são mínimas. – Vicente sabia bem mais do que dizia ao chefe, mas ele estava acostumado a mentir, era isso o que fazia pela família.
– Fala isso para o pai dela! p***a! – Santos dá um soco na mesa assustando Vicente. – Ele provavelmente será o novo prefeito, está disparado nas pesquisas. Estamos ferrados! Prepara-se pra perder seu cargo Vicente!
– Desculpa interromper senhor. – Carina, uma secretária, entra com a cabeça baixa, tentando se esconder, mas tanto Vicente quanto Santos nota que ela é muito bonita. – Os federais estão aqui.
– Droga!!
– Desculpe- me senhor. – Carina murmura.
– Tudo bem. – Ele abaixa o tom de voz e sorri para Vicente, um sorriso malicioso. – Só peça que eles entrem.
Carina sai da sala. Santos fica encarando seu quadril e depois volta a olhar para Vicente que o observa com curiosidade.
– É uma bela garota. – Santos está claramente interessado na jovem secretária. – O que vamos fazer com os federais?
– Nada. Nós fizemos tudo o que estava em nosso alcance. – Vicente da de ombros e solta um suspiro de alívio.
A secretária do Departamento de polícia avisa que o promotor e o delegado civil está a espera dos dois agentes federais. Os dois sorriem para ela e continuam a conversar sobre o futebol. Carina senta-se na sua mesa e repara em um dos agentes, o que conversa sempre com um sorriso, ela está cansada dos policias velhos e depravados que dão em cima dela, aquele agente federal é bonito, importante e claramente bem educado, a ponto de não olhar para ela com desrespeito. O único problema é que usa nome falso, todos os federais costumam usar. Zack é um nome o qual nenhum brasileiro usaria em circunstâncias normais.
O promotor é um homem experiente e cheio de arrogância, mas quando os federais estavam no caso... Bom, eram eles que decidiam quando iriam conversar.
Smith e Zack se vestiam igualmente. Terno preto, camisa branca e gravata preta, o cabelo cortado baixo. Eles eram jovens, muito jovens, mas ninguém se atreveria a desafia-los. A polícia federal sempre seria um patamar acima de qualquer coisa. Por isso até os nomes verdadeiros eram poupados.
– Vamos lá? – Zack tira o sorriso do rosto e arruma a gravata. Smith deixa a arma e o distintivo a mostra.
Os dois entram na sala ao mesmo tempo. Cada um se posiciona em um lado da mesa de modo a intimidar.
– Você ai! – Smith aponta pra Vicente. – Traga todos os documentos do caso 097.
– O quê? – Vicente levanta da cadeira claramente irritado e surpreso. O Arquivo 097 não deveria ter nada a ver com o sequestro. – Esse caso é meu.
– Era. O governador me tirou das minhas férias no Caribe pra isso. O caso agora é da polícia Federal.
– Mas o 097 é sobre o Caçador, vocês estão aqui por causa do sequestro. Não é?
– Sim. – Zack coloca a mão na cintura e apalpa a sua arma. – De duas uma delegado, ou vocês são idiotas ou estão fazendo vista grossa pra esse psicopata. É obvio que os dois casos estão ligados.
Vicente senta-se perplexo. Santos está encarando-o da mesma maneira. Os federais se entre olham com um sorriso frio no rosto, o delegado vem sendo investigado a anos pela corregedoria.
– O caso é nosso. – Zack repete. – Quero todos os documentos referentes ao caso e quero falar com as testemunhas.
– Nunca houve testemunhas. – Vicente fala consternado.
– Isso é o que veremos.
Os federais sabiam que em uma cidade tão pequena como aquela que havia somente cinco mil habitantes, não poderia haver um serial killer e um sequestrador, não podia ser duas pessoas diferentes. Sequestradores pedem resgate, psicopatas matam, mas quem está com Verônica tem objetivos completamente desconhecidos, foge de qualquer padrão.
Os agentes têm noventa por cento de certeza que o Caçador e o sequestrador são as mesmas pessoas e eles iam ainda mais além em suas suposições, o serial killer havia cometido um erro.
Antes de comparecerem na delegacia Zack e Smith receberam fotos e arquivos da tal garota Verônica Soares, 19 anos, atualmente com os cabelos vermelhos, 1,69 de altura, anos de malhação na academia e uma pele rosada que combinam perfeitamente com os belos olhos negros. Uma garota bonita e astuta, que não deixava as regras a impedirem de tentar algo. Os testes psicológicos realizados quando foi apreendida por acessar arquivos da policia havia acusado um nível mediano de psicopatia, a garota poderia se tornar uma psicopata ou não, era cinquenta por cento para cada possibilidade.
Lendo o caso sobre o Caçador os agentes descobriram a possibilidade de haver herdeiros, um já reconhecido como Estripador que agia em uma cidade onde uma base militar estava instalada, era um mistério, mas os cortes e vísceras de fora mostravam que os dois estavam ligados, com a única diferença de que o Estripador era canhoto e matava bem menos. O outro não havia matado ninguém, parecia que ainda estava sendo treinado ou era só mais uma vitima, algo o que ainda estudar durante o caso, mas os agentes estavam atentos. Talvez Verônica fosse bem mais do que uma vitima.
– E então delegado? – Smith sorri, um sorriso frio, por que estava sendo propositalmente irônico. – Cadê os arquivos?
– São cinco caixas, vai demorar algumas horas e eu não desço no arquivo agente. – Vicente tenta parecer mais profissional e confiante do que realmente está, ele não vai deixar que os agentes percebam o que ele esconde. O Caçador o mataria.
– Duas horas delegado ou pessoalmente irei caçar sua licença.
Zack e Smith saem da sala do promotor e se dirigem ao quarto de hotel que o departamento federal destinou a eles. Ao lado ficam os quartos pessoais, equipados com duchas quentes, banheiras e hidromassagens, mas aquele era o escritório. Lotado com monitores de segurança, arquivos que já detinham sobre o caso, informações sobre testemunhas, que o delegado Vicente n**a existir, e as fichas criminosas de dezenas de homens, prováveis candidatos a Caçador.
Em um canto uma mesa se destaca por conter armas, coletes, algemas e distintivos, mas a preferida deles ela a mesa no centro, cheio de sanduiches, rosquinhas doces, refrigerante e café para as noites em claro.
A missão caça ao Caçador começara, os federais não estavam de brincadeira.
– O que achou do delegado? – Pergunta Lou, a responsável por tecnologias na equipe, ela era quem acompanhava os rastreadores que os agentes inseriram no promotor e no delegado, ambos suspeitos de corrupção.
– É um cara abusado. – Smith bebe seu café enquanto Zack preenche alguns formulários. – Tem algo nele que me incomoda.
– Como se escondesse algo. – Zack murmura erguendo os olhos do computador por um momento.
– Ele pode ser o Caçador?
– Talvez. Mas acho que é cumplice, o cara estava tremendo quando nos viu.
– Deve ser um sociopata, deve receber favores do Caçador e retribui da mesma forma.
– Mas por quê? Qual é a relação dos dois?
– Melhores amigos, amantes, parentes. Há enumeras possibilidades.
Lou digita algo em seu notebook e acessa a ficha do delegado. Sem pais ou irmãos, é divorciado e tem um filho de dois anos com uma prostituta. Nada que seja prova de desonestidade.
A companhia toca. Lou se levanta e pede a senha e a pessoa responde com a voz meio rouca e amedrontada, todos já sabem que é o estagiário, ele morre de medo de cometer um erro e está caidinho por Lou.
– Trouxe os arquivos? – Pergunta Rock, um cara grande, careca e que só fala rosnando, como se sempre estivesse com raiva. Era ele que fazia as prisões, usava a força se necessário.
– Estão subindo as caixas. Está aqui é a mais recente.
– Queria saber por que estavam arquivadas se o caso está aberto. – Zack pega a caixa e coloca em cima do balcão. Cada agente pega uma pasta e começa a ler enquanto almoçam.
Passam horas e todos estão exaustos. Nada parece anormal nos arquivos, um outro erro de arquivamento, mas nada que pudesse incriminar o delegado, nada até o achado de Trainee, que é nada mais do que estagiário em inglês. Ele se levanta e tropeça nas palavras quando vai interromper o agente Zack, comandante na missão:
– Se-senhor. – murmura. – Achei algo.
– Mostre.
– O arquivista disse que haviam seis caixas, não cinco, como informou o delegado. Trouxe as seis, uma delas tinha uma etiqueta descrevendo a caixa como trotes ou enganos. Esse bilhete destacou a minha atenção, quem atendeu a ocorrência foi um cabo que registrou a ocorrência, mas Vicente ordenou que ele ignorasse e arquivasse as provas.
– O que fala no bilhete?
– “Meu pai é um assassino. Se alguém estiver lendo isso agora, por favor, me ajude, não tenho mais forças para aguentar, tentei pedir a ajuda de uma de minhas professoras, mas ele descobriu, ela corre perigo. SOCORRO!” – Trainee lê o bilhete e estende-o para Lou analisar. – Acontece que no mesmo ano, dois dias depois, uma professora foi morta, a mãe dela afirmou que o pai de um aluno deveria estar envolvido, mas o garoto e a família sumiram, a namorada do garoto testemunhou alegando confirmar a informação e então nós a protegemos, ela está em um lugar vigiado por agentes federais.
– Prenderam alguém?
– O delegado Vicente disse que não tinha provas suficientes e encerrou o caso alegando ser um latrocínio.
– Como a professora morreu?
– Um corte na garganta, sangrou até a morte. – Trainee analisa o arquivo. – Ao menos essa é a informação que o legista passou, um assistente discordou por um tempo, mas acabou se calando e sendo transferido.
Zack coça a cabeça. O caso é bem mais complicado do que se esperava. Ele analisa os documentos, o testemunho do assistente e da suposta namorada do garoto do bilhete e então liga para a central.
– Preciso que me mandem todas as informações sobre testemunhas protegidas por nós na cidade de Santa Rita do Trivelato. – Desliga o telefone e se dirige a Lou. – Ache o assistente do legista e o cabo, quero falar com eles. Mas faça isso amanhã, vamos dormir.